Não queria arruiná-lo, só que, quando notei, já tarde, queria-o muito. Honestamente, não me lembro de coisa tal. Tenho meus métodos; acabamos por nos encontrar diversas vezes. Jantares, mas entre amigos - e ele era bom amigo. Um dia quis mostrar a foto da filha. Estava animado, era sua princesa. Tive uma sensação incômoda...
Numa noite que fiquei bêbado, comecei entoando baixinho uma canção de marinheiro, em japonês. Ele devia entender, pois sorria. Para mim, nós éramos marinheiros. Sempre tive essa impressão e certeza de que um dia íamos sair para navegar.
Peguei-o pelo braço, apertando forte. Puxei-o pra perto: eu estava a fim de dançar. Não vou esquecer a face medonha dele pelo meu gesto. Estava assustado, mas como insisti e ameacei, acabamos dançando. Dançamos quase abraçados, ele relutante. Não sei por quanto tempo, mas acabou no sofá: nossas pernas enroscaram e caímos, eu encima dele. Ele disse que já estava bom, era melhor ir, estava tarde e tinha sono, também. Amanhã nos encontramos, temos de... Farejava algo em seu pescoço que seguia mais abaixo, por debaixo da camisa dele, o queixo... Fui empurrado. Ele não disse mais nada e saiu sem me olhar, parecia realmente furioso.
Me cumprimentou mal-humorado e todos perceberam, já que éramos bem calorosos um com o outro. Achei graça; ele parece uma menininha, ri, mas preocupado que aquilo continuasse. Depois duma reunião sem importância com um comitê que não sei de onde saiu, encurralei-o. Não precisa fugir de mim. Ele bufou alguma coisa e disse que se era o caso de conversarmos que conversássemos na sala dele e saiu andando, determinado, pisando até no pé e esbarrando com o ombro em mim. Nunca o vira assim, rude. Depois vieram falar comigo e não largaram, passei a tarde toda em reunião ou escrevendo cartas urgentes e essas coisas todas. Soube que Maes saíra mais cedo.
Deixou um bilhete pra mim. Vamos tomar um drinque? Então já sabia onde encontrá-lo.
Estava sentado nas cadeiras de frente do balcão. Convidei-o pra irmos pro canto do salão. Aqui está bom, sente-se, o tom parecendo mais ordem que convite.
Não pedi nada, ele bebia whisky. Fiquei olhando, sentia-me estranho, sem o direito da palavra, então permaneci calado.
Se você ainda tem em mente coisas maliciosas ou sei lá o quê, raiva na voz e ficando vermelho, pensei que fosse me xingar, esqueça-as, e bebeu um gole.
Seu filho da puta de merda...
Fui embora.

Não queria voltar ao apartamento, fui à praça. Nevava. A neve despencava, mas tão calma que me esqueci da hora.
Acordei com alguém batendo à porta. Deixei que batessem: estaria tão frio fora da cama, nem cogitava me levantar e não passavam das seis! De indignação, voltei a dormir, cobrindo até a cabeça. Era Maes. Estava na porta. Ouvi o trinco da porta. Não sabendo direito o que dizer ou pensar, fiquei mudo. Acenou um oi meio tímido e veio perto. Senta aí, convidei. Ele desenroscou o cachecol. Me ajeitei na cama pra ficarmos no mesmo nível. Então?, perguntei. Ele virou, tremelicou e me apertou o ombro com a mão.
Foi o treco mais estranho do mundo ele me puxando contra si e fechando os olhos e todo torto completamente sem jeito e duro, os lábios entreabertos tremendo também.
Tive de ensiná-lo o lance de homem com homem, porque ele ficou numa posição meio inusitada, talvez esperando. A coisa é que eu estava tão calmo como nunca antes. Dava pra curtir cada espaço de momento com ele.

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Ficou curta. Conciso demais? Me parece que sim. Bastou? Talvez nem seja bem uma história, mas uma declaração, e a gente não se deve demorar numa, você sabe. Quem sabe?

begostegostomuitoravano