dos invernos passados na torre mais alta


Shrek © Dreamworks.


i

O sol se deitou de novo, de novo e de novo. Do alto da torre mais alta ela via a paisagem árida, e onde ela se tornava verdejante; observou várias vezes as mudanças de estação e seus efeitos no horizonte, mas nem uma vez sequer viu a poeira distante levantada por um cavalo.

ii

Ela continuou esperando. Seu corpo cresceu, tornou-se desengonçado e alguns anos depois, esguio. Exceto à noite. O que ela mais sentia falta era do som da voz da mãe.

iii

Não tinha com quem conversar. Havia gastado a escassa quantidade de papel e tinta há tempos, e o dragão não se importava. Também não queria falar com ele. Mas muitas vezes contou suas escamas. Conhecia-as de cor, como as estrelas.

iv

Às vezes cantarolava uma melodia de infância, de quando ainda era só mais uma princesa, ou falava sozinha. Sempre se espantava com a rouquidão saída de sua garganta.

v

Contava o tempo de espera. Um risco para cada dia e noite passados, agrupados de cinco em cinco. Com o passar dos anos as paredes de pedra de seu quarto ficaram completamente rabiscadas. Ninguém vinha.

vi

Certa noite ela tomou uma decisão: ninguém viria. Por que alguém viria? Príncipes encantados só existiam em contos de fadas; ela era um monstro; amaldiçoada e cansada. Ao menos seria livre. Fugiu com a cumplicidade de uma noite escura. O dragão dormia.


N/A: Essa parte do UA do filme sempre me deixa pensativo.