CAPÍTULO 1 - "1 DÓLAR POR SEUS PENSAMENTOS"

Trilha sonora: "WICKED GAME", Chris Isaak.

Jack já estava muito rouco de tanto gritar. Ele engoliu seco para responder a pergunta de Kate. Até quando ele pretendia esperar? Nem ele mesmo sabia.

"Até que eu recupere minha voz. Daí, grito mais um pouco".

Foi tudo o que ele conseguiu resumir em palavras. Kate estava pensativa, como que assimilando a resposta de Jack:

"Talvez, eles não possam te escutar". Ela simplificou a situação. A voz de Kate também estava ligeiramente rouca.

"Eles me escutam, sim".

Jack sabia que de alguma forma estava sendo observado. Porém, na mata, só se ouvia o fogo que queimava na frente de Jack e Kate e o som da respiração ofegante dos dois. Kate hesitou por um breve instante, mas resolveu falar de uma vez o que tinha pra dizer a Jack:

"Eu sinto muito por ter te beijado".

Kate sentiu seu rosto esquentar e tinha certeza que suas sardas avermelharam-se. Instintivamente, ela olhou para baixo, fixando seu olhar na grama entre seus pés e a fogueira, com vergonha de encarar Jack. Para que mentir pra ele, dizendo que se arrependeu de algo que ela queria há tanto tempo? Ah, Kate... agora, o Jack vai ficar ainda mais bravo com você...

Quando ouviu aquelas palavras de Kate, Jack achou, por um instante, que tinha levado um soco no estômago. Ele sabia que, uma hora ou outra, esse assunto viria à tona, mas jamais pensou que seria desta forma: com Kate se desculpando pelo beijo. Ela sente muito? Sente muito?... Eu não. Jack pensou rapidamente no que dizer e não conseguia encontrar as palavras certas; talvez, elas não existissem. Ele tinha certeza que Kate estava apenas 'jogando verde' ao dizer aquilo e, portanto, resolveu ser honesto. Eles, finalmente, estavam tendo um momento juntos, depois de tantos desencontros e já era hora de pararem com esses joguinhos. Lembrou do beijo de Kate, tão doce, tão suave e tão... urgente.

"Eu não". Jack jamais se arrependeria de beijá-la.

Encarou Kate e ela o olhou espantada; não esperava aquela resposta de Jack. Sem saber o que dizer, ela permaneceu em silêncio, fitando profundamente os olhos castanhos de Jack. Sair correndo passou pela cabeça dela, mas definitivamente não era uma opção no momento. Sem se dar conta, inclinou-se aproximando seu rosto do de Jack e percebeu que ele estava fazendo o mesmo. Os dois sentiram seus batimentos cardíacos acelerarem a medida em que se aproximavam até que finalmente seus lábios se encontraram num beijo carinhoso, terno, suave...Era parecido com o primeiro beijo que deram, mas passaram apenas alguns segundos para que este beijo superasse o primeiro. Jack trouxe suas mãos delicadamente ao rosto de Kate, acariciando seus cachos cor de chocolate com uma delas. Kate tinha suas mãos apoiadas paralelamente no peito de Jack. Após alguns minutos, eles separaram suas bocas para recuperarem o fôlego. Foram afastando seus rostos lentamente, ficando centímetros um do outro.

Nenhum dos dois sabia o que dizer. Jack estava maravilhado com a beleza de Kate e contemplava suas sardas e seus olhos verdes, que brilhavam. Kate sentiu um calor crescendo no seu corpo, ela sabia bem que sentimentos eram esses e por isso sentiu medo. Medo. Tinha que recuar.

Afastou-se abruptamente das mãos de Jack, que continuavam até aquele instante no rosto dela. Jack não pode evitar o sentimento de dor ao ver Kate se afastar. Ela falou numa voz tão baixa, que Jack teve que se esforçar para ouvir:

"Jack, eu não posso..."

"Kate, por favor. Não diga nada". Jack interrompeu. "As coisas estão tão difíceis ultimamente, por isso eu te peço que, por favor, não diga nada".

Ela apenas assentiu com a cabeça. Sentia-se tão frágil diante do olhar de Jack que não teve forças para combater seus sentimentos, seus verdadeiros sentimentos. Ao mesmo tempo, sentiu-se encorajada a lutar contra seus medos. Era tudo o que ela precisava, o olhar reconfortante de Jack era tudo naquele momento.

Ficaram em silêncio durante alguns minutos, dessa vez, um período mais longo de tempo, num silêncio confortável.

Eles se acomodaram da melhor maneira que podiam, e enquanto as chamas da fogueira iam se transformando em brasas, Kate acabou por adormecer profundamente, tinha sido um dia intenso e ela se sentia esgotada, física e emocionalmente. Quem sabe seus sonhos seriam mais amenos?

Jack, no entanto, sentia-se inquieto, era impossível conciliar o sono. Apesar de sentir que não tinham sido só os olhos de Kate que estiveram sobre ele nas ultimas horas, os Outros não haviam manifestado sua presença ainda, e isso era ao mesmo tempo tranqüilizador e terrificante: o que aconteceria se eles não aparecessem, e o pior, o que aconteceria se eles aparecessem? Ele tinha um plano, mas mesmo assim, sentia medo, por ele, por todos do acampamento, e principalmente por Kate. Nunca se perdoaria se algo de ruim acontecesse com ela.

Apesar de debater sobre essas questões, e sua preocupação ser verdadeira, ele não podia se furtar de olhar para Kate adormecida, tão perto e ao mesmo tempo tão longe, ao alcance de suas mãos, mas com o coração fechado, pelo menos para ele.

O que será que aqueles olhos já tinham visto? Que caminhos seus pés haviam percorrido, quem aqueles braços teriam envolvido em longos e ternos abraços, que canções teriam saído de seus lábios...quem aqueles lábios já teriam beijado? Eram tantas questões, e Kate era puro mistério! Ele se sentia atraído e ao mesmo tempo receoso de descobrir mais sobre ela. Sabia que ela havia amado, e que havia matado também, mas de tudo que eles já haviam falado, o que seria verdade? Por que aquele medo irracional que a fazia fugir sempre que algo parecia realmente fazer sentido?

Mas, Jack sabia que não era pressionando-a que teria as respostas que buscava. Tentara fazer isso algumas vezes e provocara apenas tristeza. Quando a vira chorando nas cavernas, tinha ficado surpreso e mortificado por ver aqueles olhos carregados de uma dor profunda. Tinha ficado sem reação, totalmente paralisado...

Nunca mais vira o aviãozinho nas mãos dela. O que será que ele significava, e por que aquela vez ela teria mentido a respeito da chave? Será que ela imaginou que ele não o daria a ela? Ele faria o que ela desejasse, contanto que ela fosse sincera.

Imerso nestes pensamentos, Jack sentiu os olhos pesados, e não conseguindo mais controlar o sono, deixou-se adormecer ao lado do fogo. Quando deu por si, a luz que se filtrava entre as folhas da floresta banhava a clareira e revelavam que mais um dia começava na ilha.

Sentou-se esfregando os olhos e virou-se para verificar se Kate estava bem: ela dormia profundamente ainda, sua respiração tranqüila escapando pelos lábios entreabertos. Ele sorriu, e voltou-se para a fogueira para desmanchá-la. Seus olhos, no entanto, registraram uma imagem estranha, até mesmo bizarra...três pares de pés descalços ladeavam a fogueira apagada. Jack sentiu sua pele arrepiar, dos pés até a nuca, e pondo-se em pé num salto, encarou os donos daqueles pés.

"Ora, ora, ora...dois pombinhos perdidos deste lado da floresta?"

Continua.