CONTÉM SPOILERS DE HARRY POTTER AND THE DEATHLY HALLOWS

i. "O poder da vontade não transforma o homem. O tempo não transforma o homem. O amor transforma". (Paulo Coelho)

É uma noite clara, apesar da lua ainda encontrar-se crescente. Uma leve brisa varre a face do pequeno lago que se destaca em meio à mata, criando pequenas marolas que distorcem a imagem do astro refletida na superfície do espelho d'água.

Um homem caminha, absorto, próximo à sua margem, parando por algumas vezes para observar seu próprio reflexo: a imagem de um vulto ermo, de aparência surrada e lupina. Sua mente encontra-se dispersa, em meio a recordações recentes e dolorosas.

"Eu nunca teria acreditado nisso, o homem que me ensinou a enfrentar dementadores, um covarde!" – aquelas palavras não saíam do pensamento de Remus Lupin. Harry teria razão? Seria, de fato, o gesto de afastar-se de Tonks e do filho que ela carregava no ventre, um ato de covardia?

Ele sempre fora a coerência e a razão, desde a época dos Marotos; sempre fora o ponto de equilíbrio e um sustentáculo para os amigos; e desejara ser a garantia e um porto seguro para aquela que lhe entregou o coração.

Mas... um filho! Era uma parte de si próprio! Uma parte daquilo que sempre fora renegado pela maioria daqueles que o cercavam, uma parte de si que poderia carregar a maldição que lhe roubara o direito de levar uma vida normal.

Fugir! Abandonar a ela e ao filho que nem sequer nascera... continuar a viver à margem da vida, temido por uns, desprezado por outros, marginalizado onde quer que fosse, caminhando só durante o resto de seus dias pelo mundo, arrastando correntes feito um fantasma.

Seria o mais correto retirá-la de sua mente? Arrancá-la de sua alma? Extirpá-la de seu coração?

Se assim fosse, o melhor meio seria a distância... não só dela e de seu futuro rebento, mas de tudo e de todos.

Remus olha para a lua e sente uma vontade quase incontrolável de uivar para ela, contar-lhe sua desgraça, expor seu lamento, qual um lobo solitário; mas sente em seu íntimo que a voz de Harry, que lhe martela o pensamento desde então, é a voz da razão.

Um filho! Seria aquela criança capaz de amá-lo pelo que realmente é? Poderia enxergá-lo debaixo da pele da licantropia que o amaldiçoa? Por que não?

Se Nymphadora é capaz de aceitá-lo e amá-lo com intensidade igual ou maior do que aquela que ele mesmo sente por ela, por que não seu filho?

Apesar dessas dúvidas atormentarem sua alma, perfurarem seu coração e torturarem sua mente, a decisão já havia sido tomada, inconscientemente talvez, desde o primeiro momento em que se retirara da mansão dos Black, pois é a luz da casa dos Tonks que ele avista além do bosque: o jovem Harry lhe indicara o caminho correto a seguir.

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"A indiferença e o abandono muitas vezes causam mais danos do que a aversão direta". (Albus Dumbledore)

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