Capítulo I: Rotina.
Rotina. O dicionário a descreve como "repetição das mesmas coisas, dos mesmos atos; monotonia". Falando assim, parece ser uma coisa ruim, algo de que todas as pessoas deveriam fugir. Mas tudo no mundo é relativo, não existe significado absoluto. A rotina que John estava vivendo agora não lhe parecia nem um pouco ruim; pelo contrário, ele gostava bastante dela. Se ele fosse seguir essa rotina para o resto de sua vida, ele até poderia dizer que "viveria feliz".
Desde aquele dia no terraço do hospital que mudou todo o caminho o qual ele havia preparado para si próprio, o dia no qual ele parou de fugir do que sentia por Cameron e deixou-se apaixonar por ela, algumas coisas em sua vida tinham mudado.
Antigamente, ele odiava acordar. Era a pior parte do seu dia. Muitas vezes ele ia dormir pensando em não despertar, pois sabia que cada amanhecer o deixava mais perto daquilo que tentava desesperadamente fugir: o Dia do Julgamento e a guerra que viria com ele.
Mas depois daquele dia, o amanhecer era a parte do dia pela qual ele mais esperava, e tinha um bom motivo para isso: Cameron. Cada dia que começava era a certeza de ver seu rosto mais uma vez, de poder ouvir sua voz, sentir seu cheiro e tocar em sua pele. Era outro dia para que ele pudesse tentar amá-la mais do que no anterior, e ao contrário do que possa parecer, ele sempre conseguia amá-la mais.
Sem embargo, não era só por isso que ele aguardava a aurora com tanta ansiedade: a maior parte de seu desejo em acordar era para vê-la ali, olhando para ele, esperando-o pacientemente acordar. Acordar olhando para o rosto de Cameron era o maior presente que John poderia ter. Ela era a primeira coisa que ele via ao abrir os olhos. Era como acordar vendo o rosto de Deus.
Após o dia no terraço, John e Cameron criaram sua própria rotina: todo dias, às 06:00 horas, Cameron saía de seu quarto e sem fazer qualquer barulho, se esgueirava até o quarto de John para acordá-lo. Assim que ela o acordava, ele a convidava para sua cama, onde eles ficavam deitados um de frente para o outro, às vezes sem dizer uma palavra, apenas olhando em seus olhos, abraçados e deixando que o amor que sentiam um pelo outro tomasse cada vez mais conta de suas vidas, trocando calorosos beijos para mostrar um ao outro o tamanho de sua paixão. Nos braços um do outro, eles se esqueciam do tempo e espaço. No fim, tudo é relativo quando fazer uma pessoa feliz nos faz feliz. E, no caso de John e Cameron, a felicidade de um era se ver nos olhos do outro. Fazer um ao outro feliz era o que os fazia se amar cada vez mais. E se a história for sempre assim, tanto quanto melhor para eles.
Às 07:00 horas, Cameron se levantava para voltar ao seu quarto, evitando que Sarah os encontrasse daquele jeito, mas não sem antes dizer a John "Eu amo você e você me ama" e ouvi-lo responder a mesma frase. Essa oração ficaria marcada para sempre como deles. Ela os definia, e ninguém jamais poderia mudar isso. "Eu amo você e você me ama" era uma verdade universal e imutável para John e Cameron.
É fácil perceber porque esta hora era o momento preferido no dia de John e também no de Cameron. Era a ocasião na qual eles não tinham de ficar escondendo dos outros o que sentiam, o quanto se amavam. Não era necessário cuidar das palavras, dos olhares, dos sorrisos. Era apenas John e Cameron juntos, da forma como eles queriam e deviam ser sempre, em todos os momentos. Por mais que o tempo fosse exíguo, eles tinham certeza de que aquela era a melhor hora do dia. John sabia que olhando o relógio o tempo não passava quando ele se afastava de Cameron; mas se de repente o relógio fica apressado, as horas disparam, é só porque a encontrou. E aí tudo muda... nada no espaço fica parado no lugar.
De repente a rotina não parece tão ruim, não é?! Parece algo a ser invejada. De fato, muitas pessoas invejariam essa rotina. Quem não gostaria de acordar todo dia olhando para o amor de sua vida e ficar junto dele, ainda que tivesse de fingir o resto do dia?
Tudo parecia ótimo na vida de John e Cameron. Mas algo com que eles não contavam ira deixar tudo ainda melhor. O mundo às vezes conspira para juntar ainda mais as pessoas que se amam.
Derek encontrou uma pista de alguém ligado a Skynet. Um cientista, do outro lado do país, trabalhando em um programa militar para integrar softwares de segurança bélica em um servidor central. Ele estava disposto a percorrer todo o caminho através do país para ir atrás desse cientista e evitar que ele construísse este programa. O problema é que esta missão levaria, no mínimo, algo em torno de um mês ou três semanas para ser concluída, e tempo não era algo que eles tinham de sobra no momento.
"Eu vou com você Derek. Assim, quem sabe, nós conseguimos terminar esta maldita missão mais rápido. Talvez em duas semanas nós já tenhamos conseguido destruir este programa", Sarah disse.
"Você não pode vir, Sarah. Se você vier comigo, quem ficará com John, para protegê-lo e cuidar dele?", Derek contestou.
"Cameron ficará com ele.".
"E você confia nela? Pense bem, Sarah, são no mínimo duas semanas. Você não lembra o que aconteceu? Não lembra que aquela 'vaca de metal' tentou matá-lo? E se ela estiver só esperando uma oportunidade para ficar sozinha com ele e lhe quebrar o pescoço?"
"Escute, Derek! Eu nunca vou esquecer aquele dia. Não pense nem por um segundo que eu tenha esquecido daquilo. Jamais ouse pensar isso de mim. Eu não confio nela. E não gosto de fazer isso mais do que você. Mas é necessário. E sejamos sinceros: se Cameron nos quisesse mortos e exterminar John, ela já o teria feito há muito tempo atrás. Não seríamos nós ou ele que a impediria. Além do mais, eu posso não confiar nela, mas John confia. E isso é o suficiente para mim", Sarah disse, com bastante raiva em sua voz e apontando o dedo para Derek, jogando-o contra a parede, encerrando o espaço entre eles. Ele não pôde evitar, mas pensou no quanto ela ficava atraente quando estava com raiva. Ela parecia a Sarah sobre a qual John contava histórias no futuro.
Derek ainda pensou em replicar, mas ele sabia que Sarah não o ouviria. Ele nunca conseguia ganhar uma discussão dela e nem sabia o porquê dela se empenhar tanto em contrariá-lo. Além do mais, embora ele não fosse admitir isso para si mesmo, ele estava gostando de estar prensado entre Sarah e a parede. Mas antes que a situação ficasse ainda mais constrangedora, ele resolveu encerrá-la.
"Eu já percebi que não adianta continuar discutindo isso. Quem conta ao John? Eu ou você?", Derek perguntou, assumindo sua derrota.
"Eu conto. Você vá arrumar suas malas enquanto eu faço as minhas. Depois vou falar com ele e com a Cameron enquanto você me espera no carro.".
"Ok, mas nós temos um pequeno problema.".
"Qual?".
"Enquanto você não me soltar e me der um espaço, eu não tenho como sair daqui para fazer minhas malas", Derek disse, com a voz levemente mais gentil que a usual.
Sarah olhou bem fundo nos olhos do Derek, como se pudesse fuzilá-lo com eles. Ela achou melhor nem comentar nada, pois nem saberia por onde começar. No fundo, tudo que ela queria era continuar ali perto dele, sentindo sua respiração quente perto de seu rosto. Mas não era hora de pensar nisso. John era tudo que importava. Por enquanto...
Sarah, então, deixou Derek ir embora e subiu para fazer suas malas. Logo após, foi para a cozinha para falar com John, que estava tomando seu café da manhã, encontrando Cameron na passagem e dizendo para ela acompanhá-la. Chegando à cozinha, Sarah ficou em pé, a frente da mesa, enquanto Cameron foi para o lado de John, que estava sentado e olhou para sua mãe.
"John, eu e Derek vamos sair em uma missão atrás de um cientista que parece estar ligado com a Skynet. Ele vive do outro lado do país, então, nós vamos ficar fora por duas semanas. Durante esse tempo, Cameron deve ficar com você o tempo todo, entendeu? Não saia do lado dela, porque nós não estaremos aqui para protegê-lo. Vocês têm comida suficiente para esse tempo e Cameron cuidará da casa. Você entendeu?".
John estava sem compreender nada do que estava acontecendo. Embora ele tivesse gostado muito de saber que teria a casa só para ele e Cameron durante duas semanas, parte dele achava muito esquisito que Sarah estivesse disposta a ficar longe dele todo esse tempo. Ainda mais com Derek. Foi então que ele se lembrou de Derek falando com ele no hospital. Ele havia prometido que iria confrontar os dois sobre isso algum dia. Agora parecia ser uma boa hora para começar.
"Mãe, isso tudo me parece muito estranho. Você odeia ficar perto de Derek, mas está disposta a ficar longe de mim por duas semanas e me deixar com Cameron para sair em uma missão com ele?!".
Sarah ficou incrédula com a observação de John. Será que tudo estava tão claro assim para os outros?
"Você está insinuando alguma coisa, John? Porque tudo que eu faço, eu não faço por mim, eu faço por você. Não importa o quanto eu desgoste da companhia dele ou o quanto eu deteste ter de deixar você aqui com ela. O que importa é a promessa que eu fiz a você de destruir a Skynet. E se para que eu cumpra essa promessa eu tenha que fazer o que estou fazendo agora, assim seja!", Sarah disse, com tom de sua voz levemente alterado.
John ouviu atentamente sua mãe dizia, mas pôde ver em seus olhos e em seus gestos a resposta que ele procurava; e não era aquela que saia de sua boca. Após tudo que ele tinha vivido com Cameron nos últimos dias, era engraçado para ele olhar as pessoas falando de espaço, mantendo distância sem saber que antigas verdades viraram mentiras e nada protege de uma paixão vir acontecer... Mas ele também podia ver que, assim como ele um dia, ela ainda não estava pronta para perceber essa verdade e não importava o que ele falasse agora, só iria complicar as coisas.
"Ok, mãe. Certo. Eu me viro por aqui com a Cameron.", John disse, achando melhor acabar logo com essa discussão, mas deixando transparecer um pequeno sorriso de satisfação no rosto, o que não passou despercebido por Sarah.
"Tudo ficará bem, Sarah. Eu cumprirei minha missão. Eu cuidarei de John", foi a vez de Cameron falar, usando seu tom robótico, visando a não deixar muitas pistas para Sarah.
Sarah rolou os olhos com a fala de Cameron. Ela não sabia o porquê, mas estava achando Cameron diferente nos últimos dias. Ela não sabia dizer se isso era bom ou ruim, mas definitivamente havia algo de estranho com Cameron nos últimos dias. O rosto dela não parecia mais branco, sem expressão e as palavras não eram mais robóticas e frias como ela estava tentando deixar agora. Havia vida, calor, nelas. E isso deixava Sarah profundamente perturbada.
"John, não vá fazer nada estúpido. Fique em casa o máximo possível. Cameron..." Sarah disse, dando uma pausa antes de continuar, "não vá fazer com que eu me arrependa disso; se não, você rezará para ser queimada o mais rápido possível", Sarah disse, virando de costas e saindo de casa ao encontro de Derek, que já a esperava no carro.
John e Cameron foram até a porta, vendo Sarah e Derek sumir no horizonte dentro do carro. Assim que eles sumiram no horizonte, John puxou Cameron para perto e lhe deu um apaixonado beijo, o qual Cameron retribuiu com igual desejo. Assim que o beijo foi quebrado, Cameron, ainda nos braços de John, fez uma observação curiosa:
"Ela estava mentindo". "Sobre o quê?". "Sobre o motivo dela ter ido nesta missão. Ela estava mentido. Eu pude ver pelos sinais de seu corpo. Ela estava suando, seus batimentos cardíacos estavam acelerados e sua voz tremia". "É, eu sei. Eu conheço a minha mãe, eu sei quando ela está mentindo, Cam." "Eu não entendo. Qual o motivo dela ter ido nesta missão? Ela sequer confia em mim para tomar conta de você. Por que ela foi?", Cameron perguntou, inclinando sua cabeça para o lado. "Ela foi pelo mesmo motivo de eu estar feliz de ficar sozinho com você." "Oh! Obrigado por explicar". "Você não tem um jeito melhor de me agradecer?", John perguntou, com certo ar de deboche.
Cameron, então, deu um malicioso sorriso, colocando uma mão na nuca de John e puxou-o para um beijo que o deixou sem fôlego. Às vezes ela esquecia que John precisava respirar, mas até ela mesma ficava ofegante após beijar John; ele certamente levava seu ar embora, por mais impossível que isso possa soar.
Desde esse dia que Sarah e Derek os deixaram sozinhos, John e Cameron mudaram mais uma vez sua rotina. Ela continuava indo ao quarto dele todas as manhãs, mas ela não fugia no meio da noite do seu quarto para ir até lá. Ela dormia e acordava com ele. Ela lhe preparava o café da manhã, o almoço o jantar, assistia televisão com ele, conversava e o amava todos os minutos. E ele fazia de tudo para deixá-la o mais feliz com o que estava fazendo: elogiava sua comida, não a importunava com os programas estranhos que ela gostava de ver na televisão e aproveitava cada segundo ao lado dela, fazendo com que ela soubesse, sem sombra de dúvidas, que também a amava cada dia mais.
No fim das contas, quem disse que a rotina é uma coisa ruim?
