Notas do Autor
Nunhum dos personagens me pertence(neste cap), mas sim a Tite Kubo.
Peço desculpa se o conteúdo ofende o leitor, especialmente em termos religiosos, mas lembre-se que é só uma historinha.
Capítulo 1
A Ressurreição do Anti-Cristo
«O que é o coração? Algo que eu possa ver se abrir o teu peito, o teu crânio? Pelo coração, vós morreis. Pergunto-me agora, se eu próprio não terei morrido desse mal. Afinal, houve esse breve instante em que pude compreender o que a honra dele e a mão estendida dela representavam e isso bastou para que toda a minha eterna existência perdesse o sentido e se desvanecesse em cinzas. Eu morri... por causa do coração!»
Numa região a seis quilómetros de Karakura, um véu de cinzas esvoaça pelo zénite azul e límpido. Ele começa a consolidar, lentamente, nalgo que se assemelha á linha humana, branco e leve. As partículas residuais continuam a untar essa linha em camadas sobrepostas. O corpo humano ganha forma, caindo em direcção á terra numa cauda de luz, como uma estrela cadente em pleno dia.
Ulquiorra finalmente colide com o solo a uma velocidade e força atrozes, mas ainda assim, não se fere. Ele senta-se, está atordoado, amnésico e cheio de sensações estranhas. Sente uma dor aguda do lado esquerdo da sua cabeça. Toca-lhe com a mão, os dedos analisando cada centímetro por baixo do cabelo negro. Não parece haver nada de errado, nenhuma ferida, mas... é a sua máscara - desapareceu. Os seus olhos enormes e inexpressivos sobressaltam-se por um momento. A mão pálida desce, instintivamente até ao peito, as unhas brancas sobre os sabugos negros pressionando o seu centro. Sente-a, bem firme, a carne onde deveria estar o seu "hollow". As imagens da última batalha que travou no seu ciclo anterior vêm-lhe á mente. Reconhece-se como a entidade negra e alada tentando matar um humano meio shinigami que o derrota, após se transformar num hollow. Experimenta, vinculada com a sua característica impassibilidade, a confusão, a incerteza, o desamparo. Não pode compreender o que lhe está a acontecer. Um sono opressor apodera-se dele, a fraqueza, a fome é descomunal e o frio faz tremer o seu corpo nu. Ouve a voz da sua própria consciência dizendo-lhe que só há uma forma de desfazer a incoerência em a sua natureza se tornou. Aquele shinigami distorceu a ordem pela qual o destino deveria ter fluído, pensa Ulquiorra, de acordo com a sua mente computacional. Devia ter destruído o shinigami, ou o shinigami tê-lo destruído a ele, mas aconteceu qualquer coisa, qualquer coisa que ainda não pode compreender exactamente o que foi. Aqueles humanos vagunçaram tudo. Agora, há muito que reparar.
Dá-se uma pequena oscilação nas partículas espirituais em redor. Algo se aproxima, fica atento. Ouve uma voz:
― Olha só, está ali um louco todo nu. Vai-te vestir, ó palerma.
Ulquiorra gira maquinalmente a sua cabeça numa morosidade ameaçadora. São dois humanos, a uns metros de distância de si, cujos rostos sarcásticos se tornam puro terror ao ver o seu olhar insanamente inexpressivo e, no entanto, dotados de um brilho predatório. Põe-se de pé, virado para eles, num segundo parado, no segundo seguinte lançado num trejeito sobre-humano. A sua mão perfura o peito de um deles, arrancando-lhe o coração. Deixa que o órgão dê a última batida, observando-o atentamente, depois abocanha-o, desfá-lo em pedaços com os dentes, come-o com voracidade. O outro humano assiste com horror demais para puder fugir ou gritar, apenas treme espasmodicamente. Ulquiorra engole o último pedaço e chupa os seus dedos cobertos de sangue. Ainda tem fome. Mira o seu espectador. Pode ouvir o coração dele batendo como um tambor, descompassado. É sem dúvida um coração cheio de desespero. A luxúria inflama-se no seu olhar assassino e nos lábios negros tumescidos de gula. Ao vê-lo avançar para si, o homem ganha finalmente forças para correr, no entanto, Ulquiorra logo o alcança, com os seus poderosos braços envolvendo-lhe a cabeça, torce-lhe o pescoço. Já não ouve um único som vindo do corpo tombado, abre-lhe o peito, um coração suculento, recheado de medo... é delicioso. Despe o sobretudo do morto e veste-o. Começa a caminhar.
Rukia entra de rompante na casa de banho.
― Vamos, Ichigo, abriu-se uma garganta aqui perto.
― ÁÁááááá! Rukia, não podes esperar que eu acabe de fazer o que eu estou a fazer? Do lado de fora, de preferência?
Rukia pára então para pensar. Repara em Ichigo, sentado na sanita. As suas faces coram, se de embaraço ou de irritação, ele não tem como saber, mas a verdade é que ela não retrocede.
― É claro que não posso esperar, há almas em perigo, levanta-te daí.
E com isto ela sai a correr. Ichigo chama Kon num berro. Kon encara-o estupefacto.
― Hã? Ichigo, que situação tão inconveniente para me chama...ha, guf, glock...
Ichigo agarra no boneco de peluche, saca a pílula de dentro dele e engole-a, por sua vez. O shinigami separa-se do seu corpo agora entregue a Kon.
― Kon, preciso que acabes o serviço por mim, e no fim vai tomar banho e depois vai comer que eu estou com fome.
― Mas porque é que eu tenho sempre que fazer o trabalho sujo?
― Porque se tu não o fizeres, mais ninguém o poderá fazer, visto que a Rukia hoje acordou maldisposta e eu tenho trabalho á espera.
Ulquiorra continua a caminhar pelas ruas, chamando a atenção pelo seu estranho aspecto físico e por estar apenas vestido com um sobretudo preto manchado de sangue. Mas ele não repara nisso, não repara no que a lixeira colectiva que é a humanidade em si faz ou deixa de fazer. Então ele pára. As suas pequenas narinas aquilinas dilatam-se em contacto com um cheiro familiar. Cheira a coragem. A reiatsu de Ichigo fulmina o céu lá ao longe onde os Grande Menos caminham. Encontrou o seu alvo.
Ichigo vem a subir as escadas para o seu quarto, aliviado por poder finalmente descansar e por Kon ter feito tudo o que lhe havia pedido.
― O Kon até é bem atinado, de vez em quando. Se calhar a Rukia exagera um bocado com ele. (a Rukia? só a Rukia? fala a sério, Ichigo.) ― ele abre a porta do quarto, sempre com a cabeça baixa no seu jeito desleixado. ― Tenho de pedir ao Ishida que lhe costure a... hã? ― ele sente uma rajada de vento, olha para a frente. ― Áááááááááááááá!
O ser pousado no parapeito da sua janela parece ter renascido dos seus piores pesadelos. Os cabelos de Ulquiorra esvoaçam como nuvens negras sobre a pele pálida. A expressão do seu olhar é a mesma, mas o brilho que o habita é algo que Ichigo nunca viu, nem tão pouco pode compreender a sua natureza.
― Não grites, shinigami. Não sejas tolo. Não te distraias. Vim para acabar o que comecei!
