Nota: A fic contém ~sutilmente~ incesto entre irmãos e slash. Se não gosta, não leia, simples assim.

Disclaimer: Harry Potter não me pertence. Fazer o quê, né.


Nossos Olhos

*

"Vem comigo."

Durante dezesseis anos, essa foi a frase que mais repeti ao meu irmão. Naquela noite, ela foi dita baixinho, como em tantas outras vezes, para que só ele ouvisse em meio aos convidados que lotavam nossa casa para o noivado de Narcisa. Desviando-se sutilmente deles e do sorriso escorregadio de Lucius Malfoy, Regulus saiu pela porta dos fundos e me encontrou à sua espera.

Andamos devagar, ainda que eu tivesse certeza de que ele estava ansioso para que ninguém percebesse nossa ausência em casa. Há apenas uma rua dali, o velho parque trouxa que sorria para nós há anos nos esperava com um balanço enferrujado e a grama alta que ninguém nunca se dispunha a cortar.

Ele sentou no balanço, como sempre, com os dois braços se enroscando como cobras nas correntes pesadas. Sentei bem à sua frente, na grama, e ele provavelmente se perguntaria por que eu nunca me importava em me sujar, e, se tivesse de responder, eu provavelmente diria que valia a pena só para poder olhá-lo daquela posição.

E tinha sido sempre assim, desde que eu possa me lembrar. Eu imaginando o que ele estava pensando e criando diálogos inteiros na minha mente. Talvez metade deles tenham sido, de fato, realizados. O resto ficou por ser dito, pra sempre.

"O que foi?"

Essa era a pergunta que Regulus mais repetia para mim. Dizia que era perturbador que eu ficasse olhando para ele por tanto tempo sem dizer nada. Naquela noite, decidi olhar mais um pouco antes de falar. Afinal, ele estava ali, acima de mim, como uma estrela deve ficar. Como sempre, parecia mais novo e mais inocente do que realmente era. Tinha finalmente deixado o cabelo crescer um pouco mais do que o comum, e ele lhe sombreava os olhos.

Os nossos olhos.

"Eu vou embora, daqui a pouco."

"Como assim? Pra onde?"

"Pra casa de James."

Respondi olhando para a grama e, quando levantei os olhos, ele tinha aquela mesma expressão que adotava toda vez que eu falava de James. Talvez o pior momento que ele tenha enfrentado em relação a isso tenha sido o dia em que comentei que James era como um irmão pra mim.

Eu me lembrava claramente das palavras de Regulus naquele dia, quando ele tinha apenas treze anos e eu não imaginava que ele pudesse ter tanta raiva de uma vez só.

"Eu sou seu irmão."

Ele repetiu, me puxando pela gola da camisa como se eu o tivesse ofendido mortalmente. Por entre o cabelo que me caía na frente dos olhos enquanto ele me balançava, eu via os dele – os nossos – cheios de raiva.

Ciúme.

Agora, no entanto, ele apertava com força as correntes do balanço, que ao menor movimento fazia um rangido alto como um mau agouro. Regulus provocou o brinquedo velho, fazendo impulso com os pés no chão, levemente.

"Onde estão suas coisas?"

"Mandei pra lá ontem."

Ele ficou em silêncio por mais dois ou três minutos. Eu tinha certeza que sabia qual era a próxima pergunta. Só não sabia a resposta.

"E eu?"

Fiquei de joelhos na grama para poder abraçá-lo e não precisar responder. Minha cabeça no seu peito e suas mãos nos meus cabelos. Um coração descompassado e o cheiro de ferrugem. Nossos olhos naquele ponto entre o querer chorar e o não poder.

"E eu?"

Perguntei, com a voz abafada pelo aperto de Regulus, porque também não sabia. Ele riu, meio choroso, e levantou minha cabeça para me olhar e traçar os meus lábios com um dedo.

Regulus me beijou com a suavidade furiosa que só ele poderia ter. Tinha gosto de ferrugem e de saudade antecipada. No fim, os nossos olhos dizendo que aquilo era tudo e, talvez pela primeira vez, eu lamentei pelo que ficou por dizer.


N.A.: Minha primeira tentativa de Sirius/Regulus, feita pro 33º Challenge Relâmpago do 6v :)