Eu sei que vou te amar...

- Thuringwethil!

Era a voz de Mairon, que vinha de seus aposentos. Mas dessa vez vinha cheia de notas doces, quase cantadas. Andava ele numa felicidade só! E já não ralhava com os subalternos nem nada; só ficava a remoer aquela cena que o deixara tão feliz!

A mensageira entrou e fez a reverência costumeira.

- Para que me solicita, senhor?

- Ah... para que me traga um ramo de rosas.

- Rosas...?

"O patrão nunca gostou de rosas", pensou ela. "Não gosta de plantas nem de flores! Que tem ele afinal?"

- Sim, traga. Das vermelhas.

Não ousando contrariar, ela foi em busca das tais rosas vermelhas e as trouxe. E qual não foi sua surpresa ao ver Mairon desfolhá-las todas em cima de sua cama - da cama onde muitas vezes ele se deitava com Melkor quando ele ali vinha - e então se acabar de rolar em cima das pétalas!

- Ah, Thuringwethil... como é bom amar!

Ela estranhava. Que será que Melkor havia feito para Mairon a fim de que ele estivesse assim tão apaixonado? Claro, devotado ele sempre fora; era ele o mais fiel dentre todos para o vala. Mas daquele jeito...!

Daquele jeito ela nunca o vira! Estava completamente caído, completamente dado àquele amor! Teria sido alguma poção mágica? Não! Não era necessário fazê-lo para deixar Mairon completamente caído por si, e o vala disso sabia bem. Seria alguma inovação no sexo? Pois se ambos já se deitavam juntos há tantos milênios! Que de novo haveria para fazê-lo caído daquela forma? Alguma vantagem nova? Mas que vantagem seria, se ele já era o segundo em poder, somente abaixo do próprio Melkor?

O maia nada dizia. Queria guardar egoisticamente a razão daquele enleio somente para si. Somente ele sabia! E não contaria a ninguém.

- Ele me ama...! Ele disse que me ama! - repetia de si para si.

Sim, dissera enfim! Finalmente dissera. Após tanto tempo pensando que somente teria dele o sexo e as recompensas - e que seria para si suficiente, ele não exigia mais - ele dizia que o amava. Que felicidade! Aquilo só o deixava tão bem que nada mais queria. E de repente parava de fiscalizar os criados com tanta exatidão, e de cuidar terrivelmente dos exércitos de orcs e wargs, e se abandonava àquela paixão que de repente ele soubera correspondida.

Amava-o, ele!

E rolava-se na cama, e namorava-se ao espelho, e se arrumava, e escrevia cartas infindáveis para ele, e até mesmo compunha músicas! Não era raro ouvir-lhe cantar uma nova, assim:

Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida eu vou te amar
A cada despedida eu vou te amar
Desesperadamente eu vou te amar...

E cada verso meu será
Pra te dizer
Que sei que vou te amar
Por toda a minha vida...

A mensageira-morcego via aquilo e não acreditava. Sendo ela mulher de aspectos práticos, que se entregava aos homens por prazer e não por amor - e que só não se entregara a Mairon mesmo por ele literalmente pertencer completamente a Melkor; que se Melkor os pegasse ambos na cama era morte certa aos dois; e ainda tinha aquela fidelidade extrema de Mairon ao mestre, que não o deixava olhar ou mesmo cobiçar outrem e se ela se oferecesse a ele seria pelo maia mesmo duramente castigada; aquela alma prática e fria não entendia o amor e por isso mesmo não sabia porque ele estava daquela forma.

- O senhor ficou doido! - comentava ela com Draugluin e com outros criados da casa. E parecia mesmo, mas estava tão resplandecente em sua "sandice", e os deixava enfim em paz, que nem pensavam muito sobre aquilo e aproveitavam a boa vontade do patrão.

Tão distraído estava ele, que nem havia reparado a algo diferente que havia ocorrido na fortaleza. A mensageira mesmo fora quem o atentara àquilo.

- Senhor, há dois orcs que entraram sem dizer seus números e seus nomes.

- Hun? - acordou ele de repente de um devaneio, enquanto penteava os longos cabelos dourados na frente do espelho, "para ficar bonito a ele mesmo que não me veja" - Ah, esses orcs a cada dia mais atrapalhados! Mas deixe-me ver pessoalmente o que é isto!

Sendo assim, ataviou-se de forma esplendorosa, colocou um ar cruel na face e foi até os orcs.

- Muito bem. Thuringwethil me disse que entraram sem dizer os nomes, números e tarefas desempenhadas. Pois digam!

Silêncio. Nenhum deles ousava falar. Não sabiam que o sistema de vigilância militar na ilha era assim tão avançado e minucioso.

Já se via por aí que não conheciam a Mairon, que gostava de tudo detalhado e a tudo vigiava!

- Bem. Logo se vê que não são daqui. Revelem-se!

E com sua mágica Mairon despiu os disfarces dos intrusos. Não eram orcs mas sim eldar e edain - um deles era o anterior dono da ilha, de quem Mairon a tomara dez anos antes!

- Ora! Se bem não me engano é Finrod Felagund e a sua corja! A que honra devo tal visita?

- Vai nos pagar por todo o mal que tem feito, Gorthaur. Não vai ficar barato para você!

Então Felagund, conhecedor de magia élfica, passou a cantar uma canção de poder para combater a Mairon; mas o maia, ainda mais empoderado por seu amor tão forte por Melkor, cantou outra canção; terrível, pungente e forte, de queda e domínio da Escuridão; após muito tempo embatidos assim, a canção de Felagund soçobrou diante do poder enorme do maia; e assim foi. Caiu vencido no chão, enquanto seus companheiros nada puderam fazer.

Um deles era Beren, aquele que era conhecido como o noivo de Lúthien. Mairon o olhou bem e resolveu fazer uma maldadezinha antes de mandar ao calabouço:

- Ora, se não é o rapaz que está enamorado de Lúthien! Esperem só até eu pegá-la. Melkor e eu vamos conspurcá-la da pior forma possível, e você não poderá fazer nada para impedir.

E um riso sinistro, já antevendo a profanação da donzela filha de Melian, encheu o recinto, e depois ecoou por toda a ilha; e assim todos ficaram sabendo que Mairon voltara de repente à sua face de Gorthaur, o Cruel.

To be continued

OoOoOoOoOoOoO

Super legal, né? Mairon apaixonado, aí me aparecem uns eldar e edain pra encher. Mas deixa estar, será melhor pra ele.

Sobre a música, é do Tom Jobim e do Vinícius de Moraes, mas deixa a gente ficar um pouco com a ilusão de que era do Sauron! Rsssss!

Beijos a todos e todas!