Sempre...
O vento soprava frio e úmido, cantarolando entre as folhas e zunindo contra as pedras. Umedecia-me e arrepiava-me duma maneira triste, e nem cobertor nem nada no mundo poderia me aquecer se não aqueles abraços. Seu afastamento fazia tudo tão mais fácil e ao mesmo tempo tão difícil; posso dizer que meu desconforto é visível. Acho que ele percebeu, também. E eu não acreditei quando Konohamaru e Soki me disseram… E era tudo verdade… Era tudo verdade…
As sombras das árvores dançavam sob a fraca luz da rua. Meu suspiro se misturou ao vento, acompanhando seu sopro e perdendo-se ao longe. Não sabia se me sentia feliz ou triste, mas sabia que aquela noite seria inesquecível. A noite em que elevoltou. Voltara por mim? Sei lá… Mas estava vendo-o novamente. À minha frente; tangível e imponente, como nunca nos tempos de criança. Escondia-se por trás da mesma máscara de raposa, a mesma cisma por vestimentas alaranjadas… Era tudo tão ele e ao mesmo tempo, nada era como ele. Merda.
"Tive medo de jamais lhe encontrar novamente", disse entre suspiros. Senti meus olhos marejados, no entanto insisti em não chorar. Ele evitou se mover. Apenas coçou a nuca e eu me senti irritada e ignorada.
"Não é como se eu tivesse sumido para sempre, Sakura-chan", respondeu. Sua voz era inconfundível. Estava mais grave, de fato. Parecia um verdadeiro homem debaixo daquelas roupas. Aquilo me era agradável. Por um momento, senti toda a confiança que um dia tive ao seu lado. Pena que aquilo acabou num piscar de olhos, pois ele sumira naquela época. Como o vento que acabara de levar meu suspiro.
Por que ele tinha que agir daquela maneira? A dor em sua voz era tão sólida quanto a minha, pelos mesmos motivos e pelos outros. Eu sabia que a máscara escondia não seu rosto, mas sim o seu coração. Os mesmos motivos? Ah, sim. A morte é, supostamente, o maior motivo das dores que nos acomete; e a morte dele é o que nos trouxe o mesmo sofrimento. Os outros motivos? Ele nos deixou por isso. E eu sofri, assim como sofri pelo outro; e ele sofreu, também.
"Por que nos abandonou?", perguntei. Meus olhos tentavam achar a resposta sem forçá-lo a dizê-la. Contudo, aquela maldita máscara me impedia de alcançá-lo.
"Você tem um grande aprendiz. Desculpe-me por tomá-lo de você daquela forma. Prometo não o estragar!", respondeu me ignorando. Aquilo, sim, deixou-me com raiva. Fosse noutro contexto ele sabia que levaria uma surra. "Soki será grande, Sakura-chan. Você fez um ótimo trabalho, dattebayo!".
"Não posso apostar no futuro, embora também acredite no potencial dele. Ainda mais agora que o grande Uzumaki Naruto se tornou seu mestre representativo. Ensinou-o até mesmo a espionar mulheres durante o banho", respondi levemente irritada. Ainda tinha vontade de lhe dar uma surra, mas só sua presença ali me acalmava. Tive um desejo estranho de arrancar aquela máscara estúpida.
"Senti saudade'ttebayo", ele me disse. Como podem simples palavras terem o poder de me sufocar? Enfrentei coisas mais perigosas que esta, mesmo assim bastou a palavra saudade para que o vento arrancasse a lágrima que pendia em meu olho.
"Por que você nos deixou, Naruto? Por que me deixou?", foi o que pude dizer sufocando meu pranto. A pergunta saiu como um suplício e, talvez por isso, sua guarda tenha baixado.
Eis que naquele instante o capuz que lhe cobria caiu sobre os ombros, e as mechas douradas de seu cabelo voltavam a dançar com o vento. Seria este um sinal de que ele, finalmente, estaria pronto para começar de novo? Restava apenas uma barreira: a máscara de raposa que escondia seu coração. Era estranho como ele, de todas as pessoas que passaram pela sinistra provação dos Jinchuuriki, haveria de superar seu demônio interior e por ventura tornar-se um com este. Era tão estranho que, de tudo que poderia usar para esconder o coração, usara logo o símbolo de sua maior provação. E daí… Sem que eu percebesse, a máscara também foi retirada para o meu reencontro com seus olhos. Azuis… Intensos… Sinceros.
"Eu também senti sua falta", foi tudo o que pude dizer. Meus olhos continuavam marejados e senti um leve calor nas bochechas. Depois de tanto tempo estive segura novamente. Tal sensação que só Uzumaki Naruto me passava.
"Não faz muito o seu tipo dizer essas coisas, Sakura-chan. Também não é do seu feitio chorar, dattebayo. Desculpe-me se lhe fiz sofrer, mas não é certo viver em Konoha com uma vergonha dessas", ele suspirou ao fim do discurso. Soou novamente como uma estupidez. Alguém tão honrado como Uzumaki Naruto jamais teria uma vergonha em seu coração. Sua única falha foi um dia ter abandonado aquilo que ele mais queria. Devo assumir minha parcela de culpa nisso.
"Idiota! É isso o que você é, Naruto. Um grande idiota", disse com a voz chorosa. Seu olhar confuso só me serviu de gatilho, e desfaço-me em lágrimas agora. Aproximo-me com cautela, temendo que este momento seja apenas um sonho e que ele não esteja ali de fato. Apesar de sua confusão, ele permite que eu toque seu rosto e que, em seguida, envolva-o em meus braços. Posso senti-lo, então é real, penso. "Me perdoe, Naruto. Me perdoe por tudo o que lhe fiz passar…" sopro à beira de seu ouvido, e com um último suspiro digo: "Por favor, não me abandone mais".
O filho da mãe teve a audácia de tremer sob meu abraço. Quando me tocou de volta apenas disse o que eu queria ouvir. Falou o que os homens falam quando vão embora porque o mundo os chama; porque ainda não estão prontos para ficar. Foi apenas uma maldita mentira por temer o aconchego da felicidade.
"Eu prometo, Sakura-chan. Eu prometo...". Sua voz era rouca e aconchegante, apesar da mentira. Sempre confortável. Sempre.
Soube a partir daquele abraço que Naruto poderia voltar um dia, mas que este dia não era aquele. O idiota sempre dizia que não pode ser Hokage aquele que não consegue salvar nem mesmo um amigo. Todos disseram que ele o salvou, mas um idiota acredita em ninguém a não ser nele mesmo. Para Naruto, nada é mais desonroso que uma promessa não cumprida; e é exatamente este o meu maior pecado. Porque fui eu quem o fiz prometer…
O vento não me atormentava mais. Este papel era de seus braços, tão incertos e tão hesitantes, que pareciam não suportar o peso de uma folha. Novamente me enfureci e, no ápice de minha raiva, selei meus lábios nos dele. Se fosse para ir embora que pelo menos deixasse algo especial para mim. Seu corpo enrijeceu-se como pedra, e mesmo seus lábios custavam corresponder aos meus. Agarrei-o de modo que não pudesse me negar aquilo e, com muito custo, ele cedeu e apertou minha cintura. Agora, sim, seus lábios moviam-se corretamente. Foi um beijo muito gostoso, mas eu queria ainda mais.
O vento bagunçou nossos cabelos. Pareceram misturar-se num monte de fios, uns cor-de-rosa e outros amarelos. Sei disso porque encarei-o sedenta e ele retribuiu-me o olhar durante o beijo. Seus braços agora estavam firmes e me carregavam para dentro do quarto. Um pouco de brutalidade não fazia mal a ninguém; e eu estava cansada de gentilezas.
Nossas sombras projetavam-se na parede. Não que eu as tenha visto, mas porque deixei meu abajur aceso antes de ir à varanda. Se pudesse reviver tudo, queria vê-las seguindo-nos em cada movimento e gemer em frente a elas. Ah, sim. Isso foi depois. Primeiramente chegamos à beira da cama, agarrados como dois animais, mordendo os lábios um do outro e explorando tudo o que tínhamos direito. Machuquei minha perna na beirada da cama, mas não me importei e puxei Naruto para cima de mim. Havia travesseiros espalhados aqui e acolá, e a coberta, má arrotada, dobrava-se sob nossos corpos. Estava realmente bagunçado, mas não nos importávamos. Acho que foi só aqui, aliás, que minha mente pensou em algo que fizesse sentido, porque depois só queria arranhá-lo e busca-lo para mais perto de mim. Mesmo com os beijos eu já gemia… Ele já me tinha em mãos, só precisava me possuir… E assim o fez.
Fizemos tudo com roupa, mesmo. Quero dizer… A primeira vez estávamos com roupa. Da segunda em diante eu já não me lembro bem, mas sei que estava me apoiando à cabeceira enquanto gemia. Ah, sim. Esta foi a mais gostosa. Mas teve outra, também… Droga. Simplesmente não sei quando ele tirou minha roupa. Nem sei se fui eu mesma quem a tirou. Só sei que, poucas horas antes do alvorecer, eu estava enrolada no lençol e completamente nua. Havia uma dor gostosa na minha intimidade, e eu encarava o teto com os lábios entreabertos em ofego.
Naruto ainda me beijava. Sentia-o no meu pescoço, nas minhas costas, nos meus lábios… Na minha testa. Ah, ele fez muitas coisas com sua boca, mas o beijo na testa foi sobretudo especial. Depois de um tempo recuperando o fôlego, abracei-o contra meu peito e roguei para que aquilo se repetisse algum dia. E que algum dia, seja mais distante ou mais próximo, aquilo pudesse durar para sempre… Sempre…
"Naruto", chamei-o. "Prometa a mim só mais uma coisa antes de partir", mordi os lábios e senti, de alguma forma, que ele sabia que eu já sabia.
"O que você quiser, Sakura-chan", disse com sua voz grave tentando cobrir seu corpo com minha perna.
"Pode ficar comigo até que a manhã chegue?", perguntei tímida. No entanto, a pergunta não pareceu surpreendê-lo.
"Mas é claro, dattebayo!", exclamou feliz. Seu sorriso continuava o mesmo de sempre… Radiante e intenso. Assim como seus olhos.
Suas sobrancelhas arquearam-se no entorno de seu cenho, e ele percebeu que eu tinha mais um pedido.
"Promete me visitar sempre?".
Com aquela cara de "nunca volto com a minha palavra", ouço-o dizer…
"Sempre".
