Era todo dia, e todo o dia, a mesma coisa. Ela acordava ainda com o gosto de sal na boca, o rosto marcado e os olhos ardendo. As unhas já haviam desaparecido, fazia meses que as roia incessantemente. Passava as mãos pelo cabelo embaraçado e descia até a mesa do café. Seus pais estavam ali, rindo para ela daquele jeito que a quebrava milhares, milhares, e milhares de vezes. Não percebiam a maquiagem borrada da noite anterior. Nem da anterior a anterior. Nem da que veio antes. Apenas sorriam e perguntavam a mesma coisa: "Dormiu bem, querida?" e ela sempre respondia com um sorriso fraco, daqueles que se dá quando ainda está com sono: "Muito bem." Mas ela não havia dormido por muito mais de uma hora.

Subia de novo para o quarto, onde ficava o dia inteiro acompanhada de seu livro. Era apenas um. Aquele de capa verde com letras prateadas, que diziam em meio às voltas da caligrafia fina: As Confissões de Salazar. Era novo, mas parecia velho de tanto que fora foliado por Hermione. As imagens desenhadas à mão, aquela mão grande e de juntas fortes; a escrita tão bem detalhada, aquela escrita que era só dele; e ela via seus olhos em cada página. Ela via seus olhos enquanto chorava nas folhas amareladas. Ela via seus olhos refletidos na janela. Ela via seus olhos. Seus olhos. Seus olhos.

Doía lá dentro ver aqueles olhos inexistentes. Ela se sentava na cama, abraçada com o livro, e muitas vezes com a foto. A foto que ficava atrás do livro. A foto que tinha os mesmos olhos estampados, que lhe sorriam todos os dias enquanto os observava. E mandava beijos para ela. Como ela ria com isso. Ria enquanto o observava-o despir a gravata e brincar com ela. Mas quando lembrava-se de que era apenas uma foto, chorava novamente. E novamente. E novamente. Como lhe doía.

Chegava o horário. Seis da tarde. Ela fechava o livro, que já havia terminado, e se levantava. Ia até o banheiro, despia-se, tomava banho, passava maquiagem, e colocava sua melhor lingerie. Depois ia para o quarto, colocava um pijama quente e macio. Deitava-se na cama puxando os lençóis até a altura dos seios, e esperava.

Quando davam sete horas ele chegava. Aparatava ao seu lado, e não demorava mais de dois segundos para enlaçar o braço em torno de seu pescoço e beijá-la com carinho. Logo depois ele a aconchegava em seu peito, e ela sentia o cheiro de cigarro, vodka, e um perfume caro. Seu cheiro. Seu cheiro. O cheiro dele. Só dele. Ela abria os lábios para dizer alguma coisa, mas tudo o que conseguia era voltar a beijá-lo. E aquilo a fazia bem. Aquilo era tão delicioso quanto ler as páginas que ele havia escrito.

Era assim a noite inteira. Eles se beijavam, e não diziam nada. Ele apenas sorria ao secar suas lágrimas. Mordia sua orelha, e ela não parava de chorar. Porque aquilo a lembrava de que se sentia triste. Mas ela gostava de ver seu sorriso, e o jeito que desabotoava apenas o primeiro botão de seu pijama. Apenas o primeiro.

E quando a manhã chegava, e os primeiros raios de Sol invadiam o quarto, ele desmanchava o sorriso e segurava o rosto redondo de Hermione entre as mãos. Beijava seus lábios com ternura, e dizia entre dentes:

- Eu volto amanhã. Eu sempre vou voltar.

Ela assentia. E apenas quando não havia mais traço de seus olhos brilhantes que ela dizia:

- Adeus, Draco.

Mas não havia mais ninguém para responder.