O Corpo

A noite já se fazia, quando os olhos dele pousou sobre aquele corpo corrompido pelo gozo, via-se a feição de satisfação nos olhos serrados de ambas as partes. Entretanto, o corpo era o que mais chamava atenção naquele quarto, luzes baixas, iluminando parcialmente, causando um efeito de penumbra, as paredes também possuíam aquela impressão, juntamente ao seu tom de cinza e bem no meio estava à cama em completa desordem.
Nem o brilho do lençol de seda preta era capaz de ofuscar o brilho, a beleza, a "radiação" que exalava daquela pele branca, pálida e macia que ali foi posta, que contornos eram aqueles? Tão perfeitos, com pequenos e arrebitados seios, com longos e lisos cabelos ruivos, com olhos de um castanho intenso, tudo montando uma primorosa alegoria, uma escultura renascentista, uma obra de Michelangelo, obra essa que ele observava sem se cansar.
Perguntava a si mesmo se tudo não passou de um sonho, de um de seus muitos delírios, ou um deles tornou-se mesmo real, por mais que quisesse não conseguia crer que por meros minutos havia possuído seu objeto de desejo, as cenas reprisavam incessavelmente, via sua boca percorrer o corpo que tanto quis, suas mãos prendendo-o com força desigual, o prazer tomando conta de sua mente, ainda conseguia sentir o tremor causado pela ocasião, seus pensamentos todos concentrados apenas no ato ali realizado, tudo condensado no gozo final, no pecado carnal, no absurdo de seus corpos tornarem um só.
Tudo isso em sua cabeça, enquanto o corpo repousava, então em um súbito, sentou-se á beira da cama e com as pontas dos dedos começou a percorrer lentamente o que a pouco havia sido seu, passeava sob aquela pele que agora conhecia, aquele era um passei de satisfação, não pretendia acorda-lá, apenas acaricia-lá, tê-lá como sua mesmo que em sono, apreciando sua carne, sua presa até que se rendam há algo, como uma nova batalha que leve a uma guerra onde outro adormecerá.
E tudo se silencia, fica apenas a cena de castanhos intensos mergulhados em azuis acinzentados.