À Procura

"E a rotina crescia como planta

Destruia metade do caminho

e a mudança levou tempo por ser tão veloz

enquanto estavamos a salvo"

Legião Urbana - perdidos no espaço


Procurava, entediado através dos diversos links e resumos, algo interessante pra ler.

Haviam passado oito anos, quando ainda entrava na adolescência, foi transferido do orfanato da Suécia, sua terra natal, para a Grécia, mas por um imprevisto ele e mais algumas crianças estiveram uma semana na Itália.

"Ah não, as coisas aqui vão demorar demais pra acontecer!" Pensava enquanto lia o início, avaliando se valeria a pena ou não continuar a leitura.

Os lábios, quentes e macios, tomaram os seus de assalto. Um arrepio de prazer lhe passou da ponta dos pés até a raiz dos cabelos que, fartos e lisos, não saiam das mãos desconhecidas. Tímido, tocou nos ombros do rapaz fazendo-o pensar, ou melhor, fazendo-o ouvir uma vozinha lá no fundo, e em milésimos de segundo, que músculos grandes podiam ser fofinhos ao toque, uma descoberta deveras reveladora...

"Opa! Assim também está muito rápido! Quero algo mais romântico..."

Retornando à página inicial do sítio notou que havia uma nova estória, justamente de sua autora favorita! Parecia que ela escrevia sob medida para seus gostos! Adorava deixar-lhe milhares de recados, sempre com um pseudônimo feminino. Era necessário ser prudente, mas sem abdicar de suas preferências. Com prazer então, deixou-se embalar pela leitura, dando um descanso a si mesmo em meio à pressão que o trabalho lhe impunha.

No entanto, menos de quinze minutos depois, se sobressalta com batidas na porta e imediatamente minimiza a página colocando um relatório em pdf no lugar. O que talvez nem fosse necessário, já que em seu escritório sua cadeira ficava de frente para a porta, a tela do computador de frente a si próprio, consequentemente inacessível aos olhos de um intruso. Reconhecia que às vezes era meio neurótico com essas coisas.

- Senhor Camus, está tudo pronto para a visita ao empreendimento, o motorista está à sua espera. – Hyoga tinha permissão para entrar após as batidas sem precisar esperar o "entre", porém o fazia constantemente receoso, seu patrão era extremamente irascível quando se tratava de sua privacidade.

Observando o secretário loiro, ficou sem saber o que fazer. Nem sempre era fácil sair de seu mundo da fantasia para a realidade. Olhou para a mesa, procurando ajuda, e seu olhar recaiu sobre o relatório "Viabilidade econômica do empreendimento de conforto intrapredial" e uma avanlache de pensamentos cascateou trazendo-lhe a razão da visita. Rapidamente se concentrando, recolheu seus papéis e retornou ao seu mundo de números, contas e exigências. Dirigiu-se a porta decidido, nem uma sombra do olhar sonhador em sua expressão dura.

&

O funcionário, ignorando as ordens que lhe haviam sido dadas, carregou o pequeno carrinho com uma pilha enorme de tijolos. Levaria rápido e ninguém veria! Talvez... se no meio do caminho não houvesse uma pedra! A roda única da frente do veiculosinho não suportou a leve inclinação imposta e tombou.

Além do barulho assustador, os milhares de cacos de tijolos colocaram em polvorosa o antes tranqüilo canteiro de obras. Ouvindo a algazarra, o engenheiro, concentrado em digitar algo no computador enquanto a estagiária zapeava a internet, interrompe sua tarefa em busca de descobrir a origem de tanto barulho.

Mal coloca os pés fora de seu excepcionalmente organizado escritório e se petrifica com uma visão do inferno! Tivera tanto trabalho pra colocar ordem naquilo tudo.

- Ah, hoje alguém morre! Que poxxx é essa? Eu já falei milhares de vezes pra usarem a retroempilhadeira com os tijolos! Quem foi o imbecil? E logo hoje que o arquiteto enjoadinho vem conferir a obra! Merda, merda, MERDA! – berrava a plenos pulmões, e nenhum dos empregados de vistas baixas ousariam irritá-lo ainda mais com respostas para suas perguntas que eram obviamente inúteis.

Organizou os homens e distribuiu ordens para amenizar o caos. Porém, sentindo-se ansioso começou ele mesmo a recolher os destroços, estava quase na hora do arquiteto chegar e a imagem que tinha dele era péssima. Haviam lhe dito que o homem era o diabo em pessoa! Sempre rigidamente no horário, exigia muita organização, limpeza e lucro de cada um dos seus investimentos, pois sim, o cara pagava seu salário. Era, além de tudo, um dos acionistas da empresa. Depreciativamente imaginava que seria alguém narigudo e esnobe. Arquiteto? Essa raça não prestava!(1)

&

O carro parou em frente uma grande obra de um edifício com dez andares. Era sua obra prima, deixara nas mãos de um engenheiro ainda jovem, mas parecia-lhe competente, embora displicente. Não o conhecia, apenas haviam lhe dito que ele era desorganizado, seus relatórios, pelo menos, eram sempre muito bons. Fato inédito, pois todos sabem que engenheiros são analfabetos. (2) Veria a verdade hoje.

Desceu languidamente do carro, aliás, seus movimentos eram sempre calmos, deslizantes. Surpreendeu-se com a ordem que encontrou na parte da frente, no entanto, ao atravessar as pilastras teve uma visão do fundo, onde provavelmente ficaria o pequeno escritório de engenharia, e outra vez se surpreendeu, só que negativamente dessa vez.

Reinava a bagunça no recinto. Algo devia ter explodido em milhões de pedacinhos vermelhos, e uns vinte peões corriam tentando ajuntar e varrer. Pelo visto quem quer que fosse o responsável por isso se preocupava em arrumar apenas a parte da frente, essa era a impressão. "Uma superficialidade só a frente estar limpa! Esse tal de... Como é mesmo o nome dele?" Vasculhou o bolso interno do terno em busca do cartão, encontrando-o leu. "Milo? Isso. Um nome estrangeiro, não faço idéia de onde. Deve ser um sujeito horroroso, engenheiros são sempre tão estúpidos!"

Aproximou-se da muvuca, vasculhando o local à procura de alguém grande com uma barriga bem exuberante, a calça pendente por um cinto antigo e um cigarro seboso na boca. Tamanha era sua aversão por eles que sempre imaginava figuras asquerosas para representá-los. O problema é que quase sempre sua imaginação acertava.

Notou um rapaz que carregava baldes de sujeira vermelha para a caçamba. Ele destoava do ambiente com o cabelo loiro comprido amarrado em um rabo de cavalo, estava sem camisa e era bem fortinho por sinal. Será que malhava? Não, não era hora de dissecar um material masculino quando tinha tantos observadores por perto. Olhou pra dentro da porta e viu que o escritório estava vazio, não totalmente, é claro, a estagiária estava lá, mas desde quando ela conta? Estagiários não existem... começou a pensar que o fulano tinha simplesmente furado o compromisso. Sua irritação despontava perigosa.

O moço, o loiro com o cabelo longo levemente ondulado nas pontas, pareceu se surpreender com o homem parado em frente ao escritoriosinho e rapidamente aproximou-se dele um pouco suado e tentando, meio sem graça, recolocar os cabelos no lugar olhando em redor procurando alguma coisa, seja lá o que fosse parecia ter desaparecido em outra dimensão.

- Ah, oi! O senhor é o Camus, não é? – perguntou um sorriso cálido de criança quando pega em travessura. Camus não pode deixar de admirar o belo rosto do rapaz, mas não tinha tempo pra isso, e respondeu, sem polidez alguma.

- Estou à procura de Milo, pode me informar onde ele está? – Era mesmo tão chato como diziam, só não esperava a elegância e beleza que viriam juntos. Nunca antes tinha reparado em como olhos castanhos podiam ser envolventes. Milo desconcertado pelo tom imperativo e frio, sem ainda achar o que seus olhos buscavam, tentou ser educado oferecendo a mão e se apresentando:

- Sou eu mesmo.

- Sei, - disse sem corresponder ao cumprimento - mas eu quero falar com o Milo engenheiro, responsável pela obra... ou o que resta dela. – Era sempre preciso ser muito específico com esse povo, eles são meio lentos.

Milo não soube o que responder, mas dando conta de que com pó nas calças e descabelado como estava não poderia nunca ser admitido como responsável. Detestava pessoas que julgavam apenas pelas aparências, e, pelo que reparou, tinha um espécime desses à sua frente. Seria paciente, embora isso custasse, mas afinal não queria perder o emprego.

- Pois acredite senhor Camus, sou quem você procura, não parece, eu sei, mas é verdade. – Sorriu tentando amenizar a tensão. – Gostaria de entrar? Poderemos discutir melhor aqui dentro. – Abriu a porta gentilmente para o outro e pensou até em oferecer um café quando a voz semigrave e impassível chamou sua atenção novamente.

- Não seria melhor você estar... mais apresentável? – Olhava com desprezo para esconder toda sua admiração, o loiro engolindo em seco se pôs a procurar mais efetivamente até enfim encontrá-la atrás da porta. Sua camisa! Lembrava-se agora de tê-la jogado ali antes de se juntar aos seus homens, na tentativa de privá-la da sujeira geral. Esqueceu-se, entretanto, que no chão também tem poeira. "Vai assim mesmo! Cara chato..."

Devidamente vestido, começaram a discutir sobre o andamento da obra e os prazos, apesar de discordarem em quase tudo. Camus queria mais arte, Milo era mais prático, mas reconheciam mutuamente o talento do outro naquilo que fazia. Mesmo assim Milo considerou que Camus era só um mauricinho, e este achava o primeiro um desleixado.

&

Em casa Camus ponderava sobre aquele dia difícil. Após a visita na obra tivera mais uma longa reunião que nunca definia nada. Agora em seu banheiro, lavava até a alma daquelas incoerências de sua vida. Era uma pessoa pra os outros e outra totalmente diferente pra si mesmo. Na verdade ninguém tinha idéia de como era interiormente. Uma pena, o fato lhe empurrava ainda mais para a solidão.

Terminou o seu banho e vestiu o pijaminha sedoso, ansioso para dedicar-se confortavelmente de seu passa-tempo favorito. Ter uma boa história para ler sempre lhe dava uma felicidade boba. Abriu a caixa de emails simultaneamente ao sitio onde lia seus roteiros, e surpreendeu-se com um email em especial. Sua autora favorita respondeu a mensagem que mandou mais cedo! Apesar de vários outros recados que enviou, este era o primeiro respondido. Sentindo-se importante, leu o conteúdo da missiva eletrônica.

Olá Calista!

Obrigado pelos elogios!

Sabe que acabei me viciando nos seus recados?

Agora não me sinto plenamente feliz com minhas estórias se não recebo uma aprovação sua!

Loucura não? Mas é que suas mensagens sempre me motivam muito.

Adoraria te conhecer de verdade!

Beijos,

Quinze.

Ler o recado o fez ter, de repente, uma idéia maluca! Mas que não lhe saio mais da cabeça.

Seria bom ter alguém com quem conversar sobre as coisas que gostava, principalmente sobre os romances que lia, digamos pouco convencionais devido á sua própria preferência pouco convencional. Sentia falta de um contato mais humano, só falava sobre isso nas oportunidades escondidas que a vida virtual lhe oferecia. E ela era uma garota que escrevia sobre isso, com certeza lhe entenderia! E ainda ganharia uma amiga, estava sempre sozinho, isso cansava.

Decido, digitou a resposta.

Olá,

Fico honrada com suas palvras!

Conhecer-me? Por que não?! Te acho incrível, já que suas estórias me fazem rir e chorar, mas acho que você ficará surpresa ao me conhecer!

Mas podemos combinar de nos encontrarmos!

Pode ser na entrada do shopping central?

XD

Abraços da Calista!!!

Talvez tivesse ficado formal demais, porém não sabia como reagir, nunca conhecera ninguém assim e sentia-se levemente inseguro com o convite.

"Será que vai aceitar?"

Quem estava por trás da tela afinal?


(1) e (2) referem-se à eterna briga entre engenheiros e arquitetos. Não que eu goste menos de um e mais de outro!!!

Olá!

Tenham paciência! É minha primeira fic! XD

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Beijos!