Na sua ausência - Prólogo
Um dia eu estava andando despreocupada e distraidamente pelo Beco Diagonal, até que uma senhora chegou e me tirou de meus devaneios. Na hora eu assustei e achei que a mulher era uma fugitiva da área psiquiátrica do St. Mungus, por que sua aparência era muito estranha, e quase sai correndo e a deixei falando sozinha. Quase, entenda bem, quase. Se ela não tivesse dito a palavra "cigana" eu iria. Mas bem, a coisa foi mais ou menos assim:
"Olhe o que temos aqui! – disse a velha senhora enquanto eu passava pela estreita rua do Beco – Uma garota poderosa! Quase não se vê garotas assim nos dias de hoje!"
Eu olhei para ela com um belo ponto de interrogação formado no meu rosto e ia dizer que estava atrasada para qualquer compromisso, mas, ela foi mais rápida.
"Garota antiga... Muito antiga... – Antiga? Antiga como? Eu só tinha vinte anos, na época! – E grandiosa! Corajosa... Ah! Mas tão amável!"
Certo. Era fato. A mulher velha estava delirando no meio da rua. Tentei soltar meu braço dela o mais delicadamente possível, mas a mulher era forte!
"Olha, minha senhora, - disse eu enquanto puxava meu braço – eu realmente não sei do que a sra. está falando, portanto, se..."
"Uma cigana! – Aí a coisa mudou. Ela tinha dito a palavra chave que tinha tomado meus pensamentos por muitos anos – Uma cigana com amor, mas, obrigada a se dar a outro. Sim, história trágica essa, infelizmente. Para um rosto tão bonito, tão jovem, talvez tenha o mesmo destino."
Certo. A palavrinha mágica que ela me disse fez com que eu a visse de outra forma. Sim, claro, ela continuava parecendo uma velha maluca, mas, que ela sabia do que falava, ah sim, isso sabia,
"Escuta, se a sra. quiser, nós podemos tomar um café, alguma coisa, enquanto a sra. me explica o que sabe, aí as coisas ficariam mais claras para mim."
"Oh, minha querida, sinto-lhe dizer, mas, não há tempo! Desculpe-me, mas, acho que terá que seguir sozinha. Mas não se preocupe, você conseguirá entender o que se passa e por que é tão atormentada por isso. Mas corra, corra, se não, tudo será em vão! – E com uma agilidade grande demais para uma velha daquela idade, ela soltou meu braço e sumido, como se tivesse aparatado no meio da multidão."
E foi assim que começou a minha busca por sonhos, sonhos esses que não recebiam a atenção de ninguém. Nem de minha mãe, meu pai, até Carlinhos, com quem eu tenho mais afinidade dizia que era só uma fase e não dava atenção, achava que era coisa de garota. Fiquei realmente chateada uma época, pois afinal, não era só fase, ou será? Não, acho que não. Acho que fases não duram onze anos, não? Ou duram?
