VENTO

Quanto tempo conseguimos agüentar até que um grito atravesse nossa garganta num ato desesperado? Até que os olhos se recusem a enxergar a verdade, substituindo-a pelos sonhos eternos? Até que nossos ouvidos escutem apenas as mentiras que nossa mente cria? Pouco, muito pouco tempo. E, mais do que ninguém, Legolas é obrigado a enfrentar esse pouco tempo. É obrigado a viver com a indiferença do pai até que a verdade se transforme num quadro abstrato de uma vida acabada. Até que as verdades fujam de seu conhecimento, assumindo formas estranhas, obrigando-o a realizar ações que ninguém nunca esperou. Ações essas que aumentarão ou diminuirão, de forma assustadora, um amor jamais demonstrado.

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Notas inciais da autora (NIA)

1º - Poucos personagens dessa fic são da minha autoria. A maioria deles foi criada pelo maravilhoso J.R.R. Tolkien.

2º - Tirei algumas idéias dessa fic de outras que eu li! É minha primeira fanfics de O Senhor dos Anéis, mereço desconto, não? Well... Se alguém achar alguma parte parecida (ou igual) à alguma parte da sua própria fic, me desculpo desde já! Não era minha intenção copiar a fic! Só precisava de idéias... Então, peço desculpas e permissão para continuar usando qualquer das partes que poderão achar.

3º - Essa fic vai começar e terminar com uma poesia. Vento é uma poesia que eu escrevi há meses. Eu achei que o assunto da poesia coincidia com a história da fic, então usarei ela. A mesma poesia vai iniciar e terminar a fic. A primeira estrofe está aqui, na abertura da fic, no começo do primeiro capítulo e a segunda e última estrofe estará lá, no encerramento da fic, no final do último capítulo. Espero que gostem!

4º - Vou deixar aqui algumas palavras em sindarin. Não uso elas no primeiro capítulo, mas usarei a partir do segundo:

Edhel - Elfo
Adan - Humano
Ada (adar) - Pai
Nana - Mãe
Ionn (iôn) - Filho
Sell (iell) - Filha
Tôr - Irmão
Thêl - Irmã
Aran - Rei
Cunn - Príncipe
Bein - Bonito
Mell - Querido

Boa leitura!

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Decisões Para o Futuro

Vento
Meus olhos não entendem
Vento
Minha alma não compreende
Vento
Meu espírito não agüenta
Vento
Meu orgulho não aceita.

O rei escondia-se do mundo, em seu gabinete, mais uma vez. Escondendo-se do seu reino, escondendo-se dos sentimentos que a presença do filho despertava em seu ser. Era assustadora a intensidade com que esses sentimentos aumentavam quando ouvia a voz do filho, quando olhava para ele... Sem poder tocá-lo, sim poder agradá-lo. A coisa que Thranduil mais queria quando via Legolas, era abraçá-lo, passar segurança, acariciar os cabelos grandes e loiros, tão parecidos com os da mãe... Mas não podia! Ele era rei, era governante, era autoridade! E Legolas era príncipe... Mas era capitão e era súdito. E isso não muda! Assim como não muda o fato de que, por mais que negassem, eles eram pai e filho.

Três leves batidas na porta de madeira despertaram Thranduil de seus pensamentos. Ele recuperou a postura séria, pigarreou e ordenou com a voz firme e segura:

"Entre!"

E, timidamente, a porta do gabinete abriu. Dando espaço para uma figura ainda mais tímida. Thranduil reconheceu, imediatamente, a figura parada à porta. Um dos curadores de Mirkwood!

"Senhor?" Chamou o curador.

"Fale..." Incentivou o rei, voltando à atenção para os inúmeros mapas e documentos empilhados na mesa.

"Onde está o príncipe?" Perguntou o curador, escondendo-se atrás da porta.

"Como é que eu vou saber?" Indagou o rei, indignado.

O curador se encolheu ainda mais atrás da porta de madeira e não respondeu a pergunta.

"Porque quer saber?" Perguntou Thranduil, percebendo que não ia receber resposta para a pergunta anterior.

"A patrulha guiada por... ele chegou há... pouco tempo. Muitos estavam... estavam feridos! Foram atacados por... orcs! Os soldados acham que o príncipe está gravemente ferido... Mas ele não aparece desde que chegaram aqui! Estamos... preocupados, senhor!"

Thranduil olhou para o elfo encolhido atrás da porta e respirou fundo.

"Eu não mordo, sabia? Venha até aqui e me conte o que aconteceu!" Ordenou.

Obedecendo, imediatamente, a ordem do rei, o pobre elfo saiu de trás da porta e se postou em frente à mesa de Thranduil, fazendo uma pequena reverência.

"Dantenillion me disse que... que... eles foram atacados por... por orcs... ontem... e que muitos morreram... e muitos ficaram feridos... Disseram-me que o príncipe Legolas sumiu durante toda a luta... Mas o encontraram alguns instantes depois... desm... desmaiado numa clareira... ensangüentado e arfando... Cuidaram dele... ele acordou, disse que estava bem... mas sequer conseguia andar direito no... no cavalo! Quando chegaram a Mirkwood... Ele... ele desapareceu!" Explicou o curador, gaguejando.

Thranduil permaneceu calmo.

"Já procuraram no quarto?"

"Já!"

"Na biblioteca?"

"Já!"

"No meu quarto?"

"Já..." Respondeu o curador, hesitante.

"No jardim...?"

"Não..."

"Então procurem! Ele gosta de lá!"

"Sim, senhor!"

O curador fez mais uma rápida reverência antes de sair correndo gabinete a fora.

Thranduil encarou os mapas e documentos mais uma vez, sem interesse neles. Levantou-se e apoiou a cabeça na porta fria da sacada, sem abri-la e sem olhar para fora.

"Legolas... Porque assim, menino?"

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"Príncipe!" Gritou o curador.

Legolas ergueu a cabeça com dificuldade. Os olhos continuavam fechados, cobertos pelo sangue que escorria de sua cabeça. A respiração difícil e barulhenta denunciava sua posição. O peito ensangüentado manchava os galhos da árvore na qual se encontrava. O braço direito encolhido na frente do peito ardia e latejava ao menor movimento do príncipe. Tinha conseguido um milagre subindo na árvore: escondeu-se dos curadores. Mas seria por pouco tempo.

"Legolas Greenleaf! Apareça! Preciso ver você!" Gritava o curador, impaciente.

Encolheu-se um pouco mais entre as folhas alaranjadas da árvore. Um pequeno movimento que fez o braço direito latejar e todo o corpo doer. Um pequeno movimento que fez o sangue que cobria seus olhos misturar-se com lágrimas de dor e angustia.

"Legolas, por favor! Só quero o seu bem!" Insistiu o curador.

Permaneceu calado, segurando a respiração, para não ser encontrado. A última coisa que precisava era de sedativos, remédios e essas coisas horríveis que você é obrigado a usar quando está num estado horroroso. Estado esse que, infelizmente, era o de Legolas.

"Príncipe! Se eu não conseguir te achar, o rei conseguirá!"

"Não! Eu... Eu estou aqui... na árvore!" A voz de Legolas saiu desesperada e ele, lenta e dolorosamente, escorregou para o chão.

O que foi um erro. As pernas machucadas e, provavelmente, quebradas traíram Legolas, dobrando-se e fazendo-o cair de joelhos no chão. Ao sentir o joelho em contato com o chão, um choque de dor percorreu seu corpo, fazendo um grito atravessar a garganta do arqueiro.

"Legolas! Garoto! Que idéia foi..." Mas o curador não conseguiu terminar a frase.

O estado de Legolas o surpreendeu de tal forma que todas as palavras que conhecia sumiram de sua mente. O rapaz estava totalmente detonado.

"Porque se escondeu? Olhe o seu estado!" Rosnou o curador, correndo para ajudar o menino.

"Não quero que o rei me veja assim! Não quero..." Respondeu o príncipe, enquanto se levantava com a ajuda do outro elfo.

"Vamos para o seu quarto Legolas, preciso cuidar desses seus ferimentos!"

"Por favor, não conte ao rei... Não conte que eu falhei, novamente... Não conte que não fui capaz!" Implorava Legolas, andando com extrema dificuldade.

"Não contarei nada, menino!" Disse o curador, pegando o menino nos braços.

"Obrigado, Therenil... Confio em você..." Legolas sorriu, antes de fechar os olhos, para dormir o sono da cura.

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Thranduil correu até o quarto do filho. Ficou sabendo, através de fontes confiáveis, que o menino tinha sido achado e que Therenil cuidava dele, agora. Parou na porta, respirou fundo, fechou os olhos por alguns momentos e entrou no quarto.

"Senhor! O que está fazendo aqui?" Indagou o curador tentando, desesperadamente, esconder os ferimentos do arqueiro.

"Quero ver o príncipe! Deixe-me vê-lo! É uma ordem!" Rosnou Thranduil, andando com passos largos até a cama do filho.

"Não posso Thranduil! Falei para ele que não deixaria você vê-lo no estado em que ele se encontra!" Mentiu o curador. Na verdade, só tinha dito que não contaria que o rapaz havia falhado novamente.

"Sou o pai dele!" Irritou-se o rei.

"Foi um pedido do menino! Respeite!"

Mas Thranduil já alcançara a cama e, sem que Therenil notasse, já tinha arrancado as mãos do curador de cima dos ferimentos do filho.

"Thranduil, não se atreva!" Alertou o curador.

Tarde demais. O rei já havia puxado o cobertor de Legolas e encarava surpreso e assustado, o estado deplorável do príncipe.

"Therenil... Por favor... Me diga que você consegue dar um jeito nisso!" Falou o rei, olhos ainda presos no filho.

Therenil acompanhou o olhar do rei e soltou um longo suspiro.

"Consigo... São ferimentos de guerra... Ele estará melhor logo." Garantiu o curador.

Legolas mexeu a cabeça, abriu lentamente os olhos e encarou o brilho verde esmeralda dos olhos do pai.

"Se... Senhor?" Gaguejou o rapaz.

Thranduil não respondeu. Olhou para o curador, que entendeu o recado e se encaminhou para a porta.

"Chamem-me quando precisarem de mim!"

O barulho da porta batendo foi como um pesadelo para Legolas. O que iria falar para o pai? Segurou os tremores que insistiam em espalhar-se pelo seu corpo e desviou o olhar.

"O que aconteceu, capitão?" Veio a voz firme do rei.

O príncipe cerrou os olhos com força, querendo resistir ao impulso de olhar para o pai e de contar tudo.

"Nada..." Disse ele. Se omitir uma informação era difícil, mentir era um sacrifício.

"Não minta para mim, Legolas!" Alertou o pai.

"Não minto, meu senhor!" Protegeu-se o arqueiro, mentindo novamente.

"Então me diga o que aconteceu!"

"Como assim?"

"Diga-me o que aconteceu com a sua patrulha! Porque tantos soldados voltaram feridos? Porque muitos morreram? Porque você está... assim?" Disparou o rei.

Legolas fechou os olhos e balançou a cabeça com força, para logo depois parar com um grito de agonia.

"Elfo bobo! Não balance a cabeça! Só piora sua situação!"

Thranduil queria parecer irritado. Mas o grito do filho deixou-o extremamente preocupado. Podia sentir na própria carne a dor, como se fizesse parte dele. Queria abraçar aquele menino, queria lhe passar segurança... Mas tinha que se controlar. Tinha que se controlar enquanto via lágrimas de dor e desespero rolarem dos olhos azuis do filho.

"Legolas! Tudo bem?"

A voz de Therenil despertou o rei de seus pensamentos. Ele voltou o olhar para a porta.

"Thranduil, o que aconteceu?" Indagou o curador, olhando do rei para o príncipe.

O rei estava pálido e arfava. O príncipe tremia descontroladamente, chorava e arfava também. Mas nenhum dos dois respondeu.

"Pelo amor dos anéis de prata! O que aconteceu?" Estressou-se o curador.

Thranduil levantou-se e saiu do quarto, lançando antes um olhar desesperado ao curador.

"Legolas... O que houve?" Perguntou o curador, depois que o rei fechou a porta.

"Ele... ele me perguntou sobre a patrulha..." Respondeu Legolas, chorando desesperadamente.

"Calma... Calma criança!" Tranqüilizou o curador.

"Não deixe que ele me odeie, Therenil! Não deixe que ele me abandone! Não deixe que eu vá... Não saia daqui... Não deixe ele saber que não o odeio! Não deixe ele saber... Therenil!"

"Príncipe! Você não está falando nada com nexo! Durma... Vai ser melhor para você!" Garantiu o curador, empurrando um líquido pela garganta do garoto. Legolas engasgou, mas bebeu o líquido, dormindo logo em seguida. "Thranduil não vai saber de nada que não precise saber."

Therenil observou o arqueiro por mais alguns minutos, para certificar-se de que ele dormia. Quando teve certeza que legolas não acordaria tão cedo, levantou-se e caminhou até a janela do quarto do príncipe, observando o nada que se via dali.

"Thranduil, Thranduil... Não percebe o quanto você assusta seu filho?"

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"Ele não quer conta o que aconteceu! Os soldados afirmam que ele sumiu durante todo o ataque! Mas Legolas se nega a dizer o que o atacou na clareira! Mas, com certeza não era um orc!" Therenil andava de um lado para o outro. Fora chamado no gabinete do rei, para explicar o que aconteceu ao príncipe. Mas a visita do outro elfo só fez a preocupação do rei aumentar.

"Como pode ter certeza que não foi um orc?" Indagou o rei, acompanhando o movimento do curador, na outra extremidade da sala.

"Thranduil! Raciocine comigo!" Disse o curador, parando de andar e sentando numa das cadeiras da sala. "Um orc não causa os efeitos que podemos ver no príncipe! Em uma batalha com um orc, ou você morre ou você vive! Ser atacado por um orc não causa tremores descontrolados, não faz você chorar sem motivo, não te deixa pálido, não faz sua respiração alterar-se... Não te deixa na situação em que legolas se encontra! É fato comprovado!"

Thranduil continuou andando de um lado para o outro.

"O que acha que pode ser?" Perguntou o rei depois de longos minutos de silêncio.

"Veneno..."

"VENENO!" Repetiu Thranduil, finalmente caindo numa cadeira.

"Existem diversos tipos de venenos na Terra Média. Cada um com suas características próprias. Alguns causam efeitos semelhantes aos que Legolas está vivendo. Posso descobrir se é, realmente, um veneno que atinge o príncipe. Só preciso ver os livros que, infeliz...".

"Vá até a biblioteca e procure os livros que precisa!"

"Não creio que vou achar o livro aqui, na biblioteca de Mirkwood..." Admitiu o curador, baixando os olhos.

"O que sugere?"

"Que chamemos um curador que entenda mais do assunto do que eu! E que tenha esses livros..."

"Você quer dizer... Chamar o...?"

"Sim..." Interrompeu o curador.

"Não!" Gritou Thranduil. "Aquele elfo maldito nunca mais pisará em minhas terras!"

"É o único jeito de salvar seu filho!"

"Arranje outro curador!" Insistiu o rei.

Therenil respirou fundo.

"Não há opção, Thranduil! Ou é assim, ou Legolas morre!"

O rei escondeu o rosto nas mãos. Não queria aquele maldito elfo roubando o resto do afeto, já tão pequeno, que recebia do filho.

"Então chame-o! Mas que ele não fique muito tempo perto de Legolas!"

"Sua condição não faz sentido! Ele cuidará do Legolas! Ficará perto dele tanto quanto for necessário!"

"Não quero esse elfo perto do príncipe!"

Um silêncio mórbido caiu sobre o gabinete depois da frase do rei. Therenil encarou Thranduil, tentando entender o sentido das palavras dele. E quando esse sentido se fez claro, o curador desatou a rir.

"Thranduil, Thranduil... Ele não roubará o amor que Legolas sente por você! Ele não ocupa o lugar que é só seu no coração do príncipe!"

E o rei ficou extremamente embaraçado ao perceber que o curador descobrira seu medo.

"Ele considera Legolas como um filho! E Legolas o considera como o pai que nunca teve..."

"Porque não dá ao seu filho o afeto que ele merece? Assim ele pararia de tentar se consolar nos braços de outro!"

"Tenho medo... Medo de magoá-lo!"

"E é por isso que ele busca conforto e proteção, coisas que só um pai pode dar, nos braços de Lorde Elrond!"

E com um aceno de cabeça, que pôde ser entendido como uma reverência, o curador se retirou. Deixando Thranduil com seus pensamentos.