1. Conforto – Saori e Mu, um consolo que se transformará em algo mais, ou em algo menos...
Que voe por todo o mar, e volte aqui, pro meu peito...
Mudou a minha vida e mais... Pedi o vento pra trazer você aqui...
Pedi o vento pra trazer você pra mim
O vento traz você de novo
O vento faz o meu mundo novo...
— Ainda não resolveu o que fará a respeito daquele assunto, Shion? — perguntou uma solícita Saori, enquanto assinava alguns papéis. — Imagino que você e Mu já acertaram suas pendências...
O mestre olhou-a, com certa condescendência, que ela procurou ignorar. Sabia que nenhum de seus cavaleiros gostava de ser interrogado em seus assuntos pessoais, mas ela, ultimamente, andava preocupada com o cavaleiro de Áries. Ele era sempre tão calmo e prestativo; poucos notavam a sutil mudança em seu humor. E agora, com a iminência do casamento de seu mestre com a mulher que ele amara outrora, isso ficava tão evidente...Imaginou se nem mesmo Shion dava-se conta. Ou simplesmente, não quis piorar as coisas. "Deve haver algo que possa fazer, Saori, para aliviá-lo. Você deveria saber: afinal, é uma deusa... Pense, pense..."
— Bem, acho que nós já fizemos todos os acertos necessários nestes documentos... – falou ele. Depois, com cuidado, abraçou-a, deixando-a boquiaberta. — Obrigado por sua preocupação, Atena. Sei que saberá o que fazer. Eu já fiz tudo que poderia. Agora, não vejo como eu poderia ajudá-lo mais... — sussurrou, pois as lágrimas não lhe deixaram falar melhor.
Mais tarde naquele dia, o dia do casamento de Shion e Hèllene, todos se encontravam festejando. Menos uma pessoa. Um jovem afastado dos outros olhava para além dos montes, onde deveria estar o mar, mas, por estar muito escuro, não se divisava o limite entre este e o céu. Seus pensamentos demoraram-se na noiva. "Como pude pensar que ela se interessava por mim, como homem, e não como amigo... eu jamais saberia... Como pude me apaixonar pela sombra de uma mulher que sempre pertenceu a outro... e como se não bastasse, o outro é o meu Mestre, aquele que me levou a conseguir esta armadura" . Fechou os olhos tentando não imaginar o que os esperaria... "Não os culpo... O ingênuo fui eu..."
— Não acha que está um pouco afastado da festa, Mu? Quero crer que é porque admirava as estrelas...
O Cavaleiro sobressaltou-se ao ver Saori a seu lado. Ela sorria, e um cálido cosmo o envolveu... Acaso ela saberia que ele estava tão deprimido, que nem podia sorrir em correspondência a ela? Seu coração no entanto foi acalentado por ela.
— Atena. — forçou um sorriso — Como não percebi sua doce presença? Está adorável esta noite. Mais do que o normal. — as palavras gentis foram ditas numa calma fria.
Mesmo assim o sorriso dela aumentou, e ela ficou um pouco corada.
— Obrigada, Mu. Você também está muito bem. — sem saber como expor sua preocupação, ela foi direto ao assunto. — Faz tempo que não o vejo sorrir...
Na mesma hora o sorriso esvaiu-se dos lábios dele, e uma expressão de cansaço e frustração alcançou os seus olhos e a fronte alva.
— Desculpe-me, senhorita Saori. Pensei que tivesse sido discreto. — falou num tom sem emoção.
"Pobre Mu".
— Não acho que deva se esconder de mim...Mas se não quiser dizer nada, tudo bem. — seus olhos enterneceram-se por ele. — Se precisar conversar, pode me procurar. Não sei...bem...como ajudá-lo...
Ele deu um sorriso cansado, puxando a mão dela e beijando-a:
— Ninguém pode me ajudar, Atena, nem mesmo você. O vento que o trouxe à minha vida já o fez se afastar novamente. E para sempre.
Saori observou o cavaleiro se afastar em direção as escadarias que o levariam de volta à sua reclusa e solitária casa. "O vento que o trouxe à minha vida já o levou embora". Ela baixou os olhos. Por que sempre acabava sendo assim, para alguns de seus cavaleiros? Sempre haveria um traço de tristeza e dor que os acompanharia? Talvez isto os fosse fortalecer, como fortalecera a ela, mas, era doloroso e sentia vontade de os colocar no colo, e chorar com eles, cuidar deles... Eles fizeram tanto por amor a ela, a Atena... Muitos de livre e espontânea vontade... Como Aioros, Mu, Afrodite, Kamus... Como tantos outros... Que ela mal conhecia, que passavam longe dela, e só à sua sombra já se abaixavam, em reverência.
Suspirou. Se fosse há alguns anos atrás este comportamento seria até elogiado e aceito por ela, porém, agora, que tudo estava em relativa paz ¹, e o tempo fizera sua parte também, ela queria... Não, necessitava ser tratada com mais calor e confiança. Não era só deusa. Era mulher, humana, ainda que sua divindade fosse reverenciada, ela queria sua humanidade amada, como outras moças, como suas amazonas, e conhecidas... Então, imaginava ser assim também com seus amigos.
Enquanto divagava, começou a caminhar e permitiu que os pés a levassem... Desceu a escadaria, parando em frente à casa de Virgem. Shaka com certeza estava nas bodas... Mas ela não pode evitar uma imensa vontade de entrar na sala das árvores gêmeas. "Acho que ele não iria se importar..." Devagar, empurrou a imensa porta. Não era muito pesada, mas se abriu muito facilmente... Como se alguém a tivesse deixado aberta de propósito... Talvez o próprio Shaka... Pisou no jardim perfumado, palco de uma das mais tristes e duras lutas que ele tivera...
Ergueu a cabeça para as árvores, e qual não foi sua surpresa quando viu Mu sentado entre elas. Ela mais sentiu que viu suas lágrimas. De dor. Sem pensar, como se estivesse num pesadelo, correu até ele, caindo de joelhos antes de abraçá-lo. Seu cosmo acendeu-se de tal maneira, que ela receou que outros percebessem. Mas não importava. Não deixaria sozinho. Não agora. Encostou o rosto na cabeça dele, e teve consciência que Mu encostava-se em seu peito, um tanto quanto surpreso.
— Oh! — conseguiu exclamar Mu antes de desabar de verdade.
Viera até ali para fugir de todos. O amigo não se importaria de ele estar ali; sabia o quanto aquele lugar lhe trazia paz e conforto. O coração do cavaleiro estava estilhaçado. A angústia o dominava, e o maldito sentimento de rejeição permeava todo seu ser. Não queria que outros vissem-no sofrer. Até porque poucos sabiam do fato. Mas jamais esperara encontrar, ou, ser encontrado ali por Atena. Justo aquela que não deveria preocupar... com um simples cavaleiro, de ouro, é verdade, mas ainda um cavaleiro que jurara protegê-la. Envergonhou-se de sua atitude fraca. Porém, ao dar-se conta dos braços dela ao seu redor, suas defesas se foram pra muito longe, e sentiu-se livre pra chorar... E chorou. Como não chorava há muito tempo. Depois de alguns instantes, foi escorregando até estar deitado com a cabeça no colo da deusa. Encolheu-se ali. Chorou até que só se ouvissem profundos suspiros, esvaindo-se de seus lábios. A cabeça descansava no colo de Saori que lhe acariciava as melenas cor de lavanda com muito cuidado. Por um momento enfureceu-se com sua própria debilidade, no entanto, não queria sair dali... Uma proteção tão meiga e suave, que curaria seu coração. Ele podia sentir o olhar dela sobre si. Se fosse pena, ele já teria levantado... i"Dane-se se for pena... Eu... aprecio sua consolação... Atena"
Percebeu o sorriso dela.
— Devo ter pensado em voz alta, não? – riu ele, baixinho. Segurou uma das mãos delas. — Não sabe o quanto isso é importante pra mim, senhorita Saori. Eu...Agradeço... — um sono invencível abatia-se sobre ele. E simplesmente adormeceu.
Os olhos verdes da mulher tinham as pupilas dilatadas. "Descanse, Mu... talvez o vento traga novos ares pra você... Ele irá passar por muitos lugares antes disso, mas, eu sei que ele mudará sua vida, e trará algo bom pra você..." seu rosto ficou sério por um momento. "Quem sabe não traga também para mim..."
1. "Em relativa paz..." – espero que concordem comigo.
2. A música do início, se não me engano, é do J Quest, e eu não sei porque me deu vontade de escrever esta pequena fic com ela de fundo. Pode dizer que não tem nada a ver, mas...rs
NA.: Olá, cá estou eu novamente com um par inusitado... Saori é minha fonte de inspiração pra romances... São tantos possíveis, e com o único que seria "certo" pra muitos nem consigo pensar... Bem, eu espero que não me matem e que me digam se gostaram. Ou não. Críticas são bem vindas.
Bjs
