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A campainha tocou, Eileen Snape secou a mão no encardido avental amarrado em sua cintura e dirigiu-se para porta. Uma mulher magra, quase esquelética, de aparência triste. Trajava um vestido cinza que há muito fora negro. Na cabeça um lenço que escondia seus grossos e longos fios cor de azeviche.
- Bom dia! - ela saudou com seus dentes pequenos e brancos a amiga de seu filho, era Lílian Evans.
- Olá, bom dia! – a adolescente respondeu – Sevvie está? – perguntou.
- Sim, no quarto dele, só um momento pois vou chamá-lo – a mulher disse antes de fechar a porta.
Lílian como sempre não fora convidada para entrar. Ficou do lado de fora ouvindo os passos da mãe de Severo se afastar; o pai do amigo não gostava de bruxos, ou aberrações como ele dizia. Não demorou muito e a porta abriu novamente. O rapaz apareceu trajando uma camisa de manga comprida preta, a velha bermuda marrom e o par de tênis com rasgos do lado, a roupa dava um ar de skatista a Severo. A jovem estava acostumada a vê-lo vestindo roupas velhas e farrapos, mas nunca blusa de mangas compridas em dias de sol.
- Sevvie, o que foi? - ela perguntou ao entrelaçar seus dedos ao dele quando já estavam longe da casa.
- Nada. - Ele respondeu num resmungo mal-humorado.
- Pare de mentir para mim! - ela disse apertando a mão dele e recostando-se no braço.
Severo engoliu um imperceptível gemido de dor, mas os olhos verdes captaram a expressão dele.
- O que foi? - ela indagou novamente observando-o.
- Nada, vamos antes que o parque encha – ele disse apressando o passo e arrastando-a.
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Um novo parque de diversões tinha chegado à cidade e apesar da personalidade hostil de Severo, Lílian tinha conseguido convencê-lo a irem. Agora, como o mais novo casal de namorados do bairro. Tinham começado o relacionamento no último inverno, em Hogwarts, escondidos dos Marotos e do restante da escola. Ambos tinham catorze anos.
- Sevvie deixa que eu pago! - Lílian insistiu batendo o pé.
- Lílian, não seria certo da minha parte deixar você pagar. Ainda que eu seja filho daquele trasgo tenho educação. – Ele retrucou.
- É, mas eu também sei que aquele trasgo não te dá dinheiro.
Ele sacolejou os ombros fazendo cara de pouca importância.
- E daí? Para que eu fiquei duas semanas cortando grama, passeando com cachorros e tomando conta dos gatos nojentos da senhora Wislow? - indagou treinando o movimento que o consagraria para sempre: o levantar da sobrancelha.
Lílian perdeu a resposta, boquiaberta ficou olhando-o até que recuperou as palavras.
- Sevvie! Eu não acredito! - ela falou ao jogar-se em cima dele num abraço.
Ele a recebeu com um sorriso discreto, mas a dor fez com que gemesse alto.
- O que você tem? - ela perguntou soltando-o devagar.
- Nada, vamos para a roda gigante – ele respondeu ao arrastá-la pela segunda vez.
A ruiva deixou-se levar mais uma vez, mas em seus olhos a desconfiança cintilava, tinha uma vaga ideia do que estava acontecendo.
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Eles comeram pipoca, foram no barco pirata, atiraram no alvo, passearam no túnel do amor, a contragosto de Severo, e por fim sentaram num banco para comerem maçã do amor.
- Isso é duro Lilían – Severo falou tentando morder a fruta coberta pela cauda caramelizada.
- Essa é a graça Sevvie – ela disse com as mãos, boca e bochechas lambuzadas de vermelho.
- Desisto! - ele disse ao jogar sua maçã no cesto de lixo e levantar à procura de um lugar para lavar-se, como não achou teve de comprar um garrafa de água – Tome, aproveite lave-se e beba, isso é muito doce.
Lílian aceitou a garrafa e lavou as mãos e as bochechas com o pouco de água que tinha, mas não bebeu.
- Sevvie venha, vamos para um lugar mais reservado – ela disse ao puxá-lo.
Ele a seguiu sem reclamar.
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- Acho que aqui está bom – ela falou encostando-se no tronco de uma árvore.
Severo acercou-se dela e aos poucos seus corpos uniram-se. Lílian enlaçou o pescoço dele para aproximá-los mais, Snape apertou a cintura dela e o beijo aconteceu. As mãos dele subiram pela lateral do corpo adolescente, refestelando-se com liberdade dada, apertou-a contra ele e um gemido de dor interrompeu o momento.
- Sevvie o que foi? - ela indagou ainda presa a boca do rapaz.
- Nada – ele respondeu ignorando a preocupação dela.
A reação de Lílian foi um empurrão.
- Droga Sevvie! Pare de falar que não é nada! Anda logo, diga o que aconteceu!
Ele sabia que não adiantava mentir para ela.
- O que aquele monstro fez com você dessa vez? - ela perguntou ainda longe dele, com raiva.
Severo fugiu dos olhos dela ao olhar para o chão.
Lílian foi até ele e pegou o braço do jovem que se estendia pela lateral do corpo. Ao subir um pouco a manga da blusa os hematomas começaram a aparecer.
- Sevvie... - a voz dela era um lamento. Ela deixou o braço e foi para a região do abdomen, as manchas eram maiores e mais escuras – Sevvie... - emocionada – Por que ele fez isso com você? - inquiriu ao encarar o namorado.
- E por um acaso ele precisa de motivos? Um copo de bebida e a minha existência são o suficiente. - Respondeu sem importar-se com o espanto no rosto de Lílian. Abaixou a blusa. - Eu já passei pomada restauradora mais demorará um tempo até melhorar. Vem aqui – ele a chamou estendendo o braço.
Lílian atendeu e num movimento estava encolhida entre os braços dele.
- Um dia isso acabará, assim que eu puder matá-lo! – Severo disse frio e seco no ouvido dela.
- Pare com isso Sevvie, não diga isso nem brincando! – ralhou com o namorado ameaçando se afastar, mas ele a impediu.
- Podemos deixar esse amasso para amanhã? - ele perguntou com um tom safado.
Lílian virou-se devagar e fitou-o.
- Para quando você quiser. – E um deu-lhe um beijo de leve.
Os dois caminharam abraçados para praça e ficaram até tarde aproveitando a noite quente e o céu estrelado.
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- São três anos Lílian, três anos! - exclamou assustando-a. Sua respiração era forte e ele estava completamente diferente do que a jovem estava acostumada a ver.
- Sevvie – ela caminhou até ele, mas suas mãos não o tocaram. Severo esquivou-se dela.
A dor nele era lancinante. Lílian Evans estava deixando-o e logo estaria nos braços do Potter.
- Não temos mais nada em comum, o sentimento se perdeu! - ela justificou o fim do namoro.
- Lílian não arranje desculpas tolas para isso! Você sucumbiu as investidas daquele idiota! - quase gritou.
Ela andou em direção a ele outra vez.
- Eu... eu... você me abandonou Sevvie. Deixou-me para ficar com esses amiguinhos Comensais que odeiam gente como eu! - apontou para si. As lágrimas lavavam seu rosto salpicado de sardas, prendeu o cabelo atrás da orelha – Agora que já é tarde você vem com esse papo de que... de que EU te abandonei! Hipócrita! - gritou.
- Saia! - ele rosnou.
- Sevvie...
- Saia Lílian – ordenou de costas para ela – SAIA! Vá de uma vez! - o jovem Severo ordenou a chorosa Lílian Evans.
A ex-amiga e namorada de Snape continuou em silêncio, emitindo pequenos soluços e gemidos de dor diante da reação furiosa dele.
- Eu sempre soube que um dia você ficaria com ele. Não prolongue o inevitável. Vá Lílian! - ele ordenou outra vez de costas para ela.
A ruiva não tentou responder. Enxugou o rosto, enrubescido, com as costas das mãos e saiu deixando-o sozinho na sala.
Severo permaneceu de costas para o local onde Lílian estivera, pensou em virar e sair, mas a dor em seu peito era tão forte que o impossibilitava de mover-se. Sua respiração era arrastada, seus dentes rangiam diante dos espasmos que torciam seu tórax cada vez que o ar entrava e saía de seus pulmões.
Foi escorregando devagar e chegou ao chão. Ajoelhado e curvado sobre si ele emitiu um urro que expressava o quanto sofria. Seus olhos nublaram e as lágrimas rolaram timidamente molhando a pele seca do seu rosto.
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- Severo?
O homen olhou para o lado e viu Hermione observando-o.
- O que foi? Não vai mesmo tirar as fotos? - ela questionou perscrutando a face perdida.
Snape demorou a responder.
- Severo? - Hermione o chamou mais uma vez - Ei!, acorda! - bateu as mãos – O que foi? - já estava preocupada.
Ele não poderia falar a verdade, não ainda. Hermione sentia ciúme do passado dele com Lílian simplesmente pelo fato do ter um passado.
- Estou pensando nas formas de recusar esse convite infame! - finalmente respondeu e viu a alegria dela voltar.
- Mas, você não vai se esquivar mesmo, está me prometendo essas fotos há meses e eu ganhei a aposta.
- Tolice! - resmungou ao girar para fugir dela.
- Opa! Volte aqui! – ela disse ao segurar a roupa dele – Aposta é aposta Severo. Além do mais você disse que me daria esse presente quando eu fizesse dezessete anos.
- Que eu me lembre todos os presentes foram devidamente dados, não? Sua maioridade bruxa foi comemorada da melhor forma. - Snape proferiu ao puxá-la para fazer um carinho, com seu nariz, no queixo da moça.
- Uhum... fiquei toda a segunda metade do sexto ano esperando que você percebesse - ela balbuciou entregue a carícia dele, os olhos fechados.
- Eu já tinha visto, mas não poderia fazer nada até que você se tornasse maior tecnicamente.
- Ou seja, indo para o sétimo ano. Seis meses de paquera, troca de olhares...
- Estudos conjuntos para ajudar a Ordem – ele completou.
- Mas não mude de assunto, as fotos estavam no pacote de presente de aniversário! – ela lembrou despertando da sedução que era Snape.
Severo rendeu-se.
- Está bem Hermione.
Ela salpicou um beijo nele e correu em direção a máquina.
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N/A: Perdoem os erros.
