Título – Diário de um Anjo
Autor – Maylene (Maylene Angel)
Descrição – Ficção constituída por 5 Capítulos
Atenção – Esta ficção está escrita sob a forma de Diário e dá a conhecer uma visão diferente do mundo em que vivemos. Várias crenças e o tema da religião estão aqui abordados de uma forma violenta. Uma visão do nosso mundo, revelando vários aspectos negativos e ao mesmo tempo o melhor de tudo isso…
Espero que apreciem esta utopia.
1ª Entrada – Anjo das Nuvens
Ainda era um anjo muito novo quando me fascinei pelo mundo obscuro inferior ao meu, aquele mundo corrupto que os humanos governam. Um lugar cheio de mortes, dor, tristeza e maldade, um mundo a que eu não pertencia pois a grande diferença que me separava daqueles seres era o facto de estarem condenados à morte e eu à vida. Eu era um anjo repleto de luz e eles de escuridão.
Que tristes criaturas efémeras, caminhando pelo mundo que elas próprias construíam para acabarem bem lá no fundo do inferno… Era a este lugar que todos os humanos pertencem e nem podia acreditar quando me apercebi que uma grande maioria deles passava anos a rezar, a tentarem conquistar um lugar que não lhes pertencia e que nunca lhes pertencerá, pois as preces não pagam as maldades que cometem quando não estão a rezar. De certa forma até achava piada às diversas formas como esses seres insignificantes oravam para um entidade que eles próprios desconheciam, um ser sobrenatural que nunca existiu, apenas ganhava forma na mente deles e mesmo que lhes perguntássemos qual era o seu aspecto nem a isso sabiam responder.
Mas eu vivia bem afastado desse mundo, vivia num lugar aonde eles nunca poderiam pertencer, onde nunca poderiam ascender… Não era o único anjo e nunca o serei, como eu há imensos seres resplandecentes. Anjos – seres brancos, com asas. Alguns vestem longas vestes brancas e douradas, outros optam por não se vestirem; alguns são loiros, outros morenos mas todos nós temos olhos azuis cintilantes. A personalidade não se diferencia muito de anjo para anjo mas há sempre uns que são mais amorosos que outros. Vivemos eternamente e não nos queixamos da vida que temos, ela não podia ser mais perfeita. As nuvens abrigam-nos, o céu ilumina-nos e não conhecemos o significado da noite, essa coisa linda na minha opinião, que os humanos têm e nós não. Nós nunca dormimos, nem os olhos fechamos, sempre atarefados a percorrer as diferentes partes do universo e a fazermos as missões que nos são confiadas.
Eu era demasiado novo para participar nessas andanças que esgotam os outros como eu. Ficava então a observar esse planeta azul e verde, esses continentes, esses oceanos e esses seres amaldiçoados.
Foi então que entre eles descobrir algo me despertou a atenção. Um dos condenados que vagueava pela terra, um infeliz que caminhava abandonado entre as multidões que nem se apercebia da sua presença. Um estranho sem destino, sem presente, sem futuro, envolto em escuridão. Curioso olhei novamente, era tão estranho… em nada se parecia comigo, aqueles olhos cheios de ódio, uns lábios grossos, gretados sem um mínimo sorriso capaz de confortar corações, as roupas de cores que eu nunca tinha visto todas rasgadas e imundas, os cabelos de duas tonalidades, cinzento e azul escuro que esvoaçava ao vento e uma coisa estranha que trazia na cara, parecia que tinha sido marcado por alguém, duas marcas bem definidas na sua face. Mas uma coisa perturbava-me, o seu aspecto era muito diferente do meu, aquele ser era forte, musculado e alto.
Disseram-me que os seres humanos diferenciam-se uns dos outros pelo que chamavam de sexo, uns eram homens e outros eram mulheres. Os homens eram os que tinham a postura mais rectilínea e robusta enquanto as mulheres era bem mais delicadas e com um corpo fino, definido por diversas curvas e as portadoras da maternidade que impedia que a sua espécie terminasse.
Nós, os anjos, não nos diferenciamos pelo sexo, somos todos iguais, uns apenas são mais altos que outros, uns são mais delicados, outros mais fortes mas todos temos os mesmos trabalhos para fazer.
Esse ser que me despertara a atenção devia ser portanto um homem, mas seria também um rapaz? Aparentava ser ainda bastante novo, pois apesar da sua face ostentar imenso sofrimento era ainda a face de uma criança como eu. Foi-me explicado que não era bem assim! Os anjos levam muito tempo a crescer porque são eternos, ao contrário dos humanos que são obrigados a desenvolverem-se depressa pois estão condenados à morte.
Tantos dias passei a olhar para aquele estranho mundo, a desejar compreendê-lo, a ansiar conhecê-lo e aquele rapaz… ai como eu desejava tirar-lhe aquela expressão de tristeza.
Chegou o dia em que me foi confiada a minha primeira missão como anjo e por incrível que pareça, era uma missão bastante difícil de realizar, muitos tinham-na rejeitado e outros nem queriam ouvir falar nela. Mas foi com curiosidade que o nosso anjo ancião me explicou que teria de ir ao mundo dos humanos buscar um objecto sagrado que eles possuíam e que tanto o profanavam. "O que é?" – perguntei eu, mas ele apenas me respondeu:
- Saberás assim que o encontrares. Como já reparei que passas imenso tempo a olhar para aquele lugar horrível e uma vez que mais nenhum de nós quer lá ir, pensei que talvez tu conseguisses realizar esta missão.
- É claro que gostaria muito, assim poderia conhecer aquele mundo, sempre foi o meu desejo, não é pecado pois não?
- Não meu pequeno anjo. Nós não conhecemos a palavra pecado, não está na nossa natureza. Podes ir realizar o teu sonho, nós também sonhamos e esses sonhos integram-se no nosso conhecimento, no entanto terás de obedecer a algumas regras rígidas…
As regras eram de facto muito estranhas mas nada difícil de compreender. Para mim não havia qualquer problema. Muitos aspectos não percebia. Resumindo… elas mandavam-me que não me misturasse com os humanos, tinha de permanecer puro, limpo, com a minha divina sanidade e a última proibia-me de alguma vez tocar um daqueles seres mais do que um simples toque na pele. Ele disse-me para eu evitar beijar alguém, pois isso significaria o meu fim. Acabar-se-ia a minha luz, o meu lugar nas nuvens seria perdido e eu estaria condenado ao inferno, tal como esses seres que tanta curiosidade me despertava. Isso não! Perder o meu lugar divino e cair no mundo obscuro estava fora de questão. Estava pronto a recusar a proposta mas a minha curiosidade falou alto de mais. Também essa coisa do beijo ou do toque maior que o normal não era nada muito mau. Eu não sabia o que isso significava e também não me interessava. Só uma coisa me incomodava, era aquilo que eu buscava!
