Adaptação: Adeus ao Amor-Homens do Texas - Diana Palmer

CAPITULO I

O homem alto e de cabelos grisalhos estava um pouco separado do resto do grupo, os olhos fixos na jovem de preto ao lado de Alice. Seu primo James morrera e aquela mulher era a culpada. Não só ator mentara o marido durante dois anos, levando-o ao alcoo lismo, como também deixara que pegasse o carro quando estava bêbado; ele caíra de uma ponte e morrera. E ali estava ela, quatro milhões de dólares mais rica, sem derra mar uma lágrima sequer e completamente impassível. Notando o olhar frio de Edward, Alice se aproximou:

— Pare de ficar olhando assim para ela. Como pode ser tão desagradável? — perguntou, zangada.

Ele tinha quarenta anos, quinze mais velho do que sua irmã, mas ficara grisalho prematuramente, enquanto os ca belos de Alice continuavam escuros. Ambos tinham os mes mos olhos azuis e o mesmo temperamento exaltado.

— Estou sendo desagradável? — ele sorriu, gélido, levando o cigarro à boca.

— Você prometeu que ia largar de fumar.

— E larguei. Só fumo quando estou muito tenso e ao ar livre.

— Não estou preocupada com os que respiram a sua fumaça: é meu irmão e me importo com você.

— Vou tentar parar, sossegue... — Olhou novamente para a viúva. — Ela é qualquer coisa, não? Não vi nenhuma lágrima e foram casados por dois anos!

— Ninguém sabe o que acontece num casamento, Edward.

— Creio que não. Eu nunca quis me casar, mas parece que funciona para algumas pessoas.

— Como os Hale, aqui de Jacobsville — comentou Alice, sorrindo —, que se dão muito bem. Tenho inveja deles.

Edward não estava a fim de falar nisso. Deu outra tragada no cigarro e olhou para a viúva, que estava perto da limusine negra.

— Por que o véu cobrindo o rosto? — inquiriu ele. — Ela tem medo que a mãe de James repare que não está chorando?

— Você é tão cínico, Edward! Não é de admirar que nunca tenha se casado. As pessoas dizem que no sul do Texas não há mulher nenhuma que tenha coragem bastante para se arriscar!

— Não há mulher no sul do Texas que eu queira.

— E a última de todas é Isabella Cullen — acrescentou ela, reparando que ele voltava a fitar com ódio sua melhor amiga.

— Ela é mais jovem que você — lembrou ele. — Vinte e quatro anos contra os meus quarenta. É jovem demais, mesmo que eu estivesse interessado. Mas não estou.

— Ela não é como você pensa, Edward.

— Acho bonita sua lealdade para com as pessoas que ama, porém nunca vai conseguir me convencer que essa viúva está triste.

— Você sempre foi muito grosseiro com ela — acusou a irmã.

— Ela sempre me irritou — rebateu ele.

Alice ficou quieta. Chegara a pensar que seu irmão se apaixonara, pela primeira vez na vida, ao conhecer Isabella, mas que desistira por se achar velho demais para ela. Não via por quê, uma vez que com quarenta anos, Edward tinha físico de um homem com vinte. Tornara-se milionário sem nunca sentar-se a uma mesa de escritório. Era um rancheiro esguio, forte e muito atraente, no entanto, desde que Isabella se casara nunca mais soubera de namoradas dele.

— Você vai para a casa conosco? — quis saber Alice.

— Eles vão ler o testamento depois do almoço.

— Isabella está com pressa, é?

— Foi idéia da mãe do James, não dela.

— O que não me surpreende — disse ele, áspero. — Tina vai adorar pôr Isabella na rua.

— De fato, titia parece bem hostil.

— E não devia? — Ele deu uma risadinha amarga. — Isabella matou o filho dela!

— Edward!

O olhar dele parecia duro a ponto de cortar um diamante, quando voltou a falar:

— Isabella nunca amou James e se casou com ele porque o pai morreu e ela não tinha nada, nem mesmo onde morar. E então passou dois anos dedicando-se a infernizar a vida dele, a irritá-lo e fazê-lo infeliz. Várias vezes ele desabafou comigo...

— Como? Você nunca chegou perto da casa deles! — exclamou Alice. — Bem, creio que esteve lá uma vez, numa visita de poucas horas. Até se recusou a ser padrinho de casamento, quando ele o convidou!

— James costumava ir a Victoria me visitar e sempre me telefonava... Vivia falando em Isabella. — A voz dele endureceu; — Ela o levou à bebida.

— Isabella é minha amiga e continuaria sendo, mesmo que eu acreditasse nisso. A gente aceita também o lado ruim dos amigos, não acha?

— Não sei. Não tenho amigos.

Era verdade, Edward não confiava em ninguém, fosse homem ou mulher.

— Pelo menos — tentou Alice —, podia dar pêsames para ela, Edward.

— Por quê, sabendo que Isabella não se importa com a morte do marido? Jamais faço coisa alguma só por causa das aparências.

Ela sacudiu a cabeça e voltou para perto da amiga, ficando com ela até terminar o funeral.

O trajeto até a mansão de tijolos vermelhos foi curto e Isabella o fez em silêncio. Estavam quase na casa quando voltou-se para Alice e perguntou:

— Edward estava falando de mim, não é?

Os cabelos negros, que realçavam os olhos azuis-escuros, emolduravam o rosto muito pálido e a voz soava trêmula.

— Estava...

— Não precisa suavizar o que ele pensa — murmurou Isabella. — Conheço-o desde que nos tornamos amigas na escola, lembra?

— Sim, claro.

— Jamais gostou de mim, mesmo antes de eu me casar com o primo de vocês...

Isabella não mencionou como sabia disso, nem que Edward a empurrara para um casamento que não desejava.

— Edward não gosta de compromissos — contemporizou Alice.

— Ele ficou muito marcado por causa da mãe de vocês, não? — perguntou Isabella, que conhecia a infância deles através de Alice.

— Marcou, mesmo. Por causa disso, é contra tudo e con tra todos na vida, não se apega a ninguém. Uma época, antes de seu casamento, pensei que estivesse interessado em você... — Alice suspirou. — Ele reage com tanta vio lência a tudo que se refere a você! Estranho, não?

A expressão impassível de Isabella não revelou o que pensava: fora obrigada a aprender a esconder os sentimentos, porque James usava qualquer indício de fraqueza. Logo no início do casamento ela cometera o erro de falar sobre Edward e naquela noite James bebera muito, batera nela. Desde en tão, passara a esconder o que sentia.

-Isto vai terminar logo — consolou-a Alice.

— Quem sabe...

-Por que a Tina fez tanta questão de ler o testamento tão depressa?

— Porque tem certeza que James vai deixar tudo para ela, inclusive a casa — foi a calma resposta de Isabella. — Sabe como se opôs ao nosso casamento e assim que se tornar única herdeira, vai me pôr na rua. É de se esperar que James não me deixe nada: ele me dava cem dólares por semana para as despesas da casa, com as contas e tudo.

Só então Alice reparou que o vestido de Isabella estava fora de moda e bem usado.

— Minhas roupas são as que tinha antes de casar — explicou ela, entendendo o olhar. — Mas isso nunca me importou.

Alice não pôde deixar de pensar que Tina, mãe de James e sua tia, usava um vestido de grifes última moda, e dirigia um Lincoln do ano.

— Por que ele a tratava assim? — indagou, curiosa,

— Tinha suas razões — sorriu Isabella, com tristeza. — Não ligo para o dinheiro. Sei datilografia, sou formada em sociologia. Vou sobreviver.

— Mas o James deve ter lhe deixado alguma coisa!

— Ele me odiava, você não sabe? Estava acostumado a ter as mulheres aos seus pés e não suportava ser a segunda opção de alguém — disse Isabella. enigmaticamente. — Pelo menos não terei mais medo e estou tão envergonhada!

— Por quê?

— Por causa do alívio que sinto. Está acabado, final mente!

Alice queria saber mais, porém se conteve, depois Isabella lhe contaria. James fizera tudo para mantê-las separa das, porque não queria ninguém perto da esposa, nem mes mo outras mulheres. A princípio pensara que se tratava de um amor obsessivo, mas aos poucos entendera que era algo bem mais terrível.

— Vai ser bom não ter de fugir para almoçarmos juntas, de vez em quando — comentou, apertando a mão da amiga.

— Você disse ao Edward que tínhamos de nos encontrar assim? — perguntou Isabella, preocupada.

— Não. Edward não admite que se fale em você.

— Entendo...

— Mas eu não entendo — rebateu Alice — e tenho vergonha do modo como ele agiu!

— Ele gostava do primo.

— Acho que sim, mas nem tentou ver o seu lado! James agia de modo estranho quando havia outros homens perto de vocês... torna-se agressivo, briguento. Mas não com o Edward. Ninguém faz isso com ele, sem pagar caro.

— Sim, eu sei.

A limusine parou e o motorista saltou para abrir a porta.

— Obrigada, Henry — agradeceu Isabella.

— As ordens, Sra. Cullen.

Henry estava na casa dos cinqüenta e fora a salvação de Isabella desde que começara a trabalhar para James, há seis meses.

Ao entrarem. Alice não viu nenhum criado, coisa estra nha numa casa de oito quartos com banheiros e demais dependências.

— James despediu todo o pessoal, exceto Henry — explicou Isabella, tirando o véu, percebendo a surpresa de Alice. — Quis despedi-lo também, mas o convenci que ele precisava do motorista. Sente-se aí, eu vou fazer um café.

-Nada disso, eu faço e você descansa. Conseguiu dormir esta noite?

-Os pesadelos não paravam... — murmurou Isabella, sacudindo os ombros.

-O médico não lhe deu nenhum calmante?

-Não gosto de ficar sem controle — Isabella sentou-se.

-Tem certeza de que não quer que eu...

A porta da frente foi aberta e fechada. Ninguém batera e apenas uma pessoa poderia agir assim. Isabella não ergueu os olhos quando Edward entrou, soltando a gravata. Dessa vez não estava com o chapéu Stetson, nem com as botas que usava o tempo todo. Assumia um outro tipo de elegância com aquele terno caro.

— Eu ia fazer café — disse Alice com um olhar de advertência para o irmão. — Você quer?

— Claro. E uns biscoitos também. Não tomei o café da manha.

— Vou ver o que encontro.

Alice achava estranho ninguém ter aparecido para trazer comida: era uma tradição nas áreas rurais e estavam em Jacobsville, Texas.

Mas Edward não era delicado como a irmã.

— Por que ninguém trouxe comida? — perguntou, sen tando-se na grande poltrona diante de Isabella. — Seus vizinhos também acham que você o matou?

Isabella engoliu seco e ergueu os olhos para ele:

— Não temos vizinhos próximos, nem amigos. James não queria ninguém por perto.

— E você não queria James por perto. Ele me contou tudo, Isabella. Tudo.

Ela podia imaginar o que James contara; gostava de fazer as pessoas pensarem que era frígida, intratável. Fechou os olhos e esfregou a testa, onde se formava uma dor de cabeça.

— Você não tem que cuidar do rancho, Edward? — tentou reagir, apesar do cansaço.

— Meu primo predileto está morto — respondeu ele, frio — e vim para o funeral.

— O funeral já acabou.

— E você está quatro milhões mais rica, pelo menos até o testamento ser lido — atacou ele. — Tina vem vindo.

— Sem dúvida, devidamente apressada por você.

— Não foi preciso — ironizou Edward.

A dor e o tormento dos últimos dois anos a consumiam como ácido e Isabella sussurrou, rouca:

— Não, claro que não.

Levantou-se, elegante no vestido negro, um pouco solto no corpo esguio. Esguio demais. Ele não esperava que es tivesse abatida, pois sabia que Isabella não amava James e que não lamentava sua morte.

— Eu não matei James — murmurou ela, em frágil defesa. Ele também se levantou:

— Deixou que ele pegasse o carro e dirigisse, completamente bêbado. Cresci em Jacobsville, aliás, Alice e eu voltamos para cá. Conheço a maioria das pessoas daqui e todos falam na morte de James... Vocês estavam numa festa e a certa altura ele quis voltar para casa, mas você se recusou a ir; então, ele saiu sozinho e o carro caiu da ponte.

Era assim que contavam a história! Isabella olhou-o, ca lada. Alice não contara que estavam mudando para Jacobsville. Como poderia morar na mesma cidade que ele?

— Não vai se defender? — espicaçou Edward. — Não tem nenhuma desculpa?

— Por que me dar ao trabalho? Você não vai acreditar mesmo.

— É verdade...

Vinham barulhos da cozinha: era Alice, lembrando-os que estava lá. Cada vez mais tensa, Isabella juntou as mãos para impedir que tremessem.

O olhar acusador dele doía quando Edward voltou a falar:

-James me escreveu há duas semanas. Disse que tinha mudado o testamento e que eu estava nele. Você sabia? — Não, ela só sabia que James mudara o testamento. — Tina também deve estar.

Isabella estava cansada. Cansada do pesadelo que vinha vivendo, cansada das provocações de Edward. Ajeitou os ca belos com um suspiro.

— Suma, Edward. Por favor...

De súbito uma dolorosa tensão tomou-lhe todo corpo, as lágrimas formaram-se e ameaçavam explodir. Virou-se para que ele não as visse, mas tropeçou numa dobra do tapete e viu o chão se aproximando. Edward a segurou, voltou-a e olhou-lhe o rosto pálido. Então, sem uma palavra, passou os braços em volta dela e a abraçou com gentileza, sem paixão.

— Como conseguiu fazer isso? — perguntou, como se ela tivesse planejado o tropeção.

O que não era fato: as lágrimas desceram e ela se defendeu:

— Não fingi tropeçar para que você me abraçasse, se é o que pensa! Não quero nada de você!

— Nem o meu amor? Uma vez você implorou por ele...

Ela tremeu. Essa lembrança, como tantas outras dos úl timos dois anos, não era agradável. Tentou se afastar, mas ele não deixou. Estava consciente, até demais, do cheiro do corpo dele, do calor daquele peito musculoso. Edward, pen sou, desesperada. Edward!

Tinha as mãos contraídas, apoiadas no peito dele, e cerrou os dentes quando ele acariciou-lhe as costas de leve, como se relutasse em fazê-lo.

Isabella precisava muito de conforto, mas não o esperava de Edward. Ele era como James, dominador, e ela não era mais a garota que o idolatrava. Agora sabia como os homens eram por trás da aparência civilizada e sentia-se ameaçada por eles. Gemeu quando as mãos dele apertaram-lhe os braços. Edward a machucava sem perceber. Ou percebia e o fazia de propósito, como James?

Ao ouvir o gemido, o controle que Edward pensava ter sumiu por completo.

— Oh, por Deus! — exclamou, abraçando-a com força. O coração de Isabella apertou-se, dolorosamente. Dois anos antes, teria sido o paraíso, mas agora tinha lembranças tristes dele e lembranças amargas, violentas, de James, que a faziam temer qualquer contato físico com um homem.

As lágrimas vieram com força e ela soluçou nos braços de Edward. Chorou por James, a quem nunca amara. Chorou por si mesma, porque o marido a destruíra como mulher.

Alice parou na porta, chocada com a expressão de angústia no rosto do irmão. Ele estava de olhos fechados, o queixo apoiado na cabeça de Isabella. Deu alguns passos atrás e fez barulho antes de tornar a entrar.

— Café! — anunciou, animada, sem olhar direto para ele. Edward soltou Isabella, pegou um lenço e entregou-lhe, sem que ela o olhasse.

— Vejam, encontrei um pacote de biscoitos num armário.— disse Alice, enquanto Edward voltava para a poltrona.

— Tina me disse que vai ficar num hotel... — comentou Edward, em tom casual.

— Convidei-a para ficar aqui, mas ela recusou — Isabella tomou um gole de café.

Ele desviou os olhos para a xícara que a irmã lhe entregou.

— Você devia descansar, Bella — sugeriu Alice. — Vá para o Caribe ou outro lugar.

— Por que não? — ajudou Edward, olhando-a com frieza.

— Você pode pagar.

— Pare com isso! — desesperou-se Isabella.

— Edward, por favor! — pediu Alice.

O som de um carro se aproximando os interrompeu. Ele se levantou e foi até a porta, procurando controlar-se.

-Não posso suportar — desabafou Isabella. — Ele fica me atacando!

-James disse alguma coisa para Edward... — Alice tinha pena da amiga — conversavam a seu respeito, toda vez que ele o procurava.

-Imagino o que James inventou! Eu fui seu bode ex piatório, a desculpa para as coisas terríveis que fazia. Dizia que bebia por minha causa, sabia?

— Ele bebia porque queria! — revoltou-se Alice.

— Você é a única pessoa na cidade que acredita nisso — riu Isabella, amarga, e tomou um gole do café.

Ouviu-se vozes vindas do saguão e ela não falou mais.

— Pensei que o advogado já estaria aqui a essa hora — disse Tina Cullen, em tom irritado, elegantíssima num conjunto Chanel. Olhou para Isabella, fria: — Se fosse você, eu começaria a fazer as malas.

— Já fiz. Não precisei muito tempo.

Outro carro chegou.

— É o advogado — disse Alice, depois de olhar pela janela. Imóvel, Isabella olhava para a poltrona preferida de James, com expressão perdida, pensativa.

Edward a observava. Estava se sentindo culpada, é? Devia mesmo. Esperava que a consciência a torturasse, que nunca mais lhe desse um instante de paz.

Ela sentiu o olhar insistente e o fitou. As mãos dele quase partiram os braços da poltrona para controlar o impulso de violência.

O advogado, um senhor alto e grisalho, rompeu o clima tenso ao entrar e Isabella agradeceu no íntimo: não entendia porque Edward a odiava tanto pela morte de um primo que nem era assim tão próximo. Mas ele sempre a odiara... Fora hostil desde a primeira vez, dois anos antes, quando se vira forçado a ficar perto dela.