D O N E
Sinopse: "A guerra estava em todos os lugares à sua volta, explodindo, destruindo. E estava dentro dela também".
Lily gostaria de ter sabido quão difícil seria prosseguir com aquela escolha. Gostaria de ter sabido antes de se alistar no Exército, antes de se jogar naquela marcha suicida repleta de morte e dor. Gostaria que alguém lhe tivesse dito que estava cometendo um erro, que nada daquilo daria certo, que ela acabaria deixando partes de sua alma para trás cada vez que alguém morria a sua frente. Em seus braços. [JILY - UA]
Disclaimer: Personagens principais pertencentes a J.K. Rowling.
Significado da palavra "DONE": Feito.
Ship: JILY. Universo Alternativo (nenhum bruxo).
Fanfic +18 (M), ou seja, contém cenas de sexo explícito, portanto se não gosta, não leia.
01 – DO IT.
A guerra é como um humano. Consome oxigênio, precisa de líquido para sobreviver, é cheia de altos e baixos, momentos depressivos e repletos de felicidade, raiva e paixão. A guerra é como alguém aprendendo a andar: num momento você cai, mas no outro sabe exatamente como se equilibrar para que consiga colocar um pé na frente do outro. A guerra pode proporcionar alegria às pessoas ou pode simplesmente destruí-las. A guerra é como um humano. A guerra é humana. A única diferença é que o oxigênio que consome é utilizado para explodir bombas, o líquido que precisa para sobreviver é o sangue dos soldados e dos inimigos molhando o chão por onde os exércitos marcham e, os momentos de altos e baixos, depressão e felicidade, são decididos entre derrotas e vitórias. A guerra respira e pensa e cresce. E, em um momento qualquer, ela morre.
Lily gostaria de ter sabido daquilo antes de se alistar para o Exército, antes de se jogar naquela marcha suicida repleta de morte e dor. Gostaria que alguém lhe tivesse dito que estava cometendo um erro, que nada daquilo daria certo, que ela acabaria deixando partes de sua alma para trás cada vez que alguém morria a sua frente. Em seus braços.
Mas sabia que, embora o medo a sufocasse a cada vez que fechava os olhos, embora seu corpo inteiro tremesse de dor cada vez que se deixava descansar... embora lágrimas escorressem de seus olhos cada vez que lembrava de todos os nomes de seu batalhão que tiveram suas vidas apagadas... ela não mudaria nada. Ela não conseguia se arrepender, pois, para cada uma daquelas vidas perdidas, milhares haviam sido salvas. E, embora doesse e ardesse e a culpa sobreviesse a cada segundo, fazendo-a duvidar de si mesma e de suas capacidades, ela sabia que havia escolhido certo.
A guerra estava em todos os lugares à sua volta, explodindo, destruindo. E estava dentro dela também.
— Capitã Evans. — Coronel Moody bradou, arrancando-a de seus devaneios enquanto corria em sua direção, ofegante. — Capitã Evans! — Ele continuava a gritar, mas ela não conseguia focar o olhar sobre ele, pois seus olhos estavam tão cheios de lágrimas, completa e totalmente toldados com a dor. — Afaste-se! Afaste-se!
Mas ela não se afastou. Ela não podia fazê-lo. Ela prometera que não soltaria. Que não o soltaria. E, se fosse preciso morrer para poder cumprir sua palavra, ela o faria.
Ofegante, James Potter ergueu os olhos para ela, também marejados, também dolorosos. Se encararam por alguns instantes, trocando palavras silenciosas, preces silenciosas. James tinha dificuldades para respirar, seus olhos estavam ficando opacos. Não havia muito tempo. Para nenhum dos dois.
— Não. — Lily disse, finalmente conseguindo enxergar Alastor Moody, o Coronel que os encarava como se não pudesse crer no que estava vendo. Haviam mais dois homens atrás dele. Tenentes Lupin e Longbottom e em suas faces sujas e machucadas o mesmo olhar de dor estava estampado. — Eu vou ficar bem aqui. Exatamente aqui. Tire todo mundo deste lugar, Coronel. Tire todos eles e nos avisem... nos avisem quando...
— NÃO! — Moody berrou, descontrolando-se. Segundos depois, parecendo assustado, ele tentou se recompor, embora Lily pudesse ver em seus olhos o quanto lhe custava. — Vocês não podem... não podem. — Ele murmurava.
— Já tentamos de tudo, Senhor. De tudo. Não há mais nada que fazer. — A voz dela estava rouca, portanto ela limpou a garganta antes de voltar a falar, tentando parecer firme diante do desespero de seu comandante. — Vocês precisam sair daqui. Precisam se afastar e avisar aos outros. Por favor.
— Capitã Evans... Lily... — Moody a chamou pelo nome, como raramente fazia, o que fez com que o coração dela apertasse. Mas ela sabia que de nada adiantava. Ele sabia que de nada adiantava. Ela havia feito uma escolha e arcaria com as consequências até o final. Moody sempre soubera de sua determinação, sabia que, depois que Lily tomava uma decisão, estava feito.
— Lily... — James falou e sua voz estava fraca demais, baixa demais... — Você não precisa... por favor, vá com o Coronel, por favor, Lily, você não...
— Está feito, James. — Lily falou, irritada com a insistência dele, irritada pelo fato de ele não entender que ela não desistiria, que ela não o deixaria. Não havia sido sempre daquele jeito? Então porque ela iria deixa-lo na mão justo quando mais precisava? Parecia óbvio demais para ela, óbvio demais que ela jamais o deixaria.
— Evans, você ouviu o Potter, até mesmo ele sabe que isso é uma loucura! — Lupin rosnou, dando um passo para a frente.
— Pare! — Lily falou, encarando-o com toda a autoridade que havia adquirido nos últimos sete anos em que servia àquele batalhão. — Você não pode me obrigar. Eu fiz a minha escolh de ficar aqui, junto de James.
— Isso é...
— Está feito. — Lily disse, firme, encarando o comandante e os outros dois por alguns segundos antes de voltar-se para James. — Está feito. — Repetiu.
James a encarou, seus olhos castanhos efervesciam de um desespero silencioso. Havia tanta dor e tanto arrependimento ali que Lily pensou que acabaria se afogando. Mas então sua expressão mudou para uma mais calma enquanto eles se comunicavam daquele jeito, do jeito deles. O mesmo olhar que haviam trocado antes de cada batalha, antes de cada movimento, antes de cada decisão... E então ele assentiu, firmando o contrato, assinando a sentença. Ele não desistiria. E ela não o soltaria.
— Moody. Remus. Frank. — Ela chamou os três homens, ainda sem desviar o olhar de James. — Se afastem, tranquem o portão e chamem os outros. E então nos avisem.
— Lily...
— Se afastem, tranquem o portão, chamem os outros e então nos avisem. — Lily finalizou em tom de ordem.
Ela não conseguiu ver a expressão no rosto de seu comandante antes de ele se afastar, pois, estava tão focada em James que nada mais parecia ter importância.
— James. — Foi Remus quem o chamou e sua voz era dolorosa. James interrompeu a comunicação visual com Lily, voltando-se para o seu melhor amigo. Eles também trocaram um olhar intenso.
— Remus. — James assentiu.
E então eles não falaram mais nada. Tenente Lupin voltou-se para Lily, batendo continência para ela.
— Tenho muito orgulho de dizer que fazemos parte do mesmo batalhão. — Ele disse e então sorriu, um sorriso triste, para ela.
— Temos. — Tenente Longbottom concordou com Remus, olhando de Lily para James com uma expressão consternada. — Vocês estão salvando milhares de vidas.
— Não existe melhor forma de morrer. — James disse e então tossiu, fazendo com que o coração de Lily parasse por um segundo. Ele arregalou os olhos, percebendo seu erro e então imobilizou-se, esperando. Remus e Frank também estavam totalmente parados, não pareciam nem mesmo respirar. Eles sabiam tão bem quanto Lily e James que o menor movimento poderia causar um desastre.
— É melhor vocês irem logo. — Lily disse quando percebeu que nada iria acontecer e então soltou a respiração que estivera contendo. — Vão.
Houve hesitação da parte dos tenentes, ambos parecendo totalmente desamparados diante da escolha que haviam tomado.
— Vão. — Lily ordenou e, embora visse as lágrimas descerem pelo rosto de Remus, embora o olhar no rosto de Frank fosse tão doloroso e solitário, embora lhe apertasse o coração ter de vê-los partir, sabia que era a escolha acertada.
Como sempre, eles não duvidaram da ordem de sua superior. E então Lily pôde ouvi-los se afastarem, o som de seus passos abafados parecendo reverberar pelo seu corpo como uma última sentença. O barulho dos portões do grande galpão sendo fechados e trancados ecoou por vários instantes até que, finalmente, o silêncio sobreveio.
E então ela voltou a olhar para James que estava fraco e tinha dificuldades para respirar. Tentando não se balançar demais, ela encostou sua testa à dele. James ergueu os olhos para ela e suor pegajoso e frio brotava de seus poros.
Ele sorriu.
— Parece... parece que voltamos alguns anos, Capitã. — Ele disse, ofegante.
— É como se o tempo não tivesse passado para nós, Major. — Lily respondeu e retribuiu o sorriso, mesmo que lhe doesse.
— Bem, você não tinha tantas rugas naquela época. — Ele brincou, embora sua voz fosse fraca demais para que qualquer outra pessoa ouvisse além dela.
— E você parecia mais corajoso.
James assentiu levemente, uma única lágrima descendo pelo seu rosto.
— Lily... você não precisa fazer isso. — Ele falou e seu tom de voz, embora baixo, estava mais forte. — Você não precisa...
— Você lembra, James? Lembra das nossas primeiras vezes? Lembra de como tudo aconteceu? Lembra o que me disse? — Ela o interrompeu, não dando espaço para a incerteza dele, não querendo que ele duvidasse. Não naquele momento que não permitia qualquer espaço para dúvidas.
— Eu disse que... — Ele fechou os olhos por alguns instantes e mais algumas lágrimas desceram por seu rosto pálido. — Eu disse "está feito".
Lily sorriu, lembrando-se daquele momento. Do momento exato em que James Potter passara a ser mais do que apenas um colega em campo, mais do que apenas um soldado.
Eles estavam em guerra, é claro, mas era a primeira guerra em que Lily iria participar de modo mais ativo. Ela era médica, portanto, quando se alistara no exército eles prontamente a aceitaram, afinal médicos eram como milagres ambulantes para qualquer batalhão. O General Dumbledore pareceu sequer se importar com o fato de que ela era mulher, de que ela era nova, de que ela era totalmente inexperiente. Ele a aceitou e lhe disse "seja bem-vinda, Evans".
Ninguém conseguia acreditar que ela, a cirurgiã especialista em traumas, prestes a se tornar chefe num dos hospitais mais bem vistos dos Estados Unidos, com várias pesquisas publicadas, dias e noites de estudos incansáveis e várias letras antes do nome... Lily Evans, a estrela da medicina, havia se alistado no Exército.
Como era possível alguém desistir de uma vida tão boa? Como era possível que ela fosse fazer algo tão estúpido como aquilo? Estava ficando louca? Estava doente? O que poderia ter motivado a alguém com um futuro tão brilhante pela frente a fazer algo tão imprudente?
Mas ninguém sabia, é claro.
Naquela época, Lily estava fugindo. Fugindo de sua antiga vida depressiva no grande e renomado hospital de Hogsmeade, St. Mungus. Fugindo de uma família que lhe causara mais mal do que bem. Fugindo de um passado doloroso e cheio de sofrimento. Fugia de si mesma e de todas as dúvidas que a corroíam todas as horas de seus dias.
Ela era ótima no que fazia. Uma das melhores, reconhecia aquilo. Mas de quê adiantava se não era feliz? As pessoas continuavam a morrer em suas mãos, continuavam a se desesperar. Ela continuava tendo de informar às famílias que seus entes queridos estavam mortos. Ela continuava sem conseguir dormir, pois, cada vez que fechava os olhos, os fantasmas de seus pacientes, daqueles que não conseguira salvar, a assombravam.
Ela matava mais do que salvava. E a grande parte das mortes pareciam não ter explicações. Pessoas que estavam indo para o trabalho, que estavam indo comprar presentes de Natal. Uma mãe que fora auxiliar o filho a arrumar a cama e acabara caindo e quebrando vários ossos. Um filho que deixara a mãe cedo demais, novo demais, com uma vida inteira pela frente que fora roubada dele com um último e doloroso suspiro... Crianças, adolescentes, adultos, idosos. Todos tinham suas vidas retiradas com tanta facilidade, sem qualquer finalidade a não ser a de alimentar a escuridão que nunca estava satisfeita e sempre retornava para pegar mais e mais pacientes de suas mãos, tomando-os como se fossem seus, sem deixar qualquer opção para a Lily a não ser a culpa.
Lily queria saber os motivos, os interesses. Ela não conseguia se contentar com a simples morte, sem os porquês. O não-saber a deixava louca. A dúvida a deixava cansada. E a perda a deixava desumana. Não havia muito mais de sua alma para que fosse destruída.
E nem todo o dinheiro e reconhecimento do mundo conseguiria fazê-la fechar os olhos e ter uma boa noite de sono, portanto, quando decidira se alistar e deixar para trás o seu passado, estava apenas fugindo.
Quando chegou no acampamento de seu batalhão e percebeu-se uma das únicas mulheres entre quase 500 homens, sequer piscou ou receou de suas escolhas. Quando teve de enfrentar preconceito e batalhar pelo seu lugar dentre eles, não teve dúvidas. Quando aprendeu a lutar e a usar uma arma, sequer tremeu. Quando os homens chegavam em seu hospital provisório, cheios de ferimentos que, por muitas vezes pareciam impossíveis, ela não teve medo. Ela conseguia compreender os motivos ali. Ela conseguia aceita-los.
Com o passar dos meses, foi se compreendendo, se conhecendo. Percebeu que, embora a guerra morasse à sua volta, havia muito dentro de si mesma para ser batalhado também. Ela cortava e costurava, gritava e comandava. Havia enfermeiros e médicos muito bons ali. Havia jovens guerreiros que queriam defender seu país. Haviam jovens com desilusões amorosas. Haviam maridos cheios de pesar por terem deixado a família em casa, mas que mesmo assim davam a alma nos momentos de luta, combatendo com todas as suas forças junto de seus parceiros. Haviam os que pareciam ter se encontrado ali, no meio do acampamento, dos corpos, do sangue e do suor. E haviam aqueles que queriam mais do que tudo voltar para casa.
Lily conversava com todos eles, convivia com todos eles, reconhecia-os e, embora estivesse feliz, como em muito tempo não se sentia, ainda havia uma parte dela que queria saber a qual daqueles grupos ela pertencia.
E, quando James entrou em sua vida, foi que tudo pareceu se encaixar.
Ele era o Tenente Potter, respeitado e renomado. Ele comandava quando Moody não estava, embora houvessem outros superiores. Dava para ver de longe o quanto aquele ali era o seu lugar. Ele não tinha dúvidas, parecia não ter medos. Filho de um Tenente-General aposentado e de uma médica renomada e conhecida mundialmente, Tenente J. Potter parecia nunca duvidar do que fazia e de quem era.
Lily costumava observá-lo junto de seus companheiros, Tenentes Lupin, Black e Pettigrew. Eles eram inseparáveis e, onde um estava, o outro também parecia estar. Eram como uma força da natureza, pois, em todas as batalhas em que lutavam juntos, venciam. Seus esquemas táticos, unidos com os planos do Coronel Moody funcionavam à perfeição. Não havia dúvidas em seu trabalho, apenas esforço conjunto, muitos estudos e, é claro, dedicação. Eles planejavam, organizavam, batalhavam e venciam. Sempre assim.
Lily e James nunca haviam trocado muitas palavras, exceto quando falavam sobre os feridos. Ele ordenava algumas coisas a ela, sempre em claro e bom tom de "salve meu soldado" ou "não o deixe morrer". Lily nunca o deixava na mão. Eram uma boa equipe. Silenciosa. James entendia o trabalho dela, pois houvera atendido ao pedido de sua mãe de, antes de embrenhar-se na vida militar, dar uma chance à medicina. Ele quase concluíra o curso. Exceto que, em seu último ano, percebera que não era aquele o futuro que queria para sua vida e, por conta daquilo, alistara-se no exército.
Euphemia Potter tivera uma semana particularmente difícil quando o filho decidira partir para o Iraque. Seu único e querido filho. Lily lembrava de vê-la chorar pelos cantos do hospital, de seu olhar vazio a cada cirurgia. Ela sorria e brilhava quando salvava uma vida. Mas durava pouco. Também lembrava de Euphemia Potter abraçando-a forte quando Lily perdera a mãe, seu último familiar vivo, e então a mulher segurara seu rosto entre suas mãos e dissera a ela que, de ali por diante, seria sua família.
Lily a amava. E, de todas as lembranças dolorosas, uma das mais difíceis era lembrar do momento em que contara que também estava indo para o Iraque. Que também a estava deixando. Que a vida que elas tinham ali não era suficiente. O olhar no rosto de Euphemia, como se estivesse vendo um fantasma, como se Lily houvesse acabado de morrer à sua frente, a atormentara por muitas noites.
Trabalhara muitos anos com Euphemia em St. Mungus e aprendera muito com ela. Fleamont Potter, o veterano de muitas batalhas, costumava contar sobre suas aventuras para Lily a cada vez que ia ao hospital. E, é claro, os dois falavam muito de James Potter e de Sirius Black, seu melhor amigo. E de como eles eram inseparáveis. Brincavam e diziam que "James e Lily seriam um casal perfeito", exceto pelo fato de que nunca tinham se visto e de que nenhum dos dois tinha interesse.
James queria conquistar o mundo e, Lily, queria conquistar apenas ela mesma. Não possuíam muita coisa em comum e, embora com certeza já tivessem ouvido falar bastante um sobre o outro, nunca haviam tocado no assunto.
Até que, em uma invasão particularmente difícil ao território inimigo no Iémen, houve uma explosão, muitos soldados foram perdidos. E, James Potter, estava morto.
Ou era o que diziam os oficiais enquanto carregavam seu corpo em uma maca ensanguentava até o hospital onde Lily estava cuidando de vários feridos com graves queimaduras.
A primeira coisa que pensou ao vê-lo tão desconjuntado, fora em Euphemia e no quanto aquilo causaria dor à mulher que, para ela, era como uma mãe.
Lily correra até ele, despejando todos seus conhecimentos médicos sobre o corpo machucado e ensanguentado de James Potter. Ele estava sem pulso, portanto ela fez seu coração voltar a bater. Ele tinha muitos cortes, portanto ela o costurou. Ele tinha fraturas, portanto ela o concertou. Para cada uma de suas queimaduras, Lily dosava pomadas. Como nunca havia sentido desde que assumira aquele posto, Lily estava com medo. E, James, que se recusava a abrir os olhos, parecia decidido a deixar para ela a tarefa de avisar seus pais. Lily não podia aceitar, não queria aceitar.
Dia após dia, Lily patrulhava as camas, os pacientes, medicando-os, liberando-os, realocando-os. E, para sua alegria, vários deles estavam melhores. Alguns, inclusive, já haviam voltado para o campo de batalha. Seu comandante estava orgulhoso. E, ela, continuava com medo.
James Potter acordou cinco dias depois da explosão e, em seus olhos a dor e confusão eram palpáveis.
— Eu... morri? — Foi a primeira coisa que falou, focando os olhos sobre ela. Era fácil localizá-la: tinha cabelos vermelho como fogo e olhos verdes como esmeraldas. Lily Evans era como um raio de sol em meio a nuvens escuras e, embora sua testa estivesse franzida de preocupação e seus ombros estivessem tensos, James a achou linda.
Como sempre.
Ele costumava observá-la bastante quando estava em seus raros momentos de descanso. Lily estava sempre caminhando por aquele hospital improvisado, indo de um lado a outro enquanto cuidava de seus pacientes. Ela era a melhor médica que conhecera e, por Deus, sua mãe era uma cirurgiã renomada mundialmente. Havia algo nela, uma necessidade, algo que a fazia brilhar cada vez que conversava com um dos acamados.
James gostava muito da vista. Lembrava de sua mãe falando sobre ela até pelos cotovelos, de seu pai sorrindo enquanto brincava que estava perdendo a chance de trabalhar perto da médica mais bonita da atualidade. Ele ouvira muito sobre Lily. Sobre sua família problemática. Sobre o quanto sofrera até conseguir chegar ao sucesso. Sobre suas histórias e pacientes que, milagrosamente, ela conseguira salvar. Até mesmo sua mãe, Euphemia, a admirava. Costumava dizer que Lily "seria o futuro da medicina". Qual fora a surpresa de James quando, no início de seu terceiro ano no Exército, Lily Evans fora apresentada como a nova médica do batalhão.
Ele conseguia lembrar de sua expressão, seus olhos pareciam fundos em seu rosto pálido e sua expressão transparecia todo o seu medo. Foi motivador vê-la evoluindo com o passar dos dias, seu rosto tomando uma forma determinada enquanto ela parecia finalmente estar se encaixando. Ela era uma das únicas três mulheres do batalhão, junto das Sargentos Meadowes e McKinnon. Ela era excepcional em lidar com todo o preconceito que, infelizmente, enfrentou. James tentava aliviar a barra, gritando ordens para seus homens, mas não fora necessário. Em algumas semanas, ela os conquistara. Sorria para eles, gritava com eles, ordenava-os. E todos pareciam perceber que diante de si estava alguém que, no momento em que nenhuma esperança sobrevivesse, poderia trazer algum milagre.
Ela assumira o cargo de comandante do hospital apenas dois meses depois de iniciar seu trabalho. Fora condecorada ao salvar a vida do Coronel quando todos os outros médicos haviam desistido. Moody, mesmo sem um pedaço da perna e tendo de usar um olho de vidro, ainda estava vivo e, por Deus, mais amedrontador e com sede de vingança do que nunca. A garota tinha garra, tinha vontade. Era como se Lily Evans houvesse nascido para estar ali.
— Não, você está vivo. — Ela respondeu, arrancando-o de seus devaneios. E então ela sorriu para ele, doce. — Você me deu um trabalhão, Tenente Potter.
— Costumo... ouvir bastante isso. — Ele respondeu e então tentou sentar, mas assim que fez o esforço, sentiu uma dor lancinante percorrer por toda extensão de seu dorso, deixando-o sem ar. Mais rápido do que teria imaginado, Tenente Evans estava segurando-o contra os travesseiros, ajeitando-o enquanto massageava seu lado esquerdo. James nem percebeu, mas lágrimas de dor desciam por seu rosto enquanto sentia ardência em seus braços e na perna direita. Finalmente baixou os olhos e deparou-se com uma confusão de pomada, esparadrapo, faixas e gesso.
Ergueu os olhos para ela, ofegante. E então sorriu.
— Um trabalhão.
— Agora você entende o que eu estava dizendo. — Ela murmurou, mas, embora sorrisse, seus olhos o avaliavam, firmes.
— As queimaduras... são de terceiro grau?
— Não, são de segundo. Você teve sorte. Parece que quando a doca explodiu, você foi protegido por uma porta de metal bastante dura. Infelizmente o metal superaqueceu e você acabou se queimando. Mas, acho que devemos agradecer por isso, pois, caso aquela porta não estivesse lá, você provavelmente não estaria aqui.
— Bastante otimista o seu ponto de vista. — James ficou feliz ao constatar que ainda era capaz de rolar os olhos.
— Conte com isso. Está sentindo alguma dor?
— Tirando a dor infernal-que-parece-estar-me-rasgando-ao-meio que percorreu por minhas costas ao tentar me sentar, estou ótimo.
— Bem, era de se esperar que doesse, afinal é isso que acontece quando temos algumas costelas fraturadas.
— Algumas...?
— Duas. Tente não quebrar mais nada enquanto está aqui. — E, sem dizer mais nada, Tenente Evans se afastou, encaminhando-se para outra cama onde um paciente que parecia não ter tido a mesma sorte de James se encontrava.
— Você acordou! — A voz de Sirius retumbou pela sala, fazendo com que James se assustasse. Sorriu ao voltar o olhar para a entrada e deparar-se com os três melhores amigos.
— Black! Lupin! Pettigrew! Aqui não é a casa da mãe Joana, portanto não quero saber de gritos! — Evans resmungou, voltando-se para os dois homens que arregalaram os olhos ao ouvirem sua reprimenda. — Por acaso não perceberam que tem vários pacientes realmente doentes aqui que estão tentando dormir? Portanto, por favor, se for para agirem como se estivessem em um boteco de esquina, façam o favor de se retirarem. — Seus olhos verdes faiscavam enquanto ela tinha as duas mãos na cintura, encarando-os, furiosa.
— Me desculpe, Tenente Evans, não irá se repetir. — Sirius murmurou, sendo imitado por Remus.
James não conseguiu conter o sorriso ao ver a reação dos amigos. Era engraçado perceber que, mesmo quando Moody gritava com eles, Sirius sempre parecia irreverente, inabalável. Mas era só Lily Evans encará-lo meio enviesada que Sirius colocava o rabo entre as pernas e abaixava a cabeça.
Aquele era o efeito que a Tenente tinha sobre eles. Sobre todos eles.
— Ótimo. Espero mesmo que não. — Ela estreitou os olhos e então voltou a se afastar, altiva.
— Minha mãe falava bastante de você. — James comentava enquanto, com a ajuda de Lily, caminhava por entre as barracas ao seu redor.
Ela tinha os cabelos presos em um coque alto que exalavam um perfume de lírios, mesmo ali, em meio a toda aquela fuligem e cheiro de pólvora. Ele estava havia parado de usar muletas há dois dias para andar e tinha o peito enfaixado e, embora conseguisse caminhar perfeitamente sozinho – mesmo que muito lento – Lily segurava-o pelo ombro, pronta para apanhá-lo caso se desequilibrasse.
James achava o comportamento exagerado, mas gostava da sensação de seu toque, portanto não se incomodou em pedir a ela para que se afastasse.
— Não tanto quanto me falava sobre você, pode ter certeza. — Lily disse, rolando os olhos enquanto parecia perdida em lembranças. — Ela costumava dizer que o fato de você ter decidido vir para cá indicava claramente o seu nível de inteligência.
James riu, sentindo uma leve fisgada em seu externo, mas segurou a careta, não querendo que ela se importasse além do que o necessário com aquela dor mínima.
— Euphemia sempre foi muito carinhosa.
— Na verdade, sim. — Lily afastou uma mecha de cabelo do rosto, limpando o suor de cima dos lábios com a parte externa da mão logo em seguida. — Ela sente sua falta, Tenente.
Ele desviou o olhar do dela, encarando o grande tanque que alguns soldados estavam limpando. Observou-os, concentrados em suas funções, enquanto procurava por palavras que pudessem externar seus sentimentos.
Fazia quase quatro semanas desde que ele havia acordado e, embora tivesse melhoras extremas, ainda sentia dores. E odiava-se por aquilo. Ele sabia que a guerra continuava há poucos quilômetros dele, sabia de todos os homens que havia perdido na última investida e enraivecia-se ao ver-se tão debilitado que precisava contentar-se em dormir em uma maca. Lily parecia ter percebido o incomodo dele, pois, alguns dias antes, oferecera-se para caminhar com ele e, desde então, eles dois haviam estabelecido uma espécie de amizade. Quando estava com ela, James conseguia parar de pensar nos homens que estavam sendo mortos, nas baixas que o batalhão estava tendo, na dor e no medo que sentia ao pensar que algum de seus amigos poderia ser o próximo. Lily aliviava um pouco a carga de seus dias dolorosamente pesados.
E ficara muito feliz ao perceber que parecia ter o mesmo efeito sobre ela.
— Minha mãe sempre foi... ótima. Ela sempre se esforçou para me dar tudo o que eu precisava. Tentava deixar tudo mais fácil para mim. E ela conseguiu, em grande parte, facilitar a minha vida. Nunca tive imprevistos ou contratempos. Tudo o que eu queria, era só pedir que simplesmente estava ali, na minha frente. O sonho dela era que eu me formasse em medicina, como ela, para que pudesse seguir seus passos em sua carreira gloriosa. E, sabe, Evans, por algum tempo foi o que eu quis também. — Meneou a cabeça e suspirou. — Meu pai nunca forçou a barra comigo. Ele sempre me contava sobre suas histórias no exército, sobre suas batalhas, suas perdas..., mas nunca me influenciou. Quando comecei a especialização em medicina, minha mãe parecia estar prestes a explodir de felicidade. Mas, embora eu me sentisse feliz em me imaginar salvando vidas... não estava satisfeito. Eu comecei um estágio no meu último ano, em um hospital pequeno em Seattle. E, por mais que eu me esforçasse, por mais que houvessem cirurgiões e médicos ótimos trabalhando comigo, tinha vezes que nem todo conhecimento do mundo ajudava.
— E as pessoas continuavam morrendo, não é? Mesmo que você passasse noites estudando, mesmo que você se esforçasse para salvá-las, mesmo tomando medidas drásticas. Ainda assim, elas pareciam sempre escapar por entre seus dedos...
James assentiu, observando-a com atenção, como se a estivesse vendo pela primeira vez.
— E aí eu me alistei. — Concluiu, embora muito vagamente. Lembrava da expressão de sua mãe, do quanto ela implorara para que não fosse. Mas estava feito. — Acho que ela nunca vai me perdoar por isso.
— Ela perdoou. — Lily disse e suspirou, encarando-o de modo penetrante. — Ela já o perdoou, James. Ela sabe que, embora pareça loucura, você está fazendo algo que ama. Você está salvando vidas. Existe algo mais nobre do que isso?
— Não. Acho que não. — Ele disse e então sorriu para ela, deixando-a levemente atordoada.
— Tenentes! — Capitão Shacklebolt se aproximou, interrompendo a pequena troca de olhares entre os dois, os passos firmes e a expressão decidida deixando bastante claro que estava ali para dar ordens.
— Capitão. — Lily e James bateram continência para o superior, ambos curiosos sobre o motivo pelo qual ele deveria estar ali. — Aconteceu alguma coisa, Senhor? — Lily adicionou, preocupada.
— Infelizmente, sim, Tenente. — Shacklebolt disse e então passou uma mão pela testa, afastando o suor que se acumulava ali por conta do calor extremo ao qual estavam expostos. O homem voltou-se para a médica, encarando-a como se soubesse que estava prestes a pedir algo impossível, mas que faria ainda assim. — Precisamos do Potter. Moody está inoperante. Eu estou em seu lugar, contudo preciso de um braço direito. Potter é o melhor dos meus homens e, embora eu saiba que ainda está se recuperando, preciso dele.
— Nem pensar. — Lily disse, parecendo abismada com a audácia do homem. — Ele estava praticamente morto! Eu precisei usar todos os meus conhecimentos médicos para conseguir salvá-lo!
— Tenente Evans, eu sei que...
— Não, você não sabe! — Lily cruzou os braços sobre o peito, furiosa. — Sabe quão duro é conseguir salvar alguém do estado no qual ele se encontrava? Principalmente aqui que não temos todos os recursos necessários? E você quer que eu jogue tudo isso pelos ares porque quer um "braço direito"? Arranje outro! Me desculpe, Capitão, mas pedir isso é o mesmo que me mandar embora e inutilizar os meus serviços...
— Evans...
— Não. — Ela concluiu, tácita. Seus olhos verdes encaravam-no, cheios de uma fúria contida. James surpreendeu-se com a intensidade dela. Lembrava de vê-la brigar com Moody quando ele queria diminuir o tempo de recuperação de seus pacientes, mas jamais havia percebido quão bonita ela ficava quando o fazia. Seus lábios encrespavam-se, seu rosto toldava-se de vermelho e suas sardas pareciam acender. Algo pareceu aquecer dentro de James ao vê-la defender sua saúde com tanto afinco. Mas ele sentiu o estômago despencar ao perceber que o que falaria a seguir faria com que aquele olhar furioso voltasse para ele.
— Evans... — James a chamou, cauteloso. A mulher voltou-se para ele, arqueando uma sobrancelha enquanto o observava. — Eu... quero alta. — Disse e, novamente, o sangue preencheu o rosto dela, deixando-a quase da mesma cor de seus cabelos. — Sei que ainda não estou totalmente recuperado, mas...
— Mas você quer agir como um soldado honrado, portanto vai ir até lá e se matar na primeira oportunidade. — Ela o interrompeu e então estreitou os olhos para ele, irritada. Afastou-se dele, tirando a mão que o apoiava de suas costas. — Se quer mesmo fazer isso, Potter, vou passar o seu prontuário para a Sargento Meadowes. Converse com ela e peça alta. Não serei eu que lhe sentenciarei à morte. — E, dizendo aquilo, bateu continência para os dois homens, a expressão cheia de sarcasmo antes de virar as costas e se afastar a passos largos.
James tentou não se afetar muito com aquilo, mas não conseguiu deixar de sentir um aperto no estômago.
— Parece que conquistamos o desgosto da Tenente. — Shacklebolt, que também parecia afetado com o comportamento dela, suspirou. — Só espero que ela não considere nos matar caso nos machuquemos.
James riu, rolando os olhos para ele.
— Acho mais provável que ela deixe nossos ossos se juntarem errado só para quebra-los novamente.
— Outch. — Shacklebolt estremeceu.
— Mas então, Capitão, o que você precisa de mim?
— Eu disse que você acabaria morto! — Ela bufava, furiosa, arrancando sem muito cuidado os esparadrapos sujos que cobriam o ferimento no braço de James.
— Eu não estou morto... — James resmungou, mas teve que parar, pois naquele instante Lily colocou seu ombro destroncado de volta para o lugar, fazendo-o soltar vários palavrões que teria feito sua mãe ficar de cabelos em pé. — Ei! — Reclamou. — Cuidado!
— Cale a sua maldita boca, Potter. — Ela bufou, irritada, encaixando o estetoscópio nos ouvidos para ouvir o coração dele. — Mas que merda...
— Desculpe. — James murmurou quando ela finalmente se afastou dele, parecendo ter acabado de tortura-lo. Ele não conseguia entender porque ela estava tão irritada, embora soubesse que havia sido completamente imprudente ao ir com Shacklebolt para a frente de batalha quando não estava totalmente recuperado.
— Cale a boca. — Bufou e então lançou um olhar furioso para ele, fazendo-o calar-se. Se afastou em direção à maca ao seu lado, onde Sirius estava deitado, a cabeça enfaixada enquanto mordiscava uma barrinha de cereal. Lily prontamente arrancou a barra das mãos de Sirius, fulminando-o antes de começar a retirar a faixa para observar os pontos em sua testa.
— Sabe, ruiva, você precisa sorrir um pouco mais. — Sirius disse enquanto ela olhava sua testa. Lily baixou o olhar para ele, arqueando uma sobrancelha em um claro "cale a boca" silencioso. Sirius sorriu. — Vai ficar com rugas antes do tempo.
— Os pontos em sua testa poderiam facilmente infeccionar, Black, o que ocasionaria uma cicatriz bastante feia e poderia, inclusive, afetar a sua visão. Tenho certeza de que você não gostaria que uma coisa assim acontecesse. — Seu tom era ameaçador. Sirius calou a boca. James tentou segurar um sorriso. — McKinnon voltará em algumas horas para vê-los. — Ela disse e escreveu alguma coisa no prontuário antes de encará-los. — Fiquem vivos e não façam nada imprudente.
— Você vai para onde? — James deixou escapar quando a viu se afastar. Lily parou de andar e voltou-se para encará-lo. — Desculpe, Tenente, não é da minha conta.
— Certamente que não é. — Ela disse e voltou a se direcionar para a saída, hesitando antes de abrir a porta. — Vou para a frente, Tenente. Há muitos soldados caídos por lá e, infelizmente, nem todos podem ser movidos. — E então saiu, deixando-o com o coração na mão.
Lily Evans estava indo para a frente da batalha. Somente o lugar mais perigoso onde ela poderia estar. James tentou não pensar muito sobre aquilo, tentou manter uma conversação divertida com Sirius, tentou não se preocupar, mas de minuto a minuto pelos próximos três dias, tudo o que conseguia fazer era encarar a porta, rezando para que ela entrasse por ela.
— Seria mais fácil se você simplesmente ficasse olhando para lá, sempre, James. — Sirius, que havia recebido alta no dia anterior, disse para ele ao pegá-lo encarando a porta novamente.
— Estou com medo, Sirius. Três dias e nenhuma movimentação. E se aconteceu alguma coisa? E se estiverem precisando de mais soldados?
— Se precisassem já teriam chamado.
— Estou preocupado com Remus e Peter. — James suspirou, pensando em Remus, o amigo que havia ocupado seu lugar ao lado de Shacklebolt quando ele levara um tiro no quadril na última invasão e em Peter que, embora fosse um ótimo soldado, costumava ser muito desastrado.
— E com a Evans também, hm? — Sirius piscou para ele, sorrindo, maroto.
— Minha mãe a trata como se fosse uma filha, Sirius. Seria péssimo se algo acontecesse com ela e eu fosse obrigado a contar para minha mãe. — Estremeceu com o pensamento.
— Sim, porque é somente por conta disso que está preocupado. — Sirius bufou, divertido.
James preferiu não responder, apenas fechando os olhos enquanto tentava acalmar a respiração e dormir. Quem sabe assim o amigo fosse embora e o deixasse quieto e sem comentários maldosos por algumas horas.
Ele não percebeu o momento, mas acabou adormecendo, sua mente sendo invadida por sonhos nada convencionais e nenhum pouco saudáveis envolvendo ele, Lily Evans e lençóis. Quando acordou no meio da madrugada ao sentir alguém tocar em sua testa, precisou conter um palavrão, pois fora interrompido no meio da melhor parte de seu sonho. Céus, e pensar que fazia tanto tempo que não conseguia adormecer sem acabar tendo pesadelos com a guerra.
A raiva inicial sumiu totalmente quando ele percebeu quem o havia acordado.
— Você voltou. — Ele disse e ergueu-se abruptamente, sentando-se em sua maca.
— E você parece melhor. — Lily, que tinha um curativo na bochecha, sorriu para ele, pegando o prontuário da mesa ao lado de sua cama e lendo as informações. A sala estava silenciosa. Deveria ser o meio da madrugada e todos estavam dormindo.
— O que houve com a sua bochecha? Está tudo bem? Algo aconteceu? — James encheu-a de perguntas, falando rapidamente enquanto sentia o alivio preencher seu corpo. Como podia ter estado tão preocupado por alguém que, até algum tempo atrás, não passava de uma conhecida?
— Está tudo bem comigo, Tenente. Obrigada por perguntar. — Ela disse e então o sorriso sumiu de seu rosto, deixando uma expressão que James conhecia muito bem. — Shacklebolt pediu que eu lhe chamasse até a sala dele.
E, mesmo que ela não tivesse acrescentado mais nada, James sabia que alguma coisa muito ruim deveria ter acontecido.
Em um acordo silencioso, Lily ajudou-o a colocar um casaco e os calçados – o que foi meio desnecessário, afinal James já estava conseguindo mover o quadril perfeitamente, mas não reclamou do contato e da preocupação que ela demonstrava por ele. Ainda estava aliviado por tê-la ali, a salvo. Eles saíram para a noite e ele não pode deixar de se sentir aliviado ao ver o céu estrelado, o vento fresco da madrugada fazendo com que ele fechasse os olhos por alguns instantes, respirando profundamente para aproveitar aquele momento raro, longe do calor infernal dos dias quentes no sol.
Quando chegaram à barraca onde Shacklebolt estava, Lily ficou do lado de fora, recostada contra o couro da barraca, esperando por ele. A expressão em seu rosto era de dor e, antes de ele entrar, segurou sua mão e apertou-a, forte.
Ela podia ouvir toda a conversa do lado de fora. Podia ouvir as reações. Podia imaginá-las. Mas não queria estar lá dentro para ouvir quando Shacklebolt contasse à James que ela falhara. Que ela não conseguira chegar a tempo para salvar um de seus melhores amigos. Como conseguiria encará-lo novamente? Como seria capaz de falar com ele depois que ele ouvisse?
Fechou os olhos, sentindo-os marejarem. A dor fantasma atingindo-a novamente, a cena toda perpassando por sua mente como um filme. Ela via o rosto do Tenente Pettigrew, pálido e sem vida encará-la, seus olhos esverdeados muito arregalados, observando-a cheios de culpa. Ela chegara tarde demais. Não fora capaz de fazer nada para reanima-lo. E tudo em que conseguia pensar era no fato de que James não iria perdoá-la.
O porquê de se importar tanto era uma incógnita.
Vários minutos se passaram antes dele sair da barraca. A expressão em seu rosto era de resignação. Lily podia ver em seus punhos cerrados o quanto estava com dor. Ela caminhou em seu lado enquanto voltavam para o hospital, ambos em um silêncio tenso.
Somente quando James estava deitado e as cortinas em volta da cama fechadas, é que ele desmoronou. Lágrimas silenciosas desciam por seu rosto fazendo com que a culpa efervescesse no estomago de Lily, deixando-a enjoada.
— Me desculpe. — Ela se ouviu dizer, sentindo uma lágrima solitária descer pelo próprio rosto. — Me desculpe... eu não cheguei a tempo, eu... me desculpe... — E então, sem que percebesse, mais lágrimas se juntaram a primeira e ela soluçava.
Sentiu quando James segurou sua mão, apertando-a, firme contra a dele.
— Não foi sua culpa. — Ele disse, fazendo com que ela erguesse os olhos para deparar-se com o seu olhar determinado. — Não repita isso! Não foi sua culpa! Você não podia ter feito nada além do que fez! Você chegou e ele já estava morto.
— Eu... — Ela tentou externar seus pensamentos, mas estava muito cansada. Havia perdido muitos soldados na frente da batalha, em sua grande maioria porque havia chegado tarde demais. Sabia que não era culpa sua, que eles já estavam mortos mesmo antes de ela tentar qualquer coisa, mas ainda assim conseguia enxerga-los a cada vez que fechava os olhos. — Me desculpe.
— Está feito, Lily. — James disse, chamando-a pela primeira vez pelo nome de batismo, sem qualquer sigla ou condecoração antes. Esticou a outra mão para o rosto dela, afastando algumas lágrimas insistentes.
— Está errado, você sabe. Eu deveria estar te consolando e não o contrário. — Ela disse e fungou, inclinando o rosto em direção à palma da mão dele, aumentando o tempo de contato.
Eles ficaram daquele jeito por vários minutos, James limpando o rosto dela das lágrimas enquanto Lily bagunçava seus cabelos. Estavam acostumados com as perdas, tanto ela com os anos no hospital quanto ele, com anos de serviço militar. Não era o primeiro amigo que ele havia perdido e também não era o primeiro paciente que morria nas mãos delas, mas a perda e a dor compartilhada pareciam ecoar entre eles, desolando-os.
James não percebeu quando aconteceu, mas Lily estava próxima demais. Suas respirações entrecortadas se cruzavam e o perfume dos cabelos dela invadiu sua mente, deixando-o zonzo. Sem qualquer hesitação, eles encostaram os lábios, ficando daquele modo por vários segundos, aproveitando as sensações que haviam desencadeado com aquele toque, antes de aprofundarem o beijo.
Foi um beijo cheio de pesar, dor e culpa. Foi um beijo intenso e consolador. Não saberiam dizer por quanto tempo ficaram ali, apenas aproveitando a companhia um do outro, mas o sol estava nascendo quando ouviram os sons de passos se aproximando.
— Eu... — Lily começou a falar ao se afastar, ofegante, mas James a interrompeu, segurando seu rosto entre suas mãos.
— Está feito.
Os dias transformaram-se em semanas e, as semanas, em meses. A batalha aumentava, mais batalhões eram deslocados para ajudar e o trabalho de Lily aumentava a cada dia mais.
Ela e James não haviam mais se beijado. Ou se falado além do necessário. A verdade era que estavam se evitando. Por semanas – quando James estava na frente das investidas ou quando Lily era deslocada à outras unidades – ficavam sem se ver, o que colaborava bastante para o gelo que estavam trocando.
Lily tentava não pensar muito nos beijos que haviam trocado enquanto que James tentava evitar ao máximo dormir para não sonhar com ela. Infelizmente, para os dois, era inevitável. A cada intervalo ou os raros momentos em que Lily tinha algum descanso, encontrava-se tocando em seus lábios, relembrando. E, James, por mais que tentasse se ocupar, precisava dormir e, a cada vez que fechava os olhos, deparava-se com os muito verdes dela encarando-o, misteriosos.
O que estava acontecendo com eles? Perguntavam-se. Mas não possuíam muito tempo para pensar sobre aquilo.
Somente quando finalmente conquistaram parte do território inimigo, quando as batalhas deram uma trégua é que voltaram a se encontrar.
Era noite e Lily estava saindo do hospital, feliz por entregar o posto à Meadowes que, surpreendentemente, tornara-se uma grande amiga. Sentia dor em todo o corpo, suas costas reclamavam do tempo em que se curvara por cima dos pacientes, suas pernas e pés pulsavam a cada passo por conta das muitas horas sem sentar. Tudo o que queria era um banho e, então, deitar a cabeça no travesseiro e dormir por várias horas. Foi até sua barraca, que era afastada das masculinas, e pegou algumas roupas, encaminhando-se até o vestiário feminino. O chuveiro tinha água gelada e, embora os dias fossem quentes, ainda assim arrepiou-se no primeiro contato. Ficou alguns minutos parada, deixando a água percorrer por seu corpo, relaxando os músculos, antes de começar a se ensaboar. Saiu do banho quinze minutos depois, seus cabelos molhados presos em um coque frouxo enquanto se vestia. Juntou seus pertences e voltou para sua barraca, feliz por, finalmente, ter algum tempo para descansar, sem ter de se preocupar com mais feridos de batalha. Ou, bem, ela estava contando com aquilo.
Estava quase chegando em sua barraca quando o viu se aproximar. Ele encarava os próprios pés e bagunçava os cabelos em um gesto automático. Demorou algum tempo até erguer os olhos e deparar-se com ela.
E então sorriu.
— Estava me perguntando quando te encontraria. — Disse, simpático.
Ela estranhou o comportamento, afinal havia pensado que estavam se evitando.
— Bem, aqui estamos nós. — Lily comentou e sorriu, tentando parecer leve e não como se seu coração estivesse praticamente saindo pela sua boca.
O silêncio recaiu sobre eles que ficaram ali, encarando-se, constrangidos.
Por várias vezes, Lily abriu a boca, prestes a falar alguma coisa, qualquer coisa, mas nada saia. James não conseguia deixar de encará-la e lembrar de todos aqueles sonhos muito impróprios que o assombravam todas as noites.
Suspirando, Lily interrompeu o contato visual, e desviou de James, voltando a encaminhar-se para sua barraca. Os passos atrás de si indicavam que ele a seguia.
Assim que chegou em frente ao seu acampamento, Lily voltou-se para ele, segurando a abertura de sua barraca, arqueando uma sobrancelha numa clara indagação.
— Preciso falar com você. — James disse simplesmente e então, passando por ela, adentrou em seu dormitório.
Ele observou curiosamente a disposição de tudo por ali. Era exatamente igual à dele, contudo haviam muitos livros e materiais por cima das mesas e escrivaninhas. Ele teria imaginado que, pelo modo como ela agia e comandava, fosse encontrar um ambiente muito mais organizado do que o que observava. Contudo, percebeu que aquele lugar parecia encaixar perfeitamente na mulher que estava logo atrás dele.
— Falar sobre o quê, Tenente? — Lily, que sentia o estomago apertar devido ao nervosismo, indagou, encarando-o de modo receoso.
James voltou-se para ela, reparando em seus cabelos úmidos, no modo como as mechas escapavam de seu coque. Suas bochechas adoravelmente coradas, seus lábios rosados e seus olhos verdes que pareciam duas brilhantes esmeraldas.
Havia uma gota de água descendo por sua testa, escapando de seus cabelos ainda não totalmente secos. James aproximou-se, querendo limpar a gota, mas percebeu-se desenhando o rosto dela com seus dedos, segurando seu maxilar e erguendo o rosto e Lily para o seu.
Antes que pensasse em uma resposta para a pergunta dela ou que fizesse qualquer outra coisa que seu cérebro parecia estar tentando compreender, Lily terminou com os últimos centímetros de distância que havia entre eles e beijou-o.
Daquela vez, o beijo fora totalmente diferente dos primeiros. Era quente e cheio de emoção, um beijo que fazia com que James se sentisse acender e acalentar. Era um beijo ardente que fazia com que ambos se arrepiassem. Sem dar-se conta, tinha as mãos na cintura dela, puxando-a para mais perto, querendo acabar com qualquer espaço que havia entre ambos.
Era insano o quanto o toque dos lábios dela conseguia varrer qualquer pensamento lúcido da mente dele.
Lily afundou as mãos na nuca dele, suspirando ao senti-lo mordiscar seu lábio inferior e então descer em direção ao seu maxilar. As mãos de James fecharam-se com força sobre seu quadril, puxando-a ainda mais para ele, fazendo com que ela sentisse a dureza de sua ereção contra sua barriga. Um gemido involuntário escapou de seus lábios, fazendo-o rosnar e voltar a beijá-la, daquela vez sem muita gentileza, enfiando suas mãos por dentro da camiseta larga que ela havia vestido após o banho, acariciando-a e apertando-a.
Eles se entregaram ao beijo, desesperados. Como se quisessem suprir todo o tempo em que haviam estado separados, como se quisessem compensar a dor e todos os sentimentos ruins que os corroíam pelos dias, o efeito doloroso que a guerra tinha sobre eles. Eles queriam esquecer dos problemas e da guerra do lado de fora e dentro deles. Queriam sair dali, do meio daquele deserto infernal, do calor, do sangue. Queriam transportarem-se para um lugar onde apenas eles e o toque deles e os beijos deles importassem.
Ela soltou um gemido baixo quando suas costas tocaram no colchão e o corpo de James estendeu-se sobre ela, deixando-a apreciar com as mãos, passear pelas costas nuas dele e arranhá-lo. Deixar sua marca ali, em meio à todas as cicatrizes de guerra.
James desceu os lábios por seu pescoço, beijando os seios dela, mordiscando-os. Lily não conseguia lembrar em que momento havia retirado a camiseta e a roupa de baixo, mas também não se importava. Tudo em que conseguia pensar, tudo o que conseguia sentir eram os lábios de James, que trilhavam beijos e deixavam-na desesperada por mais enquanto ele descia por seu corpo, demorando-se em pontos específicos que a faziam suspirar.
Ainda com a boca, James mordeu a alça esquerda de sua calcinha, retirando-a lenta e torturantemente enquanto sua respiração causava arrepios pelas coxas de Lily. Quando ela finalmente estava totalmente despida, ajudou-o a retirar suas calças e deixa-lo completamente nu.
Estavam indo rápidos demais, sedentos demais e, ainda assim, ela não estava satisfeita.
James voltou a subir por suas pernas, beijando-a até chegar em seu ventre, detendo-se ali. Com os dentes, mordiscou a parte interna das coxas de Lily, fazendo-a gemer em protesto. Ele estava protelando e ela não queria demora. James sorriu, sabendo o efeito que estava tendo sobre ela e deliciando-se com aquilo.
— James... — Ela suspirou quando não conseguiu mais aguentar a tortura que era sentir a respiração dele tão perto de lá. — Por favor...
— Sim senhora, tenente. — Ele brincou e então finalmente a beijou em sua intimidade, sentindo seu gosto, sentindo-se estremecer ao percebê-la tão úmida. Podia ficar horas ali, ouvindo-a gemer e suspirar, sentindo seu corpo arquear-se em volta dele, sentindo os músculos enrijecerem em volta de sua boca... porém também não estava conseguindo aguentar. Portanto, quando vasculhou os bolsos de sua calça no chão, puxando o pacote prateado esquecido de um bolso qualquer e vestiu-se logo em seguida, não demorou muito antes de deitar sobre ela, afastando as pernas de Lily com as próprias, ajeitando-se sobre ela antes de penetrá-la.
Lily o puxou para um beijo quando o fez e, da mesma forma que ele se movimentava – a princípio calmo e então aumentando o ritmo das estocadas dentro dela – o beijo aumentava de intensidade, aprofundando-se enquanto ela arranhava suas costas e movia o quadril de encontro ao dele, forte. Firme.
Era como se estivessem lutando em sua própria batalha, como se fossem um batalhão que, trabalhando junto, chegava em um resultado maravilhoso. Eram como um exército em perfeita sincronia.
Quando, por fim, atingiram o ápice e James deitou ao lado dela, puxando a coberta fina sobre eles, sentiu-se estremecer e finalmente percebeu o que haviam feito.
— Eu... ah... — Começou a falar, mas ela o interrompeu.
— Está feito, James. — Ela disse exatamente as mesmas palavras que ele lhe havia falado após beijá-la pela primeira vez e então sorriu para ele, sonolenta. — Se quiser, pode ficar para dormir. Tem espaço para nós dois.
— Não pretendia ir para qualquer outro lugar.
Os dias pareciam demorar o dobro do tempo para passar enquanto tudo em que Lily e James conseguiam pensar eram no que iriam fazer, juntos, de noite. Era como um ritual: durante o dia mantinham um relacionamento cordial e amigável. Lily enfurnava-se no hospital e, na hora do almoço, sentava com Marlene ou Dorcas, conversava com elas e então caminhavam, observando o acampamento e ouvindo notícias dos soltados. Voltavam para o hospital e, lá, trabalhavam até tarde. E então chegava a parte preferida de Lily: a noite quando, após se banhar, ia até sua barraca e deparava-se com James lá, esperando-a com um sorriso maroto.
A princípio, era apenas sexo. E então eles começaram a conversar e contar suas histórias. Lily falava sobre sua família problemática e todos os motivos que a haviam levado a se alistar no exército enquanto que, James, descrevia batalhas e as baixas e momentos difíceis que enfrentara nos últimos anos em que havia servido.
Em poucas semanas conheciam-se como se houvessem crescido juntos. James conseguia reconhecer as expressões de Lily facilmente enquanto que, ela parecia sempre saber o que se passava na cabeça dele.
As pessoas começaram a notar o estranho companheirismo que surgira entre eles e então, os amigos de James o prensaram contra a parede, obrigando-o a confessar sobre o relacionamento com a Tenente mais temida do acampamento. Eles riram e se divertiram às custas dele e, é claro, logo estavam passeando mais do que o necessário pelo hospital, sorrindo e fazendo piadas com Lily, deixando claro para ela que eles haviam descoberto.
E não eram apenas eles, é claro. Todo o acampamento, de repente, parecia saber sobre eles dois. E, é claro, Moody – que havia voltado do Iémen – inteirou-se do assunto e chamou-os para uma "conversa".
— Quero que fique claro que não tolero qualquer tipo de comportamento pejorativo ou decadente. Não me interessa se vocês estão juntos ou não, se estão brigados ou não, contanto que isso não interfira no serviço de vocês, estamos entendidos? — Ele dissera, sério. James e Lily assentiram, sem saber exatamente o que falar além de "sim, Senhor".
Após algum tempo, as pessoas pararam de dar tanta importância para os dois e, por conta daquilo, sentiram-se livres para demonstrar um pouco mais de afeto livremente. Andavam juntos pelo acampamento, às vezes tocavam-se mais do que a cortesia permitia. Uma vez, beijaram-se levemente antes de separarem-se para cumprirem suas tarefas.
O acampamento inteiro parecia mais leve e não apenas por conta do fato de eles estarem juntos, ajudando-se mutuamente a aliviar a carga de suas vidas, mas também porque, dali a duas semanas, seriam liberados para "férias" que durariam quatro meses. Haviam feito planos para aquele momento, planos que envolviam ir até a casa dos Potter e fazer a felicidade de Euphemia ao contar para ela que estavam juntos.
Lily podia, inclusive, imaginar sua expressão de choque inicial se transformar rapidamente em surpresa e então em adoração. James não conseguia aguentar para poder dizer ao pai que encontrara alguém em meio a batalhas.
Estavam esperançosos. Havia apenas mais uma invasão antes que fossem despachados, contudo, como sempre na vida de Lily, a sorte não parecia estar lhe sorrindo.
Moody a chamara, junto de Black e outros dois tenentes. Ao chegarem em sua sala, encontraram Shacklebolt, James e o Comandante de outro regimento, Amos Diggory. Lily estranhou toda aquela cena, mas tentou deixar sua expressão a mais neutra possível ao sentar em frente ao seu comandante.
— Evans, Black, Doge e Longbottom. Vocês foram convocados a prestarem serviços no 2º Esquadrão, localizado na Síria. Há uma invasão acontecendo lá e eles tiveram muitas baixas. O médico deles foi muito ferido e eles precisam de auxílio antes que acabem sendo dizimados. Como estamos em um momento relativamente calmo, aceitei emprestá-los para o segundo regimento, mas, assim que possível, o mais rápido possível, voltarão para os meus cuidados. — Moody encarou-os, sério. — O Comandante Diggory solicitou que vocês quatro organizassem seus pertences e tudo o que for essencial ainda esta noite, pois a partida para a Síria será as cinco horas dessa madrugada. Black, você está incumbido da proteção pessoal da Tenente Evans. Não podemos nos dar ao luxo de perder mais um médico. Doge, Longbottom, vocês, enfermeiros, estarão sob os comandos de Evans, assim como você, Black. A única diferença é que, se houver uma chance de ela acabar morta e ela estiver colocando sua vida em risco, caberá a você decidir o que é o melhor a fazer. — Moody voltou-se para Lily, estreitando o único olho bom. — Você irá respeitar as decisões do Tenente Black, Evans, quando estas envolverem sua segurança pessoal. Sei que gosta de agir sozinha, mas não posso e não vou perde-la por conta da sua imprudência. Estamos entendidos?
— Sim, Senhor. — Os quatro disseram e, embora Lily sentisse um gosto amargo na boca, um aperto em seu peito e a sensação de desconsolo aumentar dentro de seu peito, ela manteve a expressão firme.
— Ótimo. — Comandante Diggory assentiu, sorrindo para eles. — Estão dispensados para organizarem seus pertences e descansarem. Aproveitem esta noite, pois, acreditem em mim: será a última em que poderão dormir em muito tempo.
Lily encarava o teto da barraca enquanto James acariciava seus cabelos. Eles estavam nus e haviam acabado de transar e, embora Lily amasse a sensação de letargia que a invadia toda vez que terminavam, estava tentando com muito afinco manter os olhos abertos para prolongar aquele momento.
— Tentei mudar o comando de Moody, tentei fazê-lo perceber a burrice que estava cometendo, mas não consegui... me desculpe, Lily. — James comentou novamente, remoendo-se. Ele parecia mais inconformado com aquela situação do que ela. — Também tentei fazer com que ele me enviasse para protege-la, mas não obtive sucesso. Aquele velho...
— Está tudo bem, James.
— Não! Não está! Você ouviu os comentários, Lily, sabe como as coisas estão por lá. Se aqui estava difícil, na Síria está três vezes pior. É suicídio mandar soldados nossos para lá.
— Fico feliz em saber que você confia na minha capacidade de sobrevivência, James. — Lily bufou, irônica.
James remexeu-se ao lado dela, puxando seu rosto com a mão direita de modo que ela o encarasse.
— Você vai sobreviver, Lily. Te proíbo de voltar em um caixão. — Ele estreitou os olhos, mas a sentença era séria.
Lily assentiu.
— Eu vou sobreviver.
— Prometa. — E os olhos dele derretiam sobre os dela, deixando-a zonza. Ela queria prometer aquilo para ele, queria dizer que voltaria e que ficariam bem, mas sabia que era insanidade. Estava indo para uma das batalhas mais acirradas e perigosas da guerra atual. E sabia que as possibilidades de sobreviver não eram das melhores.
— Tentarei. — Disse, tentando soar confiante.
Mas, para James, não era o suficiente.
— Prometa, Lily.
E então ela prometeu.
— Está feito. — Disse e selou a promessa com um beijo.
Ela não deveria ter prometido.
Era tudo em que conseguia pensar enquanto os meses se passavam naquele inferno que a frente de combate havia se transformado.
Lily tinha toda uma gama nova de cicatrizes e arranhões e queimaduras. Mas não chegava nem perto de como Sirius, Doge e Longbottom estavam. Havia mais feridas neles do que Lily podia contar e, ainda assim, continuavam em pé, sempre prontos para protege-la. Eles faziam a frente e, cada vez que um soldado caía, Doge ou Longbottom se aproximava, avaliando os machucados antes de dar o aval para Lily poder se aproximar.
Ela odiava aquilo, aquela sensação de impotência que sentia toda vez que um dos seus soldados se arriscava para fazer um serviço que deveria ser o dela. Contudo, Lily era preciosa demais, necessária demais para se arriscar tanto. E Doge e Longbottom, aos olhos de Diggory, não eram.
Lily desenvolvera um grande rancor do Comandante do 2º Regimento. Arrogante e extremamente sufocante, Diggory parecia cuidar cada passo que ela dava, sempre perto o suficiente para meter o nariz nas decisões que ela tomava. Odiava estar sob seu comando e ter de acatar suas ordens e odiava mais ainda perceber que ele sabia do desconforto dela e apenas piorava a situação para Lily.
A única parte boa em tudo aquilo, era o fato de que tinha feitos novos amigos. Melhores amigos. Frank Longbottom era dois anos mais novo que Lily e tinha três anos a mais de carreira militar do que ela. Alistara-se porque precisava de um emprego fixo, afinal iria ser pai e sabia que, mesmo que acabasse morrendo em uma doca, pelo menos sabia que sua mulher e o filho estariam assegurados. Frank, embora fosse um dos soldados mais brilhantes que conhecera, encaixava-se no grupo dos que queriam voltar para casa. Lily lembrava da expressão de desânimo dele ao subir no avião que os havia transportado para a Síria. A dor e o cansaço que o abateram. E, mesmo assim, ele sempre estava lá, dando o máximo de si para a causa.
Ela o admirava.
— Neville e Alice são tudo para mim, mas ainda assim, saber que estou aqui, dando o melhor de mim para que eles vivam em um mundo melhor, é algo que me faz levantar e querer lutar todos os dias. — Dissera enquanto seus olhos pareciam perdidos em lembranças. Em seguida, Frank puxara uma foto onde estava abraçado em uma mulher baixinha e muito bonita que carregava um bebê roliço e sorridente nos braços. Lily achou que nunca havia visto uma família mais bonita.
Doge, por outro lado, encaixava-se no grupo que amava servir. O dia dele não parecia estar completo enquanto não estivesse vestindo sua farda e correndo risco de vida. Sem dúvidas, era muito divertido. Doge conseguia alegrar os dias com seu entusiasmo e esperança de que, no final, tudo daria certo e que eles venceriam.
— Vamos honrar nossos nomes, pessoal. — Ele repetia em todas as manhãs, um sorriso enviesado bordando seus lábios enquanto encarava-os cheio de expectativa.
Sirius, por outro lado, era muito mal-humorado. Suas conversas baseavam-se, basicamente, em humor negro e sarcasmo. Ninguém era capaz de saber se ele estava falando sério ou apenas fazendo uma piada. E, por mais irritante que fosse ao se aproximar da situação na qual fora colocado – de assegurar-se da vida de Lily – ele era o favorito dela.
Haviam muitas coisas em comum entre os dois. Famílias problemáticas, pais alcoólatras e mães omissas. Sirius desistira de sua carreira de ator para entrar para as forças armadas. Ele conhecia James desde a infância e, quando o amigo decidira se alistar, Sirius o acompanhara. Agia como se amasse aventuras, como se, para ele, estar ali, batalhando e colocando a vida em risco, fosse apenas mais um dia em um parque de diversões. Mas Lily conseguia ver a dor em seu olhar quando via um homem caído, conseguia ver o alívio quando ela conseguia salvar um companheiro, podia ver o quanto custava para ele lembrar dos amigos que estavam há muitos quilômetros de distância dali e podiam ou não estar vivos. E, nessa última parte, ela preferia não pensar muito. Sirius era complexo. E, por mais arrogante que parecesse às vezes, era uma das pessoas mais altruístas que Lily havia conhecido.
— Vamos, Lily, feche a droga desses olhos e vague para seu inconsciente. — Ele havia dito em uma noite qualquer enquanto estavam de vigia atrás de uma barricada.
— Você fica muito fofo quando está preocupado. — Lily murmurou, divertida, enquanto inclinava a cabeça para encostar no ombro dele.
— Cale a boca e durma de uma vez, Evans. Não tenho paciência para ser babá. — Resmungou, mas tinha as mãos em seus cabelos, acariciando-a e acalmando-a até que, por fim, Lily adormeceu.
James não sabia dizer ao certo como havia sobrevivido aos últimos meses. Estava em casa, junto dos pais e, embora ficasse feliz ao ver a alegria de sua mãe ao tê-lo de volta, não conseguia afastar os pensamentos de Lily e Sirius que, naquele momento, deveriam estar enfrentando o que – segundo o noticiário – era uma das guerras mais sangrentas da história dos últimos anos.
Nos primeiros meses, trocara cartas semanalmente com os dois, tentando se confortar com as palavras sarcásticas de Sirius e as concisas de Lily. Tentando aceitar que, no momento, aquela era a maior benção que poderia ter: saber que estavam vivos. Infelizmente, houve uma invasão inimiga no acampamento onde eles se encontravam e, por conta daquilo, haviam perdido todo o contato. Estavam isolados e qualquer tentativa de comunicação estava vetada pelos comandantes.
Vários batalhões foram designados para a Síria a fim de ajuda-los, contudo, James não fora chamado. Moody parecia crer que James estar vivo era um milagre levando em consideração o fato de que, alguns meses atrás, quase morrera duas vezes e, por conta daquilo, merecia um descanso. Só que James não queria um descanso. James queria ir até lá para ajudar Lily e Sirius que, por Deus, podiam já estar mortos.
O tempo que se passou sem nenhuma notícia exceto a dos informantes fora difícil. James estava trabalhando no Quartel General localizado em Colúmbia, sob o comando do General Albus Dumbledore e, embora o homem sempre o informasse sobre as novidades, não conseguia se acalmar o suficiente para ter boas noites de sono.
Queria saber o que estava acontecendo, mas fora impedido mais vezes do que podia contar, tanto por Moody quanto por Dumbledore, de voltar para a batalha.
— Você vai ficar aqui, Potter, e vai recuperar toda sua forma. É um ótimo soldado e excelente no comando. Não podemos nos dar ao luxo de perdê-lo. — Moody dissera, contrariando o apelo de James.
E então, sabendo que não tinha mais o que fazer, James esperou.
Dia após dia, noite após noite, meses se passaram quase sem notícias. Até que, finalmente, Dumbledore o chamou em seu escritório e, ao chegar lá, deparou-se com Coronel Diggory que, apesar da aparência cansada, estava inteiro.
— Tenente Potter... ou deveria dizer, Capitão Potter? — Diggory sorriu para ele, embora o sorriso não chegasse aos seus olhos. — Fiquei sabendo que subiu de patente após o Iraque. Parabéns.
— Obrigada, Comandante. — James assentiu, tentando transparecer calma, enquanto que, por dentro, sentia-se ansioso. Se Diggory estava ali, significava que seus soldados também deveriam estar. Ou, pelo menos, era o que James esperava.
— Capitão Potter, o chamamos aqui para informar que o 2º regimento conseguiu afastar o exército inimigo de seu acampamento, contudo...
— Contudo, perdemos muitos homens, Capitão e, por conta disso, estamos solicitando mais homens. — Diggory concluiu, encarando-o profundamente.
— Nosso batalhão foi requisitado, Potter e eu aceitei. Quero saber se você aceita comandar o 3º batalhão. Se aceita ir para a Síria na próxima semana?
— E os nossos homens, Coronel? Tenentes Black, Doge, Evans e Longbottom? Estão...
— Vivos. — Dumbledore assentiu, fazendo com que James suspirasse, aliviado. — Receberão uma condecoração e honras neste sábado pelos serviços prestados.
— Na festa de gala? — James arqueou uma sobrancelha, surpreso com a notícia. — Eles já estão aqui?
— Sim. — Moody concordou. — Infelizmente, Doge foi muito ferido na última investida e, por conta disso, teve de ficar em Washington junto de Evans que insistiu em trata-lo-
— É claro que ela insistiu. — James murmurou, mais para si mesmo do que para os outros ali presentes.
— Black e Longbottom devem chegar aqui hoje à tarde. — O Coronel continuou e então coçou a barba, encarando James com o único olho bom. — Queremos sua resposta, Capitão, sobre a ida para a Síria. Contudo, não precisa responder hoje. Sei que as notícias sobre o cerco não foram muito animadoras e que, aparentemente, esta será uma missão suicida..., mas eles precisam de ajuda, Capitã dever do Exército se unir diante do inimigo.
— Sim, senhor, Coronel.
— Espero receber sua resposta no Sábado, Capitão. Até lá, você está dispensado de seus serviços para que possa se organizar. — E, dizendo aquilo, Dumbledore o dispensou com um aceno da mão. Batendo continência, James se afastou, sentindo-se extasiado.
Lily e Sirius estavam vivos! E, embora estivesse prestes a tomar uma decisão importante, nada poderia diminuir o alívio e a alegria que o invadiam ao saber que eles estavam à salvo.
Lily sempre odiara comportamentos pomposos. Sempre odiara ser o centro das atenções. Portanto estar ali, naquele palco enquanto ouvia o General Dumbledore enunciar todas as suas supostas conquistas, congratulando-a por seus feitos, faziam-na sentir-se enjoada. Sirius e Frank estavam ali, ao seu lado, também recebendo créditos por seus méritos. E talvez somente por aquele motivo é que ela ainda não houvesse saído correndo.
Infelizmente, Elphias Doge não conseguira sobreviver por tempo suficiente para estar ali, junto deles, embora, sem dúvidas, fosse o que mais merecesse.
Houvera uma explosão.
Na verdade, houveram várias explosões, mas eles estavam se saindo bem até aquela em particular. Elphias Doge estivera próximo demais no momento em que acontecera, tendo corrido até lá para avaliar um soldado gravemente machucado a fim de informar suas condições à Lily para que ela pudesse decidir o que fariam a seguir.
Quando o mundo inteiro explodira à volta deles, Lily sentiu como se tudo tivesse se tornado muito nítido. Sua visão aguçou, deixando claro para ela as falhas no chão onde pisavam, o suor que escorria através dos poros do rosto de seus parceiros, a expressão de terror no rosto de Elphias ao perceber que não conseguiria se afastar antes que fosse tarde demais, as partículas de pedra e terra que os envolveram segundos depois da bomba estourar alguns quilômetros abaixo, fazendo com que o mundo ao redor deles parecesse ruir.
E então dor.
Lembrava de acordar algumas horas depois, deitada em uma maca com uma enorme dor de cabeça. Sorte a dela. Sirius estava em pé, parecendo nem ter sido abalado, exceto pelo grande corte já suturado em seu braço direito. Ele correu até ela, tentando contê-la quando insistira em erguer-se da cama.
— Elphias- — Começou a falar, mas Sirius simplesmente negou com a cabeça. Ela sentiu como se todo ar houvesse escapado de seus pulmões, como se tivesse acabado de levar um soco no estômago. — Ele...?
— Não. — A voz de Sirius estava mais rouca que o normal ao segurar seu rosto entre suas mãos para encará-la. — Ele está vivo, Lily. Só não sei por quanto tempo.
Quando ela finalmente fora liberada e pudera ir até o leito de Elphias para vê-lo, gostaria de não o ter feito, pois encontrou-o totalmente despedaçado. Se não fosse pelos olhos azuis que a encaravam, não teria sido capaz de reconhecer o homem que havia se arriscado por ela mais vezes do que podia lembrar nos últimos meses.
Lily segurou sua mão, sem conseguir encontrar palavras para dizer. Ele retribuiu o aperto, esboçando o que parecia o fantasma do sorriso alegre que ele sempre dava antes de uma batalha. Aparentemente, Elphias Doge estava prestes a encarar a pior batalha de sua vida. E parecia saber que, daquela vez, não conseguiria vencer.
O peito de Lily parecia ter se transformado em um grande nó enquanto, com o passar dos dias, dava para ele o melhor tratamento que podia com os poucos recursos que lhe restavam. Ele estar vivo já era um milagre, mas Lily sabia que ele estava sofrendo com a dor. Mais dor do que ele merecia ter de aturar depois de tudo que havia feito por ela e seus parceiros.
Lily não conseguia lembrar da última vez que dormira – como Diggory havia previsto muito bem. Ela passava as noites no hospital improvisado, cuidando dos pacientes. E conversava com Doge. Contava a ele histórias que ele ainda não sabia e, quando não havia mais nenhuma outra para recitar, as repetia. Não conseguia deixa-lo por muito tempo sem sentir o peso da dor e da culpa assolá-la. Era culpa dela que ele estivesse daquele jeito. Foram as ordens dela que o haviam colocado naquela posição arriscada e que acabara causando todo aquele sofrimento desnecessário.
Quando outra tropa chegou em um avião de carga, trazendo mantimentos e informando-os que, finalmente, haviam conseguido se livrar do cerco e que ela, Sirius, Frank, Elphias e mais outras centenas de homens deveriam partir o mais rápido que podiam de volta para os Estados Unidos para que fossem tratados lá antes de voltarem — isto é, se quisessem voltar — Lily sentiu uma pontinha de esperança crescer em seu peito. Talvez, quando chegassem em Washington e ela pudesse colocar as mãos nos recursos médicos avançados de lá, conseguisse salvá-lo. Talvez, se tivesse alguma sorte, ela pudesse devolvê-lo, pelo menos um pouco, ao que era antes.
Mas, como sempre, a sorte não estava ao lado dela.
Era pedir demais que conseguisse salvar o homem que, várias vezes, salvara sua vida.
— Não se culpe por isso, Lily. — Sirius dissera, minutos depois de Doge dar seu último suspiro após inúmeras tentativas falhas de trazê-lo de volta por parte de Lily. — Você não o obrigou a ir até lá.
— Foram as minhas ordens...
— Você não o ordenou a fazer nada! Você teria ido lá se eu não a tivesse impedido! Se nós não tivéssemos te segurado, seria você a estar morta nessa cama e sabemos que Doge jamais teria se perdoado se não tivesse dado a vida dele para que você fosse salva. Ele preferiria isso, Lily, a ter de viver pensando que não fez o suficiente por você!
— Como você pode dizer um absurdo desses, Sirius! Como tem coragem? — Ela disse, assombrada com a audácia dele. — Elphias não merecia morrer! Não merecia morrer assim! — Colocou as mãos na cabeça, sentindo-se desconsolada. — Deveria mesmo ser eu, morta, naquela cama. — Sussurrou.
— Nós fizemos um juramento, Evans. Nós juramos protege-la dos inimigos para que pudesse salvar vidas. Nós sabíamos dos riscos que estávamos correndo. Elphias sabia que poderia acabar morto e, mesmo assim, acatou as ordens de bom grado. — Frank disse, aproximando-se dela, tentando fazê-la entender o que parecia muito claro para eles.
— Pelo que eu conheci dele, estaria orgulhoso de ter morrido como morreu: pela honra do exército. Para salvar um soldado. Para salvar você. — Sirius segurou seus ombros, obrigando-a a encará-lo. — Ele se sacrificou por você, Lily, pois sabia que valia a pena. Sabia que, com você viva, teríamos mais chances de viver. E, veja isso: — indicou as outras camas da emergência, atulhadas de pacientes que Lily estivera vistoriando antes de perceber que Doge estava tendo uma parada e correr até ele. — Você salvou dezenas de vidas, Lily. Centenas, inclusive. Doge deu a vida dele por você, pois sabia que valia a pena. E valeu. Eu teria feito o mesmo. Eu farei o mesmo se for necessário.
— Eu te proíbo, Sirius Black! — Lily disse, mas não com autoridade o suficiente, pois, naquele momento estava chorando demais para que qualquer coisa parecesse nada além de grunhidos.
Ele a abraçou enquanto Frank tocava em suas costas. E, por algum tempo, ela se sentiu menos culpada. Por algum tempo, ela conseguiu compreender as razões de Elphias. Por algum tempo, não se achou tão monstruosa.
Mas apenas por algum tempo.
Por todas as noites que se seguiram, tudo em que Lily conseguia pensar eram nos últimos momentos de seu soldado. Revivia aquela cena, pensando no que poderia ter feito, nas decisões que poderia ter tomado para que tudo fosse diferente. Era um exercício doloroso e desnecessário, mas não conseguia se impedir.
E estar ali, em frente a todos aqueles soldados radiantes que a encaravam cheios de orgulho, condecorando-a por suas falhas, faziam-na sentir-se prestes a desmoronar.
Quando, finalmente, desceu as escadas do palco, permitiu-se caminhar mais rápido do que o necessário, apenas assentindo quando alguma pessoa se aproximava para falar com ela, parabenizando-a. Sabia que estava sendo rude, mas o que mais poderia fazer diante de tudo aquilo?
Lily só parou de caminhar quando chegou do lado de fora, deparando-se com uma varanda que dava para um lindo jardim ao qual sequer prestou atenção. Ergueu as mãos para afastar uma mecha rebelde de seu rosto e deparou-se com lágrimas que nem havia percebido descerem, incessantes, em direção ao seu pescoço e, logo em seguida, perderem-se no tecido cintilante de seu vestido de gala.
Por alguns instantes, sentiu-se sufocada. Desceu as mãos para a garganta, tentando afastar o que quer que estivesse impedindo a passagem de ar para seus pulmões, mas não havia nada lá. O que a estava sufocando não era um inimigo. Era a culpa.
O mundo girou ao seu redor, fazendo-a suar frio enquanto a respiração se tornava a cada segundo mais difícil. Ela estava surtando, sabia, mas não conseguia se controlar, não conseguia parar... em menos de alguns segundos, estaria morta por asfixia. Uma asfixia imaginária, mas ainda assim extremamente mortal.
Segurou-se no beiral da varanda, tentando firmar-se. Mas estava perdendo. Estava perdida...
— Lily? — Ela o ouviu, longe e, por alguns instantes perguntou-se se não estaria imaginando aquilo também, se não faria parte de sua ilusão sufocante, sua mente desesperada dando a ela o que mais queria para reconforta-la em seus últimos segundos de vida. — Lily! — Mãos fortes a seguraram, afastando-a do beiral da varanda, puxando-a de encontro a um peito firme que tinha um perfume que ela reconheceria em qualquer lugar.
Lily conseguiu respirar, ofegante.
— James? — Lembrava de perguntar ao erguer os olhos e deparar-se com os castanhos que, por muitas noites, haviam sido o único conforto dela em meio à todas aquelas mortes e batalhas.
E então, desmaiou.
N/A: Helloooouuu, pipous! Tudo bem com vocês, amores? Então, cá estou eu com uma fanfic nova. Eu sei, eu sei, deveria estar atualizando as outras, mas, infelizmente, não tenho muito controle sobre minha criatividade, o que acabou resultando nesta historinha aqui
Pelos últimos três dias estive bastante envolvida com essa história. A princípio seria apenas uma oneshot com, no máximo, 3 mil palavras. A princípio, pois, olha só, estamos aqui com um capítulo de 12 mil palavras e que terá CONTINUAÇÃO. Pois é, eu sei. Sem controle, lembram?
Eu estou MUITO empolgada com essa ideia. MUITO MESMO. E espero que gostem tanto quanto eu gostei de escrevê-la
Estava em dúvida se iria dividir ou não este capítulo, mas acabei decidindo por postá-lo inteiro para não comprometer o ritmo da leitura.
É uma Jily bastante diferente de todas as que eu já escrevi, cheia de drama, dor e morte e, talvez por isso, me afeiçoei à ela
Culpem a Grey's Anatomy por todo o sofrimento.
Bem, vou parar de falar por aqui.
Não esqueçam de me contar o que acharam, right? Beijinhos :*
