N/A: Esta é a minha versão para uma primeira introdução do Gambit em algum possível filme e como ele e a Vampira teriam se encontrado pela primeira vez. A ideia é ser apenas um capítulo, mas nunca se sabe ;)
xXxXx
Ainda era cedo, por volta das vinte duas horas. Cedo o suficiente para o bar ainda estar repleto de pessoas comuns, com rotinas comuns, que procuravam apenas relaxar após um dia cansativo de trabalho. Cedo demais para degenerados e bêbados. O horário perfeito para se conseguir companhia apropriada. Gambit sabia disso por experiência. Nos dez minutos desde que adentrara o local, já havia trocado olhares com algumas garotas bonitas também interessadas, porém ainda não se aproximara de nenhuma. Bonita ou não, havia outros quesitos a serem considerados. De qualquer forma, por ora, ele sentia vontade apenas de beber; a noite ainda não havia começado.
Sentado ao balcão, ele se inclinou levemente para frente e pediu uma segunda dose de whisky. De esguelha, viu uma movimentação à sua esquerda, que colocou os seus sentidos em alerta. Olhou ao redor de forma deliberadamente entediada quando, na realidade, avaliava as saídas e o melhor curso de ação, caso houvesse sido seguido após o roubo de uma hora atrás. Enquanto sua mão direita apanhou o drink, a esquerda foi para dentro do bolso do casaco marrom e longo, e seus dedos sentiram o espólio do dia, antes que fosse entregue ao contratante.
Ele não era apenas cauteloso, era também um ladrão exímio e talentoso que muitas vezes preferia aceitar uma proposta que lhe proporcionasse um desafio novo a uma que lhe trouxesse maior recompensa financeira. Esta inclinação nunca fora bem quista por seu pai adotivo tampouco o fora sua propensão por favorecer garotas bonitas em perigo; contudo, ele nunca dera ouvido a tais críticas, pois sabia da experiência que adquiria trabalhando de acordo com suas próprias regras. Acima disso, é claro, havia também a arrogância de seus vinte e poucos anos, que vinha acompanhada de um senso irresponsável de imortalidade.
Ao notar que a desconfiança havia sido alarme falso, ele se viu imerso em um tédio arrebatador. Em retrospectiva, o roubo fora fácil demais. Portanto, sua cabeça maquinava maneiras de sair daquele sentimento de monotonia quando ouviu uma voz por trás.
"Posso me sentar?" disse a voz que era ao mesmo tempo rouca e adocicada, melodiosa e inconfundivelmente sulista.
Um sorriso malicioso se formou nos lábios dele antes mesmo de se voltar para a fonte daquela voz embriagante.
Sem esperar uma resposta, a garota de sentou na banqueta à esquerda dele. Ele lançou um olhar de soslaio e seu sorriso só fez crescer ao se deparar com uma visão ainda melhor que em sua imaginação – e suas expectativas eram sempre fantasiosamente elevadas.
"Uma cerveja, por favor" a garota pediu ao deitar os braços sobre o balcão. O movimento fez cabelos castanhos ondeados deslizarem macios sobre os ombros. Enquanto esperava pela bebida, voltou o rosto na direção do rapaz ao seu lado. Observou-o em silêncio, com um sorriso travesso sobre os lábios vermelhos. Agradeceu após a garrafa ser posta à sua frente, deu um gole pequeno e girou o corpo até ficar quase de frente para ele. "Você é o Gambit" talvez a intenção seria a de fazer uma pergunta, porém soou como uma afirmação.
"E você é uma X-Man" ele disse, com um sorrisinho debochado nos lábios. Deu mais um gole na bebida e fingiu não prestar atenção nela. Depositou a bebida no balcão e voltou o rosto na direção da garota, o que fez fios de cabelo castanhos caírem sobre os seus singulares olhos de írises vermelhas e escleras negras.
A garota, que até então achava estar interpretando a personagem de forma impecável, fingiu não estar boquiaberta e decepcionada. "Como—?"
"No seu peito" ele respondeu sem rodeios com seu sotaque reconhecivelmente Cajun. Sotaque familiar para ela, que crescera do outro lado do rio Mississippi.
Ela olhou para baixo, para o xis no seu uniforme na altura do peito à direita. Indagou-se como ele poderia ter percebido, pois mal olhara na sua direção. Contrariada, puxou a jaqueta bomber marrom para cobrir o xis, como se o gesto pudesse mudar o desfecho da conversa. De qualquer forma, resolveu continuar com o plano. "Meu nome é Vampira."
"É um prazer, Vampira" ele disse, indagando-se se ela percebia o quão sedutora sua voz era naturalmente. Ela sorriu, achando que ganhara um ponto, até ele acrescentar: "Mas diga à Tempestade que a minha resposta continua sendo não."
Se Vampira não soubesse que os poderes dele consistiam em carregar objetos inanimados com energia cinética até que se tornassem explosivos, teria o palpite de que ele pudesse ser telepata. Entretanto, chegou rapidamente à conclusão de que o Cajun era apenas bom observador e jogador.
Vendo sua missão começar com o pé esquerdo, Vampira suspirou desanimada. Nem mesmo tê-lo encontrado rapidamente havia sido mérito seu – e sim do Cérebro. Era X-Man há menos de um ano e esta era a primeira vez que saía sozinha em missão de recrutamento. Deveria ter dado ouvidos à Tempestade quando esta lhe dissera que Gambit não seria fácil de persuadir. Deveria ter encarado o desafio com menos confiança e arrogância.
De qualquer forma, Tempestade, que conhecera Gambit anos antes e o considerava um amigo, já havia tentado recrutá-lo em outras duas ocasiões, mas fora malsucedida. Na última tentativa, havia contado Tempestade, ela fizera o convite após Gambit ter não apenas ajudado, mas também ter se mostrado crucial em uma missão em Genosha. Ao término da missão, Gambit abraçou Tempestade e, após um beijo na testa, dissera solenemente que não poderia permanecer com eles. Agora, no que havia à frente, Gambit poderia ser um aliado imprescindível, e Vampira sentia o peso da responsabilidade de conseguir convencê-lo a se unir aos X-Men.
"Tempestade avisou que você se faria de difícil" ela disse, mantendo o tom sedutor/inocente. Observou o perfil do rapaz – jovem, provavelmente a mesma idade que ela – à espera de que ele se voltasse para ela. Esforçava-se para que a falta de interesse dissimulada que ele exibia tão convincentemente não a afetasse, pois sabia fazer parte do jogo.
Gambit então soltou uma gargalhada que, mesmo sarcástica, tinha o seu charme. "Não estou me fazendo de difícil. Apenas não tenho tempo para ser um X-Man, chérie" e ele finalmente voltou o rosto para ela. "Não que eu ache que o que vocês fazem não seja importante," ele adicionou e Vampira tentou não dar atenção às pitadas de ironia que percebia na voz dele "só que pensar em lutar ao lado dos mocinhos, de forma tão altruísta, não é para mim."
Com certo fascínio curioso, Vampira se inclinou levemente na direção dele. "Era o que eu achava também, até perceber que os X-Men me salvaram."
O sorriso sarcástico que agraciou os lábios dele fez Vampira achar que ele havia descoberto seu truque. Tentar ganhá-lo por meio de compreensão devia ter sido óbvio demais, ela pensou.
"Não preciso ser salvo" ele afirmou ao inclinar o rosto na direção dela e fazer o seu tom de voz cair algumas oitavas. Havia um amálgama inexplicável de malícia e desesperança de redenção em suas palavras. Vampira se perguntou qual das duas era a verdadeira. "Não há nada de errado em não escolher um lado."
A garota sentiu as pálpebras semicerrarem enquanto os olhos verdes perdiam o foco. Havia algo na voz dele que a fazia sentir a cabeça enevoar e um formigamento que a impelia a acreditar nas palavras dele. Apenas quando Gambit cortou contato visual ela pôde voltar a pensar com mais clareza.
Tempestade havia lhe contato algo a respeito de um poder menor que Gambit possuía, ela lembrou, algo como um charme hipnotizante. E mesmo após o efeito ter se dissipado, Vampira ainda se sentia envolvida pela familiaridade ao seu redor. Estar ali, de volta a Nova Orleans, trazia memórias felizes de uma infância que ficara tão longe no passado. Cedo demais, a voz grave dele a trouxe de volta à realidade.
"Não quer dizer que não podemos ser amigos" ele murmurou, de forma sugestiva.
Vampira inclinou o corpo para trás e apoiou o cotovelo esquerdo sobre o balcão, em um pretexto para se afastar dele. "Será por apenas uma missão" ela disparou.
Gambit riu em escárnio. "É sempre só uma missão."
"Nós precisamos de você, precisamos de toda a ajuda que pudermos encontrar" ela contra-argumentou. Gambit fez um movimento brusco para o lado, e Vampira o segurou pelo braço, achando que ele fosse se afastar.
Os olhos demoníacos dele decaíram sobre a mão enluvada que segurava o seu antebraço contra o balcão. Perguntou-se o porquê das luvas. Envergonhada, Vampira afastou a mão e os olhos para longe dele. Durou não mais que um instante, pois sua segurança foi recobrada ao se lembrar do motivo da sua missão.
"Sabe por que a Tempestade mandou a mim?"
A confiança incisiva na voz dela chamou a atenção de Gambit, que decidiu que simpatizava com a garota. "Porque ela sabe do meu fraco por garotas bonitas?" ele sugeriu.
Um sorrisinho se formou nos lábios dela. Não um sorriso de vaidade em resposta ao elogio, mas porque achou que finalmente tinha a vantagem. "Tempestade mencionou algo sobre você ser um mulherengo irrecuperável. Mas não é isso."
O comentário dela não derrubou a vaidade dele, na realidade, serviu para aumentá-la. "Por que então?" ele perguntou em um sussurro, trazendo o rosto para mais perto do dela.
"Porque consigo ser bastante... persuasiva."
Havia tanta insinuação na voz dela que Gambit se indagou deliciosamente a respeito do que realmente havia por traz de suas palavras. "Prove."
O canto da boca dela se contorceu enquanto retirava a luva da mão direita. "Eu só preciso de um toque para roubar tudo de você."
Interessante escolha de palavras, ele pensou. Ela claramente sabia que ele era um ladrão e o estava desafiando a aumentar a aposta. "E como isso poderia me convencer?" perguntou genuinamente intrigado.
"Se eu tocar a sua pele, posso fazer você apagar. Ninguém vai se importar se eu te carregar pra fora daqui."
"Parece um ótimo plano, chérie, tirando o fato de que me apagar e me levar pra outro lugar não vai ser o suficiente pra me fazer ajudar vocês."
"Talvez você mude de ideia quando acordar na mansão Xavier" ela rebateu.
O sorriso dele aumentou. Estava começando a gostar daquela dinâmica. "Me raptar não é algo que um X-Man faria."
"Nem sempre fui uma X-Man."
Contudo antes que ele pudesse responder, seu sorriso sumiu e seu rosto ganhou sobriedade enquanto seus olhos encaravam algo atrás dela. "Parece uma história fascinante" ele disse "mas precisamos dar o fora daqui imediatamente."
O corpo dela se retesou com a antecipação de uma mudança brusca. "Por quê?"
Gambit se inclinou na direção dela como se fosse sussurrar um segredo ou roubar-lhe um beijo. "Estamos cercados" ele disse, com os olhos fixos nos dela, mesmo que atento ao que acontecia ao redor. "A questão é: alguém seguiu você até aqui, ou a mim?"
"O que a gente faz?" ela murmurou de volta, sem saber como responder à pergunta dele. Sua cabeça girava e borbulhava com possibilidades de planos de ação.
Um sorrisinho assimétrico acariciou os lábios dele enquanto os seus olhos pareceram brilhar. "Vem comigo" murmurou antes de se levantar e oferecer a mão para ela apanhar.
Vampira engoliu em seco ao encarar o rosto impenetrável dele. Sabia que poderia ser um truque para tirá-la dali e despistá-la, mas por ora jogaria o jogo dele. Ela se pôs em pé e segurou a mão dele com a mão que permanecia enluvada.
Gambit os guiou para fora dali.
xXxXx
