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Retratações: Nada me pertence além deste enredo.
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Desafio Gundam Wing 2010 – Amores Possíveis
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Fanfic: Futile Resistance
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Gênero: Yaoi, Romance, Comédia, Ficção Científicai, Angústia Leve, Universo Alternativo
Casal: 6x2
Censura: M – NC-17
Avisos: Essa fic foi escrita a pedido de uma pessoa especial.
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Capítulo 1
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A primeira coisa que eu senti foi que minha cabeça doía. Infernalmente. Insuportavelmente. Eu realmente não sabia se ela estava intacta, por isso, corri os dedos pela testa, de forma hesitante; não queria correr o risco de acabar enfiando o dedo em algum buraco ou machucado que pudesse ter por ali. A dor era tanta que parecia que tinham espatifado meu crânio em vinte pedaços e brincado de quebra-cabeças, colando-os com fita adesiva de volta no local de origem.
É, esse tipo de dor.
Insuportável.
Mesmo com o incômodo – tortura, eu diria – resolvi abrir os olhos. Eu não tinha idéia do que ocorrera para estar naquele estado. Na verdade, eu não me lembrava do que fizera na noite anterior, mas devo ter fumado a pior erva da minha vida. Eu tinha prometido pros meus pais que iria parar e, depois dessa dor filha da mãe, eu com certeza pretendia. Posso gostar da onda e tudo o mais, mas masoquismo não entra no meu vocabulário. Sacrifício pelo prazer não era a minha praia.
Mas o problema maior não era a dor. Era notar que aquele lugar não era o meu quarto.
Meu sangue gelou. Será que eu havia dormido na rua e algum louco tarado me raptou? Ou será que meus pais haviam se cansado e me colocado numa clínica de recuperação?
Eu esperava que fosse a primeira opção. Antes um tarado do que um bando de psicólogo retardado com sermão sobre como drogas fazem mal pra saúde. Blábláblá. Como se eu já não soubesse. E não sou um viciado, eu só fumo – fumava, no passado, a partir deste momento – por diversão. Nada que comprometesse a minha saúde. Pais são realmente neuróticos, Meu Deus.
O lugar era... estranho. Nada que eu já tenha visitado antes, pelo menos; e olha que minha família é podre de rica! Mas aquele lugar... aquelas paredes de uma textura que eu nunca vi na vida, num tom estranho de verde; aquelas luzes quase fluorescentes eram algo que me deixaram bastante surpreso. E os lençóis! Que bosta de tecido era aquele? Parecia água ou sei lá. Era tão suave que quando você pegava, ele parecia escorrer pelos dedos. Isso sim é luxo, meu irmão!
Tentei me levantar, soltando um gemido e segurando a cabeça. O que infernos eu havia feito ontem? Eu não conseguia me lembrar de nada, absolutamente nada do dia anterior. A coisa estava feia para o meu lado e eu não podia dizer que não estava assustado.
Para meu assombro total, a porta – que tecnologia era aquela, Jesus! – se abriu de cima pra baixo. Sim! A porta simplesmente se abaixou e entrou no chão! Meu cacete, será que eu havia batido a cabeça e pirado? Ou misturaram alguma bosta na erva? Não sei o que aconteceu, mas que Jesus me espancasse, eu acho que só não me mijei porque o que surgiu na porta não foi um tarado, como eu imaginava, mas uma mulher. Psicóloga? Ah, não. Não, não, não. Isso não.
– Maxwell? – Ela perguntou, fazendo minha cabeça latejar e um novo gemido deixar meus lábios.
– Doutora? Antes do sermão, você poderia me dar algo para a cabeça? Eu juro que tento ser legal e ouvir tudo sem dar um pio. – Resmunguei, não querendo piorar a minha situação.
Vi a mulher esquisita franzir o cenho em confusão, e quis perguntar o que havia de errado com ela.
– Maxwell, eu não sou 'Doutora'. Sou a Coronel Une e eu estou aqui para lhe prestar assistência em nome do Príncipe Peacecraft.
É, aquilo era uma bad trip. Uma das piores que eu já havia tido na vida, porque nunca, nunquinha, eu tinha alucinado assim. Ou, talvez, o lugar era um hospício e a mulher fosse alguma interna pirada. Mas, querendo ou não, ela não tinha cara de louca. Nem roupa de louca. Ela estava realmente vestida como militar, e tinha cara de militar. Daquelas bem mal comidas, na minha humilde opinião.
– Olha, eu aprendi na escola que monarquia é uma coisa praticamente extinta na Terra, sabe como é, dona Une. A menos que eu tenha me teletransportado para a Europa, não faço idéia de quem possa ser esse cara. Ele não é 'príncipe' do trafico, é? – Eu tive que perguntar. Vai saber onde meus amigos me enfiaram, eu não podia manchar a imagem do meu pai me envolvendo com criminosos!
A mulher fez uma cara tão horrorizada que eu quase temi pela minha vida.
– Trafico! Você não está na Terra, garoto estúpido! Você está em E'pyon! – Ela gritou e minha cabeça protestou. Acho que foi por isso que demorou alguns segundos pra que processasse o que ela tinha dito.
– Eu estou em quem?!
– E'pyon não é alguém. Você está em outro planeta. Não lhe foi explicado o seu destino? – Ela respondeu, cheia de arrogância. Argh, não gostei dessa mulher. Além de ser chata, é maluca. E'pyon! Hah, muito bom. Outro planeta. Claro.
– Tia, olha só, eu posso parecer idiota, mas eu realmente não sou. Não sei de que destino você está falando, mas eu sei que não existe planeta nenhum com esse nome ridículo.
Ela ficou em silêncio por alguns segundos, algo que minha cabeça agradeceu com todas as forças. Por mim, ela podia ficar com aquela boca fechada pro resto da vida.
Mas nem tudo é perfeito.
– Não lhe disseram nada. – Ela afirmou numa voz estranha, e eu pude ver algo semelhante à pena nos olhos dela. Deve ter sido aquela luz estranha pregando peças em mim.
Sem mais nada a dizer, a mulher chata saiu do quarto, e a porta subiu e fechou. Eu quase poderia acreditar que estava em outro planeta só por aquela tecnologia, mas, por favor, eu não sou burro. Não tenho mais doze anos.
Voltei a me deitar, olhando para o teto e rezando para a dor nojenta passar e aquela bad trip terminar. Eu nunca mais fumo, juro. Essa onda não está sendo agradável, nem um pouco, e eu estou começando a realmente ficar com medo. E se eu ficar preso na minha cabeça pra sempre? Tipo aqueles retardados vegetativos depois de overdoses, que ficam babando e falando coisa sem sentido?
Duo Maxwell, menos. É só maconha, não heroína ou pó. Maconha é inofensiva, você não vai ficar débil mental por causa dela. É. Não vai.
É o que eu espero.
A porta voltou a se abrir depois de alguns poucos minutos e a Une chata voltou, com algo que lembrava uma seringa na mão. Aquilo sim foi o suficiente para me levantar em total alarme. O que aquela louca pretendia fazer?
– Hey, o que...
Sem me dar tempo de terminar, ela segurou minha cabeça com força e afastou a minha trança, aplicando a coisa no meu pescoço e me soltando em seguida. Ótimo. Eu estava sendo drogado por uma maluca! Deus do céu, por que diabos...
A dor passou. Simplesmente sumiu, desapareceu. Não existia mais.
Eu olhei pra Une, expressando todo o meu espanto, e ela simplesmente ergueu uma sobrancelha arrogante, como se para demonstrar sua superioridade. Mulher nojenta! Depois me perguntam por que eu sou gay!
É, eu prefiro um macho, daqueles caladões e sexy, daqueles que te olham de cima a baixo com aquela expressão de 'vou te comer' e te jogam na parede e... bem, deixa pra lá. O fato é: eu não gosto de mulheres. Meus amigos costumam fazer graça disso, mas nada ofensivo. Acho que eles simplesmente não entendem, apesar de respeitarem – e fazerem perguntas cretinas, claro – e aceitarem. Sei que isso é raro, por isso sou bastante devotado a eles. Meus amigos são quase como família, sabe? Meus irmãos mesmo.
– Agora que se sente melhor, vou te levar para ser banhado e vestido decentemente. Vossa Majestade vai lhe dar a honra de ele mesmo explicar a sua situação, já que os humanos inúteis não foram capazes de fazê-lo. – Eu senti uma nota de desgosto, nojo mesmo, na voz dela ao falar dos humanos. Que ridículo! Ela realmente acha que eu estou acreditando nessa história de planeta alien? Porque, pra mim, essa Une bem louca não me parece menos humana que qualquer outra mulher.
– Eu não vou a lugar nenhum! Eu nem sei onde estou! – Protestei, olhando-a enfezado. Odeio quando me subestimam.
– Você não tem dizeres aqui. Você só obedece ordens.
Dito isso, ela me segurou pela gola da camisa e me levantou, sem esforço algum. Ok, eu sou um garoto pequeno e leve, mas... ela é uma mulher! Foi só então que eu percebi o quanto Une era alta. E o quão estranhos eram os seus olhos. E a sua pele... sua orelhas, seu nariz. Deus, ela era uma ET! Jesus, Maria e José, onde infernos eu estou?
Os olhos dela pareciam olhos de cobra. Aquelas coisas bem esquisitas, com umas íris enormes, e as pupilas verticais assustadoras. A pele dela também lembrava escamas de cobra, só que mais discretas e suaves, e suas orelhas... bem, eram minúsculas. O nariz, apesar de não ser tão diferente do humano, era levemente mais achatado, mas não chegava a ser feio, só estranho.
Juntando isso com a forma que ela se movia – bem parecido com uma cobra mesmo – eu podia afirmar que aquela Une era uma descendente legítima de jararaca.
– Me solta! – Exigi, me debatendo mesmo com a certeza de que não seria uma decisão sábia.
– Não quero usar força contra você, Maxwell. O Príncipe não vai ficar feliz, então, se comporte ou você vai se machucar.
Eu havia sido abduzido! Igual naquelas histórias loucas de sci-fi. Fui abduzido para alguma nave alien e estava sendo ameaçado por uma militar alien, que pretendia me levar para um príncipe alien. Oh Deus, eu realmente espero que isso seja só uma bad trip... ou um sonho. Um sonho seria melhor.
Eu parei de me debater, de verdade. Porque, se ela já conseguia me levantar e me carregar com uma mão só, imagine se resolvesse usar força. Eu não costumo a ser covarde, mas estar nas mãos de um ET fêmea, a qual eu não alcançaria nem o ombro se estivesse em pé, me fez pensar duas vezes antes de tentar ser corajoso. E idiota.
Deixei que ela me levasse, afinal, qual seria a outra opção? Se eu realmente estivesse em um planeta desconhecido ou algo assim, o que eu poderia fazer? Fugir seria estúpido, já que eu não faço idéia de onde esse tal de E'pyon fica. Então, eu só posso esperar que meus pais sintam a minha falta e resolvam me procurar.
O fato era que eles poderiam procurar o mundo inteiro, mas duvido que pensem em me encontrar fora da Terra.
Tal pensamento me deprimiu, fazendo com que eu me sentisse derrotado. Eu nunca ia ser encontrado... só se os ETs resolvessem pedir resgate, o que eu duvidava muito. Com uma tecnologia e um lugar daqueles, eles não pareciam precisar de grana, ainda mais vinda da Terra. Eu estava encrencado de verdade.
Mas, em toda a minha inteligência, só fui começar a perceber os detalhes enquanto estava sendo delicadamente – ironia, claro – carregado por aquela mulher para sabe-se-lá-onde. Tipo o fato de ela entender e falar a minha língua, ou talvez o tal 'destino' a que ela se referia. Isso era bastante estranho e eu estava ficando ainda mais intrigado.
– Hey, dona Une, posso perguntar uma coisa? – Arrisquei, sabendo que curiosidade poderia acabar me ferrando ainda mais. Bem, quem liga. Tá no inferno, abraça o capeta, colega.
– Mais alguma coisa? – Ela respondeu, ríspida, e eu quis me encolher diante do olhar dela. Espero que ela não seja mãe um dia... eu teria pena dos filhotinhos de jararaca dela. Alias, será que os ETs botam ovos? Acho melhor não pensar nisso, meu estômago está começando a protestar pela imagem mental.
– É... bem, como você me entende e eu te entendo? Assim, a língua e tudo o mais.
Ela respirou fundo e eu me segurei para não me debater. Não, sério, essa tal Une é assustadora. Até o Freddy Krueger ia se mijar de medo dela.
– Foi implantado um chip no seu cérebro para facilitar o processo.
Isso explicava muita coisa. A dor de cabeça, por exemplo. Mas não o que eu estava fazendo ali.
– E o que...
– Sem mais perguntas. O príncipe poderá respondê-las se for do agrado dele. – Ela me cortou! Será que aliens não tinham educação? Eu imagino que esse tal príncipe seja um cara tão mal comido quanto essa Une, porque, pelo que eu pude perceber, até a jararaca tinha medo dele!
Que Jesus me protegesse, então. Ou quem sabe São Jorge, afinal, dragão e cobra devem ser parentes. O mais engraçado é que eu nunca fui religioso, sempre achei um porre e uma perda de tempo ir à missa e ouvir blábláblá de padre. Mas, se esses malucos estiverem certos sobre Deus, Jesus e sei lá mais o que, eu talvez tivesse alguma chance de sair daqui se pedisse a ajuda dos caras. Vai saber. Esperança é a última que morre.
Em silêncio, a mulher me carregou por diversos corredores, passando por diversas portas – automáticas! – sem que encontrássemos ninguém pelo caminho. Isso era estranho, mas não questionei; não era como se eu quisesse ver mais ETs na vida, eu já estava satisfeito com a Une e, provavelmente, o tal do príncipe. Eu não tinha escolha mesmo.
Eu soube que havíamos chegado ao destino quando a filha da mãe simplesmente me largou no chão sem aviso algum. Gemi de dor, mas não ousei olhar feio em sua direção; eu não era idiota a esse ponto. Me coloquei de pé, sendo subitamente surpreendido pelo lugar.
Era simplesmente... magnífico. Deixava todas as casas de banho romanas, gregas, árabes e de qualquer outra civilização idosa no chinelo.
As colunas e paredes eram construídas por um material que eu nunca havia visto antes, e a textura era algo que lembrava o mármore, mesmo sendo visivelmente metálica. O tom, de um bege com reflexos dourados, era algo tão fascinante que eu me vi querendo tocar as paredes, mas não o fiz. Cinco diferentes piscinas, maiores que qualquer uma daquelas esportivas, estavam presentes no local, e, ao fazer um sinal estranho com as mãos, que lembrava uma palma, Une 'invocou' ETs.
Aquilo só podia ser invocação, porque o pessoal apareceu exatamente no segundo em que ela fez aquele treco. Impressionante.
Os criados se aproximaram, tentando tirar a minha roupa e me deixando complemente confuso. Eu não queria ser tocado por eles, eu não era uma criança! Mas ninguém disse nada pra mim enquanto me despia, e eu, desesperadamente, tentava afastar as mãos dos aliens e manter as minhas roupas. Eu protestei, tentando me cobrir e fazer com que me deixassem em paz, afinal, poderia tomar meu banho sozinho, mas, sem que eu esperasse, Une surgiu diante de mim e um forte tapa atingiu meu rosto. Acho que só não cai porque um dos ETs me amparou. Meu olhar, incrédulo, se fixou no dela e me retraí diante de sua fúria. Minha bochecha ardia e latejava, e, pela primeira vez, eu realmente senti vontade de chorar.
Fui arrastado, sem mais protestar, para uma das piscinas, notando que a água era... diferente. Um forte cheiro metálico emanava desta, e sua textura era mais densa, algo como chá, e eu me perguntei se aquilo não seria tóxico para um humano como eu. Mas a água era transparente também, para a minha total surpresa. A temperatura era morna, o que me deixou um pouco mais relaxado, mas as mãos que voltaram a me tocar, me banhando, desfazendo a minha trança e lavando os meus cabelos, fizeram com que eu me sentisse quase como uma boneca. Um objeto. As lágrimas começaram a surgir em meus olhos, nublando-os, mas eu me segurei e não as derramei. Não ia ser fraco na frente daqueles... seres.
Fechei os olhos e tentei pensar em outras coisas. Lembrei dos meus amigos, de como Solo costumava a passar o braço pelos meus ombros quando me via triste, e cantarolava alguma música que eu gostava em sua tentativa de me animar. O sorriso dele, sempre carinhoso e charmoso, a forma com que ele cuidava de mim...
Sem que eu notasse, me peguei sussurrando uma das músicas que a gente sempre ouvia. Eu sabia que meus sentimentos por Solo eram mais do que só amizade, mas eu não era estúpido de dizer isso em voz alta. Ele poderia aceitar minha opção sexual, me tratar como um irmão, mas duvido muito que ele correspondesse ao que eu sentia. Solo era um 'lady's man', logo, eu não tinha qualquer chance. Era realmente deprimente saber que eu estava preso em outro planeta, sem sequer ter tido a chance de beijá-lo. Ou beijar qualquer outra pessoa, falando nisso. Eu nunca imaginei que fosse morrer virgem...
E eu tinha certeza que ia morrer, afinal, depois de me banharem, os ETs me vestiram com roupas luxuosas, com tecidos tão maravilhosos quanto os lençóis; roupas dignas de um sacrifício. Meus cabelos foram penteados e secados, deixados soltos, enquanto algumas mechas eram separadas e trançadas, outras decoradas com contas azuladas, da mesma cor da túnica que eu usava.
Eu seria sacrificado a algum deus alien, era certo, estava na cara.
Depois de vestido e – pasmem! – perfumado, Une levantou meu rosto e o analisou. Eu ainda o sentia latejar, então, devia estar bem vermelho, e ela fez uma cara de desgosto para expressar tal fato.
– Livrem-se da marca. Não quero pintura pesada, decore somente os olhos, deixe os lábios intocados. – Ela ordenou, e novamente fui entregue aos cuidados de ETs-criados.
Então, ela queria sumir com a prova de seu crime, não era? Ah, mas eu faria questão de mudar isso e dificultar a vida dela. Eu teria uma vingança, ela ia ver, afinal, eu me lembro muito bem de ouvi-la falar sobre o príncipe não ficar feliz se ela me machucasse. Bem, um sacrifício deve ser entregue sem qualquer marca ao deus, não é mesmo? Eu ia me vingar da jararaca antes de morrer!
Me mandaram fechar os olhos, enquanto pós e coisas geladas eram aplicadas em minha pele. Os pincéis me faziam cócegas, mas eu não conseguia me mover para me livrar deles, o que fazia com que eu me sentisse ainda mais uma boneca. Esses rituais estavam acabando comigo.
Demorou bastante até que terminassem de me pintar, e, depois de o fazerem, para minha total surpresa, uma alien surgiu com um pequeno espelho.
– Olhe e diga se algo o desagrada. – Ela pediu, gentilmente, e eu quase caí para trás quando vi meu reflexo.
Deus do céu! Aquele não podia ser eu! Meus olhos estavam decorados, na parte de baixo, com pequenas marcas negras, que lembravam aquelas pinturas de deuses hindu, adornadas por tons de violeta claro e escuro. A parte de cima estava contornada em negro, tipo daqueles emos, só que alongados de uma forma que me fez lembrar os egípcios, e meu rosto estava num tom de pêssego suave, sem qualquer marca de tapa. Isso tudo porque a jararaca não queria maquiagem pesada, imagina se quisesse! Eu estava parecendo um indiano com crise de identidade, mas... eu gostei. Era um trabalho tão delicado e harmonioso que, apesar de ser maquiagem, não tirava nenhum atributo da minha masculinidade. Olhando naquele espelho, eu não me senti menos homem, ou feminino, eu me senti bonito. Eu queria que Solo pudesse me ver assim...
ET é realmente um bicho inteligente, tenho que admitir. E eles nem eram cabeçudos!
Olhei para a criada e neguei com a cabeça, incapaz de dizer qualquer coisa. Eles realmente deviam valorizar o deus deles para estarem me produzindo tanto.
Une me carregou, com toda a sua delicadeza, para fora do lugar. Caminhamos por diversos corredores, e eu estava começando a ficar tonto com todos aqueles caminhos e portas futuristas. Parecia um labirinto! Sem que a jararaca notasse, porém, eu lambi a palma de uma das mãos, sorrindo enquanto a passava pela bochecha dolorida, retirando o pó com a umidade. Agora era só esperar para ver o que iria acontecer.
Uma das portas, para a minha surpresa, não se abriu, e ETs com roupas semelhantes às de Une guardavam-na. Os dois me olharam de cima a baixo com visível surpresa, e, porque não, admiração. Me senti corar e desviei os olhos. Eu não precisava de aliens tarados me secando, muito obrigado. Minha vida já estava uma bosta sem isso.
Ambos saudaram a Coronel Jararaca e permitiram sua passagem, enquanto ela me carregava consigo e lançava olhares reprovadores pros guardas. Ainda bem. Mas não sei se estava tão feliz assim... afinal, eu ia morrer virgem. Mas eu não queria ser estuprado por ETs muito menos. Mesmo eles sendo atraentes. Ok, bonitões.
Mas o que me fez congelar foi o par de olhos azuis que se prendeu em mim quando nós entramos no lugar. Os longos cabelos loiros, que emolduravam uma face masculina, harmoniosa e, por todos os demônios dos sete infernos, perfeita, eram tão lisos e suaves que me fizeram querer tocá-los. Deus, quem era aquele Adônis? Aquele símbolo de beleza máscula e perfeição? Com certeza, aquele ET era o ser mais bonito que eu já havia visto na vida e isso é dizer alguma coisa.
Senti meu rosto esquentar diante do olhar intenso que ele me dispensava, e eu não sabia se queria sair correndo daqueles olhos, ou na direção deles. Meu corpo inteiro estremeceu quando ele se levantou do lugar em que estava e caminhou em minha direção. Une estava curvada e falava alguma coisa, mas eu não prestava atenção; quem iria prestar atenção nela quando tinha algo como ele para olhar?
Quando o loiro gato chegou perto o suficiente, minhas narinas foram inundadas com o perfume dele. Era forte, masculino, e delicioso. Aliás, ele inteiro era delicioso, naquelas calças brancas – brancas, Deus – apertadas que não deixavam nada para a imaginação, e aquele casaco vermelho sexy que marcava seus ombros largos, me fazendo pensar nos músculos que deviam ter ali embaixo. O loirão era grande; devia ter mais de dois metros de altura, e as pupilas verticais naqueles olhos azuis gélidos, não eram assustadoras, mas sim sedutoras. Que homem era aquele...?
Ele segurou meu rosto com firmeza, me analisando com uma precisão fria e calculista, e para a minha total surpresa, sua língua bifurcada deixou seus lábios, quase como uma cobra, mas de forma vagarosa e sensual, que ele sequer parecia perceber. Eu realmente estava lutando contra uma bela ereção diante daquilo, mas o meu nervosismo foi o suficiente para deixar meu corpo calmo.
– Bela escolha de cores, Une. – Ele disse, e sua voz grossa e profunda me arrepiou.
– Fico feliz que tenha gostado, Majestade.
Antes mesmo de eu poder expressar surpresa por aquele deus ser o príncipe, eu senti um de seus dedos tocar minha bochecha, a que latejava pelo tapa da jararaca. O cenho dele se franziu instantaneamente e eu tive que conter o ímpeto de sorrir. Ele não parecia feliz com aquilo.
– Todavia, eu me lembro de ter dado ordens expressas a respeito de agressões. Eu conheço o tamanho de suas mãos, Coronel. – A voz dele se tornou tão fria que eu estremeci, encolhendo-me sem sequer perceber.
– Ele desobedeceu ordens, Meu Príncipe. – Ela tentou se justificar, mas um tapa tão forte que fez o som reverberar pelo ambiente, atingiu-lhe o rosto, fazendo-a cair em total surpresa.
– Você também. – O loiro constatou, olhando-a impassivelmente.
Ao invés de sentir prazer por ver a jararaca no chão, eu me encolhi de verdade, tremendo de medo. José, padrasto de Jesus, no que eu havia me metido? O cara podia ser lindo, maravilhoso, mas totalmente louco! A minha vontade de correr foi sobreposta pelo travamento causado pelo pânico, ainda mais quando os olhos dele se voltaram para mim, a língua novamente deixando seus lábios enquanto ele me observava.
– Não precisa temer. Você já foi punido pelo seu erro, mesmo que de forma errônea, e eu espero que ele não se repita no futuro. – Aquela voz grossa havia tomado um tom mais ameno, e os dedos dele voltaram a acariciar meu rosto rapidamente.
Une já havia se recuperado, de pé e olhando firmemente para lugar nenhum. Quase senti pena dela; seus cabelos estavam levemente bagunçados, com um rastro imperceptível de sangue no canto de sua boca, assim como um vermelho enorme marcava seu rosto. Mesmo assim, ela ainda se mantinha digna e orgulhosa. Eu queria saber fazer isso, porque eu estava sentindo que ia regredir à infância e precisar de fraudas se ficasse ali por muito tempo.
– Dispensada, Une. – O príncipe declarou, e ela simplesmente fez uma mesura e saiu, sem aparentar nada da dor que devia estar sentindo.
Eu queria que ela voltasse, juro. Perto dele, ela era uma cobra doméstica e carinhosa. Deus, eu não queria ficar perto daquele homem... Eu não sabia do que ele era capaz, nem o que queria comigo. A afirmação do 'não se repita no futuro' sobre o meu erro me fez crer que eu não seria sacrificado.
O loiro me guiou, segurando minha mão entre a dele, que a cobriu totalmente, me deixando bastante consciente do quanto ele era maior e mais poderoso do que eu. Sinalizando para que eu me sentasse em uma grande almofada dourada – algo que fiz imediatamente – o príncipe se sentou ao meu lado. Notei que a mesa a frente estava repleta de travessas com coisas esquisitas dentro, e suspeitei que aquilo se tratasse de comida.
– Sente fome? – Ele perguntou e, por mais que eu quisesse dar alguma resposta, eu só consegui negar com a cabeça. Meu estômago estava completamente revoltado, e se eu comesse, com certeza vomitaria. – Entendo. Bem, não há porque prolongar suas dúvidas. Tenho certeza de que quer saber por que está aqui.
Eu o olhei, atento, e assenti, me sentindo estúpido por não encontrar a minha voz para lhe dizer nada.
– Eu o observei, Duo Maxwell. Por um mês inteiro, eu o observei. Você não é como os outros humanos e isso me chamou a atenção.
Aquelas afirmações me deixaram ainda mais assustado. O cara era um stalker? O que ele tinha 'observado' pra não me achar normal? E o pior: como ele tinha me observado?
Parecendo ler meus pensamentos, um minúsculo sorriso se contornou nos lábios dele, me fazendo estremecer, sem saber se era por medo ou... outra coisa.
– Nossa tecnologia é avançada, Duo Maxwell. Eu posso encontrar qualquer coisa, qualquer imagem, simplesmente por um estereótipo. Eu queria encontrar alguém com características semelhantes às suas, e te encontrei. – O sorriso se alargou, e eu achei que fosse vomitar. Ele podia ser lindo, mas era assustador. – Seu pai não quis te entregar a princípio, mas eu sei insistir.
Foi então que eu senti o ar ficar preso em minha garganta. Meu pai...? Meu pai me entregou? O que aquele alien estava tentando me dizer? O que ele queria com alguém com as minhas características? Minha cabeça girava em torno daquelas perguntas, me deixando confuso e em um estado quase letárgico de desespero. Deus, o que eu estava fazendo ali?
– Seu pai te deu a mim para evitar que eu destruísse o seu planeta medíocre. Você agora é meu escravo.
Meu peito se contraiu em agonia, um bolo se formou em minha garganta. Eu não sabia o que pensar. Meu pai não faria aquilo! Ele podia não gostar muito de mim por eu ser problemático, mas ele não me daria pra um ET! Nem que... nem que isso significasse manter a paz mundial. Eu tinha que acreditar naquilo, eu tinha que me agarrar naquela esperança, mesmo sabendo que meu pai daria a própria vida pela paz mundial. Era o que ele sempre trabalhara para manter, era o objetivo, a missão dele. E ele sacrificaria tudo por isso. Até a minha vida.
As lágrimas molharam meu rosto, escorrendo sem qualquer autorização – sem que eu sequer notasse – e borrando toda a maquiagem que haviam feito em mim. Um soluço desesperado deixou meus olhos, enquanto eu sacudia a cabeça em uma negativa veemente. Eu não poderia acreditar naquilo, não poderia, não conseguiria!
– Você está mentindo! – Bradei, olhando-o com fúria e desespero.
Ele inclinou a cabeça, como que confuso, e estalou os dedos, fazendo com um holograma estranho aparecesse diante de nós. Ele tocou a imagem e eu notei que esta praticamente absorveu o dedo dele, enquanto ele semicerrava os olhos e algumas coisas piscavam na tela do holograma. Foi então que ele viu o que queria e, livrando o dedo, arrastou uma imagem para o centro da tela, expandindo-a o suficiente para ocupar todo o espaço disponível. Com um clique, a imagem ganhou vida e eu pude ver que se tratava de um vídeo. Ou melhor, uma lembrança.
Era o meu pai. A voz dele soava derrotada, mas ele tentava argumentar, mesmo com a intolerância do alien. Eu via tudo aquilo como se fosse outra pessoa, como se não se tratasse de mim. Eu me sentia... desprendido do meu corpo enquanto assistia meu pai concordar em me entregar em troca da paz. O desespero dele era claro, já que ele escondia o rosto com as mãos e seus ombros se chacoalhavam em um choro contido, mas, mesmo assim, ele me deu. Ele deu a minha vida em troca da de bilhões e trilhões de seres vivos. Por mais que eu soubesse que ele não tinha opção, não fazia aquilo mais fácil. Eu era um escravo em um planeta estranho graças ao meu pai, o homem que havia me colocado no mundo.
Outro soluço rompeu meus lábios e eu desviei os olhos, não querendo mais ver aquilo. O loiro se tocou e fechou o holograma, observando-me com uma expressão impassível. Eu quis socá-lo, chutá-lo, qualquer coisa que pudesse fazer aquela dor passar, mas eu sabia que ele ia acabar me matando se eu tentasse. Eu estava indefeso, em outra galáxia, sendo propriedade de um ET louco.
– Por quê...? Por que você queria destruir o meu planeta? – Perguntei, sem conseguir me conter, minha voz trêmula e frágil demais. Eu não queria expor vulnerabilidade, mas acho que era tarde demais.
– Eu não queria destruir o seu planeta. Eu queria você, e estava disposto a pegar à força, caso as negociações falhassem. A tecnologia da Terra é ridícula, não poderia evitar a destruição que a de E'pyon causaria se eles tentassem lutar e resistir. – Ele constatou com uma frieza que me deixou ainda mais incomodado. Ele era um stalker louco e obcecado, totalmente obcecado. – Agora você é meu e seu planeta não vai sofrer as consequências.
Aquela constatação, aquele atestado de posse, fez com que algo estranho, um ódio desconhecido, se apoderasse do meu corpo e me fizessem tremer diante de sua força. Eu não era um objeto! Eu não pertencia a nenhum alien louco e obcecado! Ele não tinha o direito de ameaçar destruir um planeta inteiro por causa de um capricho idiota! Sem pensar, me lancei contra ele, na intenção de agredi-lo de alguma forma, de descontar nele toda a raiva que eu sentia. Mas ele me segurou com uma facilidade frustrante, me puxando contra o seu corpo, enterrando uma mão em meu cabelo e puxando, me deixando completamente imobilizado.
– Gosto de ser desafiado, Duo Maxwell. Gosto dessa sua imprudência e petulância, desse brilho nos seus olhos. Foi por isso que te escolhi. – Ele sussurrou, e, para a minha total surpresa, os lábios dele tomaram os meus num beijo possessivo e agressivo. Meus olhos se arregalaram totalmente, me deixando imóvel, mas, ao sentir a língua dele tentar tocar a minha, eu me debati, tentando me livrar daquela pegada forte que ele mantinha em mim.
Sem sucesso, mordi-lhe o lábio, fazendo-o retroagir em surpresa, e usando aquilo em vantagem para tentar me soltar de suas mãos. Porém, ele me puxou pelos cabelos e voltou a me segurar no lugar onde eu estava, me olhando com uma superioridade irritante.
– Você não tem para onde fugir. – Ele constatou, virando a minha cabeça e cravando as presas que eu sequer sabia que existiam em meu pescoço.
Minha primeira reação foi gritar, diante da dor enorme que me assolou, mas em seguida, eu senti o corpo inteiro ficar dormente e minha mente se apagar aos poucos. Aqueles olhos azuis me observavam com uma adoração doentia, enquanto os dedos de sua mão desocupada acariciavam meu rosto com delicadeza.
– Durma, Duo Maxwell.
Meus últimos pensamentos foram os de que eu estava sendo envenenado por aquele alien cobra, e de que ele havia tirado tudo de mim. Tudo. Minha casa, minha família, meus amigos... meu primeiro beijo. Eu não tinha mais nada.
Continua…
