Saint Seiya é de autoria de Masami Kurumada.
Presente de amigo secreto do Panbox para Medéia! Ela gostou e eu espero que vocês também.
Boa leitura!
1.
Eu gostaria poder dizer que minha vida amorosa foi um mar de rosas até hoje. Bom, mas não foi e alguém apresente-me uma mulher que possa me dizer o contrário, pois nem as bacantes ou deusas como a bela Afrodite foram plenamente servidas nessa estranha ciranda em que nós brincamos dia após dia.
Eu tenho um nome simplório e medíocre seguindo essa mesma ordem. Chamo-me Shina e sim, é com "S" e não, o escrivão não escreveu meu nome errado. Tenho dezessete anos seguidos de lutas, brigas e tudo aquilo que a sociedade não quer para uma mulher. NÃO sou delicada, NÃO sou simpática e NÃO, eu também NÃO sou bonita.
Sinceramente, eu não tenho muita certeza se é aqui que eu deveria estar, mas não me sobra muitas alternativas. Enfim, Marin me aconselhou a fazer análise e quando se tem uma amiga ruiva, bonita e bem sucedida em que tudo dá certo...
- Sinto uma pontada de inveja da sua parte.
- Não é inveja! Chega a ser até admiração.
- Inveja não é necessariamente uma coisa ruim, aceite como uma forma promissora de conformismo para aliviar suas tensões femininas.
- O que você sabe de "tensões femininas", cara?
- Nada. Eu só li a respeito e é a única coisa que nós, pobres homens, podemos fazer para suportar vocês.
- Suportar?
- Acha que é gentil ser acuado sobre tudo o que se faz?
- Vocês reclamam das mulheres, mas em geral apenas uma mulher que já foi bastante machucada por outros homens age dessa forma.
- Aí está. Nós sabemos separar e vocês não. Enfim, você é que faz análise e não eu.
Eu pago cinqüenta euros para ver esse babaca rir de mim e fingir que pode me ajudar, mas ele não pode. Ninguém pode e quero me lembrar porque estou aqui encarando esse homem e porque escolhi UM HOMEM para resolver um problema meu: UMA MULHER. No fundo queria estar bebendo com uma amiga e falando mal deles, de todos eles, e não venho mais nesse lixo de consultório. Sequer posso ser franca sobre a minha vida pessoal contando os fatos como realmente são.
Eu era - sou, sei lá - uma guerreira de Athena, a deusa da sabedoria, que luta pelo bem estar na terra e que no momento está encarnada em uma menina muito rica de nome Saori Kido. Essa garota tem a atenção de mais de oitenta e oito guerreiros dispostos a tudo para defender seus interesses, além de um mundo empresarial imenso que a conhece, respeita e teme suas decisões que influenciam diretamente nas finanças de metade do velho mundo. Como se não bastasse tem um rosto delicado, como o de uma boneca, mãos sedosas - mãos que nunca tiveram que esmurrar uma parede de concreto ou tijolo -, seu corpo é escultural. Apesar de tudo eu nunca ambicionei nada disso, mas ela roubou de mim a única coisa valiosa que eu tinha: a minha ilusão.
Tem três coisas que uma mulher rejeitada e apaixonada teme: que ele vá embora;
que ele se apaixone por outra mulher; e não conseguir esquecê-lo.
Bem, eu não escapei de nenhuma dessas três provações malditas. Enquanto ele estava sozinho tudo bem, alimenta-se todo aquele sentimento em silêncio e tranquilamente sabendo que o homem a quem você ama também está só.
Mas...
O que você faz quando ele...
Se apaixona loucamente... por outra pessoa.
A pessoa a quem você deve proteger.
Depois da batalha contra Hades em que perdemos considerável parte de nosso exército e sofremos terríveis provações o santuário praticamente se dissolveu e apenas alguns poucos guerreiros restaram. Como a situação aparentemente se "acalmou" e de um pacto muito mau explicado entre Athena e outros deuses fomos submetidos a uma realidade estranha e absolutamente terrível: a vida normal.
Tirar a máscara foi como um tratamento de choque; eu não estava preparada para fazer aquilo, tão pouco sentir o vento no meu rosto após cinco anos sem sequer saber o que era sentir
Logo após esse dia eu corri feito uma doida na direção do homem que eu amava, queria mostrar pra ele mais uma vez como o meu rosto era delicado, que Shina de Cobra era tão mulher quanto qualquer uma, não era nenhum homem com seios e que a voz autoritária na verdade pertencia a uma pessoa com sentimentos... tamanha minha decepção ao ver nos braços de quem ele estava.
Bem, depois de ser tão magoada eu fui a luta e conclui que a vida estava a minha espera. Gostaria de poder dizer que cai em altas noitadas com os amigos e bebedeiras intermináveis, que passei na mão de vários outros homens para poder me sentir bem comigo mesma de algum modo - se é que isso é possível -, mas meu amor próprio falou mais alto (ou será que foram minhas pernas que não acharam forças para me levar até lá?) e eu apenas me tranquei um fim de semana inteiro dentro do meu quarto.
Quando acordei na segunda-feira de manhã estava pronta para me deixar morrer em combate, mas não para encarar Seiya e Saori oficialmente juntos, como prometiam fofocas de anúncios matrimoniais dos últimos dias.
Sai para fora da minha cabana que eu dividi com Cássius por cerca de cinco anos de forma turbulenta, porém saudável e construtiva para ambos. Sinto saudade de meu discípulo e amigo apesar de ter sido tão ruim e rigorosa para o mesmo.
Sinto falta de um homem disposto a morrer por mim...
Shina andou solitária embaixo dos primeiros raios de sol fortes daquele dia quente e seus olhos se estreitaram com os radiantes feixes luminosos. Apesar de devidamente composta e pronta para começar um treinamento ela não tinha pressa alguma aquela manhã. Iria até Athena para conversar a respeito de algo muito importante e que de certo modo era até um pouco humilhante para se pedir considerando seu orgulho. Contudo, não se abateu e subiu decidida as - agora vazias - casas do zodíaco.
Conseguiu entrar sem muita dificuldade, mas foi com surpresa que encontrou dois cavaleiros dividindo poso sobre o mesmo teto da deusa e sem o menor pudor.
- O que faz aqui tão cedo?
- Eu é que pergunto.
- Eu dormi aqui, oras.
Por um momento toda a saliva sumiu de sua boca e seu corpo se contraiu todo e de forma involuntária.
- Calma, não se preocupe. Eu também estive aqui e, por favor Seiya, evite maus entendidos.
O belo homem loiro de olhos azuis serenos saiu da escuridão de um canto escuro e foi até o centro iluminado do salão para poder conversar com os outros dois habitantes do lugar. Seu olhar encontrou o dela, mas esta não importou-se, afinal, era apenas o Hyoga de sempre. Parou para encarar Seiya que jazia a sua frente.
Ele estava descalço, com os cabelos meio desgrenhados indicando que acabara de acordar, mas apesar dos bocejos involuntários e da aparência apática parecia estar começando a se recuperar e pronto para iniciar um novo dia.
- Quero um audiência com Athena, urgente.
- Impossível! Saori está dormindo agora.
Aquela voz de seda a se referir a deusa fez com que seu ódio pulasse dentro de si como um bicho enjaulado louco para sair e aliviar-se. Não suportava ver aquela ternura presente e nem aquela tentativa patética de proteção.
- Pois, vá acordá-la! - disse no tom mais manso que conseguiu.
- Shina, você não pode voltar mais tarde? - perguntou Seiya - Que saco! O dia mal começou e você já está me arranjando confusão?
- EU ESTOU ARRANJANDO CONFUSÃO? EU NÃO ARRANJAVA QUANDO DEDIQUEI PAR-PAR-TE DA MINHA VIDA A E-SS-SSE SANTUÁRIO, NÃO É? - seu ódio era tão grande que começava a gaguejar e foi com certa estranheza que viu a deusa sair do enorme portal ao fundo para ver o que estava acontecendo.
- Bom dia - ela disse arrastando seus chinelos pequenos e um fino roupão de seda sobre a camisola que vestia - Tão cedo e já tão animados.
Shina parou para mirá-la em sua delicadeza sem par, seu rosto de menina tão gentil e perfeito quando a de uma pintura renascentista e sentiu seu ego encolher mais - se é que isso é possível -, pois aquela beleza angelical e de cílios longos estava longe de ser a dela.
- Eu não queria que ela te acordasse - disse Seiya atencioso e parecendo constrangido por não ter conseguido zelar pelo sono da deusa, o que só fez o rancor de Shina aumentar, mas ela não fez nada em resposta.
- Tudo bem, imagino que seja importante para que tenha vindo tão cedo, Shina.
- Sim. É!
- Então diga.
Por um momento pareceu que toda sua convicção a despeito de seu pedido tinha se extinguido e seu problema, perto da realidade do santuário e rotinas de treinamento, tornara-se por certo ângulo, torpe e medíocre.
- Vim abdicar de minhas férias atrasadas.
- E precisa fazer esse barulho todo? - perguntou Seiya atordoado, porém Saori o repreendeu com um olhar.
- Há algum motivo especial? - perguntou terna.
- Minha saúde mental é um motivo mais do que razoável - retrucou mordaz.
- Com certeza - sorriu - Entenda, Shina, não posso permitir que simplesmente se vá. Apesar de vocês estarem gozando de razoável liberdade e de suas vidas estarem ficando mais normais. Aonde pretende ir?
Parou de súbito.
Para onde iria?
Sabia que queria ir para longe. Bem longe. Mas, especificamente onde era um mistério. E com o orgulho mais ferido do que estava antes ela respondeu em um sussurro:
- Não sei.
- Não sabe? Bem, eu lamento Shina, mas se ao menos pudesse permitir que você fosse em uma missão ou com alguém para você monitorar.
- Saori, posso me meter? - perguntou o loiro com sua voz calma e grossa.
- Claro.
- Não sei se lembra, mas estarei indo para a Sibéria hoje para visitar minha terra natal e ver como estão os aldeões do lugar em que cresci. Seria útil e mais agradável não viajar sozinho essa noite.
- O que você está insinuando? - perguntou Shina atenta.
- Gostaria de me fazer companhia?
- A Sibéria é fria.
- Não será problema para uma amazona como você.
- Eu acho uma ótima idéia. O que pensa, Seiya?
- Seria bem legal para a Shina que acha que o mundo é do tamanho de uma batata. Hahaha...
A alegação a fez corar e cada vez mais irritada com o rumo da conversa disse:
- Aceito! Vai ser um prazer ficar um tempo longe de você, Seiya Ogawara! - e deu meia volta pronta para ir embora - Estarei pronta ao final da tarde!
- Certamente - disse Hyoga prestativo - Não se atrase.
- Boa viagem, Shina! - disse Saori que não obteve uma resposta da amazona.
- O que será que deu nela? - perguntou Seiya coçando a cabeça enquanto enlaçava a deusa pela cintura.
- Eu tenho um palpite... - disse Hyoga vendo o casal se beijar de relance enquanto deixava o lugar rapidamente.
Continua...
