Cegueira

André Gregatti

Azul. Essa era a cor que brilhava em todas as saletas de nossa base. Quando recebemos a proposta para irmos àquele planeta, ouvíamos críticas por todo lugar em que pisássemos, mas a ansiedade pela oportunidade nos fez cegos. Agora eu via o péssimo resultado de nossa incompetência.

A cegueira, minha companheira de longa data, não tomava meus olhos, mas minha consciência. Hoje me lembro de todas as formas que minha família tentou me alertar. Eles sempre estavam lá, ao meu lado, observando cada degrau da minha derradeira subida. Subida que resultou na maior queda já vista pela humanidade.

Agora, tudo brilhava azul ou preto. As luzes da sala tomavam minha visão, me deixando tonta. Nossa missão inicial era ocupar e estimular o desenvolvimento de ecossistemas que sustentassem a vida humana, mas não sabíamos que ao chegar encontraríamos forças armadas inimigas.

A cor de minha roupa desaparecera sob o brilho gélido das luzes, o verde militar tornara-se preto e somente era possível observar em seu mar de escuridão as condecorações que eu recebera. Grande vantagem. "Comandante" era o título mais ridículo que eu já vira: muita responsabilidade, pouco reconhecimento. Aprender a seguir ordens só servira para me trazer até aqui. Autorizar a saída de meus oficiais só piorara minha situação. Agora eu estava sozinha, presa em uma base, que pensava ser segura, com poucos recursos.

Enfim, eu entendi: Encarar a realidade se tornara uma tarefa árdua. O que fazer quando precisamos tomar uma grande decisão quando nos resta três ou quatro horas de vida? A pressão me sufocava e eu estava me desesperando. Estratégias de guerra já não eram opção. Eu precisava de foco e visão e agora era minha última oportunidade de gerar um pouco de caos na organização inimiga.

Eu tinha apenas aquela oportunidade e eu já imaginava como empreender meu último ataque. Corri em direção ao depósito de suprimentos e enchi um último tanque de oxigênio. Vesti meu traje de sobrevivência e corri em direção à escotilha. Sair da segurança dos dormitórios e me arriscar nos cem metros ao ar livre para chegar ao centro de comando não era algo muito convidativo, mas estritamente necessário para meu sucesso.

Corri. E tudo o que vi, afinal, era vermelho. Vermelho sangue. Vermelho decepção. Não havia saída, eu sabia. Minhas pernas estavam imobilizadas. A queda foi apenas uma consequência de uma vida de erros. Então eu finalmente estava vendo... A rapidez da morte fora algo inesperado, mas a paz encontrada em meu último refúgio me libertara. E, quando tudo finalmente acabou, a culpa era o que me restara. A culpa por uma vida de erros esdrúxulos acompanhada pela responsabilidade de observar meu fado se repetir milhares de vezes por toda a eternidade.