O silêncio que prevalecia ao longo do corredor de paredes brancas era quebrado apenas pelo irritante toque do telefone que a secretária intencionalmente ignorava ao analisar varias pastas de arquivos em sua mesa. Algumas pessoas vagavam pelo local completamente mudas parecendo esperar por algo. Um homem gordo sentado em uma das cadeiras de espera dormia profundamente com a boca aberta que vez ou outra deixava sair um ronco baixo, mas o homem bem arrumado ao seu lado lendo tranquilamente um jornal lhe dava uma cotovelada assim que o fato ocorria fazendo com que o barulho grosseiro não saísse mais de sua garganta. Uma mulher de meia idade andava de um lado para o outro impacientemente olhando em sua volta com perceptível nojo. A porta da frente rangeu fazendo com que uma brisa trouxesse o barulho do lado de fora rapidamente para aquele local, mas tudo ficou em silêncio novamente assim que a porta tornou a se fechar.

Olhou para o corredor tão conhecido e levou os dedos até o rosto retirando calmamente os óculos de sol o pendurando no robusto decote de sua blusa social branca. A calça preta colada em seu corpo traçava todas as curvas proporcionais da panturrilha ao quadril. O som do salto alto batendo contra o piso anunciou sua caminhada ao longo do caminho recebendo a total atenção daqueles que se encontravam ali. Inspirou presunçosamente e olhou para cada um dos rostos com certo desdém. Sabia o impacto que causava nos lugares, e não era só por causa do longo cabelo negro ou da pesada maquiagem nos olhos. A algema e o revólver em sua cintura ajudava muito no pacote.

Chegou até a grande mesa de madeira clara e cumprimentou carinhosamente a nova ocupante daquele cargo ao lhe entregar sua carteira. Esperou até que a jovem pegasse o aparelho e devolvesse seu documento. Fez um discreto reconhecimento do belo corpo moreno já preparando as investidas futuras. Olhou mais uma vez o local e um leve sorriso debochado tomou o canto de seus lábios ao reconhecer alguns dos rostos ali presente. A jovem moça morena a chamou pelo nome e lhe informou que poderia entrar. Fez um pequeno gesto com a cabeça em agradecimento lançando seu melhor sorriso charmoso prendendo a atenção da mulher sentada a mesa e se dirigiu a porta.

– Está atrasada doutora.

A voz suave informou, mesmo que sem necessidade, assim que sentiu a presença de mais uma pessoa no grande aposento. A dona dos cabelos negros fechou a porta e caminhou em direção a dona daquela voz que se encontrava atrás de uma grande bancada lendo alguns possíveis documentos. O cabelo chocolate preso em um coque mal feito deixava a franja solta no rosto de feições pequenas e as grandes argolas de ouro bem visíveis. Os olhos castanhos se ergueram sobre o óculos de aro fino fitando duramente a bela mulher que tinha acabado de entrar em seu local de trabalho.

– Me desculpe excelência. Houveram algumas complicações e não pude chegar mais cedo. - Explicou-se com todo o respeito que tinha.

– Que seja. - Suspirou retirando o óculos de leitura o largando junto com os papéis na bancada. - Não quero saber de mais uma de suas desculpas esfarrapadas. Sente-se. - Indicou a cadeira a frente.

– Me perdoe o comentário, mas isso não é linguajar para uma juíza, meritíssima. - Contorceu o rosto em uma careta se sentando na cadeira oferecida.

– Se julgar minha linguagem mais uma vez lhe dou o beneficio de uma multa. Quer arriscar? - Ameaçou apontando a caneta na direção da mulher sentada a sua frente.

– Okay, não está mais aqui quem falou. - Encolheu os ombros. - Pois então, a que devo a honra do seu grandioso chamado? - Indagou para a mulher de maquiagem leve que batia a caneta na madeira incontrolavelmente.

– Está vendo isso aqui. - Apontou para uma pilha de pasta ao seu lado direito. - Queria te agradecer por essa pilha desnecessária de processos. - Sorriu sarcástica.

– Desnecessária? - Franziu a sobrancelha. - Todos eles eram necessários. Apenas fiz o meu trabalho.

A mulher de cima da bancada pegou uma pasta e começou a analisar folha por folha.

– Uma adolescente furtando um óculos em uma das lojas do shopping. Três rapazes consumindo maconha após a um show de rock. Jovem dirigindo sem a carteira... - Pausou largando os papéis. - Você está de brincadeira comigo?

– Mas são infrações.

– Infrações que você mesma pode resolver, Demetria. Você pode muito bem solucionar esses problemas com mais eficácia do que as medidas sócio-educativas que sou obrigada a sentenciar. Você sabe como a lei é falha, então pare de ficar me enviando essas coisas de pequeno porte, porque eu já estou farta de aplicar sermão em marmanjo. Se vira.

– Não era esse o discurso antes de nos formarmos. - Comentou baixinho desviando os olhos.

– Quando estávamos na universidade nós não sabíamos como era realmente o processo aqui fora. Você mais do que ninguém entende do que estou falando. - Cortou ríspida o que fez a mais nova se recompor em sua presença. - Apenas pare de me trazer coisas inúteis. Estou lhe dando o completo aval para punir LEVEMENTE.. - Deu ênfase na palavra conhecendo bem a mulher a sua frente. - Esses casos simples.

– Vou fazer o possível. - Respondeu prontamente.

– Obrigada. - Suspirou descansando as costas na cadeira. - Não aguento mais tanto trabalho.

– A que horas estará livre?

– Pretendo sumir daqui depois das três. - Inclinou-se para frente apoiando os cotovelos na madeira.

– Podemos sair, sei lá. - Coçou a nuca meio sem jeito jogando o cabelo sobre o ombro direito. - Faz tempo que não saímos juntas.

– Demi, a gente mora no mesmo apartamento. - Sorriu.

– Eu sei. - Cruzou as pernas ficando mais confortável. - Mas não parece. Quer dizer, ontem eu nem te vi. Quando eu acordei já estava atrasada e nem vi se ainda estava dormindo, quando cheguei estava tão morta que fui direto para o meu quarto. E quando a gente se encontra é sempre aqui nesse lugar frio. - Abrangeu o local com uma das mãos. - E só dialogamos sobre trabalho.

– Você está certa. - Ponderou por um segundo. - Te encontro em casa e depois decidimos para onde sair. - Colocou o óculos delicadamente sobre o pequeno nariz. - Você já está liberada. - Começou a escrever algo sobre um bloco de papel.

– Obrigada. - Agradeceu se levantando da cadeira pronta para sair do aposento, mas voltou parecendo se esquecer de algo. - Selena?

– Hum? - Ergueu os olhos mais uma vez.

– Por que que toda vez que eu venho aqui tem uma menina diferente na recepção? - Indicou a porta atrás de si com o polegar.

– Porque você sempre dá um jeitinho de sair com as minhas secretárias. - Sorriu cinicamente.

– Eu não tenho culpa se você só escolhe mulheres interessantes para trabalhar aqui. - Explicou-se. - Você as demitiu por minha causa?

– Por sua causa? Não. - Negou com a cabeça franzindo levemente o cenho. - Elas que não eram profissionais o suficiente para não comentar sobre suas vidas particulares em minha frente. Sério, eu não preciso saber dessas coisas.

– Isso é ciúme? - Cruzou os braços fitando a mulher ainda atrás da bancada.

– Vá embora, Demetria. - A ignorou voltando a atenção para a papelada com certo divertimento.

– Sim, vossa majestade. - Fez uma exagerada reverência e abriu a porta.

–x-x-x-

– Mas ele era gostoso. - Cortou jogando mais uma pipoca para dentro da boca.

As duas mulheres caminhavam pela avenida a passos lentos sendo guiadas pela lua no alto da rua. O cinema se distanciava a cada passo que davam. Demi olhava para o chão parecendo estar com o pensamento distante. Suas mãos escondidas nos bolsos da saia bege de cintura alta estalavam os dedos secretamente para não irritar a mulher ao seu lado. Selena odiava estalar os dedos e não suportava assistir alguém realizar o feito em si mesmo. Sorriu parecendo ainda distante.

– Ele foi o único que conseguiu ficar com nós duas. - Apontou.

– Foi. - A mais alta concordou parecendo se recordar de algo. - Mas em minha defesa, eu não sabia que você tinha ficado com ele na festa do Josh.

– Não vamos nos martirizar. - Desdenhou. - O cara era bom. - Confessou.

– O cara era ótimo. - Selena suspirou colocando mais uma pipoca na boca.

– Canalha. - Demi sorriu. - Um dos poucos que merecem meu respeito.

– Estranho esse seu método de merecer respeito. - Debochou jogando o pacote que segurava em uma lixeira próxima.

– Você está incluída nesse pequeno grupo, então não reclama. - Avisou.

– Tudo bem. - Abriu a porta de um bar reservado conduzindo a mais baixa a entrar. - Vamos beber. - Anunciou já estando dentro do recinto.

– Amanhã é quarta. - Avisou a dona do longo cabelo negro.

– Mas vamos beber. - Caminhou até o balcão e chamou o barman. - Uma garrafa de tequila por favor. - Sorriu radiante.

– Não sei se você se recorda mas não tivemos experiências muito boas com tequila, Selena. - Se sentou no banco ao lado da mulher que trajava um vestido branco simples.

– Eu não me lembro de nada. - Deu de ombros.

– Exatamente. - Explicou arrancando uma risada gostosa da Gomez.

O local estava bem movimentado para uma noite de terça feira. Nas mesas, homens e mulheres se reuniam bebendo deliciosos drinks enquanto pediam mais aperitivos. A luz baixa dava um suave visual exótico, juntamente com a música sedutora que saía da box. Alguns homens do outro lado do balcão admiravam as duas mulheres ali sozinhas. Demi já tinha percebido mas Selena resolveu comentar sobre o assunto obtendo apenas um sorriso fraco da Lovato. Um dos homens ergueu a garrafa de cerveja até os lábios tomando o liquido amargo parecendo se preparar e caminhou em direção as duas. Demi sustentou seu olhar até que ficasse a uns três passos de distância e então o homem parou. A mais baixa tinha erguido um objeto preto com o símbolo dourado cravado ali, um distintivo. Rapidamente o homem assentiu e desviou do caminho.

– Babaca. - Demi revirou os olhos.

– Por que você cisma em afastar as pessoas desta forma? - Selena encheu os copos com o liquido incolor mais uma vez.

– Porque eu adoro ver aquela expressão estampada em seus rostos. - Contorceu a boca e apertou os olhos ao sentir o liquido rasgando-lhe a garganta.

– Mas o cara era interessante. Gostaria de poder ter tido uma oportunidade de conhecê-lo. - Virou o copo na boca fazendo a mesma careta da amiga.

– Se você quiser pode ir lá falar com ele. - Informou rudemente apontando pro outro lado do salão após sugar a ácidez do limão em sua mão.

A mais alta estudou aquelas palavras e atitude com divertida descrença.

– Quem está com ciúmes agora? - Selena a olhou de maneira debochada.

– Eu não estou com ciúmes. - A voz subiu na escala fazendo a senhorita Gomez sorrir.

– Sua voz subiu na negativa. Você está com ciúmes. - Cerrou os olhos ainda a encarando.

– Quer saber? - Pegou a garrafa enchendo apenas seu copo. - Acho que essa bebida já começou a lhe causar efeito.

– Que seja. - Ergueu uma das mãos fazendo um pequeno gesto para o barman. - Uma porção de salgados.

–x-x-x-

A porta do sofisticado apartamento se abriu revelando as duas silhuetas cambaleantes. Demi se moveu cuidadosamente até o interruptor para iluminar o local fazendo a mulher apoiada em seu ombro reclamar da claridade que irritava seus olhos. Com a mão livre tirou ali mesmo as sandálias e ajeitou melhor Selena ao seu corpo para que não caíssem. A mais velha podia muito bem andar sozinha mas o salto alto que usava provavelmente lhe presentearia com uma torção no tornozelo. A mais baixa caminhou até o sofá colocando Selena cuidadosamente sobre o estofado. Tirou seus sapatos e tentou erguê-la novamente.

– Vamos Selly, me ajuda vai. - Pediu segurando em suas mãos.

– Me deixa aqui mesmo. Está fofinho. - Abraçou uma almofada fechando os olhos. Demi sorriu.

– Como você consegue ser tão fraca com a bebida? - Suspirou se sentindo derrotada.

– É o equilíbrio entre a gente. - Riu debilmente do comentário sem lógica.

Um vinco se formou entre seus olhos castanhos estudando se conseguiria levar a mulher bêbada até o quarto. Puxou Selena com força para longe do sofá escutando as reclamações em sua orelha. Segurou firme na cintura fina coberta pelo pano do vestido para que nenhuma das duas desabassem no assoalho frio. Passaram pelo primeiro quarto que tinha a porta pintada de vermelho e chegaram até uma da cor branca em meio a pintura bege da parede. Demi empurrou o material de madeira e entrou no aposento. Caminhou até o fundo do quarto deitando Selena na cama e se virou para acender a luz ouvindo mais reclamações.

– Me desculpa, mas amanhã você vai me agradecer por isso.

Caminhou até o outro lado do cômodo ligando o ar condicionado na temperatura habitual. Puxou bruscamente a colcha que forrava a cama fazendo Selena se virar e abraçar o travesseiro. Abriu a porta do armário, pegou duas peças pequenas de roupa e caminhou em direção a cama novamente.

– Selena? - Chamou notando que estava de olhos fechados. - Selly.. - Balançou sutilmente seu ombro.

– O quê? - Escutou a voz pesada depois de alguns segundos.

– Tem que trocar de roupa. - Avisou desdobrando as peças em suas mãos.

Selena abriu os olhos franzindo levemente a testa. Parecia irritada. Tentou se levantar mas parou apoiando um cotovelo no colchão mantendo seu tronco erguido. Esfregou a sobrancelha esquerda com dois dedos. Demi conteve o riso. A ressaca já estava batendo. A mais velha encostou as costas no colchão mais uma vez parecendo desistir da ideia de se levantar.

– Okay. - Demi entendeu. - Eu troco sua roupa então. - Se ajeitou sobre a cama. Selena abriu os olhos parecendo despertar.

– Vai trocar minha roupa, Dem's? - Se não fosse pelo álcool o tom sensual poderia até ter sido notado.

Demi ignorou o comentário e deslizou o short pela perna lisa o ajeitando por baixo do vestido. Virou um pouco Selena podendo achar o zíper. A mais velha pareceu querer ajudar no processo ao se escorar na cabeceira. Demi puxou o pedaço de pano com cuidado a deixando com o sutiã rosa claro. Pegou rapidamente a camisa vermelha para vesti-la sem mais demora. Conseguiu passar os braços e cabeça pelos locais certos completando o serviço. Pegou o vestido jogado na cama se preparando para sair dali mas em um movimento rápido seu corpo estava embaixo do de Selena que lhe fitava com curiosidade.

– Que foi? - Se alarmou ao perceber a posição na qual se encontrava.

A mais velha prendia os membros inferiores de Demi com as próprias pernas. Suas mãos se fixaram nos pulsos da mais nova os segurando a cima de sua cabeça contra o colchão. Estava completamente imobilizada, as duas sabiam disso. A sombra de um sorriso apareceu no canto da boca de Selena, o que fez a Lovato ter uma leve ideia do que estava se passando ali.

– Selena.. - Começou com a respiração entrecortada. - Me solta e vai dormir.

– Não quero não. - A voz banhada em desejo saiu de sua boca.

Desceu um pouco o rosto na direção de sua presa fazendo cócegas no pescoço da mais baixa com as pontas de seu cabelo.

– Selly, não faz isso. - Tentou mais uma vez. - Amanhã você vai querer se matar. E o pior, eu posso parar na cadeia.

Um sorriso completo tomou conta da mais velha que agora roçava seus narizes.

– Selly.. - Chamou em um sussurro inútil.

Aproximou lentamente os lábios na direção dos vermelhos que tanto lhe provocava com palavras. Demi fechou os olhos com o roçar macio em sua boca. Selena iniciou o beijo carinhosamente e após alguns segundos brincando com os lábios sua língua tocou timidamente na boca da Lovato. A mais nova acolheu gentilmente aquele músculo o sugando lentamente. O gosto da Tequila ainda estava ali, mas quase imperceptível. Selena soltou os pulsos da mulher assim que sentiu ser correspondida. Deslizou suavemente as mãos pelos braços erguidos até a região da cintura onde uma fez morada e a outra tornou a subir acomodando a cabeça da mais nova como um travesseiro. Aprofundou mais a língua explorando ainda mais o local desconhecido, um suspiro de satisfação saindo das narinas. A mais baixa levou as mãos as costas de Selena a puxando para baixo completando o contato de seus corpos.

As mãos massageavam fortemente as costas da mulher sobre seu corpo arrancando-lhe mais alguns suspiros. Selena queria mais, muito mais. Se afastou da boca de Demi e desceu distribuindo beijos úmidos e cálidos ao longo da clavícula. Estremeceu com o contado das mãos entrando por baixo da camiseta em suas costas. Fechou os lábios na pele alva do pescoço e não se conteve em chupá-lo. Um arrepio percorreu o corpo de Demi até a nuca fazendo seu íntimo latejar sutilmente. Suas mãos imediatamente pararam o que estavam fazendo e ergueram a mulher para longe de seu corpo. Selena a olhou meio atordoada.

– Selly.. - Pausou tentando controlar melhor a voz e a respiração. - Melhor pararmos por aqui. Acho que já me encrenquei demais.

A mais alta se sentou cambaleante na cama assim que Demi soltou seus braços. Notou os olhos vermelhos de Selena, não sabia o grau de embriaguez a qual a amiga se encontrava. A mais velha fez um biquinho parecendo chateada. Demi se sentou de frente para ela, acariciou a maçã rosada de Selena e permaneceu no local a fitando. Não sabia muito bem o que fazer. Não sabia muito bem o que pensar. O álcool em seu metabolismo já fazia tudo ficar nebuloso. Precisava dormir. Observou a mais velha se aproximar novamente unindo os lábios nos seus de maneira singela e então se afastou. Deitou na cama e dormiu.