Não tenho direitos sobre as personagens dos Piratas do Caribe (tenho mesmo que dizer isto em todos os capítulos?). Os rituais apresentados, bem como a religião da princesa e da rainha é ficção, apenas baseada na Wicca.
Capítulo 1
A lua iluminava toda a clareira aberta na mata. Os galhos retorcidos das árvores parecem ter vida própria em sua dança, formando sombras sobre o círculo de mulheres que entoavam cânticos. Ao centro do círculo, uma mulher de longos cabelos negros e olhos de um azul escuro como o céu noturno. Usava um vestido branco e uma capa prateada. Em suas mãos, um punhal de prata, com rubis encrustados no cabo. Com um gesto, apontando o punhal em direção à lua, todos cessaram o cântico e ela começou a falar:
"Irmãs, por todos os séculos estivemos como guardiãs de toda a sabedoria de nossos antepassados, em uma luta incansável. Vejo no horizonte que está se aproximando o fim de nossa era. Nosso grupo não mais poderá se reunir, para nossa própria segurança".
Sussurros ecoaram entre as mulheres. Trocaram olhares de terror entre si. Seus maridos jamais tomaram conhecimento dessas reuniões secretas que ocorriam em cada um dos oito Sabás realizados durante o ano. Mas, a cada dia, tornava-se mais difícil esconder o segredo. Eles desconfiavam de algo, pensavam que elas teriam amantes, quantas vezes foram espancadas em casa para que contassem algo, mas elas sabiam que o peso do segredo que guardavam era maior que qualquer castigo físico. Eram 14 mulheres, com diversas origens. Quatro mulheres de pescadores, cinco mulheres de mercadores, duas mulheres de oficiais da marinha real, uma mulher de um rico comerciante, a rainha Beltane e sua filha, a princesa Litha, ainda uma criança de seis anos, que observava a tudo calmamente, fascinada com o que sua mãe dizia, no centro da clareira.
"De nós, eu sou a única que tenho uma filha mulher. Por mais que meu marido tenha ansiado por um primogênito homem, fui abençoada com uma filha, que dará continuidade ao nosso segredo. Nosso fim está próximo, o tribunal da Inquisição chegou ao reino, não podemos segurar as mãos do que o destino nos traz. Ela será a nossa esperança".
Com um gesto, chamou Litha ao centro do círculo. Os cânticos recomeçaram, cada vez mais altos. Havia tambores, a menina não sabia de onde vinham, mas todo aquele barulho começou a ecoar em seu coração. Sua cabeça doía, seus ouvidos doíam e ela não conseguia mais manter os olhos abertos... As mulheres agora estavam de mãos dadas, o círculo se movia, os cânticos misturavam-se com o vento forte que varria a copa das árvores, fazendo com que as folhas caíssem feito uma chuva sobre todas elas. Beltane segurou o pulso esquerdo de sua filha e começou a desenhar uma estrela, com a lâmina afiada do punhal. A menina via o seu sangue manchar o vestido de sua mãe, mas ela não sentia dor. Parecia anestesiada, em transe. Havia tantas palavras naqueles cânticos que ela queria aprender, uma história tão linda e tão terrivelmente assustadora, ela não queria esquecer nada daquele momento. Não era uma brincadeira de criança, mas também não era um sonho. No entanto, ela não conseguia distinguir onde estava, nem entendia o que estava acontecendo.
Por toda a noite, foram contadas histórias de um passado muito antigo, em um idioma que não era o que ela estava acostumada a falar diariamente, mas que seu coração entendia. Palavras sussurradas, ditas com urgência, como se aquelas mulheres temessem que tudo se perdesse no silêncio do tempo.
Com os primeiros raios de sol, a rainha Beltane entoou o cântico final e desfez o círculo. Cada uma das mulheres seguiu para seus lares com a triste certeza de que jamais se encontrariam novamente...
Oito anos depois
Litha cresceu rápido e, a cada dia ficava mais parecida com sua mãe. Olhos de um azul escuro profundo, parecendo o mar na maré cheia, pele muito branca, cabelos negros, o que lhe dava uma feição delicada, como se ela mesma não fosse real, mas recém-saída de um sonho.
No entanto, havia herdado o temperamento de sua mãe, uma mulher forte, que lutou até o último instante por sua religião. A rainha Beltane era Wicca, fazia parte da religião da deusa, era a única coisa que seu pai, o Rei Henrique VI disse. A princesa perdera sua mãe quando ainda era criança. Nunca lhe falaram muito sobre isso, mas ela sabia que tudo foi por causa da Inquisição, quando acreditaram que ela fosse uma bruxa, assim como outras mulheres da cidade também foram queimadas vivas em fogueiras.
Litha queria lembrar-se mais de sua mãe, mas não conseguia. Fora criada por uma tutora, Luise, que sempre a tratara com muito carinho. Seu pai casou-se novamente, com a rainha Katarine, que lhe dera duas filhas. No entanto, a princesa passava a maior parte do tempo sozinha. Não se sentia bem com a forma com que a rainha a olhava. Entendia que muitos da corte olhavam-na de forma diferente por saberem do destino de sua mãe. Mas, as pessoas não tinham o direito de admirar a mãe natureza? Por um motivo tão simples morreram muitos no Reino e no mundo inteiro. Apenas por não serem iguais a maioria. E evitavam olhá-la nos olhos, como se ela, uma garota de catorze anos, pudesse lançar feitiços...
Sua vida na corte não tinha muitas surpresas. Ela gostava de caminhar pelo jardim do palácio, com os olhos perdidos no horizonte sem fim do mar. Sonhava com uma vida diferente, livre. Invejava os corsários, os piratas do Mar Mediterrâneo. Eles podiam tudo, eram livres. Por que não nascera homem? Perguntava-se. Seria bem mais divertido cavalgar pelas florestas, descobrindo novos lugares, novas nascentes, novas aventuras. Molhar-se nas águas das cachoeiras, sujar-se na terra, nadar no mar... No entanto, ela tinha uma maldita vida enclausurada no castelo.
"É hora, Litha. Deves refugiar-te além do horizonte".
Litha olhou para trás, mas não havia ninguém por perto. No entanto, aquela voz não foi um desejo ou um pensamento seu. Alguém lhe disse para fugir. Ou não teria entendido bem? Afinal, era apenas uma menina, como alguém nessa idade pode fugir? Voltou a caminhar pelo jardim, desta vez olhando o céu. A primeira estrela já aparecia, mesmo ainda restando um pouco da luminosidade do sol. Ela amava o céu, sem limites, como sua alma, que poderia tocar aquela estrela.
"Teu último aviso virá dos olhos envoltos no manto negro. Depois teu tempo estará encerrado".
Não, desta vez ela teve certeza de que havia alguém falando com ela. Olhou atrás das roseiras, talvez houvesse algum soldado da guarda querendo brincar ou assustá-la. Ele ia ver, quando o encontrasse! Caminhou mais um pouco, mas o jardim estava deserto. A noite caía rápido, não fosse pelas tochas tudo estaria completamente escuro. Resolveu esquecer esses pensamentos e voltou ao interior do castelo.
Os dias passavam-se lentamente até que uma noite, o sono pareceu abandoná-la. Ela tentou ler, caminhou pelo enorme quarto, que tinha uma cama ao centro, seu trocador no lado esquerdo e sua penteadeira no lado direito, próximo à janela. Nada a fez querer dormir. Ouviu passos no corredor que traz para o seu quarto. Não era algo comum, alguém andar pelo castelo durante a madrugada, então ela se escondeu em um canto escuro, ao lado do trocador. Bem que poderia ter algo para se defender, uma espada, uma pistola, mas o único objeto mais próximo era uma escova de cabelos e ela sabia que isso não a ajudaria.
Um vulto com uma capa negra entrou em seu quarto. Trazia algo sob a capa, como se fosse uma caixa. Quando baixou o capuz, ela reconheceu quem era...
"Pai, o que faz aqui a essa hora?"
"Minha filha querida, minha princesa amada, não tenho mais tempo. Preciso que entenda algumas coisas muito importantes."
"A essa hora, pai. Não podem esperar até amanhã?"
"Não há amanhã. Tome. Abra esta caixa."
Disse o rei, enquanto colocava sobre a cama a caixa de madeira. Litha aproximou-se. Isso não parecia real, mais parecia uma brincadeira! Por que seu pai lhe daria um presente em plena madrugada? Ela o olhou e viu medo em seu olhar. Ela sentou na cama e abriu lentamente a caixa. Dentro continha um punhal de prata, com rubis encrustados no cabo. Lindo, mas, o que ela faria com um punhal?
"Este punhal pertencia a sua mãe. Antes que ela fosse levada ao tribunal de Inquisição, ela disse que eu saberia a hora de lhe entregar. Há três noites eu sonho com ela, dizendo que a hora está chegando e que eu devo fazer tudo o que ela me disse antes de morrer. Não entendo suas razões, mas a respeito, porque eu a amava muito".
"Não lembro muito de minha mãe. Mas, se esse punhal era dela, será uma honra guardá-lo comigo."
"Ela lhe deixou uma carta, mas não está aqui. Está no local para onde você vai. Ande! Arrume suas coisas. Apenas duas mudas de roupa e objetos pessoais necessários. Você parte em uma hora para o Caribe, em um navio mercante."
"Por que, pai? Do que estou fugindo?"
"Este local torna-se mais perigoso a cada dia para você"
"Mas o senhor é o Rei, não pode me proteger?"
"Eu daria minha vida por você, mas sua segurança não depende de mim."
Litha olhou para seu pai. Pensou que seria algum plano da rainha Katarine, que nunca gostou de sua presença no palácio e, por várias vezes, disse preferir que houvesse sido queimada junto com sua mãe bruxa. Então, seu pai preferia ficar com Katarine e suas outras irmãs a ficar com ela? Nesse momento, lembrou-se do que ouviu no jardim, há algum tempo. Manto negro, último aviso... Havia algo estranho e ela pretendia descobrir o que estava acontecendo.
"Nos veremos de novo?" Ela perguntou com lágrimas nos olhos.
"Claro, minha filha. Você pode me escrever e eu escreverei para você. Apenas envie as cartas por Josh, o mercador que a levará, para que eu tenha certeza de que ninguém saberá onde você está."
Litha levantou-se, pegou dois vestidos simples, alguns objetos pessoais, colocando-os em uma sacola. Vestiu um vestido azul escuro, um manto negro e botas. Escondeu o punhal entre seus pertences.
"Estou pronta, pai. Sei que não me contou tudo o que sabe, mas, se for assim, é porque tenho de descobrir sozinha."
"Tão jovem e tão sábia a minha princesa! Sentirei muito a sua falta, como sinto falta de sua mãe."
Os dois se abraçaram. Litha chorava, mas, em seu coração, entendia que tinha de partir. Sabia que nunca pertencera àquele lugar e que ainda tinha muito o que viver até chegar ao que poderia chamar de lar.
Seguiram por uma saída secreta do castelo e foram pelas ruas mais escuras até o porto, onde um homem os esperava. Apenas cruzaram os olhares e nada foi dito, como se aquele momento já houvesse sido combinado com antecedência. Ela virou-se para olhar o seu pai mais uma vez antes de embarcar. Ele pegou sua pistola e entregou nas mãos de Litha.
"Para sua segurança. Rezo para que não precise usar, mas sempre a guarde próxima a você. Josh é um bom homem, cuidará de você como de uma filha. A ex-esposa dele era amiga de sua mãe."
O rei deu-lhe um beijo no rosto e Josh a chamou para embarcar.
