Título original: "The spell that cannot be broken

Autora: Silver Weasley


1º ano - Primeiras lágrimas

Eram 11 horas e Ron Weasley não conseguia dormir. Ele tinha 11 anos e era a sua primeira noite em Hogwarts. O chapéu seleccionador tinha-o posto nos Gryffindor (graças a Merlin), tinha conhecido o famoso Harry Potter e era a primeira vez que dormia fora de casa sem a sua mãe ou o seu pai por perto. Não que ele sentisse saudades, vocês sabem…

No entanto ele estava cansado e apesar de os primeiros anos terem sido restritamente avisados de que tinham de se deitar às 9 horas, ele saiu do dormitório, passou pelos seus novos colegas e foi em bicos de pés até à confortável e vazia sala comum.

Ele sentou-se numa cadeira e olhou para o fogo que ardia na lareira, esperando que as saudades que sentia de casa passassem. Sim, ele admitia: estava com saudades. Ele era um aluno do primeiro ano e já era crescido o suficiente para dormir fora de casa. Ele não devia sentir aquela dor horrível no estômago nem estar a pensar: "Eu quero a minha mamã." Ele afundou-se ainda mais na cadeira e suspirou longa e sofregadamente.

Era errado estar tão assustado com tudo aquilo? Pela primeira vez na vida, ele seria capaz de aprender magia e quem sabe ser bom no uso desta. Ou talvez não.

Era tudo acerca de falhar para Ron – o medo de o fazer. Ele cresceu na sombra dos seus irmãos mais velhos, com o peso de viver para os alcançar, para se afastar e ainda assim fazer a sua família feliz por uma vez sequer. Ele tinha uniformes em segunda mão, um rato velho sem um dedo e uma varinha velha. Além disso, parte dele achava que a sua vida ali seria miserável. Ele enterrou a cabeça nas mãos; antes tirar aquilo de dentro de si cedo, do que tarde.

Harry parecia ser uma pessoa simpática, mas quem garantia que ele não mudaria de ideias em relação à sua amizade com Ron? E se ele decidisse ser amigo dos outros colegas – Seamus ou Dean, talvez? – e deixasse Ron de lado?

Sozinho. Sem amigos. Sem dinheiro. Sem a mãe para o abraçar caso ele tivesse um dia mau. Sem Ginny para o espicaçar e jogar xadrez com ele. Sem o pai a quem dizer piadas.

"Oh Merlin", pensou ele deixando cair uma lágrima pela sua face sardenta. "Eu nunca pensei que fosse sentir saudades assim tão depressa."

-Humm… Desculpa, eu estava só… Estás bem? – Ron procurou a voz e ao levantar-se da cadeira, quase que se esbarrava com a rapariga de cabelos armados que havia conhecido no comboio. Ela estava a usar uma camisa de dormir azul e carregava um pesado livro. A sua cara estava pálida debaixo da imensidão de cabelos.

-Eu estou bem. – respondeu ele. – E tu, o que é que estás aqui a fazer?

-Eu não conseguia dormir. – disse ela calmamente - E tu?

-Ahh… Claro que conseguia. Eu só queria…erm…

-Sentes saudades de casa? – perguntou ela olhando para ele. – Tens a certeza de que estás bem? Os teus olhos estão todos vermelhos.

-Claro que estou bem. – disse-lhe Ron, defensivamente, voltando à sua voz. – Eu apanhei uma constipação e estava cá em baixo a tentar esvaziar a mente. Eu vou voltar para a cama. – ele virou-se, andando em direcção às escadas, mas a rapariga atrás dele disse-lhe:

-Está tudo bem. Eu não vou dizer a ninguém que estavas a chorar. – Ron contraiu os músculos e virou-se para olhá-la antes de voltar para o dormitório. Uma parte de si sabia que ela estava só a tentar ser simpática, mas ele não gostava de pessoas que soubessem as suas fraquezas. "Eu não estava a chorar" pensou ele, "eu só tenho saudades de casa".

A sua visão turvou-se quando mais lágrimas caíram. Ele afundou a cara na almofada. Esta seria uma longa, longa noite.

4º ano - O regresso d'Aquele-Cujo-Nome-Não-Deve-Ser-Pronunciado

Tinham passado horas desde que Harry tinha aparecido no campo de Quidditch carregando o corpo de Cedric Diggory e a Taça do Torneio dos Três Feiticeiros, mas Ron ainda não tinha parado de tremer.

Tinha sido a angústia, a tristeza e o choro de Mr. Diggory que o tinham assustado mais, esquecendo o facto de que toda a escola entrara em pânico, apesar dos esforços dos professores para acalmar os alunos. Os chefes de equipa, os prefeitos, e os chefes de turma tinham conseguido levar quase toda a gente para a escola e mantê-los em segurança nas respectivas salas comuns.

O Harry disse-lhe que o Quem-Nós-Sabemos estava de volta. Falou-lhe do cemitério, dos Devoradores da Morte e da reencarnação do Senhor das Trevas. E disse-lhe que o Moody era o filho de Mr. Crouch sob o efeito da poção Polissuco.

Então, pálido e assustado, Harry tinha ido tentar dormir. Ron e Hermione sentaram-se ao lado um do outro, ambos bastante assustados com tudo o que se estava a passar.

-Ele está de volta. – disse Hermione num murmúrio, a voz a falhar-lhe.

-De volta – repetiu Ron contraindo tanto os músculos que até a cara ficou corada. – Estás bem?

-Não – respondeu ela, a sua voz a falhar novamente. Durante toda a noite ela tinha ficado calma, mas agora Ron podia ver o terror invadir-lhe os olhos de chocolate e quando uma lágrima jorrou deles, Ron teve que lutar para que o nó histérico que tinha na garganta não se desfizesse em lágrimas.

-Eu também. – disse ele, conseguindo falar apesar do nó.

-Oh, Ron. – murmurou ela deixando a sua cabeça pousar no ombro dele. Ele colocou uma mão nas costas dela e tentou reconfortá-la o melhor que conseguiu.

-Estou assustado, Hermione. Ele matou tantas pessoas e agora está de volta. – os seus olhos encontraram os de Hermione e esta disse:

-Não faz mal estares assustado. Eu também estou, aliás, todos estamos.

-Eu não sei o que faria se te perdesse ou ao Harry. Eu não sei o que faria se a minha família…a Ginny…se eles… - o medo era imenso. Todas as horríveis histórias que os pais lhe tinham contado. Podiam acontecer tantas coisas ao trio.

Ron não se apercebeu de que estava a chorar até Hermione o ter abraçado e ele ter descansado a cabeça no seu ombro. Não conseguiu notar as lágrimas que lhe corriam pela cara até que ela pousou a sua cabeça no topo da dele, para tentar acabar com os soluços e choros.

Eles ficaram ali sentados por algum tempo e desta vez, Ron não se importou de se sentir fraco.

5º ano - Mr. Weasley e a serpente

O seu pai quase morrera.

Ele fôra atacado pela serpente do Quem-Nós-Sabemos e quase morrera.

O seu pai estava no hospital porque quase morrera.

Tinham passado dias e mesmo assim Ron não conseguia esquecer. Ele tinha ficado feliz pelo facto do seu pai não ter morrido, dele ter conseguido sobreviver, pelo Harry ter tido aquela visão e ter avisado todos a tempo. Mal teve tempo para chorar. Ele tinha ficado pasmado quando ouviu as notícias e não houve tempo para lágrimas.

Incomodava-o o facto de ainda se sentir assim. Afinal de contas, era quase Natal. Harry tinha sido convencido de que não estava a ser possuído, a Hermione estava de visita e Ron estava mais assustado do que nunca com o regresso do Quem-Nós-Sabemos.

Ele estava sentado no quarto que partilhava com Harry, em Grimmauld Place, quando a Hermione bateu à porta e entrou. Harry estava lá em baixo com Ginny, Fred e George a jogar Cartas Explosivas.

-Como é que te sentes? – perguntou Hermione, sentando-se na cama ao seu lado. – Tens estado horrivelmente calado estes últimos dias.

-Continuo chocado… – admitiu Ron. – Ele quase morreu, sabes?

-Eu sei. – disse ela pondo-lhe uma mão no ombro. – Mas ele está vivo, não está?

-Sim, mas isso não quer dizer que algo como isto não vai voltar a acontecer. – disse-lhe Ron, olhando para os seus pés. – Estou preocupado, só isso.

-Claro que estás preocupado Ron, aliás, não é para menos. – disse Hermione pondo a outra mão no braço dele. – Olha, não podes ficar assim. Anda lá, vem jogar xadrez comigo! Ganhar-me faz-te sempre sentir melhor. – Ron deu-lhe um sorriso fraco, mas não olhou para ela.

-Não é uma má ideia. Queres jogar cá em cima?

-Claro. – disse ela levantando-se e ajeitando a saia. – Eu vou buscar o tabuleiro. – quando teve a certeza de que ela já tinha ido embora, um lágrima caiu dos olhos verdes de Ron.

6º ano - O funeral

Ron nunca tinha estado num funeral, mas há uma altura para tudo. Havia gente à sua volta a falar da carreira de Dumbledore, Hermione a chorar compulsivamente, e de repente a sua visão ficou turva.

Pela primeira vez ocorreu-lhe que o melhor feiticeiro do mundo tinha partido. Para sempre. Essencialmente, estavam todos lixados, segundo Ron.

O funeral acabou, Harry saiu, deixando Ginny sozinha e Seamus tinha o braço à volta da chorosa Lavender.

-Ron? – perguntou uma voz ao seu lado. Ele virou-se e viu Hermione, com lágrimas a correrem-lhe pela cara.

-Anda cá. – disse ele puxando-a para um abraço. Ele chorou no seu ombro e passou-lhe a mão pelo cabelo. O que é que ele podia fazer mais? Seria estúpido murmurar-lhe que tudo iria passar e que ele iria protegê-la. Era uma promessa que ambos sabiam que não podia ser mantida.

Ele amava-a. Percebeu-o já há muito tempo e este abraço relembrou-lhe isso. Ele amava-a e tinha medo que ela talvez nunca viesse a saber disso. Dumbledore partira, partira para sempre, e agora Ron sabia que a guerra se tinha tornado mais difícil. O homem que podia ter salvado o mundo tinha morrido na altura de mais necessidade.

Parecia uma sentença de morte.

Então, quando Hermione chorou mais uma vez no seu ombro, Ron chorou também, lágrimas a correrem-lhe pelo nariz até ao cabelo de Hermione. Eles choraram por Dumbledore, por Harry, por si próprios e pelo mundo.

Ele chorou por aquele momento, pelo dia de Verão e por cada inspiração que fazia.

Ele chorou pela vida.

6º ano - Um bom prenúncio

O comboio ainda estava longe da plataforma nove e três quartos e Ron e Hermione estavam a cumprir deveres de Prefeito. Parecia estúpido ter que fazer uma ronda para "manter tudo calmo", mas pelo menos isso conseguia mantê-lo ocupado, longe da enorme discussão entre Harry e Ginny num compartimento abandonado. Algo sobre Ginny "não desistir assim tão facilmente", o quer que isso fosse.

Ele e Hermione pararam num corredor, em silêncio, e mantiveram-se lá durante algum tempo, encostados à parede. A tensão era palpável; após o funeral, as lágrimas e o pacto de seguir Harry, Ron e Hermione estavam ambos solenes, perdidos nos seus próprios pensamentos.

Ron tinha estado a reflectir sobre todas as asneiras que tinha feito durante o ano. O que é que podia ter acontecido se tivesse evitado fazer algumas. Abruptamente, algo fez um "click" no seu cérebro. Ele estava ali, em frente à rapariga com a qual queria casar – ele estava mesmo à sua beira – e ele nem sequer a tinha beijado ou dito que estava arrependido por tê-la magoado ou até mesmo que gostava dela.

Bem, a morte pairava e esta era uma oportunidade que não se podia desperdiçar. Ele tinha a certeza de que não o faria.

-Ei, Hermione? – disse ele num tom casual.

-Sim? – perguntou ela olhando-o nos olhos.

-Desculpa aquilo da Lavender. – disse ele. Ela pestanejou e disse:

-Ron, o que é que…

-Olha, ambos sabemos porque é que eu saí com ela, – disse ele – e eu fui estúpido e estou arrependido, não devia ter-te tratado da maneira que tratei, não devia ter-te magoado. Eu estava só… eu estava só passado da cabeça contigo, e eu sei que não é desculpa, mas, bem… err… - houve um longo silêncio até que Hermione disse:

-Isso foi inesperado.

-Eu cometi erros. – explicou Ron – Quer dizer, é claro que eu cometi erros mas cometi muitos em relação a ti. Eu sei que fui estúpido – pior do que estúpido – e Hermione, eu desperdicei muito tempo.

-O que é que queres dizer com isso, Ron? – perguntou ela.

-Tu sabes o que é que eu quero dizer.

-Não, não sei. – disse ela numa voz sumida. – Eu quero que me expliques. Estou farta de tentar adivinhar o que queres dizer, o que tu sentes. Elucida-me, está bem?

-É justo. – com isto, aproximou Hermione dele.

-O que é que estás a fazer? – perguntou ela enquanto ele afastava um fio de cabelo da cara dela. – Ron…?

-Eu quero ser perfeitamente claro. – murmurou ele, chegando-se ainda mais perto de maneira a que eles ficassem apenas a escassos centímetros de distância. – Eu não quero estragar tudo, desta vez.

-Eu… - ela olhou para ele, os olhos abertos de espanto, a cara corada e recuou. Ele foi até ela, agarrou-a pela cintura. – Eu não tenho a certeza se…se…

-Não estejas assustada. – murmurou Ron, encostando a sua testa à dela. – É apenas amor. – E então, ele acabou com o espaço que restava entre eles e beijou-a. Ela correspondeu, aproximando-se mais. As suas mãos passaram dos braços dele suavemente até ao seu pescoço, e os seus dedos enterraram-se no cabelo dele.

Foi breve, foi lindo, foi maravilhoso, mas acima de tudo, foi o concretizar de um sonho.

Talvez porque tinham aquele sentimento puro, estranho, guardado dentro deles há tanto tempo. Quando se separaram, ambos a respirar ofegantemente, ainda admirados com o poder de tudo aquilo, Hermione sussurrou, a voz sumida:

-Eu amo-te. – aquelas foram as palavras mais bonitas que Ron alguma vez ouviu e encheu de coragem, poder, força…algo que ele nunca tinha sentido antes. O medo persistia; ele continuava aterrorizado com o facto de ir para uma guerra inganhável. A diferença era que agora, ele sabia melhor do que nunca porque é que o ia fazer.

Ele ia fazê-lo porque amava Hermione, a paz e o bem-estar. Ele ia fazê-lo porque Harry Potter era como um irmão para ele, porque ele queria que os seus pais vivessem para ver os seus netos, porque no fim de contas, Ron Weasley fazia sempre a coisa certa.

"Isto é coragem" pensou ele, "isto é crescer."

-Eu também te amo. – disse ele a Hermione e essa foi a coisa mais honesta que ele alguma vez disse. Eles sorriram um ao outro enquanto ele apertava mais os seus braços à volta dela e as testas de ambos descansaram uma na outra uma vez mais. Ron não se lembrava de alguma vez se ter sentido assim tão poderoso e feliz.

Se um amor assim podia incutir nele tanta coragem, então talvez houvesse esperança. Afinal, não era a sua alma que tinha sido dividida em sete partes.

Ron tinha chorado por muitas razões – dor, frustração, por estar zangado, magoado e por tristeza – mas nunca tinha chorado de alegria. Francamente, isso sempre lhe parecera estúpido; se uma pessoa se sente feliz, porquê gastar tempo com lágrimas?

Para sua surpresa, várias lágrimas começaram a correr-lhe pela cara, livremente, mas ele não se importou – não traziam dor.

-Ron, o que é que se passa? – perguntou Hermione preocupada. Os seus dedos acariciaram-lhe a cara e ela olhou para os olhos dele.

-Estou feliz, só isso. – disse ele abrindo um sorriso. Os seus olhos abriram-se em surpresa, depositou-lhe um beijo na cara e murmurou-lhe:

-É grande demais para ser descrito em palavras, não é?

-Muito grande. – concordou ele. – Mas talvez seja esse o objectivo. – ele cobriu as mãos dela com as suas, inclinando-se para a beijar outra vez, com lágrimas na face e a esperança de ser mais forte do que alguma vez fôra. Ron sabia-o sem dúvida alguma.

Ele podia ter imortalidade, um grupo de fiéis seguidores, magia negra horrível e o mal do seu lado, mas Quem-Nós-Sabemos – não, Voldemort – não tinha hipótese alguma contra o amor.