I ain't in no hurry, you go run and tell your friends
I'm losing touch
Fill their heads with rumors of impending doom
It must be true

Não estou com pressa, você vai correndo contar aos seus amigos

que estou perdendo o jeito

Enche a cabeça deles com rumores de uma perdição iminente

deve ser verdade

Losing Touch – The Killers

Ele não fazia idéia de quanto tempo havia se passado desde que entrara ali. Uma hora? Duas? Doze? Não importava. Aliás, o que importava naquele estágio? Só mais um copo de qualquer coisa com um teor alcoólico muito alto na sua mão e a perspectiva de que isso anestesiasse a dor que ele sentia no peito dele.

Aquilo tudo era culpa dele. Por mais que alegasse ver por trás do que ele realmente era, Rose não compreendia nem um terço. Como ela poderia entender como era difícil ter crescido com todas aquelas expectativas em cima de você? Ela era naturalmente genial, não era como ele que tinha que se esforçar.

E não era fácil, depois de tantos anos, parar com tudo o que havia feito. Era um processo contínuo de destruir as expectativas alheias uma a uma, para não decepcionar ninguém. Melhor surpreender quando fizer algo bom do que decepcionar quando fizer algo errado. Adrian odiava esse tipo de pressão.

E ele apostava que se Rose tivesse crescido num ambiente em que fosse conhecida como "o sobrinho da rainha", ela também teria se distorcido de alguma forma. Ela não podia julga-lo assim.

Mas não era isso que era o pior. Ela podia te-lo chamado de rato, covarde, de qualquer coisa, se não o tivesse traído. Era isso que doía mais, o fato de sua confiança ter sido quebrada. Ele se esforçava mais do que conseguia, fazia tudo o que ela queria e no final só recebeu ingratidão e desprezo daquela vadia. E Belikov? Ele havia confiado cegamente numa cobra criada, que só fez devorar a sua mulher e deixá-lo na merda.
Tudo bem. Ele ainda tinha a bebida.

Em algum lugar, uma música da Amy Winehouse tocando tornava tudo ainda mais deprimente. Ele, Adrian Ivashkov, sobrinho da rainha assassinada, numa espelunca daquelas? Era de se esperar. Principalmente porque aquele era o décimo dia desde aquela conversa.

Era muito divertido, para não dizer o contrário, ver Lissa, Christian, aquela vadia e seu consorte brincando de governarem os vampiros do mundo. De repente era como se ele nunca tivesse existido, nunca tivesse passado por tudo o que passou para ajudá-los.

Você está sendo irracional, Adrian.

Não, ele só estava sendo realista. Eles o haviam usado. Seu dinheiro, sua influência, o fato de ser portador do espírito... ele não passava de uma cobaia, uma marionete. E era disso que sua vida consistia: se ele confiasse em alguém, desse seu melhor, as pessoas o desapontavam. Então por que diabos ele tinha que se dar ao trabalho?

Tomou o seu novo drink de uma vez e sentiu o mundo girar. Era agradável perder o controle assim, esquecer de tudo e de todos e se entregar ao seu mundo pessoal. Ele já havia desistido de tentar viver na realidade e era mais fácil se perder se estivesse bêbado. Não que fosse por causa do espírito, porque ele ficava adormecido, mas sim por causa do efeito inebriante da bebida.

Em algum momento, alguém o levou para seu quarto. Ele não sabia exatamente quem nem quando porque estava desmaiado, mas quando acordou deu de cara com seus aposentos. Estava na cama, sem camisa e embaixo das cobertas. Sua cabeça rodava e doía e ele esticou a mão para procurar a garrafa de uísque que deixava na mesa de cabeceira para curar a ressaca. Não encontrou nada.

Um pouco de loucura deve ter-lhe vindo a cabeça, porque a primeira coisa que pensou foi que Rose havia roubado a sua bebida. Aquilo não fazia sentido. Provavelmente ele havia acabado com a garrafa e esquecido de pegar outra no bar.

— Procura isso, Lorde Ivashkov? — a voz o assustou e o fez sentar direito na cama, o mundo girando ainda mais. Ouviu uma risada contida. — Por favor, não se levante de uma vez. Não quer vomitar no carpete como vomitou na minha roupa.

Ele fez uma cara confusa ao tentar focalizar sua visão na pessoa que falava com ele. Era uma mulher com uma roupa preto e branca.

— Seja lá o que eu te prometi noite passada, eu estava bêbado. Pode ir falar com a minha mãe que ela resolverá qualquer problema que tiver. — ele falou enquanto levantava a coberta.

Ele estava de calça. Então aparentemente não havia chegado aos finalmentes com ela. Suspirou um pouco aliviado. Ele tinha medo do que poderia fazer enquanto bêbado e tinha certeza de que não queria deixar vários bastardos por aí.

— Tome isso. — ela lhe entregou uma garrafa de água enquanto repousava a garrafa de uísque no criado mudo. A voz dela tinha um sotaque rico, que enchia os ouvidos e dava vontade de sorrir. — Noite passada você só prometeu que viria comigo depois de "mais um" e tomou praticamente todo o bar.

— Bem, desculpa? — ele disse, tomando um gole da água. Sua cabeça se estabilizou um pouco e ele tentou se levantar. — Minha mãe a mandou?

— Sim. Eu tive dificuldades em achá-lo, mas minhas habilidades de pesquisa são fantásticas. — ela disse, em tom sarcástico. — A propósito, sua mãe pediu que vá vê-la.

— Por que eu deveria? — ele se levantou e caminhou até o banheiro. A mulher permaneceu parada no quarto, as mãos apoiadas nas costas.

— Eu só repasso as ordens.

Ele resmungou algo e fechou a porta do banheiro. Ouviu a outra porta bater quando a mulher saiu e abriu o chuveiro, se enfiando lá dentro. Sua mãe era uma das pessoas que ele menos queria ver no mundo, junto com a Rainha e seu séquito de aproveitadores adestrados. Ela estava radiante com o fim do seu relacionamento com aquela vadia e aproveitava cada momento que podia para apresenta-los à nobres e respeitosas senhoritas da realeza moroi.

Isso era o mesmo que dizer que ela as apresentava para meninas sem graça que só sabiam falar sobre brocado e fofocar sobre as últimas basbaquices que aconteciam na corte. O fim do relacionamento dele com Rose era uma delas e ele não agüentava mais ter que ouvi-las dizendo como era terrível e tentando remendar seu coraçãozinho.
Ele gostava do seu coração despedaçado. Era muito melhor, porque evitava que ele o quebrasse novamente.

Saiu do banho e se vestiu, encontrando a mulher parada do lado de fora do seu quarto. Sua mãe deveria saber que não era certo enviar uma guardiã para busca-lo. Lembrava-o demais de Rose. A mulher em questão devia ter a mesma idade que ele, com os cabelos cor de mel presos num rabo de cavalo e olhos assustadoramente azuis, como os de Christian. Era cheia de sardas e isso lhe dava um ar de mais nova, junto com a baixa estatura. Como uma criatura que parecia ser tão pequena poderia lutar e protege-lo?

— Qual o seu nome? — ele perguntou, por educação.

— Guardiã Brennan, ao seu dispor. — ela respondeu com um tom educado, seguindo-o ligeiramente atrás, como era o protocolo.

— Não preciso que me escolte, Senhorita Brennan. — Adrian disse, em tom irritado.

— Lady Daniela Ivashkov deu ordens expressas de que eu só poderia deixa-lo a sós quando você a encontrasse. — ela disse, com um tom leve que pareceu quase brincadeira com o sotaque engraçado dela.

— Hunm... — ele resmungou e tirou um cigarro do bolso, acendendo-o. O que diabos exigia tanta urgência?

— Isso tem cheiro de... — Brennan parou a frase do meio e pareceu um pouco constrangida. — Desculpa.

— Não se preocupe. Não gosta de cigarro? — ele disse, com um tom meio azedo. Mais um ponto para ela por parecer com Rose.

— Não é isso. — ela balançou a cabeça, visivelmente constrangida com a quebra de protocolo. — Tem cheiro de trevos.

— Ah. É. Prefiro esse cheiro aos outros.

Ela ficou calada e Adrian a examinou com o canto dos olhos. Guardiã Brennan não havia dito nada, mas era óbvio por sua expressão que ela gostava do cheiro. Ela gostava do cheiro. Era óbvio que Adrian estava sonhando novamente.

Caminharam mais um pouco até chegar nos aposentos de Daniela e Brennan abriu a porta, conduzindo-o para dentro. Sua mãe estava sozinha, acomodada em uma das cadeiras com um livro no colo e levantou os olhos. Sorriu para Brennan.

— Oh, bem que disseram que você era a melhor, Faith. Você realmente trouxe Adrian até mim. Não sei como agradecer.

— Não se preocupe, Lady Daniela. Essa é só minha obrigação. — Brennan lançou um olhar pra Adrian que ele não soube decifrar. — Ele está aqui. Sóbrio. Como pediu.

— Obrigada. Pode se retirar.

Ficaram a sós e Daniela apontou uma cadeira para que seu filho se sentasse. Adrian se acomodou, tragando mais um pouco do cigarro.

— Não sei por que você ainda fuma essas coisas, meu filho. Se tinha uma vantagem no seu relacionamento bobo com Rose, era que ela o fazia parar com seus vícios.

— Você me chamou aqui para me criticar, mãe? — ele disse, irritado, dando uma baforada na direção dela.

— Não, querido. Nós temos uma solenidade para ir e a rainha requisitou especialmente que você esteja presente. — Daniela espalhou a fumaça com a mão, fazendo uma careta.

— Diga para ela que eu enchi a cara e desmaiei em algum lugar por aí.

— Ela é tão boa para você, você deveria ter um mínimo de respeito por ela.

— Eu tenho. Diga a ela que qualquer instante em que quiser falar comigo, ela pode vir. Mas a sós. Sem aquela capacho que ela chama de guarda-costas junto.

— Adrian! — Daniela soou escandalizada. — Não diga algo assim, pode ser considerado traição!

— Você sabe, eu não me importo, de verdade. — ele deu de ombros.

Sua mãe o encarou por alguns minutos, parecendo pensativa. Ele procurou com os olhos por alguma bebida — qualquer bebida — que pudesse confundir os seus sentidos. Era como se seu peito tivesse sido aberto por uma bomba nuclear. A perspectiva de rever Rose, depois de tudo aquilo, era aterrorizante. Adrian não fazia idéia do que faria, de qual seria a sua reação.

— Eu e seu pai conversamos sobre você. — ela se levantou e se aproximou. — Você sabe, por mais que não pareça, seu pai se preocupa com você. E ele sugeriu algo que talvez você ache absurdo, mas acredito que seja uma boa idéia.

— O quê? — ele disse, irritado. Lá vinha bobagem.

— Que você saia da corte. Vá viver a sua vida em alguma cidade humana, freqüentando alguma universidade ou algum curso ou até mesmo indo encher a cara de barzinho em barzinho. Pelo menos até que isso se resolva.

Sai da corte. Ir estudar em algum lugar? Aquilo não daria certo. Mas a idéia pareceu boa, uma forma de fugir daquilo, da pressão que Lissa iria fazer até conseguir vê-lo. Ela o havia dado algum tempo, mas ele precisaria de mais.

— Hunm... que lugar vocês cogitaram? — ele perguntou, apagando o cigarro no estofado do sofá.

— Não sei. Onde você quiser. Podemos consultar seus futuros guardiões, se quiser.

— Ah, é isso. É isso, não é? Por isso você mandou aquela garota ir me buscar ontem, para testá-la. — Adrian afundou na cadeira, a necessidade de um drinque cada vez maior. — Você quer chamá-la aqui e perguntar para onde ela deseja ir? Eu deixo.

Daniela deu um sorriso. Adrian já devia saber que sua mãe escondia muita sagacidade embaixo daquela máscara de submissão caseira. Ela seria uma ótima rival para qualquer um dos políticos da Corte, qualquer dia que desejasse. Era, inclusive, muito mais desenvolta que seu pai. A mulher caminhou até a porta e chamou a guardiã de volta para o cômodo. Faith Brennan parou no meio da sala, sob o olhar dos dois morois, se sentindo ligeiramente desconfortável.

— Sim? — ela perguntou, seu sotaque cada vez mais agradável aos ouvidos de Adrian.

— Se você tivesse que trabalhar em alguma cidade, como guardiã de alguém, onde seria, guardiã Brennan? — Adrian perguntou e recebeu uma cara de espanto.

— Na América?

— No mundo. — Adrian disse, antes que sua mãe pudesse responder.

— Dublin. — e essa palavra a entregou. Ela era irlandesa.

— Então, querida mãe, nós vamos para Dublin. — ele se levantou e jogou o cigarro num lixo. — Onde eu vou beber, beber, beber até cair! Io-lê-i-hul!

E ele deixou as duas mulheres no quarto, sua mãe extremamente irritada ao ver seu feitiço se voltando contra ela e a guardiã confusa e sem entender o que estava acontecendo.

A perspectiva da Irlanda era agradável. Boas bebidas, boa gente, boas mulheres... Era bem melhor do que se afogar em álcool nesse fim de mundo, cercado por aproveitadores e fofoqueiros.

Xxxx

NOTAS:

Oi, pessoas. Volto do além. Não perguntem de Sinfonia, por favor.
Er... sei lá a periodicidade disso, mas acho que vai ser rápida e eu vou terminar. Torçam para nada bizarro acontecer no caminho.
Ta aí, sem muitos spoilers de Last Sacrifice, mas eu recomendaria parcimônia. Nenhuma revelação que não seja óbvia, também.
A Faith é criação minha.