Pegos no meio do caminho.
- James, se você abaixar a mão mais um centímetro, eu juro que você não vai ter dedos para pegar aquele maldito pomo que você roubou no segundo ano da sala dos troféus. – Lily ralhou com o namorado pelo o que pareceu ser a enésima vez na noite, ascendendo bruscamente a mão direita de James para a sua cintura.
- Como você sabe que eu roubei o pomo no segundo ano? – Ele perguntou com a língua arrastada. Era efeito da cerveja amanteigada que estava rolando solta no Salão Comunal da Grifinória em comemoração à vitória da Taça Dupla: a de Quadribol e a das Casas.
Língua esta que não se arrastou nem um pouco quando Lily apenas enviesou os olhos em resposta à pergunta, e ele a beijou com voracidade, empurrando-a contra a parede de pedra e ignorando todos os avisos puritanos de Lily ao deixar as suas mãos passearem pelo corpo conhecido da namorada.
Mas ela sabia que o gosto amargo que sentia na boca dele definitivamente não era nada parecido com o familiar sabor doce e quente da bebida de inverno.
- James, por que você está com gosto de raiz de mandrágora? – Ela perguntou e ele arqueou as sobrancelhas.
- Por que, pelas ceroulas de Merlin, você sabe o gosto de raiz de mandrágora? – Ele retorquiu em perplexidade.
- Não pergunte. – Ela respondeu rapidamente e ele arqueou uma sobrancelha. – É sério! O que você tomou? Não foi só cerveja amanteigada. – Ele afundou o rosto na curva do pescoço da garota, distribuindo beijos na pele exposta enquanto ela arriscava as mãos frias por baixo da camiseta fina de algodão que ele vestia. – James! Vamos, me conte. – Ele apenas grunhiu e continuou em sua procissão, atacando o lóbulo da orelha de Lily, que apenas teve condições psíquicas de fincar as unhas nas costas dele, fazendo-o gemer e toma-la com rapidez pelo quadril, encaixando-a entre o próprio corpo e a parede de pedra, segurou-a pelas coxas e ela enganchou as pernas em sua cintura, equilibrando-se o máximo que podia.
- Uísque. – Ele respondeu sensualmente em seu ouvido e ela arranhou levemente as costas dele, e, quando o viu arrepiar-se, abriu um botão da própria camisa e passou a língua pela linha da mandíbula dele.
- De fogo? – Ela murmurou e ele caranguejou as mãos por baixo da saia dela, que ofegou em surpresa.
- Não. – Ele respondeu entre as respirações e ela estacou, em choque.
- VOCÊS TOMARAM UÍSQUE TROUXA? – Ela deixou as mãos caírem ao seu lado, perplexa, e ele a segurou com mais força ainda, e, pela primeira vez em minutos, mirou-a nos olhos grandes e verdes.
- E isto é um problema porquê... – Ele perguntou com um esboço de sorriso e ela beijou-o antes que seu bom senso voltasse.
- Porque bebidas alcoólicas, em especial as trouxas, são estritamente proibidas em qualquer lugar nos terrenos de Hogwarts. – Uma voz arrastada e macilenta respondeu a pergunta retórica de James, fazendo os lábios dos dois se descolarem imediatamente, e Lily sabia que se estivesse no chão, as suas pernas teriam bambeado ao ver quem a pegara no flagra.
- Snape. – James constatou com a voz dura e colocou Lily no chão, puxando a camiseta para baixo enquanto ela fechava três (que não sabia como e quando tinham sido abertos) botões de sua camisa e ajeitava a saia jeans. Segurou a mão de James firmemente ao tentar manter a cabeça erguida com dignidade para fitar o ex-amigo. – Perdeu alguma coisa aqui?
- Alguns pontos da Grifinória, pode esperar. – Severus respondeu em tom de nojo e os lábios vermelhos de James se abriram em um esgar.
- Tire quantos você quiser, a contagem já foi feita. Nós vencemos. – Lily surpreendeu-se ao ouvir a própria voz amargurada, e Snape arregalou os olhos para ela, mais surpreso ainda enquanto James apertou de leve a sua mão.
- Aposto que eles reconsiderariam o caso ao saberem o que os dois monitores-chefes estavam fazendo...
- Na sua última noite em Hogwarts? – James acrescentou em tom de desdém, ao encrespar os lábios nos cantos. – Uns beijos em um corredor escuro? – James largou a mão de Lily e deu dois passos em direção a Snape. – Talvez chegar onde você jamais sonhou cogitar? Sexo? – Snape manteve-se impassível enquanto o tom de James tornava-se cada vez mais insinuante. – E o que é melhor: Sexo entre duas pessoas que se amam? – Snape sentiu o seu estomago revirar ao ver os olhos de Lily brilharem por um ínfimo segundo para o namorado, e James sorriu abertamente. – Por que, ranhoso? Isso você não faz com Mulciber? Isso o senhor das trevas não lhe dá? – Os olhos castanhos de James faiscavam perigosamente para os negros de Snape e a mão deste roçou a varinha em seu bolso. – Quer saber? Mil vezes fazer amor, isso mesmo, meu caro, fazer amor, com Lily Evans do que ter todo o sangue-puro do mundo. – A tensão era quase elétrica entre os dois, e, depois de alguns instantes, James finalmente soltou os ombros e sorriu arrogantemente. – Mas você não saberia o que é isso. Você nunca saberia o que é amar alguém. Não acho que você seja capaz.
James sorriu mais uma vez e deu as costas para Severus, estendendo a mão no caminho para alcançar a de Lily.
Então, tudo o que Lily viu foi a varinha de Severus cortando o ar em uma rapidez alucinante, e ao vê-lo apontar para as costas de James, sacou a sua própria e colocou-se entre os dois.
- Estupefaça! – Snape rugiu antes que percebesse e o jato vermelho foi exatamente em direção ao casal.
- Protego! - Lily brandiu a varinha para cima, formando um escudo sobre si e James, fazendo o feitiço de Snape voltar com menos intensidade, apenas o suficiente para empurrá-lo para longe em poucos metros. Um surpreso e assustado James passou os braços carinhosamente pelos ombros de Lily, e a beijou na cabeça.
– Algo mais que você queira acrescentar ao relatório de sua ronda? – Lily cuspiu em direção a Snape, que apenas arregalou os olhos.
- Você vai mesmo ficar com esse cara? – Severus perguntou com veemência, e ela se surpreendeu com a urgência em sua voz.
- Como você se importasse. – Ela respondeu com rancor na voz.
- Sério mesmo? – Snape arregalou os olhos em pedido. – Depois de tudo o que ele fez? O que aconteceu com o 'biltre arrogante'? – Ele perguntou desesperado, e ela apenas riu friamente.
- Continua aqui. – Ela piscou em direção ao namorado e sorriu apaixonadamente. – James pode ser capaz de muitas coisas, Severus, mas saiba que ele nunca seria covarde o suficiente para atacar alguém pelas costas e sem varinha em punho. – Lily respondeu no tom mais enojado que pôde encontrar. - Algo mais que você queira acrescentar ao relatório de sua ronda? – Ela repetiu com mais firmeza do que antes e ele apenas balançou negativamente a cabeça. – Que bom. Temos uma festa da vitória a atender no nosso Salão Comunal...
- E todos ficariam terrivelmente decepcionados se percebessem que a monitora chefe e o capitão do time de Quadribol se ausentaram por alguns instantes apenas para lidar com... – James pareceu pensar em algo suficientemente nojento, e Lily se adiantou.
- um Sonserino. – O asco na voz de Lily era estranho até aos ouvidos dela mesma, mas ela continuou com os olhos mais duros do que nunca. – Eu sinto muito que não sejamos mais amigos, Severus. Você se tornou alguém irreconhecível para mim.
- Posso dizer o mesmo. – Severus apontou com tristeza na voz, e por um segundo, um infinito e fugaz segundo, ele pôde ver um lampejo de afeto nos olhos verdes de Lily. Por um pequeno momento, ele sentiu como se nada tivesse mudado entre eles.
Quase como naquele tempo.
Com passos duros, James apertou mais possessivamente os ombros de Lily e os dois começaram a se afastar lentamente, com os passos no mesmo ritmo, tamborilando pelo chão liso de pedra.
- Lily! – Por instinto, (e um pouco por costume também) ela virou-se com mais rapidez do que deveria, estacando ao lado do namorado e Severus apenas levantou uma sobrancelha em desdém. – Você não deveria se atirar na frente de um feitiço. Seja menos idiota, isso ainda vai te machucar.
- Não é idiota ser corajosa quando se defende alguém que se gosta. – Ela replicou acidamente. – Eu sinto muito por ser assim. Mas é quem eu sou e nada vai mudar isso.
E ele observou o casal caminhar tranquilamente em compasso até dobrar no primeiro corredor à esquerda, que levava para a Sala Comunal da Grifinória.
E o deixava ali, sozinho. E não apenas sozinho: sozinho e solitário, com muito frio, apesar de a noite de primavera estar excepcionalmente quente.
Talvez Merlin esteja feliz. Talvez ele fosse Grifinório. Ele pensou taciturno, ao voltar cabisbaixo para as masmorras.
Ao entrar no seu quarto e colocar o seu pijama puído, extremamente desejoso de deitar na cama e conseguir esquentar aquele frio que insistia em dominar o seu coração e as suas extremidades, notou um pequeno pedaço de pergaminho dobrado sobre o seu travesseiro.
Me venham com uma maldita reunião de Comensais e eu juro que azaro a primeira máscara que eu vir. Ou coloco pus de bubotúbera no suco de abóbora do Mulciber. A culpa é toda dele.
Mas ao abrir o bilhete, deparou-se com uma caligrafia muito redonda e caprichada para ser a do seu amigo. Demorou um instante até que ele conseguisse reconhece-la sem precisar ler o que estava escrito, mas ao fazê-lo, sentiu o calor formigar da ponta dos dedos até o sangue bombeado em seu peito.
Sentiu-se vivo novamente.
O bilhete era simples e curto.
Eu realmente sinto muito.
Mas foi você que quis assim. Eu lavo as minhas mãos.
Mas não consigo deixar de sentir muito.
Sinto e sempre sentirei a sua falta.
L.
Odiou-se por alguns instantes, até que percebeu estar quase amassando o papel em que Lily tocara mais cedo. Imaginou as mãos brancas e macias por cima do papel, agarrando a pena com força (ela sempre tivera a 'mão pesada') e com uma pequena ruga entre as sobrancelhas, como costumava fazer ao tratar de assuntos complexos.
Sentia-se devastado.
Mas não conseguia deixar de estar quente: ela ainda se importava.
Ela ainda gostava.
E isso era o suficiente para dar forças.
