Disclaimer: os personagens de Naruto não me pertencem.

Aviso: os personagens abaixo podem estar um pouco OOC. A fanfic que segue é um UA.


- Para Ikete -


Meu Candidato a Presidente


O problema todo começou com Lee. Porque ele era um fanático por esoterismo e isso só podia culminar em desastre.

Todas as manhãs, antes que Neji pudesse ir para o trabalho, Lee aparecia para sua sessão matinal de alongamento, logo após o cooper, e, enquanto o atualizava com fofocas que Neji definitivamente não estava interessado em saber, obrigava-o a tomar um enorme copo de batida. Foi estabelecida uma rotina sagrada.

Às vezes Neji se aborrecia com aquela invasão em sua vida privada. Era um homem fechado e não tinha o hábito de dividir suas insatisfações e temores com qualquer pessoa.

Sakura, a psicóloga que namorava seu autodeclarado melhor amigo, costumava dizer que aquele comportamento antissocial se devia ao tratamento formal que recebera dos pais na infância, tornando-o uma pessoa difícil de romper barreiras. Mas ele não podia apenas concordar menos com ela, uma vez que fora criado pelo tio (seu pai era um importante arqueólogo e vivia na África há cerca de vinte e um anos, não que ele estivesse contando), e, se havia um problema que não existia na casa dos Hyuuga, era sobre limites. Todos estavam sempre interessados demais em saber sobre sua ele. Principalmente sobre seus relacionamentos.

Com o passar do tempo, Neji aprendera a lidar com Rock Lee, o personal trainer místico, e com Haruno Sakura, a nerd ninfomaníaca – fora inevitável denominá-los por apelidos ridículos, uma vez que ambos o chamavam de engomadinho crédulo. Os dois podiam ser as criaturas mais insuportáveis do planeta quando se uniam. Mas "aprender a líder com eles" não queria necessariamente dizer que os amava.

Principalmente quando eles decidiam levar uma cartomante ambulante ao seu apartamento para uma consulta relâmpago.

- Eu quero que você pegue esta doida varrida e a enfie na bunda, Lee – Neji quis gritar logo que conseguiu arrastar o outro para a cozinha.

- Não tenho um rabo tão flexível – Lee reiterou, encolhendo os ombros enquanto se virava e abria a porta do armário aéreo, pegando a caixa de sachês de hortelã. – E você precisa parar de ser tão cético e acreditar na mágica da vida, meu amigo – continuou, passando a revirar a cozinha atrás da chaleira. – Merda! Onde está a chaleira?

- Sou pago para ser crédulo. É assim que os engenheiros são – reiterou Neji, o cenho franzido. – Se eu acreditasse na mágica da vida, não precisaria fazer tantos cálculos para ver se o terreno vai ceder e o prédio vai cair – seguiu pela cozinha, agarrando o utensílio requisitado. – Agora, porcaria, você e sua maldita namorada poderiam cuidar dos próprios problemas e me deixar terminar meu maldito projeto?

- Depois do chá? – indagou Lee, distraído, enquanto abria a torneira.

- Depois do chá – respondeu o outro, enfim, com um suspiro profundo, sabendo que continuar a lutar seria inútil.

Cerca de quase duas horas depois, quando a profetisa Ino se foi, as enormes madeixas loiras sacudindo atrás das costas, deixou na sala um forte cheiro de incenso, um mapa astral e o bolso de Neji com cinqüenta dólares a menos.

- De acordo com Ino, e você sabe como a Ino é confiável – Sakura, que estava jogada sobre o sofá, ajeitou os enormes óculos sobre o nariz. – porque foi ela quem disse que eu e Lee nos encontraríamos, e nós nos encontramos, é claro, naquela maldita prova do vestido de casamento da noiva do meu irmão, você vai encontrar sua cara metade muito em breve. E em circunstâncias incomuns, portanto não pense que ela será uma dessas workaholic com quem você se socializa, Hyuuga.

- Considerando que ultimamente as únicas mulheres com que eu tenho me socializado são Tayuya e Temari, que são um casal, eu não acho que você deva se preocupar com minhas colegas de trabalho, ratazana – reiterou Neji, esfregando a testa com aborrecimento. Olhou para o relógio. – São dez da noite! Vocês estão de brincadeira. Me fizeram perder tempo e dinheiro com essa impostora.

- Nãnãnã, queridinho – Sakura se pôs de pé imediatamente, colocando uma das mãos na cintura. – Só estamos preocupados com o fato de você não ter encontrado sua cara metade ainda.

- Jesus – o Hyuuga revirou os olhos. – Eu só tenho vinte e seis anos. E recém consegui uma promoção. A última coisa que me importa é qualquer porcaria que envolva cara metade.

- Mas estamos quase em 2012! – Lee, que até o momento se encontrava entretido com os 215 canais da TV a cabo do amigo, ergueu os orbes negros para fitá-lo, um ar de ultraje no rosto, como se recém houvesse escutado uma sentença profana. – O calendário dos Maias acaba, lembra? Todos nós vamos morrer! Você quer morrer sem ter tido um sexo de qualidade?

Ao seu lado, Sakura concordou freneticamente com a cabeça, soltando ruídos ininteligíveis.

Os cabelos rosa dela estavam presos num coque frouxo, que combinava completamente com seu visual retrô. A fisionomia harmônica, os traços delicados, a boca rosada e os olhos cor de jade escondidos por detrás dos óculos, porém, quebravam o choque provocado pelo vestuário. Era uma sorte que ela houvesse ganhado bons genes – Neji sempre pensava naquilo quando a via fazer combinações que nem ele, que era um obtuso completo no quisito moda, faria.

- O tigrão está certo – ela disse, a voz sonora ecoando por todo o apartamento. – Como você pode ser tão negligente com seu amor eterno? Sexo com amor é um treco doido, Neji, de dar frio na barriga.

- Eu chamaria isso de febre – reiterou Neji, cético.

Lee deu um tapa no apoio de braço do sofá, desligando o televisor.

- Você nos agradecerá quando tiver orgasmos múltiplos! – exclamou, levantando-se. – Vamos, coelhinha. Vamos lá pra casa assistir a um filminho. Deixei o torrent baixando e a essa hora o download já teve ter terminado – e passou a caminhar na direção da porta, estendendo a mão para Sakura, que imediatamente aceitou.

- Nós nos vemos logo, logo, delícia – a Haruno piscou e ambos deixaram o apartamento sem olhar para trás.

Neji suspirou logo que se viu só. Fora melhor deixar Lee pensando que homens poderiam ter orgasmos múltiplos do que interrompê-lo e precisar ouvir a sua defesa de tese, concluiu, seguindo na direção do escritório, onde seu trabalho o esperava.

Felizmente, ele só foi ver os amigos quase uma semana depois, na festa de noivado de Kakashi, tio de Sakura.

O coquetel começou pontualmente às 21h, mas Ebisu, seu chefe, o manteve preso até perto das oito e meia e o Hyuuga sequer teve tempo de trocar de roupa antes de enfrentar o tráfego terrível daquela linda noite de verão. Quando chegou ao local dos festejos, era quase dez e a linda noite de verão se convertera numa tormenta de última hora.

- Nejizinho – Anko, a noiva, veio imediatamente recepcioná-lo. – Você está todo molhado, garotão.

- A chuva tem esse efeito, geralmente – resmungou ele, aceitando a toalha de rosto que lhe fora oferecida, tentando seu melhor para se enxugar. – A propósito, parabéns – felicitou, soando um pouco seco. – Tenho toda a certeza de que Kakashi vai mantê-la muito ocupada pelos próximos 50 anos.

- Não faça essa careta como se eu estivesse prestes a cometer um pecado – ela sussurrou, certificando-se de que ninguém os ouviria. – Que eu saiba, tesão pode levar ao casamento e ninguém ainda foi processado por isso – zombou, começando a rir. Logo, estendeu o braço e agarrou a mão de Neji, puxando-o na direção dos demais convidados, que estavam entretidos com diálogos em pequenos grupos. – E agora você deve sorrir. Todos precisam conhecer meu ex-namorado.

- Nós nunca fomos namorados – corrigiu Neji, a boca torcida em desagrado.

- Eu sei, mas não seria tão emocionante se eu dissesse que éramos vizinhos, não acha? – Anko soltou uma risada escandalosa, arrumando os seios no generoso decote.

Os convidados começaram a ir embora perto da uma da manhã. Por consideração, o moreno esperou algum tempo antes de ir para casa. No círculo social em que se inseria – ou em que Lee, Anko ou Sakura o inseriam – estava o irmão da Haruno, chamado Naruto, sua esposa delicada e irritante, chamada Hinata, e a cartomante Ino – "Ino só, por favor, docinho".

Neji não tinha idéia de que tipo de motivação levava as pessoas a lhe atribuírem apelidos ridículos e íntimos. Embora se esforçasse para apresentar uma pose dura e impassível, todas as mulheres do planeta pareciam possuir cerca propensão a esquecer seu nome e afofá-lo enquanto murmuravam coisas como "docinho", "garotão" e "delícia".

- Não se esqueça, Sakurinha, de pedir para deixar alguma coisa quando for fazer uma depilação brasileira – Ino dizia, um ar profético. – Ou você parecerá uma criança de cinco anos.

- Achei que você só visse o futuro – comentou Neji, arqueando uma sobrancelha.

- Eu não vejo o futuro, meu caro – a loira respondeu. – Eu apenas capturo as pistas deixadas por ele com a ajuda dos meus instrumentos – esclareceu, não apenas para ele como também para todos à sua volta, de modo que Naruto soltou um ruído de concordância, balançando a cabeça.

- Genial! – exclamou pela terceira vez na conversa, erguendo o copo de tequila (Neji já começara a pensar que aquela era a única palavra do seu vocabulário).

- Pelo menos uma vez na vida, pare de ser o engomadinho crédulo de sempre – Sakura lhe deu um beliscão na nádega enquanto resmungava em seu ouvido. – Agora olhe lá - apontou para uma ruiva de curvas voluptuosas que estava junto de um homem enorme. – Aquela mulher se chama Karin. Obviamente, não é sua cara metade. Acho que podemos chamá-la de sexo rápido. E você está precisando esvaziar o saco pra ver se melhora esse humor horrível. Então, divirta-se, Hyuuga – e deu um tapa amigável no seu ombro.

Ele se divertiu por uma semana. Até que Karin resolveu se interessar pelo papo esotérico de Lee, que apareceu para o café da manhã numa das madrugadas em que a mulher dormira na sua cama. Foi o fim definitivo do relacionamento. Mas ela ainda participou de um ménage à trois com Lee e Sakura antes de desaparecer por completo.

- O que você acha de irmos buscar seu par perfeito num Adictos do Sexo Anônimos? – questionou Chouji, seu vizinho reconhecidamente punheteiro já familiarizado com o drama, numa noite dessas.

- Definitivamente, não – respondeu Neji, fechando a porta do seu apartamento e seguindo na direção do elevador, pois se prontificara a pegar a Haruno no trabalho para que pudessem ir à uma partida de hóquei no gelo do seu time do coração daquela noite.

- Eu sempre quis comer uma ninfomaníaca. Você podia pelo menos me acompanhar – pediu o homem, o jornal enfiado debaixo do braço enquanto adentrava no próprio apto.

- Nem em um milhão de anos – reiterou o Hyuuga.

Sakura estava esperando na frente da entrada do consultório quando ele chegou. Sequer precisou descer do carro. A mulher saltou para o banco do passageiro, os cabelos compridos desajeitados pelo vento, e se virou para olhá-lo.

- Uma pessoa vai com nós – disse, abaixando o vidro de modo rápido para que Neji não tivesse tempo de reiterar. – Tenten, garota, entra aí! – gritou para uma moça que continuava no cordão da calçada. - E não se preocupa que foi esterilizado! – sacudiu o braço freneticamente, chamando-a na direção do automóvel.

- Saki, eu não sou uma maníaca por limpeza – falou ela assim que abriu a porta e escorregou para o banco de trás. Suas bochechas estavam coradas pelo calor da noite. Ela vestia um jeans simples, acompanhado de uma camiseta de mangas curtas, o que contrastava por completo com as vestes ridículas da Haruno, que naquele dia optara por um conjuntinho verde com babados. Verde era a cor preferida do casal Esoterismo-Está-em-Alta.

- Oh, está bem – Sakura ajeitou os óculos, parecendo eufórica. – Neji, delícia, esta é Tenten, minha melhor amiga! – ela parecia excitada ao pronunciar o título de Tenten. Nunca tivera uma melhor amiga. Neji podia entender o porquê.

- Você não vai fazer sexo com ela como fez com sua outra melhor amiga, não é? – ele perguntou, sem poder se conter, referindo-se a Karin.

- Karin não era minha melhor amiga – respondeu a mulher, ultrajada. - Ela foi só um experimento para meu relacionamento! Agora ponha esta sua lata-velha para funcionar, porque hoje à noite os Destroyers definitivamente vão ganhar e nós não podemos perder um minuto! – tirou um boné do time citado de dentro da bolsa, colocando-o sobre a cabeça.

Neji suspirou logo que começou a dirigir na direção do estádio.

Ele, Sakura e Lee tinham cadeiras compradas há quase seis anos. Fora, inclusive, num jogo que conheceram a Haruno. Ela estava meio bêbada naquela partida, pois viera da festa de um ano do filho da sua secretária e ninguém lhe dissera que o ponche para os pais havia sido batizado. Não foi necessária uma hora para que ambos, o hoje casal, abandonassem-no para ir fazer sexo no banheiro feminino – isso os fez serem presos por atentado ao pudor e Neji foi obrigado a pagar a fiança, às duas da manhã de uma quarta-feira.

Quando o terceiro membro do time estava ausente (naquele mês, Lee havia conseguido trabalho como personal trainer de uma modelo noutra cidade), sempre iam apenas os dois restantes e ficavam vaiando o time adversário até perderem a voz. Mas agora que Sakura tinha arranjado uma melhor amiga – talvez num site de relacionamentos na Internet ou algo tão lógico quanto – o ritual fora quebrado.

É claro, a criatura mais supersticiosa que conhecia era sua mãe. Depois de quase vinte e sete anos de telefonemas desesperados, dizendo que seu momento final estava próximo porque ela passara debaixo de uma escada (ou encontrara um gato preto, ou quebrara um espelho, ou chamara por Maria Degolada três vezes na frente do espelho), ele não podia deixar de considerar o quão importantes eram os rituais estabelecidos pela rotina.

Não acreditava em cataclismas, nem em Nostradamus ou invasão alienígena, mas desde a vez em que ele quebrara o braço porque saíra dois minutos atrasado de casa, considerava importante não contrariar a rotina.

E, bem, oh, merda, isso devia querer dizer que ele era algo supersticioso também.

- Ei, liga o som, Neji – pediu Tenten, enfiando a cabeça entre o apoio dos dois bancos da frente.

Foi a psicóloga quem atendeu à solicitação da moça. Tocava uma canção antiga das Spice Girls, a qual Sakura imediatamente começou a cantar.

O percurso foi encarado com tranquilidade (se ouvir alguém gritar "Yo, I'll tell you what I want, what I really, really want.So tell me what you want, what you really, really want" pudesse ser considerado algo tranquilo) até que Tenten pôs os olhos sobre o relógio do painel do automóvel.

- Oh, meu Deus! – ofegou, levando a mão à boca. – Já são quase dez. Não acredito. Jurava que estávamos perto das nove – verificou o relógio que trazia no pulso. – Não acredito – murmurou, erguendo-se um pouco do banco para tirar o celular do bolso da calça jeans. – Seu carro está certo, Neji! Está certo – ofegou outra vez, parecendo desesperada ao fazer o mesmo com o aparelho telefônico.

- O quê? – Sakura foi a única capaz de verbalizar a confusão sentida pela dupla acomodada na parte da frente do automóvel. Virou-se para que pudesse fitar a amiga. – O que houve? É uma reunião de emergência? Algum alinhamento dos astros...? Oh, não, não tem nenhum hoje, que eu saiba – completou, pensativa.

- Pare o carro! – a outra gritou, sem dar ouvidos ao falatório incessante da Haruno.

- Nós estamos na pista do meio, Tenten – disse Neji, franzindo o cenho. – O que quer que tenha sido, não pode esperar até que cheguemos a um local onde posso estacionar?

- Não! – Tenten ofegou, passando a mão pelos cabelos castanhos, bagunçando seus coques duplos. – Precisa ser agora – afirmou, profunda seriedade em seu tom de voz. – Agora, Sakura, precisa ser agora – frisou, desviando os orbes cor de chocolate na direção da psicóloga, até que ela pareceu compreender a respeito do que se tratava a situação e estalou a língua.

- Ligue o pisca-alerta, Hyuuga – mandou Sakura. – Não se preocupe, garota – virou-se mais uma vez para poder fitar a parte traseira do carro. – Pense comigo: o mundo não irá explodir, os pássaros não irão atacá-la, não haverá nenhum terremoto, ahmmmm, faça o som! – levou os dedos indicadores às têmporas. – Vamos, Tenten, ahmmmm!

- Ahmmm – ela começou, mas de repente soltou um gemido. – Não posso. Não consigo! – abriu a porta, aproveitando que o veículo parara num semáforo, e saltou para fora, correndo até a calçada.

Neji, que até aquele momento se mantivera entretido com a direção, lançou um olhar chocado para a amiga.

- Mas que inferno...? – indagou, franzindo o cenho. – Aonde você arranjou essa maníaca?

- Ela não é maníaca! Só tem alguns probleminhas – gaguejou a Haruno, olhando freneticamente pela janela, tentando ver para onde fora a outra. – Estacione e nos encontre em dez minutos – e saltou para fora do carro, fazendo com que os motoristas que estavam atrás buzinassem.

O Hyuuga praguejou silenciosamente enquanto dava sinal para entrar na pista da direita e procurar um local para parar. Ele sabia que seria uma péssima ideia trazer uma completa desconhecida para se inteirar da tradição dos jogos de hóquei. Quero dizer, a única coisa que ele sabia sobre ela é que Tenten tinha algum tipo de problema irreversível com o horário, deu uma olhada no relógio, dez da noite. Eram nove e cinqüenta e sete agora.

Demorou algum tempo para que encontrasse uma vaga. Deixou o veículo com mau-humor enquanto ligava o alarme e seguia na direção tomada pelas duas mulheres. Precisou percorrer duas quadras até encontrá-las, o que não foi nada, comparando-se à estranheza da cena que vislumbrou: Tenten estava fazendo agachamentos, acompanhada de Sakura.

- Vocês não podiam deixar o maldito exercício de ginástica para o intervalo do jogo? – indagou ao se aproximar, irritado.

- Uff... – a Haruno ofegou, começando a se cansar. – Tenten... uff... tem TOC – explicou, sem sair da posição, subindo e descendo. – Isso-isso... ahh, nós estamos tentando um tratamento. Merda, Tenten – praguejou, fitando a morena, que parecia concentrada. – Quantos mais?

- Vinte – reiterou ela, sem sequer arquejar. Voltou os olhos castanhos para Neji. – Fui instrutora de ginástica por quase dez anos. Minha mãe tinha verdadeira fixação pelos próprios glúteos. Meus problemas começaram há muito tempo, mas não pude percebê-los até que decidi abandonar o ramo e me fixar na carreira de modelo fotográfica – explicou. – Desculpe perturbar seu jogo, Neji – disse, parecendo arrependida por um instante. – Agora vamos lá, Sakura! – seu tom mudou por completo. – Trinta e sete, trinta e oito... Não relaxa!

Ele lançou uma mirada fria para os transeuntes que os encaravam com estranheza. A dureza da sua expressão acabou por espantá-los e afastar os engraçadinhos.

- Oh... meu... Deus! – a Haruno se agarrou no braço de Neji logo após o término dos exercícios. – Neji, vá procurar meu pulmão. Acho que ele saiu correndo.

- Eu sempre disse a você que só sexo não era o bastante, ratazana – reiterou o homem, tratando de segurá-la antes que ela caísse no chão, sem fôlego.

- Não se preocupe, Saki – Tenten se aproximou, ajeitando os cabelos bagunçados, um enorme alívio na face. – Em alguns meses você ficará com um traseiro tão bom quanto o meu – garantiu, começando a rir. Apoiou as palmas das mãos sobre os joelhos. – Graças a Deus – murmurou então. – Pensei que não daria tempo. Aconteceria uma calamidade! – balbuciou, limpando o suor da testa.

- Quantas vezes por dia você faz isso? – indagou o Hyuuga, arqueando as sobrancelhas.

- Seis vezes por dia – respondeu ela, ficando ereta. – Não são sempre agachamentos. É algo em que eu penso na hora – explicou. – Dava seis aulas por dia. É sempre nos antigos horários. Não consigo parar. É angustiante – torceu os dedos da mão, enfim voltando a atenção para Sakura, que parecia estar com problemas de falta de ar. – Respire devagar, inspire, relaxe... – agarrou a mão da amiga, massageando-a. – Você não precisava fazer isso por mim, Saki – falou. – Já estou acostumada a ser encarada como louca.

- Amigas são pra essas coisas – reiterou a Haruno, séria. – E eu já estava começando a ficar preocupada com o fato de que Lee está com um traseiro mais gostoso que o meu.

- Okay, eu prefiro me abster desse tipo de imagens perturbadoras – anunciou Neji, fazendo uma careta. – Será que podemos voltar para o carro? Com o andar da carruagem, vamos perder muito mais do que um minuto do jogo. E eu realmente preciso de um cachorro-quente.

A partir daquele dia, Tenten foi presença constante em todos os eventos em que Sakura comparecia. Elas pareciam algum tipo de irmãs com ligação sobrenatural e, embora o tratamento para o transtorno obsessivo-compulsivo não estivesse tendo o efeito esperado, a morena tinha consultas constantes com a psicóloga para tentar resolver seus problemas de infância.

Depois da sétima vez em que teve de esperá-las cumprir o ritual sagrado de apoios, abdominais ou outra atividade igualmente excêntrica, o Hyuuga acabou por se habituar. Não compartilhava dos exercícios, apenas contava no relógio quanto tempo faltava para que o período dramático terminasse – o que levava de dez a quinze minutos. E às vezes cronometrava, apenas por ocupação. Tenten adorava saber quanto tempo demorava para realizar cada série.

Era mais uma daquelas noites em que se encontravam para beber numa boate e eles aguardavam na fila.

- Dois minutos – disse Neji assim que parou o cronômetro do relógio de pulso. Fitou a morena à sua frente, que executava polichinelos já há algum tempo. – Você está melhorando – falou, como se o fato de vê-la saltar sobre o piso de concreto com o vestido justo e os saltos altos fosse algo completamente comum.

- Merda – Tenten tornou a ajeitar os cabelos. – Pelo menos essa foi a última de hoje – murmurou. – Obrigada – pegou a bolsa, que anteriormente se encontrava com o Hyuuga, de volta.

- Você é algum tipo de ginasta? – indagou uma garota que estava à frente deles na fila e que agora os encarava de maneira curiosa.

- Não – reiterou Neji de imediato, rosto impassível. – Ela fez uma promessa para curar seu irmão mais novo da asma e agora precisa fazer uma série de polichinelos a cada duas horas – posicionou a mão sobre o ombro desnudo da morena, que forçou uma expressão infeliz na face.

Como não poderia deixar de ser, dado o conteúdo da confissão, a curiosa os fitou, incrédula e indecisa se de fato acreditava na história ou não.

- Você sabe como são as promessas – comentou Tenten, parecendo realmente abatida. – Se eu quebrasse o acordo feito com Deus, hoje Mamoru poderia estar ainda pior.

- Oh, está certo. Desculpe – e a garota voltou o rosto para frente, constrangida por fazê-los tocar num assunto tão frágil.

Os dois apenas se entreolharam com um ar de zombaria evidente. Nos últimos tempos, haviam se habituado a responder cada vez de maneira mais criativa quando se defrontavam com um bisbilhoteiro mais descarado.

Quando Lee e Sakura estavam junto, as mentiras eram piores, muito piores, é claro, dada a personalidade problemática de ambos. Geralmente os três paravam, onde quer que fosse, para executar os exercícios (no meio do shopping ou no estacionamento, lá estavam eles). Às vezes o personal trainer até mesmo colocava uma música para tocar no MP3 do celular.

Eles se viam quase todos os dias, a despeito dos pedidos incessantes de Neji para que o grupo o deixasse trabalhar. Às vezes Tenten não estava bem. Então era necessária muita cautela e algum açúcar. Do que ele próprio sabia, em apenas duas vezes ela conseguira permanecer imóvel nos horários estipulados pela rotina, mas suara, tivera enjoo e queda de pressão. Os progressos eram lentos.

Era domingo e esperavam para entrar no cinema. Era a estreia de um filme de Sherlock Holmes, o personagem preferido da Haruno.

Com um pacote de pipocas, Neji recém voltava da bomboniere quando notou Tenten parada ao lado de um casal perto da fila de entrada. Estava suada e ligeiramente descabelada. Instintivamente o Hyuuga lançou um olhar ao relógio: duas e dez da tarde. Hora do show.

- ...e meu marido reclamou que minhas coxas estavam ficando flácidas – dizia a morena, empolgada, até girar o rosto e vê-lo. – Oh, lá está ele – acenou, alegremente. O mesmo não se pôde dizer da dupla posicionada logo atrás dele, que o encarava com alguma secura, fruto da mentira contada. – Este é Neji – apresentou, postando a mão sobre o bíceps do engenheiro. – Com um corpinho sarado como o dele, vocês vêem que preciso me cuidar para não perder o posto de bola da vez.

- O que importa é a flexibilidade, meu bem – reiterou o Hyuuga, lhe passando o refrigerante. – Onde diabos foram Lee e Sakura? – indagou.

- Transar no banheiro – respondeu Tenten, pegando uma pipoca. Acenou para o casal logo atrás, que tinha um olhar chocado. – Foi um prazer.

No aniversário de vinte e seis anos de Naruto, todos se encontraram num restaurante para comemorar. Neji chegou sozinho e uma hora atrasado, por imprevistos no trabalho. Os convidados já haviam começado a comer, mas ele não se importou. Sentou-se perto de Lee, ao lado de Tenten, e pediu uma bebida.

Havia muita gente desconhecida. Naruto era um cara popular, havia afirmado sua irmã, e Hinata parecia muito tímida dentre tantos convidados.

A conversa rolou sobre temas neutros por algum tempo até que o tópico chegou aos engenheiros – depois de passar pelos jogadores de futebol, modelos fotográficas, psicólogas e atrizes pornôs (não que houvesse alguma no recinto, ou pelo menos Neji não sabia se existia ou não).

- O Neji aqui é meu candidato a presidente – Lee deu um tapa amigável sobre o ombro do Hyuuga. – É meu orgulho. Todo certinho. Até demais, se me perguntarem. O tipo de cara que uma filha gostaria de apresentar para um pai. Quem não apostaria nele para governar suas finanças?

- Pena que eu não estou concorrendo – reiterou o mesmo, seco.

- Mas eu totalmente, totalmente votaria em você, delícia – comentou Sakura, piscando.

- Está bem. Vou pensar nisso perto das próximas eleições.

- Ele é sempre tão sarcástico – soltou a Haruno para todos à volta, suspirando dramaticamente, o que fez Tenten rir. – Nosso engomadinho crédulo parece que nunca vai abrir seu coração. Precisa de uma companhia feminina para adoçar sua vida. É por isso que nós iniciamos uma séria campanha para achar a peça que falta no seu quebra-cabeça, aliás – como de hábito, parecia uma mãe falando de um filho. – A mulher ideal pode mudar tudo.

- Está bem – Neji não deu atenção, ocupado com seu uísque. – Vou passar a analisar melhor meu leque de opções e dar a cada concorrente um questionário para saber se somos compatíveis. Você está certa. Por que não acreditar que uma mulher me transformaria por completo, não é verdade?

- Acho que nós devíamos marcar outra consulta com a cartomante Ino – sugeriu Lee, muito sério, ignorando seu sarcasmo. – Ela garantiu que você encontraria seu par perfeito muito em breve. Mas o muito em breve já passou há tempos! Nós não podemos lançar um candidato solteiro à presidência. Diriam que você é gay.

- Claro – disse Tenten. – Faz todo o sentido, não é mesmo, Neji? Aliás, solteiro e homossexual deveriam ser sinônimos – zombou, começando a gargalhar.

Infelizmente, Lee e Sakura não desistiram do plano de entrar em contato com a cartomante Ino e lhe telefonaram na noite seguinte, enquanto todos estavam acomodados na sala do apartamento do casal, um pouco bêbados e sem mais moedas. Jogar pôquer valendo era o passatempo preferido do grupo.

A loira concordou em atendê-los no dia seguinte. Chegou com os cabelos enrolados num turbante e enfiada num vestido de tecido diáfano que escondia por completo sua silhueta.

- Ei - Tenten estava junto naquela noite. Dissera que não perderia aquilo por nada. – Esta pedra na testa não é coisa de indianos? – indagou para Ino, curiosa.

Por sorte, pensou Neji, Tenten era muito mais descrente dos poderes do esoterismo do que ele. Mesmo após vários monólogos empenhados de Lee, sua resolução continuou a mesma. Ele apreciava aquela capacidade de não se render àquilo que os outros pensavam. Mostrava força de espírito.

Ino, porém, não parecia achar nada engraçadas as piadas feitas com seu muito sério e honorável serviço.

- É apenas simbólico – respondeu enfim, desgostosa. – Presente da minha mãe – explicou, ao que todos soltaram um ruído de concordância. – Agora vamos ao tarô! – espalhou cuidadosamente as cartas sobre a mesa. – Tenho a absoluta certeza de que, com um pouco de procura aplicada, encontraremos a desejada moça.

- Oh – Tenten ofegou, deslumbrada. – Nós ainda estamos procurando pela sua namorada em potencial? – indagou para Neji, que recém se jogara num sofá.

- Não é só uma namorada em potencial – interveio Sakura, em tom de repreensão. – Ino sabe o que faz – garantiu, de modo que a dita cuja anuiu, orgulhosa de si mesma. – Vocês precisam dar crédito a ela. Talvez você não tenha encontrado sua cara metade – frisou a denominação, pois sabia o que Neji de fato pensava sobre isso. – por alguma interferência.

- Minha TV a cabo está com um ótimo sinal – reiterou o Hyuuga, ligando o televisor e colocando num canal de jogos de basquete da NBA.

- Oh, meu Deus! Não esse tipo de sinal, idiota – rugiu a psicóloga. Virou-se na poltrona, voltando a cabeça para o corredor logo atrás de si. – LEE, TIGRÃO, EU PRECISO DE AJUDA! – berrou, logo tornando a se acomodar, suspirosa. - É difícil ajudar aos céticos.

Para o azar deles, Ino não teve nenhuma visão. Ela disse que estava com tensão pré-menstrual e aquilo obstruía sua leitura da sorte.

- Vamos admitir – falou Neji logo após a loira deixar a casa. – Eu não tenho uma tampa para a panela, uma cara metade, um par ideal, uma companheira perfeita, nem nada do tipo. Sou só mais um homem solitário neste planeta. E isso soa ótimo para mim, obrigado por perguntarem.

- Não! – resmungou Lee, ocupado com o pacote de salgadinhos que comia. – Esse negócio de ser solitário é patético. Você vai broxar algum dia. E precisa de alguém que o perdoe quando isso acontecer.

- Vamos rever o que a profetisa disse da última vez – sugeriu Sakura, livrando-se dos sapatos para pôr os pés sobre o assento da sua poltrona. – Ten, me joga aquele bloco de notas – pediu, no que foi imediatamente atendida. – Agora, o que ela disse? – indagou a todos. – Que o Neji-sarado encontraria alguém muito em breve, em circunstâncias incomuns.

- J-jesus – balbuciou Tenten, interrompendo-a de súbito. – São quase oito! Vamos lá, pessoal – ergueu-se da cadeira. – Um aquecimento rápido – e começou a dar pequenos saltos sobre o tapete.

Neji apenas ficou observando enquanto os três começavam a malhar. A campainha soou naquele minuto. Era Chouji, que chegava com quatro caixas de pizza, atraído pelo ruído comum quando se tratava das visitas do vizinho.

- Oba – o gorducho foi entrando. – Aula de ginástica? – perguntou.

("Contrai o glúteo e relaxa. Um, dois, um, dois, respira fundo. Mexe o popô!" Tenten falava ao fundo.)

- Pelos próximos dez minutos é de graça – avisou Neji, seguindo até a geladeira. – Vou pegar umas cervejas.

A carreira de modelo fotográfica de Tenten não deu certo, mas ela eventualmente se curou do TOC. Lee desistiu dos envolvimentos físicos e psicológicos do melhor amigo depois que descobriu o sexo tântrico. Chouji encontrou o amor com uma ninfomaníaca. Sakura ficou com um traseiro duro.

Eles continuaram se vendo pelos próximos oito meses, até que, numa noite de bebedeira, Neji e Tenten dormiram juntos. E descobriram que a cartomante Ino estava certa. Mas isso não os fez acreditar em esoterismo. Apenas consideraram, apesar das declarações da Haruno de que a mulher nunca errava, aquela uma jogada de sorte. Até que ela lhes disse que teriam um filho. Foi quando ambos se preocuparam.

FIM