Espírito do Atlântico pertence parcialmente a Anne Mather! Quanto aos personagens, uns pertencem a Anne Mather e outros a J.K. Rowling.
Espírito do Atântico
Lily ia caminhando por entre as árvores, descendo com cuidado o terreno inclinado e escorregadio. Pairava no ar um aroma de pinho misturado com outros cheiros característicos do bosque. Andava à vontade, sem medo. Desde quando chegara, fazia esse caminho todas as manhãs e já estava acostumada aos ruídos e farfalhar de folhas provocados pelos pequenos animais que ali viviam e que fugiam, ariscos, à sua passagem. Sabia que não passava ninguém por ali, por isso não temia deparar com estranhos. O belo hotel de Molly e Arthur, com pequenos chalés isolados, ficava longe da trilha do bosque e nenhum motorista se atrevia a enveredar-se de carro por aquele caminho de terra batida. Os hóspedes vinham de barco, pelo lago, e os passeios que faziam em geral eram em canoa, lancha ou veleiro. Lily tinha certeza de que nada a incomodaria.
Era pouco mais de seis horas da manhã e a essa hora ninguém costumava frequentar o lago. Os hóspedes, em geral gente de meia-idade, preferiam ir um pouco mais tarde, portanto Lily estava acostumada a considerar-se dona do lugar durante aqueles momentos. Mais tarde, a imensidão do lago Huron era tomada por lanchas e esquiadores bronzeados; barcos a remo que mostravam aos visitantes as trinta mil ilhazinhas que tornavam o lago famoso.
Naquele momento, entretanto, estava deserto e silencioso como se fosse inverno, época em que a superfície das águas se congelava formando uma crosta de vários metros de profundidade e os veranistas voltavam para seus lares aquecidos, sonhando com os adoráveis dias que haviam passado naquele local.
Absorta em seus pensamentos, Lily começou a lembrar os nomes dos lugares que visitara, Georgian Bay... Beausoleil Island, Wanbanoka, Penetang Rock, Giant's Tomb... conhecera tudo isso nas três semanas em que estava ali. Era tudo muito bonito e amplo. Sentia-se grata a Adam por ele ter aceitado esse afastamento. Estava mesmo precisando disso para se recuperar do terrível choque causado pelo suicídio do pai, e, é claro, sentia-se imensamente grata aos Weasley por lhe terem possibilitado essas férias.
Antes que chegasse às rochas da margem, ela ouviu um ruído de algo caindo na água. Estranho, o que seria aquilo? Lily franziu a testa, intrigada, e foi se aproximando devagarzinho. Assim que chegou mais perto viu alguém de cabelos escuros nadando. Ela já imaginava que devia ser isso, naturalmente, mas mesmo assim ficou decepcionada e não gostou. Olhou para as roupas amontoadas numa pedra perto de onde tinha parado e teve raiva daquele estranho que invadia sua intimidade. Seria homem ou mulher? Pelas roupas era difícil identificar... hoje em dia todo mundo usa jeans e camisa, como poderia saber?
Imaginou todos os hóspedes que estavam no hotel, para ver se identificava algum deles com as roupas. Mas nenhum deles costumava nadar assim tão cedo. Tinha a família Fairley... mas o homem era de meia-idade e gordo e a mulher não usava aquele tipo de roupa. Seria alguém do casal Meades? Eles eram mais jovens... mas pareciam estar em lua-de-mel e só saíam do quarto na hora do almoço! Quem seria, então? Só sobrava a família Éden e as Peters, mãe e filha. Mas nenhum deles costumava dar mergulhos matinais ou usar aquelas roupas descontraídas. Sentiu uma enorme irritação. Estava quase certa de que era um homem e isso estragava seu dia. Não queria dividir com ninguém aquela paisagem e tinha uma vaga intuição de que seu sossego seria perturbado. Ficou indecisa sem saber o que devia fazer. Pensou em voltar ao hotel, mas afastou a idéia com raiva. Por que não teria direito de ficar ali? Nada disso! Talvez tivesse mais direito do que aquele estranho, embora não houvesse placas de "propriedade privada" no local.
Estava parada na pedra, olhando distraída na direção dele, quando ele se virou e a viu. Começou a nadar para a margem. Ela ficou terrivelmente nervosa, mas não saiu do lugar, até que ele chegou perto. Só então viu que era realmente um homem, por sinal bastante insolente. O olhar que ele lhe lançou fez com que Lily se sentisse nua, apesar de estar ainda com o short sobre o biquini.
— Ei!
Ficou indignada ao perceber que ele a estava chamando. Que petulância! Então isso lá era jeito de falar com ela? Vai ver estava pensando que ela estava curiosa para conhecê-lo, ou interessada nele... Quem estava pensando que ela era, para tratá-la com aquela vulgaridade? Resolveu ignorá-lo e virou-se para outro lado, protegendo os olhos do sol, fingindo estar procurando algo. Quem sabe mostrando desinteresse ele fosse embora e a deixasse em paz! Daí poderia ficar com sua solidão e nadar à vontade, como costumava fazer todas as manhãs.
— Ei... você aí! — Repetiu ele com voz bem masculina em tom de zombaria.
Ela ficou ainda mais indignada e olhou-o com frieza glacial nos olhos verdes. Ele estava bem perto da pedra, mas ainda era fundo e não dava pé, por isso movimentava-se lentamente para permanecer à superfície. Lily não pôde deixar de notar que a pele dele era bronzeada.
— Quer fazer o favor de parar de me chatear! — ela disse irritada, sentindo-se de repente estranhamente constrangida de estar sem camisa para cobrir o reduzidíssimo sutiã do biquini.
— Aquilo ali na pedra, ao seu lado, é minha roupa — disse ele com familiaridade.
O sotaque dele parecia inglês. Será que ele era inglês como ela, em viagem pelo Canadá, ou será que era canadense de alguma outra região? Contudo, ela não demonstrou o menor interesse ou curiosidade. Manteve a postura fria e distante.
— Já percebi — retrucou ela. — Por que não se veste e vai embora?
— Eu vou... vou me vestir, quero dizer, se você for boazinha e sair daí — respondeu ele, olhando-a de alto a baixo com aprovação. — A não ser que queira vir me fazer companhia aqui na água...
— Não, muito obrigada. — Ela não estava achando graça nenhuma. — E se acha que vou sair daqui só porque você está mandando, está muito enganado! Essas terras pertencem ao Hotel Weasley Point. Você é que é o intruso!
— O lago não tem dono, é de todos — retrucou ele, afastando o cabelo do rosto com a mão elegante, de dedos longos. — Agora, quer fazer o favor de me deixar sair daqui? A água está gelada, puxa vida!
— E desde quando eu estou impedindo? — retrucou Lily, com frieza, batendo de leve com a toalha nas pernas. — Aliás, quem mandou você nadar, se a água está fria?
— A questão, mocinha, é que eu estou sem sunga e já que você insiste em ficar olhando...
Lily virou-se de costas antes que ele terminasse a frase. Sentia que o rosto estava corado de vergonha. Que sujeito mais maluco, estava nadando nu! Mas isso era sem-vergonhice pura! Uma indecência!
— Pronto, pode olhar.
O tom de zombaria da voz dele a perturbava mais ainda e ela virou-se devagarzinho, um pouco apreensiva com o que ia ver. Ele vestira a roupa sem se enxugar e a calça aderira ao corpo em lugares que Lily não pôde deixar de notar, mas que preferia não ter visto. As formas dele ficaram realçadas e ela reparou que ele tinha quadris estreitos e músculos fortes nas coxas. Era alto, magro, mas não anguloso, e movimentava-se com extrema agilidade e leveza. Numa fração de segundo aproximou-se da pedra onde ela estava. Lily deu um passo para trás. Dentro d'água ele não parecia tão agressivo, mas agora mostrava-se forte, viril, cheio de energia, e muito seguro de si, de uma maneira bem diferente do que era Adam. Entretanto, Adam era mais velho, mais maduro e sem dúvida nem um pouco perigoso.
— Olá — disse ele, estendendo a mão. — Eu me chamo James Potter, e você?
Lily ficou confusa, assim tomada de surpresa.
— Que lhe interessa saber? Eu... ahn... como é que você chegou aqui?
— De moto — respondeu ele, lacônico, inclinando-se para calçar o tênis. — Está parada ali — apontou ele com um movimento de cabeça em direção às árvores. — E você?
Por instantes, ela ficou indecisa, depois resolveu que era melhor deixar bem claro que tinha todo o direito de estar ali.
— Estou hospedada no hotel e como já lhe disse essas terras...
— No Hotel Weasley Point — finalizou ele. — Já sei. Sou intruso e coisa e tal, e daí? O que pretende fazer?
Lily não sabia como responder. Olhou para ele desconfiada. Tinha sido loucura provocá-lo... afinal, ele era bem maior e mais forte do que ela e estavam longe do hotel. O que poderia fazer, se de repente ele resolvesse atacá-la? Não havia ninguém por ali aquela hora...
— Bem, não tem importância... você já está mesmo indo embora, não é? — disse ela, tentando parecer calma e baixando as pálpebras de longos cílios.
— E se eu não for? — retrucou ele, parecendo estar se divertindo com aquilo.
Ela se virou de lado, com um gesto de desolação. Ele a estava deixando nervosa e com medo. Estava confusa, não sabia como sair da situação e ficou furiosa consigo mesma por causa disso. Por que fora se meter com ele? Devia ter ido embora. Não conseguia entender qual era a intenção dele.
— Você é inglesa, não é? Minha mãe também é inglesa — disse ele, olhando-a atentamente — Está de férias aqui ou trabalha no hotel?
— Você não desiste, mesmo, hein? — disse ela, olhando brava para ele. — Por que você não volta para o seu canto e me deixa em paz?
— Eu sou curioso, ora. Que mal há nisso? — Ele encolheu os ombros. — A propósito, meu cantinho fica lá... Ele apontou para a curva do lago.
— Não perguntei — retrucou ela, ríspida. — Não tenho o menor interesse em saber quem você é ou onde mora.
— Não mesmo? — gotinhas de água escorriam do cabelo dele, molhando o ombro da camisa. — Que pena, porque eu tenho interesse em saber sobre você...
— Ah, é? Mas que interessante! — o tom era irônico. — Agora, se me dá licença...
— James — lembrou ele com voz suave. — James Potter. Você ainda não me disse seu nome.
— Pois é, não disse. — Lily sorriu com petulância. — Quer me dar licença, por favor?
— Você quer nadar?
— Quero.
— Ué, esteja à vontade. Por que não nada, então? Não se incomode comigo!
Lily estava furiosa. A atitude dele era de provocação. Não tinha a menor intenção de tirar o short na frente dele e cair na água. Não daria esse gostinho a ele. Seus olhos verdes fuzilavam.
— O que houve? — provocou ele. — Está com medo que eu decida ir nadar de novo para lhe fazer companhia?
— Ah, meu Deus! — suspirou Lily. — Você não estava indo embora, então por que não vai de uma vez?
— Não vai me dizer que está com medo de que eu roube sua roupa...
— Não tem perigo, eu não nado sem roupa.
— Pois devia! — O olhar insolente percorreu de novo o corpo dela. — Por que não experimenta? Vai ver que não tem coisa melhor do que isso!
— Você está me ofendendo, agora!
— Ora, você está exagerando! Onde é que esteve nesses últimos dez anos? Num convento? Num internato?
Lily virou-se e começou a subir pelas pedras em direção ao bosque. Ele não podia imaginar como acertara em cheio dizendo aquilo! Além disso, já desistira de nadar naquela manhã, parece que não ia ser mesmo possível... Ele já estragara seu dia.
— Espere...
Lily ouviu os passos dele seguindo-a, mas não se virou. De repente, sentiu a mão dele em sua perna e ficou em pânico. Ninguém jamais tocara em seu corpo, nem Adam. A mão de um estranho em sua coxa parecia queimar a pele.
— Me larga! — gritou ela, num movimento tão brusco que desequilibrou eles dois.
James escorregou na pedra lisa e ela caiu em cima dele.
— Sua maluca! — disse ele por entre dentes enquanto caíam.
— A culpa é sua! Por que me puxou daquele jeito? — declarou ela, constrangida, sentindo contra o ombro os músculos rijos do peito dele.
Ele caiu na risada, de repente, enquanto se levantavam.
— Está bem, foi maluquice minha, mesmo — disse ele. — Mas, afinal, o que foi que eu fiz de tão assustador para deixar você nesse estado?
— Você não me deixou em estado nenhum! — protestou ela, com veemência. — Não me causou nenhuma emoção ou sentimento, seja lá qual for! Só queria que fosse embora logo!
— Está bem — disse ele, encolhendo os ombros.
Estava bem perto dela e ela sentiu o cheiro másculo daquela pele molhada. A proximidade dele a perturbava, ainda mais do jeito como estava, com a camisa aberta sobre o peito e a calça úmida delineando as formas. Sem dúvida ele era atraente, ela não pôde deixar de notar, e se perguntou mentalmente quem seria ele. Não parecia um turista, como os que costumavam se hospedar no hotel... O que estaria fazendo num lugar como aquele, de moto? Sentiu uma estranha sensação no estômago que não sabia explicar.
— Até logo, então. — ela disse para disfarçar a perturbação.
Ele inclinou a cabeça, ajeitando a camisa para dentro da calça e ela ficou em expectativa desejando que ele fosse embora logo. Em vez disso, ele ergueu a cabeça de novo e lançou a ela um olhar perscrutante, notando o ligeiro tremor dos lábios e a respiração alterada que fazia subir e descer os seios de Lily de um jeito inconscientemente provocante.
— Até logo — respondeu afinal.
E antes que ela pudesse fazer qualquer coisa para impedi-lo, ele estendeu a mão, segurou-a pela nuca e beijou-a na boca. Seu primeiro impulso foi empurrá-lo, mas ao tocar no corpo dele, afastou as mãos depressa sem coragem de encostar nele. Depois gemeu, protestando, mas o som ficou abafado na garganta e ele, ignorando todos os protestos, continuava a beijá-la forçando-a a entreabrir os lábios. Uma sensação vertiginosa se apoderou dela como se estivesse sucumbindo às experientes carícias dele e quando deu por si estava correspondendo.
— Não! — ela gritou desolada, quando finalmente conseguiu se desvencilhar, e esfregou os lábios com as costas da mão.
Sentia-se ultrajada e vulgar porque por um instante correspondera e desejara continuar nos braços dele.
— Até qualquer dia — ele disse enquanto se afastava, mas ela não se virou para vê-lo.
Ficou parada ali, ouvindo os passos dele na direção em que ele dissera estar a moto e só depois de ouvir o barulho do possante motor se afastando é que teve coragem de se virar. Só então se descontraiu e suspirou aliviada. Ainda um pouco trêmula, Lily procurou uma pedra mais lisa e se deitou ao sol. Perdera completamente a vontade de nadar e ficara imaginando se conseguiria voltar ali outras vezes sem se lembrar do que acabara de acontecer. Protegeu os olhos do sol com a mão e começou a observar uma das muitas ilhazinhas ao longe, tentando se acalmar. Tudo estava como antes, nada tinha mudado, repetia ela mentalmente. Não devia se sentir culpada ou envergonhada, porque um estranho invadira sua vida e a desordenara momentaneamente. Ele se aproveitara da situação, sem dúvida... Ele era esse tipo de homem! Devia estar acampado por ali, no bosque, com um bando de jovens desmiolados que nem ele, que só pensavam em motocicletas e farras. Depois de alguns instantes, ergueu-se, pegou a toalha e resolveu ir embora. Era melhor voltar para nadar mais tarde. Talvez conseguisse convencer Gui um dos cinco filhos de Molly a lhe fazer companhia. Pelo menos isso seria uma garantia de que nada daquele tipo poderia lhe acontecer.
O hotel estava situado numa elevação de onde se avistava toda a baía. Era um conjunto de chalés, isolados, com quarto e banheiro, e no centro uma construção maior com sala de estar e restaurante. Ao fundo ficava a floresta, logo abaixo havia a marina, onde os veranistas que costumavam passar temporada no hotel ancoravam seus pequenos barcos. Depois, era só subir os degraus de pedra que levavam à entrada. O lago era o único meio de se chegar ao hotel. Havia um caminho através da floresta, mas não era bem demarcado e quem não conhecesse bem corria o risco de se perder. Por isso quase ninguém ia por ali. A mãe de Molly Weasley tinha sido amiga da mãe de Lily e embora Molly fosse oito anos mais velha do que Lily, as duas se conheciam desde criança. Quando Lily estava com dez anos, Molly se casou com Arthur, um canadense que conhecera na Alemanha, numa viagem de férias. Depois de casada, tinha se estabelecido com o marido ali em Ontário, naquele belo lugar.
As duas amigas nunca tinham perdido o contato. Escreviam-se sempre e quando, há três meses, acontecera a tragédia, Molly imediatamente convidou Lily para passar algum tempo com ela. O Canadá, no início do verão, é um lugar encantador e, além disso, tinha a vantagem de ser um ambiente bem diferente e longe de onde acontecera o triste episódio. Lily tinha ficado muito traumatizada e por isso os amigos, na Inglaterra, a incentivaram a aceitar. Até mesmo adam, apesar de não ter ficado muito contente com a separação e, assim, cheia de melancolia, ela acabou aceitando. Isso já fazia quase um mês e Lily sabia que logo precisaria pensar em voltar, embora não quisesse. De certa forma, a experiência de ter vivido ali aquelas semanas ampliara sua visão do mundo e sua compreensão dos fatos. Já não se iludia mais a respeito do comportamento do pai em relação a ela. Voltar à Inglaterra significaria voltar ao vazio que ela descobrira ser sua vida e nem mesmo Adam poderia ajudá-la a preencher aquele vazio nem compensá-la por todos esses anos que vivera em total ignorância, sem saber das coisas. Sempre pensara que o pai tivesse ficado muito perturbado por causa da morte da mãe dela. Lily tinha apenas doze anos na época. Só agora entendera que o pai era um inútil, mesmo. Além de tudo, falso, enganara todo mundo. Lily sabia agora que a firma só se mantivera devido ao dinheiro de Adam.
Molly e Arthur moravam num pequeno apartamento dentro do prédio central. Dali era mais fácil controlar a administração, a recepção e os empregados. Havia um sistema de interfone que mantinha todos os chalés em comunicação com a recepção onde Molly trabalhava. Quando Lily chegou, o hotel já estava bastante movimentado, com os hóspedes acordando e transitando pelas salas. A amiga a cumprimentou da porta assim que a viu.
— Oi! — disse ela.
— Oi! — respondeu Lily, balançando a toalha na mão. — Hum... estou sentindo cheiro de café fresquinho.
— Acabou de ser feito! — Molly ergueu a sobrancelha, intrigada, assim que a amiga chegou mais perto. — Ué... voltou cedo, hoje. Não nadou?
— Não, não nadei — ela respondeu sem vontade de entrar em detalhes, mas Molly queria saber.
— E por que não? Por acaso está se sentindo mal, está com alguma dor...? Porque se estiver vou chamar o dr. Brewster imediatamente!
— Não, não estou doente, não tenho nada. — Lily forçou um sorriso. — É que... bem, tinha gente nadando, quando eu cheguei e eu não estava a fim de ter companhia... — disse ela tentando parecer displicente.
Passou por Molly, entrou na sala de refeições e foi sentar-se na mesa de sempre, perto da janela. O restaurante ainda estava vazio, mas as garçonetes já estavam por ali e Penny, uma delas, foi atendê-la à mesa, perguntando o que queria.
— Só café com torradas — respondeu Lily, percebendo o olhar crítico de Molly que ficara na porta, observando-a de longe.
— E então? — disse ela, aproximando-se, parando perto da mesa, de braços cruzados.
Ela engordara bastante, depois que se casara e fora morar ali. Também não era para menos, com todas aquelas iguarias que serviam nas refeições!
— Então, o quê? — respondeu Lily tentando ganhar tempo para ver se a outra desistia do assunto.
— Quem estava nadando no lago? Não era ninguém aqui do hotel, disso tenho certeza. Não sabia que alguém mais conhecia aquele recanto isolado!
— Nem eu — retrucou Lily, brincando com o talher. — Mas sem dúvida estávamos enganadas.
— Então, quem era? Alguém que estava acampado? Mas por ali não tem lugar para se armar uma barraca...
— Não sei. Era um homem, acho que um turista. Ele disse que estava do outro lado do lago, lá perto da caverna...
— Você falou com ele? — Molly interessou-se, puxou uma cadeira e sentou-se em frente a Lily. — Ah... e que tal? Gostou dele? Todos esses dias você tem fugido dos rapazes que a gente quer apresentar a você... agora foi encontrar alguém lá no lago, o lugar mais inesperado! Veja como são as coisas!
— Não foi nada disso, não é o que está pensando! Ele estava lá nadando e... bem, daí falou comigo, só isso. Não houve nada demais para você ficar aí toda animada, imaginando coisas!
Contudo Lily não pôde conter a emoção que se apoderou dela ao lembrar-se do beijo, do jeito como ele a abraçou, do corpo dele molhado. Sem querer, ficou arrepiada e cruzou os braços para disfarçar.
— Mas quem era ele, afinal? — insistiu Molly erguendo as sobrancelhas. — Ele não falou ao menos o nome? — Ela franziu a testa. — Não posso imaginar onde esteja hospedado. Será que com os Black ou os Rosier, que têm casas de verão por aqui?
— Ele não parecia ser um grã-fino, Molly... Ele estava de moto e bem à vontade... — ela corou, ao lembrar da roupa dele.
— Era bem mais velho?
— Não, era jovem. — Nesse momento chegou a bandeja do café e Lily achou que seria um pretexto para mudar de assunto. — Hum, é justamente o que estou precisando. Está friozinho aqui, não está?
Molly esperou até que Penny se afastasse, depois olhou a amiga com impaciência.
— Não vai me dizer como é o nome dele, ou você não sabe?
Lily suspirou e depois de certa relutância disse:
— James Potter
— Não!
Molly arregalou os olhos, incrédula e Lily ficou ainda mais confusa. Já não bastava o que tinha acontecido? Agora, por que aquele espanto da amiga?
— Molly, olha, eu sei que você faz tudo por mim com a melhor das intenções... você sabe que eu vou me casar com Adam. Já está tudo combinado. Assim que eu melhorar e estiver em condições...
— Lily, o nome dele é mesmo James Potter? — interrompeu-a Molly, colocando a mão no braço dela, impedindo-a de morder a torrada.
— Foi o que ele disse — respondeu Lily, puxando o braço.
— Meu Deus! — disse Molly, balançando a cabeça.
— O que há de mal com esse nome? — Lily perguntou depois de engolir um pedaço de torrada e limpar a boca no guardanapo. — Não vai me dizer que é algum foragido da prisão ou qualquer coisa assim, não é?
— Não, não é isso. — Ela fez uma pausa, toda excitada, depois achou que a amiga merecia uma explicação. — Lily, James é sobrinho de Anthea Rosier. Ela era Potter também, antes de se casar e... puxa vida! Eles são simplesmente os donos do Banco Nacional Escocês, em Nova Iorque!
Lily largou a faca e recostou-se na cadeira.
— Bom, e daí?
— Como, e daí? — Molly umedeceu os lábios. — Lily, será que não percebe... conversou com o filho de Charlus Potter!
Todos aqueles nomes não significavam nada para ela, mas ao menos entendia que banqueiros de Nova Iorque são pessoas riquíssimas e era por isso que a amiga estava com aquela expressão de assombro e toda aquela excitação. Tentando parecer natural, serviu-se de mais café.
— Acho que você está enganada, Molly. Ele... bem, ele disse que a mãe era inglesa, não americana.
— Pois é! É isso mesmo, ela é inglesa! — Molly estava excitadíssima. — Dorea Potter, a mãe dele, é inglesa.
Lily respirou fundo.
— Bem... — Ela tentou parecer displicente. — Já lhe arranjei assunto para a fofoca do dia.
— Lily! — Molly olhou-a com reprovação. — Não me diga que não está impressionada, porque não acredito. Puxa... Imagine só, encontrar James Potter em pessoa! O que ele está fazendo aqui? O que ele disse?
Lily largou a xícara vendo Arthur entrar à procura da esposa. Ele sorriu ao localizá-las na mesa perto da janela. Assim que se aproximou, Molly mal o deixou abrir a boca e já começou a contar que Lily tinha feito amizade com o sobrinho de Anthea Rosier.
— Não é verdade — Lily ficou chateada por contradizer a amiga e olhou para Arthur como que se desculpando. — Não foi isso o que aconteceu. Para falar a verdade, eu fui bem rude com ele. Eu... Bem... disse a ele que ali era propriedade particular e ele era um intruso.
— Fez muito bem — disse Arthur, que não estava impressionado como a esposa.
— Ah... você sabe como a Margie gosta de falar que os Rosier vão à praia dela — disse Molly, erguendo-se. — Quero só ver a cara dela quando eu contar a história de Lily!
— Ah, não, Molly, não faça isso! — Lily ficou apavorada, só de pensar que a história pudesse chegar aos ouvidos de James. Molly não sabia o que acontecera na verdade e não sabia em que estava se metendo. — Por favor, esqueça o que eu falei!
— Acho melhor ficar calada, mesmo, Molly — Arthur disse. — Não se esqueça de que arrendamos essas terras dos Rosier e não quero saber de fofocas com o nome deles.
— Quer dizer que não posso contar para ninguém? — disse Molly decepcionada.
— Contar o quê? — disse Lily, aflita. — Não há nada para contar! Ah, Molly, estou arrependida de ter lhe falado disso.
— Lily, imagine só... James Potter! Imagine você e ele namorando!
Lily arregalou os olhos, incrédula.
— Você está maluca, Molly? Eu apenas o vi nadando... e, depois, você esqueceu de Adam?
— Adam? Ora, Adam! — Molly fez um gesto de desdém. — Ele é velho demais para você e duvido que você o ame, Lily.
— Molly!
Arthur ficou horrorizado com os modos de Molly e até Lily ficou meio sem jeito.
— Está bem... — disse Molly, em tom de desculpa. — Sei que não é da minha conta, mas... é que estou pensando no seu próprio bem. Adam foi sócio do seu pai e tem quase a mesma idade dele. Tem certeza de que não está procurando nele um substituto para o pai que perdeu?
Houve um silêncio pesado e para alívio de Lily, entrou um hóspede à procura de Molly, justo naquele momento. Quando Arthur ficou sozinho com ela, bateu amistosamente em seu ombro.
— Ela não falou por mal — ele disse, meio sem jeito.
— Eu sei — sorriu Lily. — Não se preocupe, Arthur. Eu conheço Molly há muito tempo e a gente tem intimidade para dizer coisas desse tipo. Não estou ofendida.
— Outra coisa, Lily, não se deixe levar pelo entusiasmo dela! Eu não deixaria uma filha minha sair com esse tal de James. É melhor ficar longe dele. Não sei se é verdade, mas dizem por aí que desde que ele saiu do colégio só apronta confusões e escândalos. Sabe como são esses filhinhos-de-papai...
— Nem precisa me dizer isso, Arthur. Pode ficar sossegado, não estou nem um pouco interessada nele e nem ele em mim. Nós... nós nos encontramos por acaso... e foi só isso!
— Ainda bem. Isso me tranquiliza.
Arthur bateu de leve no ombro dela e se afastou com a desculpa de ter que atender os hóspedes. Lily ficou sozinha para terminar de comer, mas tinha perdido completamente o apetite. Não conseguia deixar de pensar por que um homem como James, tendo o lago todo para nadar, fora escolher justo aquele recanto que era só dela e na mesma hora em que ela costumava nadar?
