Destroços. O fim de um período na prisão. É o que tenho agora.
E a porta da cela aberta.
Porque era numa cela que antes eu vivia. Eu achava que era feliz daquele jeito. Talvez realmente até tivesse sido, mas não seriam mais do que momentos, uma vez que a felicidade jamais é completa sem a liberdade. Que você me ofereceu. Afinal, uma prisão, por mais extensa e bela que seja, continua sendo uma prisão.
Foi guiada pela sua mão enluvada que saí dela. Você me mostrou que há muito mais no mundo do que eles querem nos deixar ver, que somos nós quem definimos quem somos e o destino de nossas vidas. Nosso único obstáculo somos nós mesmos.
Aprendi que não somos nós que dependemos dos poderosos e políticos. São eles que nada são sem a nossa ajuda, e se eles são poderosos é porque demos o poder nas mãos deles. São eles que devem nos temer. E que não há nada impossível para nós, quando nos fazemos ouvir.
Eles vêm e nos oferecem um país sem os males que caíram sobre o resto do mundo. Nos oferecem saúde, comida, uma falsa paz. Falsa, pois tínhamos assassinos portando distintivos, repressão a qualquer atitude contrária aos conceitos que nos impuseram, câmeras que nos vigiavam e que alegavam ser para nossa segurança. Mas agora, agora que o caos fez seu trabalho e que tudo isso são ruínas, aprendemos. Aprendemos que palavras ditas pelas barras da prisão perdem seu charme.
E agora estou aqui, para continuar seu trabalho. Para reclamar minha herança. Seria um fardo pesado, se eu ainda fosse a menininha assustada que você encontrou há um ano. A menininha que hoje é uma mulher. Graças a você. Hoje não me assusto. Recebo de bom grado o que você me deixou, e, sim, continuarei a missão. Abandono meu nome para ser V. Porque sempre precisaremos de um V. Porque todos somos V, e não há nada a temer.
Foram valiosas as lições que você me deixou. Toda a música, a poesia, o ideal. Mas sinto falta do homem. Me dói saber que não haverá uma nova dança. Que não terei mais sua voz contando histórias. Que não ficarei maluca por tudo virar "Alice no País das Maravilhas" a cada simples pergunta que faço.
E que não terei mais seus braços em torno de mim.
Mas tudo o que se oferece ao meu tato é couro e tecido, e meus lábios beijam madeira.
Nunca vi seu rosto, mas não preciso. Porque me foi concedida a graça de conhecer sua alma. Porque, mesmo sem um contato, a nossa foi a mais bela de todas as histórias de amor. Porque você é meu pai, minha mãe, sou eu, e todos nós.
Porque você me deu algo em que acreditar, me deu um rumo, me deu uma razão.
E agora, além de setembro, tenho mais uma data de aniversário. A data do meu renascimento.
Lembrai, lembrai, do cinco de novembro...
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Pai Santo! A primeira fic de V de Vingança em português do FFNet! Quanta responsabilidade...
Esta foi uma tentativa de contar os sentimentos de Evey após a morte de V, tentando ser clara tanto para quem leu a HQ quanto quem viu o filme. Me desculpem se não está muito boa, mas me esforcei. E também achei uma injustiça não termos nada em português aqui. V for Vendetta é uma das histórias mais belas que conheci, pela sua proposta, pelo seu idealismo, pelos seus personagens. V é um presente inestimável para qualquer um que se preocupe com as condições do mundo em que vivemos e para quem gosta de literatura, teatro, e personagens com profundidade dramática.
Obrigada por estar aqui e por ler essa humilde ficlet.
Etecétera
(16/08/2007)
