MERRY CHRISTMAS & A HAPPY NEW YEAR
Mycroft serviu-se de uma dose de uísque e sentou-se diante da lareira de sua casa em Wimbledon. Gregory fora à festa de Natal que John organizara em Baker Street, e insistira muito para que o político o acompanhasse. Mas, com toda a situação envolvendo Irene Adler, ele não tinha tempo e, francamente, nem disposição para confraternizar com os amigos de seu irmão. Além do mais, ele tinha que pensar com cuidado nos possíveis planos para o dia seguinte.
Nadine lhe ligara praticamente todos os dias desde a sua visita, reforçando o convite que mandara através de Gregory para o almoço de Natal em sua casa. Ela não cansava de ressaltar que fazia questão da presença do político, e que pretendia apresentá-lo ao restante da família. Mycroft odiava feriados familiares, e sentia-se constrangido só de pensar em intrometer-se daquela maneira em uma celebração íntima dos Lestrades, por mais que Gregory insistisse, fazendo aquele adorável olhar de filhotinho perdido.
O que, é claro, explicava porque ele tinha uma sacola de presentes cuidadosamente embrulhados esperando no porta-malas de seu carro.
Ele estava perdido. Total e completamente perdido. Se Gregory houvesse sugerido que eles fizessem bungee jump dentro da cratera de um vulcão ativo, ele teria perguntado quantos metros de corda deveria comprar.
Mycroft tomou um gole de uísque, apreciando o modo como o líquido queimava sua garganta ao descer, aquecendo-o mais eficazmente do que a lareira. Ele pegou o envelope verde, que já começava a se desfazer nas bordas, de tanto ser manuseado (especialmente nas quietas e solitárias horas da madrugada), e puxou seu conteúdo. As fotos, já começando a desbotar, espalharam-se em seu colo.
Ali estava Gregory, com os cabelos ainda castanhos e o rosto desprovido de marcas, sorrindo com a roupa emplastrada de suor entre seus companheiros de futebol; Gregory com Nadine ainda bebê nos braços, ao lado da falecida Julia Lestrade, em um piquenique; Gregory, de uniforme completo no dia de sua graduação na Academia de Polícia, sorrindo orgulhosamente em meio aos colegas; e a favorita de Mycroft, Gregory sobre o palco de um clube noturno, uma Fender vermelha pendurada no corpo, segurando o microfone com as duas mãos enquanto cantava, vestindo jeans justos e rasgados e uma camiseta preta dos Sex Pistols que deixavam muito pouco para a imaginação. Os cabelos estavam espetados para todos os lados, e uma expressão de alegria feroz estava congelada em seu rosto.
Nadine garantira a ele que Gregory nunca daria falta dessas fotos em específico, pois elas costumavam ficar em um álbum que pertencera à sua mãe. Quando Mycroft quis devolvê-las, dizendo que não podia ficar com algo que tinha um valor emocional tão profundo, Nadine respondera que sua mãe certamente teria concordado com o destino das fotos, e que Mycroft deveria parar de ser tão cheio de escrúpulos.
Ele acariciou o rosto de Gregory na foto, pensando na conversa que tivera com Nadine. Uma semana depois, e ele não tivera coragem de abordar o assunto com o policial. A ideia lhe excitava e assustava na mesma proporção; ele não podia crer, realmente, que um homem como Gregory Lestrade fosse interessar-se romanticamente por alguém como ele. Ainda assim, seu coração traiçoeiro começara a buscar sinais para convencer sua mente cética. Ele reparara, diversas vezes, em Gregory observando-o com o canto dos olhos e um sorriso minúsculo nos lábios; ele notara o brilho estranho no olhar do policial na ocasião em que, tendo a manhã livre, ele deixara o quarto vestindo jeans e uma camisa solta, ao invés de seus ternos habituais; e, é claro, havia a questão dos toques. Os toques esporádicos e casuais, que aumentavam em frequência e intensidade nos últimos dias, chegando ao ponto, naquela mesma tarde, de Gregory oferecer-se para ajeitar-lhe a gravata (que Mycroft tinha certeza de que estava impecável, como habitual) e demorar-se alisando as lapelas de seu terno.
O político foi despertado de seus pensamentos pelo toque de seu telefone, e soltou um grunhido ao ver o nome na tela. Hora do show.
- Oh, santo Deus. Nós não vamos começar a trocar ligações de Natal agora, vamos? Aprovaram alguma lei quanto a isso?- ele ouviu a voz de Sherlock, soando vazia e monocórdia.
- Eu acho que vocês vão encontrar Irene Adler esta noite. - Mycroft suspirou e esfregou os olhos. Ele odiava seu trabalho, às vezes.
- Nós já sabemos onde ela está. Como você teve a gentileza de apontar, dificilmente é importante.
- Não, eu quis dizer que vocês vão encontrá-la morta. - Sherlock desligou o telefone sem esperar resposta, e Mycroft imediatamente fez outra ligação.
- Anthea? Operação Jezebel ativa. Mande o carro, por favor.
MHGLMHGLMHGLMHGLMHGLMHGLMHGLMHGLMHGL
- Feliz Natal, Mycroft. - Mycroft observou a figura de Sherlock, que se afastava rumo à saída da morgue, deixando cinzas de cigarro pelo chão.
- E um feliz Ano Novo. - ele falou, pegando seu telefone - Ele está a caminho. Você encontrou alguma coisa? - John soou exausto e infeliz.
- Não. Ele aceitou o cigarro? - Mycroft rolou os olhos. Ciúme escorria da voz de John.
- Sim.
- Merda. - Mycroft ouviu John falando com outra pessoa, a voz abafada. - Ele está vindo. Dez minutos. - e então a voz da querida Sra Hudson, avisando "Não há nada no quarto" - Parece que ele está limpo. Você tem certeza que hoje é uma noite perigosa?
- Não, mas na verdade eu nunca tenho. Você precisa ficar com ele, John.
- Eu tenho planos. - Mycroft sorriu de canto, antes de responder.
- Não. - ele desligou o telefone sem despedir-se, respirando fundo. Depois de uma vida inteira preocupando-se com o bem-estar de seu irmão, ele certamente agradecia aos céus o advento do bom doutor Watson em suas vidas. Ele certamente não saberia como lidar com essa crise sem John por perto para manter um olho em Sherlock e distraí-lo. Ainda havia tanto trabalho a fazer… mas ele podia se dar ao luxo de tirar mais alguns dias, antes que as coisas se colocassem em movimento novamente. Saindo do hospital, ele entrou no carro que já o aguardava.
- Bond Street, Joshua, por favor.
