A Substituta

ESSA HISTÓRIA TAMBÉM NÃO ME PERTENCE, É UMA ADAPTAÇÃO DA OBRA DE MARGARET ROME

— Pecaminosamente rico e bonito, pecaminosamente atraente! — Assim a irmã de Kagome, Kikyou, descreveu Sesshoumaru Taisho, o grego de quem estava noiva. Mas havia um problema: Kikyou agora havia fisgado um peixe maior e não estava mais interessada em Sesshoumaru. E coube a Kagome a desagradável tarefa de ir até a Grécia dar-lhe a notícia. Só que Kagome não sabia da tragédia que acontecera a Sesshoumaru naquele meio tempo. Uma tragédia que a levaria a se apaixonar por ele e a se deixar usar como um objeto por aquele homem sem escrúpulos, da mesma maneira indefesa como se deixara manipular pela irmã, durante a vida toda...

Capítulo 01

- Não estou entendendo! – Perplexa; Kagome examinou mais uma vez, com seus bonitos olhos acinzentados, o rosto despreocupado da irmã. Sabia, instintivamente, que aquele ar de desafio não passava de uma fachada. – Se você tem mesmo medo desse homem. . . Desse grego que conheceu durante as férias. . . Por que concordou em se casar com ele?

Quando Kikyou abaixou seus brilhantes olhos azuis para o tapete, o espanto de Kagome atingiu o ponto máximo. Pela primeira vez, em vários anos de convivência, sua irmã mais nova mostrava sinais de embaraço: de cabeça baixa, esfregava um pé no outro, o rosto vermelho como um pimentão! Isso tudo trouxe à mente de Kagome a lembrança de seus dias de escola primária quando, decidida a proteger Kikyou, aceitava ser castigada pelos erros dela.

- Você precisa ser sempre tão "certinha"? – Como sempre, Kikyou reagia com ressentimento ao menor sinal de crítica. – Estou cansada de ouvir os seus sermões e não agüento mais essa história de todo mundo mandar eu me comportar direitinho, de acordo com a posição de papai. Que posição, pelo amor de Deus! - Irritada, ela indicou com um gesto a modesta sala de visitas. - Dê uma boa olhada na nossa casa - desafiou a testa franzida distorcendo as feições bonitas - e reconheça que ela não chega nem aos pés do tipo de lugar onde poderíamos estar vivendo. Nunca vou entender como uma moça bonita, como dizem que nossa falecida mãe era, que foi criada numa mansão, rodeada de luxo desde o dia em que nasceu, pôde jogar tudo fora para se casar com um pastor sem dinheiro e que, mesmo na juventude,nunca manifestou a menor vontade de subir na vida! E que hoje, vinte e cinco anos depois, continua sendo simplesmente o reverendo Philiph Higurashi, o pastor de uma paróquia pobre de dar pena em qualquer um!

Apesar de estar horrorizada com o desabafo da irmã, Kagome conseguiu manter a voz firme e dizer com simplicidade:

- Eu acho que, para mamãe, foi muito fácil se apaixonar por uma pessoa adorável como papai.

Durante alguns segundos o silêncio envolveu as duas irmãs. Depois, abruptamente, o corpo tenso de Kikyou desabou nos braços de Kagome.

- Desculpe - ela soluçou por entre lágrimas - na verdade eu não quis dizer nada disso. Ninguém melhor do que eu sabe a sorte que temos de em ser filhas de um homem tão carinhoso, amoroso, generoso e meigo como papai! Não sei por que... Não sei como pude falar tudo aquilo dele...

- Você está muito nervosa! - depois de mostrar que a perdoava, com um rápido abraço, Kagome empurrou a irmã para um sofazinho ali perto e sentou-se ao lado dela. - Chorar não é próprio de você. Sua vida tem sido tão cheia de alegria e atividade, nos últimos dois anos, que pensei que já nem soubesse mais como se chora. Desconfio que seu misterioso grego tem muito a ver com essa choradeira. E como até agora ainda não descobri que estória é essa, acho melhor você me contar tudo, tintim por tintim.

Kikyou não atendeu imediatamente ao pedido da irmã e, sabendo que ela precisava de um pouco de tempo para se recuperar, Kagome não a pressionou. Sentada, em silêncio, esperou a garota se sentir suficientemente bem, para poder explicar sua estranha perda de controle.

Apesar de se esforçar para aparentar calma, Kagome estava muito preocupada e surpresa com o ressentimento demonstrado pela irmã. Embora ainda não tenha completado vinte anos, Kikyou era uma garota extremamente sofisticada. Assim que saiu da escola, ela resolveu que queria mesmo era se divertir. Não perdia bailes nem jantares, sempre acompanhada por uma legião de rapazes, que conhecia durante as inúmeras visitas que fazia aos parentes ricos.

Kagome não costumava aceitar os convites que recebia da família de sua mãe. Não que se sentisse inferior, mas seria impossível esticar ainda mais o magro orçamento familiar e comprar as roupas necessárias para freqüentar aquele ambiente sofisticado, sem fazer feio.

Mais uma vez Kagome examinou, cheia de admiração, o rosto bonito e vivo da irmã. E ficou preocupada quando viu o modo como Kikyou mordiscava, com seus dentes muito brancos, o trêmulo lábio inferior.

- Conte-me tudo, Kikyou – encorajou com delicadeza. – Nunca vi você hesitar tanto para fazer uma confidência!

- Você vai ficar zangada comigo, Kagome! Tenho certeza disso!

- Não vou, não – Kagome prometeu o brilho divertido dos olhos desmentindo a expressão solene de seu rosto. Desde criança, Kikyou mostrava uma certa tendência para dramatizar as coisas.

Depois de lutar durante alguns momentos para encontrar as palavras certas, Kikyou começou, aparentemente envergonhada:

- Sei que foi errado da minha parte esconder o meu noivado de você e de papai. Mas, para dizer a verdade, depois que voltei para casa, esse noivado foi ficando cada vez mais irreal... Como se fosse um sonho, muito bonito e excitante enquanto durou, mas não tão curto que era fácil acreditar que nunca teria acontecido, na realidade.

- Se bem me lembro - Kagome falou gentilmente, quando viu que a irmã estava a ponto de se perder em seu mundo de sonhos - você ficou noiva desse grego durante as férias que passou a bordo do iate do primo Miroku, não foi?

Kikyou fez um gesto com a cabeça, concordando.

- Estávamos navegando no mar Egeu, quando uma tempestade repentina nos obrigou a procurar abrigo em algum porto. O lugar mais próximo era uma ilha, e fomos pra lá. Quando chegamos, descobrimos que ela pertencia a um grego muito rico, Sesshoumaru Taisho, que costumava usá-la para fugir às pressões exercidas pelo mundo dos negócios.

-Tanta riqueza até parece uma coisa pecaminosa - comentou Kagome, que era capaz de ficar impressionada com a posse de um simples terreno.

Kikyou levantou a cabeça abruptamente, olhando com respeito para a irmã.

-Essa palavra descreve tudo perfeitamente bem!Sesshoumaru é pecaminoso, sim. Pecaminosamente rico, pecaminosamente bonito e - acrescentou com voz trêmula -perigosamente atraente!

Kagome soltou uma exclamação abafada. Kikyou parecia estar descrevendo o próprio diabo! Na mesma hora, veio-lhe a imagem de um grego moreno, com chifres surgindo por entre os cabelos escuros! Apertou as mãos com força e, para sua surpresa, descobriu que as palmas estavam suadas. Mas não teve tempo de pensar sobre isso, pois Kikyou logo continuou:

-Como todos os gregos, ele foi maravilhosamente hospitaleiro. Insistiu em acomodar todos nós em sua casa, tanto os passageiros quanto os tripulantes do iate, e insistiu para que continuássemos lá, depois que a tempestade passou. Fomos seus hóspedes durante um mês - admitiu, parecendo tão surpresa com esse fato quanto Kagome - e até mesmo Miroku ficou impressionado com o luxo com que ele nos tratou. Acho que foi isso que levou nosso primo a me convencer de que eu precisava encorajar Sesshoumaru, quando... - ela hesitou o sangue invadindo o seu rosto lentamente - quando se tornou evidente para todo mundo que ele estava apaixonado por mim.

Sentindo uma necessidade urgente de desabafar a raiva que sentia, Kagome explodiu:

- isso é típico de Miroku! O que eu não consigo entender é por que você se dá ao trabalho de cultivar a amizade dele! Sinto dizer isso de um parente tão próximo, mas em minha opinião esse rapaz é fraco e degenerado, além de estragado pelo mimo dos pais e por uma renda particular muito grande!

- Vocês dois nunca se deram bem, mesmo. - Kikyou quase sorriu. - Se você não se zangasse com tanta facilidade quando Miroku a provoca, ele não perguntaria como vai seu trabalho de escoteira, cada vez que se encontram.

- Ele não pergunta, ele caçoa! -Kagome corrigiu, zangada. - Reconheço que passo a maior parte do tempo ajudando o pessoal da paróquia, mas nem por isso mereço mo apelido de "Fada Madrinha", que Miroku colocou em mim com tanta ironia.

Kikyou encolheu os ombros com indiferença, a mente já ocupada por seus próprios problemas.

- Você ainda não respondeu à minha pergunta. - lembrou, com voz tensa. - Você vai até Kairos, explicar a Sesshoumaru por que não posso me casar com ele?

Como tinha acontecido quando Kikyou fez a pergunta pela primeira vez, Kagome sentiu o sangue gelar nas veias. Ela nunca entrara em pânico em toda a sua vida, e tentou se livrar da estranha sensação, desconversando.

- Como é que eu vou poder explicar uma situação que eu mesma não estou entendendo? - alegou. - se bem que eu não poderia nunca compreender como é que esse grego conseguiu convencê-la, no curto espaço de algumas semanas, de que a coisa que você mais desejava nesse mundo era passar o resto de sua vida com ele. Principalmente, quando, seis meses depois, você declara que a atração que sentia por ele transformou-se em medo! Como é que isso pôde acontecer? - perguntou, com a testa franzida. - Se você não o viu mais depois que deixou a ilha, o que esse tal de Sesshoumaru fez para amedrontá-la tanto?

- No início, nós conversávamos pelo telefone quase todos os dias. Depois, fiquei quase seis semanas sem ter notícias dele. Foi então que percebi o erro que havia cometido com aquele noivado. Mas à medida que o tempo passava, sem Sesshoumaru dar o menor sinal de vida, passei a ter esperanças de que ele tivesse chegado à mesma conclusão que eu: de que havíamos dado importância demais a um simples namorico de férias.

- Entendo - Kagome falou. E entendia, mesmo. Apesar desse tipo de comportamento frívolo não fazer parte de sua natureza, ela sabia que, para Kikyou, esse raciocínio era normal. - O que foi que aconteceu depois? Ele entrou em contato de novo?

- É - Kikyou concordou infeliz. - Por carta. E depois que eu disse que não pretendia me casar com ele, de jeito nenhum, Sesshoumaru passou a praticamente me bombardear com cartas.

- Como ele deve amar você! - Kagome disse com tristeza, sentido uma certa pena do grego rejeitado. - No entanto, apesar de o seu noivado ser um compromisso sério, não é inquebrável, e uma moça pode muito bem mudar de opinião... Espera-se que o noivo aceite a sua decisão com dignidade se for mesmo uma pessoa educada, um cavalheiro.

-Acontece que Sesshoumaru não é nenhum cavalheiro. - Kikyou estremeceu violentamente. - Ele é mais um diamante bruto, valioso, mas não lapidado. Sofisticado por fora, mas selvagem o bastante por dentro para me obrigar a manter a palavra, usando táticas de homem das cavernas. E como eu estava com medo de que ele aparecesse por aqui, a qualquer momento, mandei-lhe um telegrama prometendo ir para Kairos assim que pudesse. Eu precisava fazer isso, Kagome! Estava desesperada de medo! -de repente um sorriso tímido surgiu em seus lábios e ela disse quase num murmúrio: - Sabe, eu me apaixonei... E desta vez é de verdade!

-Você se apaixonou?E por quem?

- Por Inuyasha Montgomery. E se meu instinto anda funcionando direito, ele está a ponto de me pedir em casamento!

- Mas que notícia maravilhosa! - Kagome comentou, sorrindo abertamente. - estou tão contente por você, minha querida! Sempre gostei de Inuyasha, ele é tão firme e digno de confiança! É o melhor rapaz da sua roda de conhecidos, sem dúvida nenhuma.

-Só que tem uma coisa... - sua voz tinha um tom agudo, que mostrava o quanto ela estava próxima do pânico. - O pai dele é um visconde, e se ele e sua esposa ouvirem o mais leve comentário sobre o meu noivado com Sesshoumaru, vão se opor ao nosso casamento, com toda certeza!

- Oh, céus! - Kagome recostou-se no sofá, sentindo-se cansada das histórias da irmã. - Você realmente faz tudo para complicar a sua vida...

-Prometo que no futuro vai ser diferente! Por favor, Kagome, vá até Kairos e devolva esse anel àquele grego tirânico, para ele ver que nosso noivado está definitivamente acabado. Você não pode se negar a fazer isso por mim! Minha felicidade depende de Sesshoumaru continuar em Kairos, fora da minha vida.

Levantando-se de um salto, Kikyou correu para fora da sala, deixando Kagome a observar o enorme anel de brilhante que tinha sido jogado na palma de sua mão. Cheia de admiração, virou-o na direção da luz, mas sentiu uma onda de repulsa invadi-la quando um raio de sol atingiu a pedra, arrancando dela um reflexo brilhante e maligno.

Cuidadosamente, colocou o anel em cima de uma mesinha lateral, com a mão trêmula. Depois, afastando os olhos daquela pedra magnífica e tentando não pensar em seu preço, continuou sentada onde estava imóvel com uma estátua, esforçando-se para controlar suas pernas trêmulas e os pensamentos confusos.

-Essa é mais um de seus velhos e conhecidos truques, mocinha! - disse baixinho, censurando a irmã ausente. - Você sempre teve a mania de jogar seus problemas em cima de mim e sair correndo, para não me dar tempo de lhe recusar ajuda. Mas desta vez não vai dar certo! Você brincou com fogo e eu não tenho a menor intenção de deixar que me queimem em seu lugar.

Kikyou ainda não tinha voltado para casa quando Kagome e o pai se sentaram à mesa, para jantar. Enquanto lhe servia a sopa, ela notou que ele estava meio sério, sem seu sorriso costumeiro. Preocupada, perguntou:

-Correu tudo bem hoje, papai?

-Mais ou menos. - Com um suspiro, o reverendo começou a temperar mais a sopa, com grandes quantidades de pimenta.

-Isso é pimenta, papai - disse, pois sabia que esse era um dos temperos de que ele menos gostava.

-Oh, Deus!

Pelo seu tom de voz, Kagome sentiu que o pai teria praguejado, se isso não fosse completamente contra seus princípios. Mas, como era ele se contentou em descarregar a irritação, empurrando o prato para longe, ao mesmo tempo em que dizia:

- Não estou com fome esta noite. Se não se importa, prefiro não tomar a sopa.

Pensando no que estaria acontecendo, Kagome terminou sua sopa, respeitando o silêncio em que o pai havia se fechado. Normalmente ela não teria hesitado em lhe perguntar qual era a causa da preocupação dele, mas naquele dia estava com a cabeça tão cheia de seus próprios problemas que não sentia nenhuma disposição para ouvi-lo falar sobre o vândalo que tinha gravado seu nome a canivete no banco da igreja, ou em como ele pretendia convencer um pedicuro a visitar, uma vez por mês, o asilo local de velhinhos.

- Onde está Kikyou?

Kagome assustou-se com a aspereza que havia na voz do pai.

-Não sei. Ela saiu de casa há umas duas horas. Se o senhor quiser, posso telefonar para os amigos dela e tentar localizá-la.

- Não, não é necessário. É melhor mesmo eu ter um pouco de tempo para me acalmar, antes de falar com aquela mocinha.

Kagome achou o tom de voz e a atitude do pai realmente assustadora. O reverendo teria ficado muito aborrecido se alguém o acusasse de favorecer uma das filhas, mas através dos anos ele sempre demonstrara, por meio de pequenos gestos, que Kikyou era a menina de seus olhos. Talvez por ela ter herdado a beleza da mãe, ele raramente a censurava e nunca lhe negava uma coisa que pudesse lhe dar, principalmente depois da morte da esposa.

- Por quê?O que ela fez de errado? - Kagome perguntou.

Mais uma vez o reverendo empurrou o prato para o lado, sem tocar na comida. Ele parecia estar sofrendo. E, pela sua expressão, devia estar achando difícil falar naquele assunto até mesmo com a filha mais velha, que costumava partilhar todos os seus problemas.

- O bispo me telefonou esta tarde, pois precisava me falar sobre um assunto muito importante - disse finalmente. - A princípio, ele não queria falar claramente, mas depois, como é um velho amigo e conhece vocês duas desde que nasceram, admitiu que havia recebido uma queixa sobre o comportamento de Kikyou, de um dos meus paroquianos.

- Oh, papai! - Indignada; Kagome levantou-se de um salto. - O bispo deve estar cansado de saber que em toda paróquia existe pelo menos uma pessoa que gosta de escândalos, alguém de mente suja, que condena as atitudes de todos os jovens. Estou desapontada com ele! Nunca pensei que o bispo fosse capaz de ouvir um boato, quanto mais dar ouvidos a ele!

-Sente-se, Kagome, e faça o favor de me deixar terminar.

O tom de comando na voz dele era tão forte e incomum, que ela obedeceu na mesma hora.

-Sejam quais forem os pontos de vista pessoais do bispo - o reverendo Higurashi continuou - ele é sempre obrigado a investigar as queixas que recebe. Ele deixou bem claro que considera a queixa sobre Kikyou completamente sem fundamento, e fez questão de dizer que, mesmo que a acusação fosse verdadeira, o comportamento de um membro da minha família não poderia nunca lançar uma sombra sobre o meu trabalho. No entanto - e ele suspirou pesadamente, passando uma das mãos sobre os olhos, num gesto que demonstrava tanto desânimo que Kagome sentiu vontade de torcer o pescoço da irmã - parte da culpa é minha, pois mimei Kikyou demais.

-Não diga isso!

-Mas é verdade - o reverendo insistiu com firmeza. - E, ao mesmo tempo, permiti que você se tornasse o "burro de carga" da paróquia, a pessoa que faz todo o trabalho e não recebe nenhuma recompensa.

- Mas o meu trabalho é um prazer! - Kagome insistiu, quase chorando por ver o pai tão triste. - E, além disso, Kikyou é tão jovem e bonita, que merece se divertir um pouco!

-Ela é apenas dois anos mais nova do que você - ele argumentou com severidade. - E você é tão boa, quanto a sua irmã é bonita.

Houve um tempo que essa comparação teria magoado Kagome, mas com o passar dos anos tinha se resignado a viver à sombra da beleza de Kikyou. Agora podia aceitar sem rancor que, apesar de as duas terem a mesma delicada estrutura óssea, a mesma pele clara, e serem praticamente da mesma altura, os cabelos de Kikyou possuíam o brilho prateado da lua, enquanto os dela tinham o brilho negro da noite, os olhos de Kikyou eram de um azul límpido e vivo, enquanto os seus eram de um cinza solene, e seu corpo era bem menos arredondado do que o da irmã. E isso era um aborrecimento, pois como usava as roupas que Kikyou deixava de lado quando saíam de moda, Kagome parecia estar sempre usando verdadeiros sacos sem forma.

O reverendo Higurashi levantou-se e endireitou o corpo.

-Decidi que preciso proibir Kikyou de continuar fazendo essas visitas prolongadas aos parentes de sua mãe. Eles levam uma vida muito luxuosa e o exemplo que seus primos dão a ela é péssimo. Só querem saber de se divertir, principalmente Miroku!

-Pelo amor de Deus, papai! Do que foi, exatamente, que acusaram Kikyou?

-De acordar a cidade inteira, correndo pelas ruas em carro esportes barulhentos; de perturbar a paz e a tranqüilidade do clube local, com festas ruidosas, onde foram servidas bebidas alcoólicas; e de não demonstrar o menor respeito pelas pessoas mais velhas que tentaram mostrar a ela o quanto estava errada - ele acabou, com evidente desgosto.

Boquiaberta, Kagome observou o pai sair da sala de jantar, sem saber se chorava de tanta frustração ou se caia na gargalhada. De repente, estava vendo o reverendo e seus contemporâneos através dos olhos da irmã, e uma onda de simpatia pela garota condenada como delinqüente, simplesmente por causa de sua juventude, tomou conta dela.

Mas, como a maioria dos homens que demoravam para se zangar,o reverendo Higurashi,uma vez zangado,podia ser assustador. Então Kagome compreendeu que, pelo bem da futura felicidade de Kikyou o pai nunca poderia saber de seu noivado com o grego!