NCIS LA ou Investigação Criminal LA não me pertence, nem qualquer das suas personagens… naturalmente.
Qual será o equivalente português para «fluffy»? Bem, seja lá qual for o equivalente, era essa a meta... ;)
- Roxo -
Apesar de voltar apenas para o Monty em cada regresso a casa – um "apenas" que ele não costumava reconhecer nesses regressos a casa – ele adorava voltar. Tinha uma sensação de conforto, de paz, de possibilidade de uma ausência da luta constante em que vivia… É claro que ele adorava o seu trabalho. Adorava a adrenalina que ele lhe trazia, adorava aquela sensação secreta de ser um ser humano especial quando ajudava a salvar o mundo… às vezes, adorava-o pelo sentimento de redenção que lhe trazia. Não raras vezes, encontrava-se perdido em memórias teimosas, lembrava como disparou sobre o próprio pai, o homem que lhe deu a vida, como disparou sobre o próprio pai, o bêbado violento e agressor, o primeiro que ameaçou tirar-lhe a vida. Anos e anos de palavras das assistentes sociais, dos psicólogos, dos professores e de uma ou outra família de acolhimento com mais respeito pela condição humana, repetindo que lhe era ausente qualquer responsabilidade ou culpa no sucedido, não calavam a voz que vivia dentro dele, relembrando o que ela dissera.
Lembra, por vezes, o dia em que um dos colegas de um centro de acolhimento – com uma história de vida não muito diferente – o chamou à atenção pelo que ele considerou de «dramatiquices», alegando que "vida é vida". A partir daí, disfarçou… e disfarça. Afinal, talvez seja mesmo um exagero; não teve família, mas isso já passou; convive com a morte de outros (de vítimas também), mas já se habituou; vive com a vida por um fio, constantemente, mas isso são ossos do ofício; sobrevive diariamente ao agonizante medo de perder todos os que o rodeiam, mas … não vai fazer dramas exagerados… Pois…
Hoje em dia, adora ainda mais o seu trabalho, porque o trabalho significa encontrá-la. Apesar disso, o regresso a casa continuou, durante muito tempo, a parecer-lhe um regresso a um templo só seu. O que ele não esperava era sentir tão diferente este regresso a casa… este regresso a casa, após esta última missão. Tinham vivido vários dias como marido e mulher e a palavra «casa» começou, dentro dele, a ser composta por elementos tão distintos. «Casa» passou a ser menos silêncio e mais tecno em altos decibéis, menos organização e mais confusão, menos lado direito e mais lado esquerdo, menos uma cadeira vazia do outro lado da mesa e mais um pequeno-almoço acompanhado de estranhos (e…"fisicamente perturbadores") gemidos de prazer pelas simples panquecas com chocolate… menos um corpo morno, em piloto automático, no final do dia e mais – muito mais – um corpo quente, vibrando e sempre no limite entre as palavras certas e as excessivas, entre os gestos justificáveis e os gestos impossíveis de retirar ou desfazer.
Ao regressar, envolvido num desconforto nauseante, com o incómodo de ter o que não tem, com a certeza de sentir e mentir, com a frustração de fugir e querer ficar, encontra um pequeno – pequenino – sorriso, quando começa a arrumar as suas roupas.
Roxo.
Como é possível?! Roxo.
Tinha esta dor de barriga de primeiro dia de escola, tinha um tremor nas pernas debilitante, sentia até as mãos húmidas, dos suores do nervosismo – tudo porque estava prestes a bater naquela porta, numa hora estranha, num dia assim…
Honestamente, achou que ele cederia. Achou que ele iria a casa dela e não ela à dele, achou que ele chegaria com um sorriso lindo nos lábios, um olhar de quem pede desculpa, um jeito de menino acanhado, que nunca é convidado, encolhendo os ombros e esperando que ela abrisse completamente a porta… mas não aconteceu. Durante a primeira hora, imaginou de que forma se fingiria chateada, incomodada e surpreendida antes de o deixar entrar. (Ele entraria apenas por pura educação e mera falta de alternativa.)
Com a segunda hora, começou a achar que não precisaria ser tão dura. Já na terceira hora, questionou tudo o que lera nos seus olhos durante a missão e sentiu o coração bem apertadinho e todo o ar fugir dos pulmões. Na quarta hora, decidiu que era Kensi Blye e uma Blye não se engana, raramente tem dúvidas e, se ele não resolve, ela trata do assunto.
Mas, em frente à porta dele, aparece o medo.
Medo.
Como é possível?! Medo.
O Monty precisou ir à rua e, apesar do adiantado da hora e do estranho frio que se fazia sentir, ele cedeu. Não esperava encontrá-la no regresso a casa, mas foi tão bom, tão espetacularmente bom, isso ter acontecido.
Hesitante, em frente à porta dele, não batia. Levantou a mão fechada duas ou três vezes, mas nunca bateu. Também não deu meia volta e foi embora.
Por muito grande que fosse a sua curiosidade, a sua capacidade para controlar o seu pequeno companheiro não foi suficiente. Monty pareceu condoer-se da situação de Kensi, ou então, já a adorava tanto quanto o seu mestre. Correu para ela, despertando-a dos seus pensamentos. Quando os viu, ela usou a euforia daquele adorável cachorro e deu-lhe atenção, aproveitando para procurar uma razão para estar ali. De repente, todas as que tinha ensaiado desapareceram.
Mas ele não perguntou.
Simplesmente sorriu, abriu a porta e convidou-a a entrar. (Lindo.)
Aproximou-se dela e, sem palavras, conduziu-a para o interior da sua sala. Levou-a até ao sofá, fê-la sentar e deu-lhe uma manta. Com o seu jeito bem-humorado e relaxado, brincou com ela, alegando que o Monty tinha "roubado" a manta no mercado de rua semanas antes, obrigando-o, não só a pagar bem mais por ela, como também a investir o seu charme na tarefa de acalmar a linda vendedora. O adjetivo não lhe agradou, mas viu bem como ele a olhava de soslaio, tentando ler a sua reação, por isso, fingiu não ligar. Mas logo de seguida, ele não conseguiu evitar adoçar o seu incessante discurso, explicando que o Monty só roubara a manta para ela, para que ficasse bem confortável e viesse visitá-los muitas vezes, simplesmente porque ela já o enfeitiçara.
Tudo isto era o que ela precisava e era o que ele queria dar-lhe, por ela ter cedido primeiro. Afinal, não tivesse sido o Monty a "exigir" aquela voltinha na rua e tinha ele feito a viagem até casa dela, para ficar, provavelmente, parado à sua porta.
Ele foi à cozinha e trouxe uma caixa de doces. Apresentou-lhe o «cronut». Depois, sentou-se ao seu lado esquerdo e puxou para ele parte da manta, tornando claro que não tinha outra e que teriam que partilhar.
Na ausência das palavras certas (e ainda sem conseguir explicar aquela viagem, naquela hora, até àquela porta), os pensamentos dela corriam sem calma ou vislumbre de qualquer conclusão. Na verdade, nem sabia bem o que acontecia no programa que a televisão exibia. Sabia apenas que queria estar ali, mas que razões expor para justificar essa vontade era a dúvida que a atormentava. E lutava, lutava mesmo com os seus desejos, as suas vontades, as suas razões… enfim, com a verdade. E crescia o medo, o medo de que, de repente, ele a questionasse, como ainda não havia feito. Por isso, achou que era melhor sair e esperava conseguir fazê-lo evitando todas as questões.
Moveu-se um pouco e encarou-o.
Dormia.
Aparentemente, ele aceitara o inevitável e resolvera apenas viver o que tanto queria viver. E a ele faltou-lhe apenas a coragem de a envolver nos seus braços, deixando ainda, entre eles, uma pequena distância física, naquele sofá, sob aquela manta.
Ela não repetia, por hábito, as tolices românticas que falam de borboletas no estômago, mas, naquele momento, parecia que o seu cérebro (com toda a sua razão) lhe pregava uma partida e imaginou isso mesmo – mil borboletas em completos rodopios. Sentiu-se feliz. Sentiu-se feliz e em vantagem, afinal ele dormia e ela estava desperta; afinal, ao acordar, ninguém saberia quem tinha feito o quê; afinal, na madrugada, todos os gatos e todos os atos são pardos; afinal, Justin e Melissa, na madrugada, destruíram sucessivas distâncias e as manhãs que se seguiram nunca identificaram culpados. Foi então a sua vez de exterminar aquela distância e, ao aproximar-se, o seu parceiro foi bem igual à personagem anteriormente criada, o Deeks foi o Justin, idêntico na reação. Depressa os braços dele a envolveram e rodou um pouco, virando todo o peito (e o coração) para ela, puxando-a para si. E era exatamente ali que ela queria estar – ela ou Melissa ou Tracy ou Kiki ou Fern (ali).
Se ela deu o primeiro passo, aproximando-se, não lhe foi difícil fazer todos os passos seguintes – bem mais assertivos. Voltou-se, abraçou-a e puxou-a para si. Disfarçava, pois não estava mesmo a dormir. Mas só disfarçava isso. Estava feliz – ali.
Haviam regressado a casa.
3x22 é um dos meus episódios preferidos e, às vezes, pergunto-me quais terão sido as sucessivas distâncias destruídas por Justin e Melissa… acredito que existiram algumas… ;)
