Career Cato

Prólogo

Ele não podia acreditar como as coisas tinham mudado em tão pouco tempo. Faziam o quê, duas semanas? Ele nem sabia mais. O que importava era que estava à beira da morte e não havia nada que pudesse fazer para impedir isso.

O pior de tudo é que estava acontecendo exatamente o que ele mais temia, da pior maneira possível.

Ele não conseguia deixar de pensar, enquanto finalmente deixava as lágrimas escorrerem por seu rosto sujo de terra e sangue, como fora fútil até aquele momento. Como nunca tivera a cabeça no lugar e como suas prioridades estavam trocadas. Fora tão burro em acreditar que seu destino era vencer, que a única coisa em que era bom era matar. Talvez se tivesse dedicado seu tempo a alguma outra coisa, se tivesse colocado sua cabeça para funcionar ao invés de só trabalhar os músculos, não estaria nessa situação agora.

Soltou um grito ao sentir sua carne ser rasgada mais uma vez. Não sabia mais qual parte de seu corpo estava sendo arrancada dessa vez, nem sentia mais a dor. O grito era de frustração.

Droga, não era para ser assim. Ele era mais forte, mais bem treinado, muito mais qualificado para vencer do que seus oponentes, todos os 23 tributos com quem ele tivera que lutar. Matara sete adversários, mais do que qualquer outro na história, e, ainda assim, não fora o suficiente.

Ele ficara entre os três últimos, e droga, um dos seus dois oponentes estava moribundo até um dia atrás. A garota era quem o preocupara desde o começo, com toda aquela atenção que chamava para si, com toda aquela historinha ridícula de amantes desafortunados. Ela parecia só uma menina boba, assim como o lado masculino do casal – ele se provara um bobo mesmo, e fraco -, mas tinha se mostrado uma caçadora habilidosa. E quem teria adivinhado? Uma garota vinda do distrito mais pobre do país, uma morta de fome. Mas era ela quem sairia dali como vitoriosa, de mãos dadas com o namorado, já que, pela primeira vez na história, dois vitoriosos foram permitidos.

Esse lugar deveria ser dele e de sua companheira de distrito, sua melhor amiga de infância, por quem ele começava a sentir um carinho muito maior do que se imaginava capaz. Mas ela se fora, morrera por um descuido dele. Ele não deveria ter deixado que ela ficasse sozinha. Ela podia ser uma guerreira incrível e a melhor atiradora de facas do universo, mas ainda assim ela era tão pequena e de aparência frágil... Se ele tivesse estado lá ele a teria salvado, e agora eles podiam estar juntos a matar seus adversários e aquelas bestas que o causavam tanta agonia. Via como se estivesse acontecendo em na frente, a última vez que a vira, sorrindo segura de um futuro em que eles poderiam ficar juntos sem precisar mais lutar. Essa realidade, porém, não existiria.

Droga.

Ele estava para morrer, na frente do país todo, do seu Distrito, que ele se esforçara tanto para impressionar e trazer a glória que eles tanto prezavam; do seu pai, sempre tão severo, como ele queria esfregar na cara do pai que era sim bom o suficiente para vencer; da sua mãe, a única pessoa que o amava de verdade, e a única que ele talvez amasse.

Lembrou-se da sua primeira Colheita, como ele ficara furioso por não ter sido escolhido. Como ficara furioso nos cinco anos seguintes por não ter sido escolhido. Todos sempre pareceram tão impressionados com ele, então por que nunca o escolhiam? Talvez eles soubessem que ele fracassaria. Talvez soubessem que ele era arrogante demais, confiante demais.

Não sentia humilhação, na verdade, só desespero. Desespero para que aquilo acabasse logo, para que seu sofrimento, que, ele agora via, sempre estivera presente, tivesse um fim misericordioso.

Mas claro que isso não aconteceria. Não, ele era um assassino cruel, um louco, um matador impiedoso, e merecia o sofrimento pelo qual estava passando. E mesmo se não merecesse, o teria. Afinal, a audiência precisava de um bom show, e aquilo... aquilo devia estar levando o público à loucura.