Foram quatro anos que se passaram sem que ela nem percebesse. Quatro anos desde que ela tirou seus pés de Ohio e foi seguir seus sonhos, foi ser quem ela sempre quis, sem se deixar olhar pra trás uma vez que fosse. Ela não acreditava que estava a semanas de finalmente se formar, isso parecia surreal! Depois de tanto testes, provas, exames práticos e teóricos, ela finalmente poderia colocar tudo aquilo em prática, ela teria chances reais de ser uma estrela agora reconhecida, coisa que nunca deixou de ser.

Seu primeiro ano foi um verdadeiro impasse no desapego emocional, ela teve que lidar com Finn, com seu próprio estilo, suas inseguranças, com Cassandra July a odiosa professora de dança e com interesses amorosos que não valiam de nada. Os três anos que se seguiram foram anos de crescimento e muito descobrimento sobre si mesma, sobre a vida, sobre até sua querida cidade, sobre continuar ganhando, mas muito mais sobre perder.

Tudo sempre se resumiu basicamente a ela ser a melhor no coral da escola, e em NYADA as coisas não era exatamente assim. Rachel, que sempre foi um talento em pessoa tinha concorrentes a sua altura, e que na maioria das vezes dançava excelentemente. Isso a abateu durante algum tempo, mas nada que fosse grande o suficiente para parar aquela menina que saiu de casa com o sonho maior do que ela mesma.

Desde que finalizou os módulos básicos de Interpretação e Música, no quarto semestre, ela veio buscando fazer audições (mesmo que para pequenas peças) e procurando expor seu trabalho... Isso a levou a grandes frustrações, e também a grandes oportunidades. Ela nunca se imaginou começando a carreira em uma peça de teatro onde ela interpretaria a "Chapeuzinho Vermelho" para crianças. Mesmo hoje, a qual ela participa de um grande grupo de teatro musical na cidade de Nova York. Não é seu sonho ainda, mas continua botando cada vez mais fé em si mesma de que logo mais o papel ideal será seu.

Isso não deu muito tempo pra que Rachel realmente pensasse em ter algo sério com alguém depois que terminou com Finn. Depois de todo o drama, depois das recaídas, ela teve de finalmente seguir em frente, e aprendeu mais ainda com isso. Foi sem querer se entregando ao Brody, que se no começo pareceu ser muito amigável, mas no final terminou como a maioria dos caras da faculdade: na cama com ela, e isso bastava para ele. Isso também bastou para ela, depois de ter consciência que não pode ter nele nenhum apoio emocional.

Com a chegada de Santana no começo do segundo ano ela e Kurt passaram a se divertir mais. A latina, que já gosta de uma folia naturalmente, não pode deixá-los continuar naquela situação monótona e com cara de Ohio que eles vinham vivendo. A primeira vez que a Rachel pisou numa boate (que era com um público alternativo, para que pudesse agradar aos três, segundo Santana) ela se sentiu intimidada. Não que ela tivesse algum problema com isso, muito longe disso, na verdade, ela só não soube lidar com a situação de estar fora de casa àquela hora, de se divertir e crescer um pouco, mas com o tempo ela foi aprendendo a gostar, a se divertir e a interagir com as pessoas ali.

Na quarta ou quinta vez que eles resolveram sair pra se divertir tinha sido um péssimo dia para Rachel, ela tinha tido aula de artes dramáticas onde o professor tinha repetido para ela pela terceira vez na última semana o quão sexy ela não era na hora de interpretar, que ela tinha que se abrir mais e ser um tanto quanto menos dramática sempre e em todas as cenas, ele também disse como ela estava despreparada para isso, que duas das suas colegas de classe, por exemplo, tinham acabado de se beijar porque isso fazia parte da cena delas, que inclusive fazia parte da segunda parte do processo, e Rachel não tinha conseguido chamar uma garota pra sair em sua cena, pela-terceira-vez-seguida! Ela nem tinha saído da etapa inicial! Rachel estava realmente frustrada! Ela tinha falhado completamente nessa mesma classe e não sabia como faria isso funcionar.

Depois de dançar muito, alguns drinks e um pouco de cansaço, se deixou caminhar até o bar. Lembrando-se da recente frustração, como se finalmente tivesse percebido que aquilo não tinha se resolvido ainda. Sem pensar duas vezes ela se deixou cair num banco ao lado do balcão e olhando fixamente o cardápio, deixou seus braços apoiados ali, não sabendo nem remotamente como ela resolveria esse problema. Como ela seria desinibida o suficiente pra poder levar toda e qualquer cena adiante, tanto nas aulas quanto na sua vida? Pediu algo que nunca tinha bebido, um drink que continha vodca com alguns ingredientes que a agradavam e isso era tudo o que ela queria.

Santana nunca havia visto Rachel tão frustrada diante do bar, na verdade nunca a tinha visto cogitar realmente se sentar ali e pedir algo para beber. Rachel sempre procurava conversar, rir, dançar e tomar uns drinks ás vezes pra relaxar, e realmente não combinava com ela essa posição.

– Não acredito que a Senhorita certinha-não-posso-arriscar-minha-voz vai beber algo...! - brincou Santana

Rachel apenas bufou, e soltou de uma vez qual era o problema dela, num monólogo sem pausas e nem cortes.

– Meu professor de Artes Dramáticas fez questão de dizer que eu não sou sexy, que preciso me abrir, que preciso trabalhar meu lado artístico depois de eu não conseguir concluir a mesma tarefa pela terceira vez... Sabe, San?! Eu não tive nenhum problema com a absorção da cena! O problema foi que eu não conseguir desenvolver. Era sobre chamar uma garota pra sair...

Santana a olhou e com um certo tom de brincadeira, respondeu:

– Vai lá, tente comigo, Berry!

Rachel entendeu a brincadeira da amiga, e se deixou levar pela necessidade que a situação requeria.

– Er... O-oi! Será que eu posso sentar aqui do seu lado?

– Hm... Porque eu deveria?

– P-porque você parece uma pessoa interessante e... AH, NÃO, SANTANA! Tá vendo? Eu não consigo fazer isso!

Sua bebida chegou, ela virou o copo mais frustrada do que nunca, sem pensar que aquilo queimaria sua garganta ao descer. E foi exatamente isso o que aconteceu, fazendo-a estremecer e dando motivo pra Santana soltar um risinho.

– Berry, relaxa! Isso é realmente importante pra você, não é? Então tente de verdade! Estamos numa das melhores noites gay dessa cidade e você pode tentar, se quiser.

Não é que Rachel nunca tivesse pensado em ficar com uma garota, ou que tivesse algum problema com isso... O problema na verdade era com ela mesma. Depois de tantos anos frustrantes no ensino médio, onde todos os caras que ficaram com ela foram por interesse, ou por comodismo, as coisas eram bem complicadas. Tendo sido criada por dois pais ela sempre levou isso em consideração, que no fundo todos somos apenas humanos, e nunca se viu como alguém que pudesse ter algum tipo de problema com situações diferentes de relacionamento. Mas mesmo assim era estranho pra ela.

– Ok, San. Eu vou tentar, mas antes preciso beber algo... Algo mais forte do que o que eu acabei de beber. - diz olhando firmemente nos olhos de Santana

Santana não cogita muito, não sabe onde a menina Berry quer chegar, mas acha que está na hora de alguém além dela mesma e de Kurt terem alguma diversão.

Depois de alguns minutos analisando Rachel se vê mais em dúvida ainda. Se ela cantar a garota elas terão que ficar? E se ela não for correspondida? Apesar de saber que ela não pode deixar nada disso a abalar ela continua temendo, mas caminha em direção de uma loira que deve ter mais ou menos sua idade, e só caminha com essa certeza porque já viu essa mesma beijando uma morena há alguns dias atrás, e isso torna suas possibilidades de rejeição um pouco menores... Rejeição é algo que ela não gostaria de lidar essa noite, não mais uma.

– Oi... - Ela diz se aproximando da loira, mais intimamente do que ela faria normalmente, mas menos do que ela poderia ter feito.

– Oi... - Ela recebe em resposta. Então é isso? Ela não sabe como continuar a bosta da conversa e é por isso que ela até talvez seja reprovada na matéria de Artes Dramáticas. Não. Ela não seria reprovada.

– Você quer dançar um pouco?... Beber alguma coisa ou só conversar um pouco... Er... Comigo? - Ela sente-se muito atrapalhada, desajeitada, mas seu sorriso continua impecável, e agora ela sente como se a loira estivesse... Levando em consideração aquilo!

– Me desculpa... Eu adoraria, mas eu não sei qual é seu nome ainda... E...

– Não seja por isso, meu nome é Rachel, e você pode me dizer o seu enquanto conversamos, se quiser...

– Olha, Rachel, meu nome é Liza... E eu adoraria conversar com você, mas eu vim acompanhada de uns amigos e eles querem ir... Então, você quer meu telefone? - Liza sorri pra ela.

Quando Rachel assentiu e anotou o número da garota em seu celular, ela sem perceber, deu um passo pra que toda a sua vida mudasse, ou melhor, se revelasse diante de seus próprios olhos.

– Então é isso, Rachel... Eu preciso mesmo ir, mas adoraria que me ligasse. - Rachel passa as mãos no cabelo meio sem jeito, mas querendo mostrar confiança, dá um beijo no canto dos lábios de Liza sem nenhum pudor.

Liza vai embora e Rachel fica pensando em como aquilo foi natural para ela, apesar da pressão, e acabou tendo a certeza de que ela não será mais reprovada em matéria alguma, além de ter ganhado uma experiência e um número de telefone. Aquilo foi muito natural, e estar no comando sempre foi seu forte. Santana assiste a cena de longe, e só consegue pensar em como ela nunca tinha desconfiado a paqueradora que sua colega era.

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Agora ela está esperando seu convite para o XXV Festival de Artes Gerais em NY chegar e pelo o que ela sabe isso deveria ser entregue essa semana no apartamento que ela divide com Kurt e com Santana. Ela é a única da sua turma que foi selecionada para a seletiva de atores que participarão da peça que ocorrerá durante os três dias de Festival. É uma oportunidade muito boa e única! Ela precisa mais que tudo estar nesse elenco, seu primeiro grande evento pode ser agora, e ela não quer mais esperar por isso.

Santana havia saído mais cedo do que o habitual, a latina estava em época de exames e não gostava de brincar quando se tratava de algo importante. Apesar da distância emocional das duas no começo da estadia de Santana em Nova York, hoje elas eram grandes amigas. Todo o apoio que Rachel precisou, ela encontrou não só em Kurt, mas em Santana também. Ela sabia que alguma coisa estava preocupando sua amiga, tendo certeza disso na noite passada quando elas foram assistir a um filme de terror e Santana não se deu o trabalho de fazer uma piadinha sequer... Ela tinha certeza de que a causa era nada menos do que o contrato que um dos estudantes de música iria conseguir com uma grande gravadora de L.A., ela também tinha certeza de que esse contrato seria da sua amiga, mas existem coisas que não devem ser rebatidas com Santana, ela é tão teimosa que só ela mesma vendo pra acreditar.

Kurt está tão tenso quanto as meninas por essa conclusão de curso delas, mas não por ele próprio... Ele pode até estar tão nervoso quanto elas, mas por uma exigência do curso de moda, que é o que ele faz, a graduação dele se estende até o final de agosto, fazendo-o ter algum tempo a mais para finalizar seus próprios trabalhos, ao mesmo tempo em que leva todo o seu verão, seu tempo (teoricamente) de férias. Mas ele só consegue pensar na oportunidade de dessa vez, ter um de seus modelos nas passarelas do maior desfile promovido pelas universidades dos Estados Unidos pode ser dele. E no pior dos casos ele terá que apenas se preocupar com o desfile interno da faculdade... Não que isso vá preocupá-lo, sendo que levou Rachel como sua musa (nada) inspiradora, e hoje ela está se vestindo super bem, recebendo elogios não só pela sua beleza, mas pelas roupas que veste. E isso pra ele é melhor do que qualquer coisa, ser reconhecido, nem que seja pelos colegas de faculdade de Rachel, como um cara que entende do que faz.

Rachel parou de divagar levemente e checou embaixo da porta pela terceira vez no dia e sentiu sua respiração parar por alguns segundos.