SEGREDOS DA NOITE

Jade Toreador & Aries Sin
Milo x Kamus, MdM x Dite, Outros...
Romance, Lemon, AU.

Nesse romance, baseado no anime Saint Seya de Masami Kurumada, os personagens são garotos de programa e ocultam na vida que a noite lhes oferece segredos, mágoas e desilusões...

N.A(s): Queremos deixar claro aqui que o nome CARLO DI ANGELIS não nos pertence, usámos esse nome em homenagem a Pipe, que nos deu autorização para utilizá-lo nas fics ESPINHO E ROSA (da Jade) e ONCE UPON A TIME, IN LONDON TOWN (de Áries Sin).

Esta fic é baseada na fic da Jade, CONTO DE NATAL. Apesar de poder ser lida separadamente, para melhor compreensão de certos acontecimentos ao longo da fic aconselhamos a ler CONTO DE NATAL.

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SEGREDOS DA NOITE

Capítulo 1

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Quente… extremamente quente… dois corpos intensamente suados chocavam um com o outro num ritmo cadenciado. Os gemidos roucos de ambos espalhavam-se pelo quarto.

Os longos cabelos loiros foram lançados para trás com um gesto, à medida que a cavalgada sobre o corpo abaixo de si se tornava mais intensa.

Os olhos semicerrados, a respiração descompassada e a diversidade de sons que emitia demonstravam puro deleite.

Sentiu suas nádegas serem apertadas com força. O corpo esguio do companheiro ergueu-se e sentiu-se ser abraçado com força. Seus lábios foram capturados para um beijo.

Shaka sorriu, não um sorriso de ternura, mas de vitória. Era subjugado, mas também subjugava. O modo como haviam se degladiado nas últimas horas, em busca de uma volúpia que não encontrava com cliente algum, mostrava-lhe que o seu amante estava tão inebriado quanto ele próprio.

Normalmente, por ser louro e longilíio, ele era quase sempre passivo com seus clientes, a mercê de mãos grotescas e bocas que lhe davam asco. Agora, ali, o hálito perfumado de Mu e o seu corpo tão imberbe quanto o dele próprio, lhe despertava o primitivo sentimento masculino de possuir e tomar. Por isso, gostava de tomar o corpo do outro, marcando, tomando, num ritual de volúpia quase violento.

Mas agora, o tibetano lhe dava um beijo... Terno... Terno demais!

Retribuiu o beijo a princípio, prolongando o contato com as línguas. Logo, as pernas se entrelaçaram num ritual delicioso de entrega, mas o hindu, incomodou-se com aquilo.

Já não deveria ter aceito o beijo de Mu. O tibetano e ele seguiam as regras de qualquer puto, que era jamais beijar seus clientes... Mas não estavam ali como os garotos de programas que eram! Queriam sexo. Com tudo de bom que o sexo costumava ter, quando não se fazia repetidas vezes por obrigação financeira.

Mas aquele beijo... Já trazia outras emoções ao seu corpo, que não eram apenas física, e... Não gostava disso. Estava ali para extravasar seu lado masculino, possuir e tomar, não para ser terno ou gentil!

Levantou-se, deixando Mu na cama.

"O que foi?".

"Nada. Apenas não posso me demorar aqui hoje".

Enquanto falava, Shaka virou-se para que a visão deliciosa do corpo nu e marcado do tibetano entre os lençóis não o fizesse cair na tentação de se deitar ali novamente.

Mu deu um sorriso cândido:

"Mas temos todo o dia de folga. Pensam que viajei, ninguém do Santuário vai desconfiar que estamos juntos, aqui".

"E desde quanto você acha que eu quero passar todo o meu dia com você? Tenho mais o que fazer".

Shaka sentiu a hora em que outro estremeceu como se houvessem lhe dado um tapa. Aquilo o incomodou também. Sabia que havia sido grosseiro e indelicado com o amante, mas... Fizera isso de propósito. Aquele clima amoroso pós-sexo era perigoso demais para os dois. Era errado dois funcionários do bordel estarem ali aos amassos, pois quebravam uma regra rígida da casa de que os putos efetivos não podiam se relacionar.

Mas se a indisciplina ficasse apenas para um amasso as escondidas, tudo bem. O bordel não iria descobrir! O que não podia... Eram os dois ficarem ali, na cama, aos beijos carinhosos.

Se Mu havia ficado magoado com sua atitude... Melhor para eles dois! Afinal, nem passava pela sua cabeça terminar caçado pelos capangas da Saori por largarem o "negócio", como acontecera com aqueles dois idiotas, Milo e Kamus, que haviam fugido do bordel por causa de... AMOR! Isso era... Ridículo.

Amor era coisa para tolos.

Ouviu a voz grave e deliciosamente suave do Tibetano, que se levantou também, num tom de magoa disfarçada.

"Pois eu também não tenho a menor intenção de ficar aqui com você. Também tenho mais o que fazer".

Um clima tenso havia caído no quarto agora. Porém, Shaka sorriu e não conseguiu resistir: acariciou os cabelos tingidos na exótica cor lilás. Para qualquer outro, aquela cor de cabelo ficaria ridícula, mas emoldurando aquele rosto afilado que parecia ser de um lindo herói de manga, a bizarra tintura se tornava um acessório simplesmente artístico e perfeito nos cabelos perfumados.

"Oras, isso não quer dizer que eu não tenha tempo para um banho a dois...".

Foi à vez do tibetano dar o troco à grosseria sofrida:

"Como você mesmo disse, não tenho o dia inteiro para ficar aqui; me visto e tomo um banho em casa, pois tenho um encontro à tarde não quero chegar atrasado".

O coração de Shaka disparou. Um encontro? Seria um amigo? Um namorado? Ou seria um amante que Mu faturava por fora, sem dar comissão para a cafetina que os sustentava? Bem, não podia dar ao outro o gostinho de se mostrar curioso, podia?

O olhar fixo no amante, Shaka sentia seu autocontrole ruir aos poucos. Todas aquelas duvidas… todas aquelas incertezas… decididamente não eram habituais.

Seu olhar lambia languidamente o corpo delicado de Mu à medida que este se baixava para apanhar suas roupas.

De costas para o loiro, Mu fazia todos os gestos com extrema calma. Os longos cabelos lavanda caíam soltos sobre as costas marcadas por momentos de maior excitação. Subia as calças jeans até às ancas tendo o cuidado de se movimentar com sensualidade. Sentia o olhar predador de Shaka sobre si. Estava plenamente consciente que era o alvo de toda a atenção do loiro. Nos jogos de sedução, ele era mestre.

Mostraria a Shaka tudo o que ele estava a perder. Deixaria a excitação do loiro no auge para depois o largar como um trapo sem interesse. O orgulho ferido reclamava por vendetta. Era esse o seu objectivo primordial naquele momento.

Se a tentação encarnasse num homem certamente seria no puto desgraçado à sua frente. Shaka estava ciente que o mínimo movimento do outro era planeado, minuciosamente executado para exercer o efeito desejado no espectador. Ele próprio conhecia todas as manhas usadas pelos da sua laia… mas céus! Aquilo era demais…

Inconscientemente passou a língua pelos lábios humedecendo-os.

Mu vestia a camisa preta quando se sentiu abraçado por trás. Sentiu os dedos longos de Shaka delinearem seu abdómen definido pelas muitas aulas de artes marciais fornecidas pelo bordel. Sorriu vitorioso.

Seus extensos fios lavanda foram afastados, deixando seu pescoço num perigoso estado de exposição. Os lábios do loiro estavam próximos… excitantemente próximos. Sentiu uma língua morna passar lentamente pelo local. Num momento repentino de plena consciência tentou afastar-se das garras que o prendiam, mas Shaka apenas o agarrou com maior pressão.

Ele não podia… não faria aquilo… ou faria?

Foi então que sentiu uma pontada de dor no local do contacto. Pouco depois, os lábios descolavam da sua pele e o abraço foi desfeito. Levou a mão ao local, massajando de leve.

O feitiço virara-se contra o feiticeiro.

Voltou-se num ataque de fúria encarando o loiro.

Shaka afastava-se calmamente, o corpo nu escondido pelos longos cabelos loiros. Um enorme sorriso de satisfação pairava em seus lábios.

"Tenha um bom encontro Mu! E se for um encontro… romântico… que as musas o inspirem para a desculpa que vai inventar para essa marca em seu pescoço!".

Com um breve aceno da mão, desapareceu no banheiro fechando a porta.

No quarto, Mu observava o estrago feito pelo desgraçado filho da mãe que acabava de sumir. Pela sua imagem reflectida no espelho conseguia ver a marca deixada em seu pescoço.

Rosnou. Alguns murmúrios de xingamentos pairaram no ar.

Acabou de fechar a camisa. Ajeitou o cabelo com os dedos longos. Encarou uma última vez a imagem reflectida da superfície baça. Um sorriso tomou conta dos seus lábios finos.

Afinal… aquela marca era a prova de uma crise de ciúmes inconsciente de Shaka. Uma marca de posse.

Olhou mais uma vez em volta, procurando o celular e a carteira. Ouviu o som da água a correr no interior do banheiro.

Saiu fechando a porta num estrondo.

"Carlo, a mademoiselle está falando com você!".

O italiano olhava displicentemente pela sacada que ficava no último andar do edifício vítreo e dourado, apelidado pelos clientes de 'Santuário', devido à exótica decoração zodiacal dos diversos ambientes.

Jogou o cigarro pela janela e virou-se com um sorriso cínico nos lábios. Sua vontade era a de dizer: 'Madamoiselle? Não estou vendo nenhuma mademoiselle, apenas uma cafetina bonitinha, mas ordinária!'.

Conteve-se, porém.

Caminhou em direção a Saori, e, ao passar por Saga, sussurrou:

"Puxa-saco".

"Ora, seu...".

A jovem Saori Kido interrompeu os dois:

"Agora não é hora de conversas paralelas. Eu perguntei, Carlo, se você já teve notícias dos dois cretinos que fugiram. Quero uma resposta!".

"Estamos coletando pistas. Os dois saíram na surdina, sem deixar muitos rastros, mas não são espertos o suficiente para virar fumaça. Já falei com uns contatos que tenho na policia, logo, vamos ter notícias do paradeiro deles".

"Isso me soa como uma desculpa esfarrapada para dizer que vocês dois não tem pista nenhuma deles!".

"Mademoiselle, eu não sou homens de dar desculpa alguma, se não está satisfeita, é só me dar às contas que eu vou embora".

Saori corou, irritada. Na boca de Carlo, a palavra 'mademoiselle' soava como se fosse 'piranha'.

"Não seja insolente, seu mal agradecido, se não fosse por mim, você estaria vagabundeando no quarto de Câncer ainda. Se me afrontar com esse seu jeito insuportável, mando você de volta para lá!".

Foi a vez de Carlo corar, só que de raiva. Saori os haviam chamado para serem guarda-costas dela, mas os dois haviam entrado ali como um dos tantos putos que a 'Casa' tinha. E agora aquela cafetina ficava jogando isso na sua cara!

Ele, um imigrante italiano clandestino, bonitão, mas sem um tostão no bolso, com uma mãe que ficara viúva recentemente e irmãos pequenos para sustentar, não tivera muito opção à não ser se vender para mulheres velhas e ricas.

Mas não gostava de ser puto de mulheres. Ser segurança não lhe dava tanto dinheiro como esse 'trabalho', mas preferia assim, porque odiava sentir-se mercadoria. Se bem que aquela patroa era quase sempre tão intragável como as clientes femininas que atendia na antiga função.

"Por mim, tanto faz. Atendendo as garotas, ganho até melhor".

Saori sorriu, um brilho divertido no olhar maldoso. Por um instante, até se esqueceu que falavam sobre Milo e Kamus, os dois fugitivos. Brincou:

"E se eu dizer que você vai ter que atender clientes homens também? De todos os gostos e tendências...".

"Vou mandar você para o inferno. Um tiro certeiro, bem entre os olhos da testa".

Ela riu. Mas parou de rir quando viu no olhar assassino de Câncer que ele não estava brincando. Deu de ombros e fingiu que não havia feito a ameaça de instantes atrás. Desconversou e voltou ao tópico que era o objeto de atenção deles todos no início da conversa:

"Pois encontre logo aqueles dois ou vai mesmo voltar para o quarto de Câncer!". Olhou para Saga. "E você, se não encontrar logo um substituto à altura para o guarto vago de Gêmeos, vai também voltar a trabalhar nele".

Saga sorriu:

"Encontrei um substituto perfeito. Tão lindo quanto eu...".

Carlo deu um riso sarcástico...

"Que modesto...".

Saori ficou curiosa:

"Já me mandou fotos dele para meu e mail?".

"Não há necessidade. Ele é uma cópia fiel minha, na verdade, meu irmão gêmeo".

Saori e Carlo ficaram surpresos. Ela ampliou um sorriso de satisfação:

"Eu sabia que você tinha um irmão, mas na verdade, deixei escapar o detalhe de que era um gêmeo! Ele... Já está no ramo?".

"Não, Kanon é um tolo sonhador, pensa que eu trabalho numa boate comum e sonha em ser arquiteto um dia, mas...". Agora era Saga quem sorria, maldoso... Completou: "Mas isso só vai fazer dele uma mercadoria interessante. É um virgem, um hetero tolo e... encantador! Lógico, eu convencê-lo a vir morar comigo, vai depender de QUANTO a senhora vai me pagar por ele. Do resto eu cuido...".

Carlo sentiu seu estômago embrulhar. Já vira de tudo na vida, mas um irmão vender o outro como se fosse carne de açougue era algo repugnante até para ele. Saga iria aliciar Kanon num mundo sórdido e vil, sem a menor piedade...

Talvez fosse melhor mesmo voltar para o quarto de Câncer. Pelo menos, não tinha que ficar perto daquela bruxa e daquele pervertido do Saga, que, agora, começa a cair nas boas graças da patroa.

Saga perguntou, respeitosamente:

"Senhorita, logo iremos achar aqueles dois cretinos, a questão é: o que faremos com ele quando os encontramos?".

"Uma boa surra para começar. Se morrerem, joguem no mar com uma pedra amarrada aos pés, se sobreviverem, e não ficarem desfigurados para o resto da vida, tragam o que sobrou deles dois para voltarem a trabalhar, agora, com um pagamento bem menos apetitoso".

Saga suspirou... Não era santo, mas não tinha nada pessoalmente contra o grego e o francês.

"Mas por que não os deixa ir, simplesmente?".

Saori riu, um riso frio, tão frio como olhar bonito e sem vida que possuía.

"Devemos mostrar que as regras da nossa 'família' não devem ser desobedecidas. Além disso... Milo me deve uma".

Os dois seguranças se entreolharam, significativamente.

Então, Saori estava com raiva porque andara caindo na cama de Milo, e este preferira fugir com um HOMEM a se tornar o brinquedo favorito da cafetina...

Os dois homens assentiram com a cabeça e não discutiram mais as ordens da poderosa mulher que, segundo os boatos, comandava não apenas o Santuário, mas uma intricada rede de tráfico de armas.

Fizeram menção de sair, mas Saori chamou um deles...

"Saga"...

O rapaz atlético e sempre sério, virou-se para a patroa, solicito. Ela acariciou o tórax bonito por entre a camisa semi-aberta e falou, insinuante, acariciando os cabelos escuros:

"Fique. Quero discutir o 'passe' que vou lhe pagar pelo seu irmão e também... me divertir um pouco...".

Carlo saiu, deixando o ex-ocupante do quarto de Gêmeos para trás, junto com aquela 'deusa' de perversão...

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Era um dos doze apartamentos do edifício roído pelo tempo, naquela enorme cidade tumultuosa.

Silêncio… calma… paz… aquele apartamento completamente selado à espera de dono era absorvido pela ausência de qualquer som… por mais leve que fosse. O lugar era pequeno, sem grandes decorações. O minimalismo era ali levado ao extremo, não deixando nada além do essencial tomar conta do local.

Os poucos móveis existentes estavam embebidos em pó, revelando a total ausência de qualquer vida no local durante um bom tempo. Espaço, não era a qualidade principal naquele lugar. Constituído apenas por quarto, sala, banheiro e cozinha, não era a habitação ideal para muita gente. Seria sim, a primeira opção para quem fosse começar uma nova vida, longe de todas as amarras de uma antiga existência.

Mas a calma aparente logo foi desequilibrada pelo estrondo da porta ao ser aberta com demasiada força.

"Du Calme Milo! Ainda vai quebrar alguma coisa antes de nos mudarmos para este lugar…". Parou de falar ao vislumbrar o estado da sala. "… completamente desprovido de qualquer norma primordial de salubridade!".

Milo revelava um enorme sorriso no rosto, parecendo uma criança que acabava de ganhar um presente pedido com tanta vontade. Estava excitadíssimo com a ideia de morar com o novo amante, e sobretudo, longe daquele lugar chamado 'Santuário' que o fazia sentir tanta repulsa.

Foi entrando devagar levantando um véu de poeira. Kamus mantinha-se à porta, alguns pertences entre os braços, estático. Completamente repugnado com o estado lastimável em que se encontrava o apartamento.

Enquanto seus pensamentos vagueavam entre o 'como é possível acumular tanto pó sem que os móveis apodreçam' e 'será que vou conseguir morar aqui?'; Milo abria a janela completamente, deixando o vento entrar, ventilando o cómodo. Estava feliz… sim… extremamente feliz… finalmente o grande amor da sua vida o tinha aceitado como amante… e não haveria pó ou moveis degradados que o iriam fazer mudar de estado de espírito!

Divertiu-se com o semblante preocupado de Kamus que permanecia estático à porta, sem ter a coragem de entrar.

Andou até ele, calmamente.

Kamus acordou de seu transe quando se sentiu ser pego no colo e levando para o interior do recém alugado apartamento.

"Me solte Milo! Eu ainda consigo andar sozinho!".

"Não foi essa a ideia com que eu fiquei ao vê-lo completamente aterrorizado por um minúsculo apartamento num estado lastimável!". Milo ria à medida que via as feições do francês se alterarem com a última fala.

Finalmente no interior, foi pousado no chão de novo, mas sem ser largado pelo amante. Era tomado por um abraço forte, seus lábios tomados para um beijo terno.

"Não gostou do lugar não foi?".

As testas coladas, Kamus via preocupação na face do grego. Verdade que estava longe de ser o melhor que tinha tido. Estava habituado a quartos luxuriosos, grandes presentes dados por seus clientes em troca de seus favores. Nada daquilo… era o que esperava.

Sim, estava com o grego. Sim, tinha fugido do lugar que o sustentava. Estava feliz… habituar-se-ia aquela nova vida… pelo amante… por Milo.

Suspirou.

"Se estiver com você… está tudo bem".

Milo aliviou-se ao ouvir aquelas palavras. Exactamente o que queria ouvir. No momento certo, à hora certa. Entrelaçou os dedos aos de Kamus, e com a outra mão tomou seu queixo iniciando um novo beijo. Longo… calmo… demorado. Tentando apagar as incertezas dos dois.

"Bien… por onde começamos?".

Milo acariciou docemente a face pálida do outro. De novo voltou a provar os lábios de Kamus, mas desta vez de um modo mais necessitado. Levou uma das mãos aos longos fios azul petróleo evitando qualquer tentativa de afastamento do francês.

Era verdade que ambos sabiam o que estavam a fazer. Tanto ele como Kamus conheciam todas as manhas para levar o outro à beira da loucura. Apesar de estarem ali, ambos eram mestres na arte do 'sexo'.

Mas não era simplesmente de sexo que ali se tratava. Não… era amor… um profundo amor que Milo portava ao amigo desde a mais terna infância. Por isso durante anos a fio se contivera de tentar algo com ele. Com ele, tinha de ser… diferente.

Kamus retribuía ao beijo, enquanto suas mãos subiam habilmente por sobre a camisa de Milo. Os botões foram desapertados um a um.

A sua racionalidade obrigava-o a evitar os movimentos mecânicos executados com os antigos clientes. Estava pronto para se entregar ao amigo pela primeira vez. Sim, apesar de se sentirem atraídos mutuamente, era a primeira vez que chegavam 'ao momento'.

Sem se separarem, caminharam até ao sofá. Alguns beijos e mordidas eram depositados sobre o pescoço de Milo, enquanto as mãos estavam ocupadas a abrir o botão das calças jeans.

Ao bater com os pés no sofá, Kamus descolou-se do amante e olhou-o nos olhos. O dia em que Milo se recusara a ele na suposta primeira vez veio à sua mente. O barco… Gigars… as primeiras carícias trocadas… a revolta de Milo. Sorriu. Sentou-se no sofá sem cortar o contacto visual. Milo, as faces ligeiramente rosadas, ofegava prevendo o que Kamus iria fazer. As mãos hábeis do francês manipulavam agora o seu sexo já desperto por entre a cueca.

Milo gemeu alto quando num gesto, a única peça de roupa que lhe restava foi retirada e seu membro tomado ate metade pelo amante. Kamus sugava bem lentamente a glande enquanto as mãos ajudavam no movimento de vai-vem. Era raro receber aquele toque de um dos seus clientes… geralmente, era sempre ele que proporcionava aquele prazer… mas céus… como ela quente…

Após alguns minutos nesta situação, estava prestes a gozar. Puxou os longos cabelos de Kamus com ligeira força. Este entendeu o gesto e parou a felação.

Encararam-se sorrindo. Milo avançou sobre o corpo abaixo de si, obrigando-o a deitar-se sobre o sofá. Tratava de despir o francês, quando ouviu a respiração deste começar a ficar pesada. Levantou-se ligeiramente, conseguindo ver a face rosada de Kamus, de olhos fechados, os lábios ligeiramente abertos, deixando escapar o ar com certa dificuldade.

"Kamus… está tudo bem?".

A pergunta deixou transparecer toda a preocupação do grego. Passava a mão sobre o rosto do francês fazendo carinhos enquanto esperava por uma resposta.

Kamus abriu ligeiramente os olhos e tentou erguer-se. Milo sentou-se no sofá desajeitadamente ajudando o francês a levantar-se. A verdade era que o simples barulho da respiração arfante de Kamus o estava a excitar demasiado.

"Asma…".

A voz do francês soou fraca, mas dava para ser ouvida. Foi então que Milo se lembrou do pequeno problema que perseguia Kamus desde que o conhecia. Kamus era ligeiramente asmático. Lembrava-se de que, enquanto pequeno, ele raramente corria grandes distâncias por causa da respiração.

Certamente com todo aquele pó, ele tinha ficado afectado. Levantou-se apressado levantando o francês consigo. Correu até à janela aberta, para que Kamus pudesse respirar o ar não tão puro vindo do exterior.

Apenas se acalmou quando viu a respiração do amigo voltar ao normal. Soltou o ar dos pulmões num suspiro longo. Estava nu, frustrado, preocupado, e completamente sujo.

Kamus olhava-o ternamente, um ligeiro sorriso nos lábios.

"Acho melhor tornar este lugar mais 'habitável' antes de tentar alguma coisa".

Abraçou o grego por trás, depositando pequenos beijos na junção do pescoço e do ombro. Enquanto uma mão era passada possessivamente pela cintura de Milo, a outra era levada ao local de maior necessidade, continuando o movimento de vai-vem parado momentos antes. Se não podia dar a Milo o que tanto esperavam, ao menos ajudá-lo-ia a atingir o ápice tão necessitado.

Os gemidos roucos ecoavam pelo apartamento. Milo lançou a cabeça para trás, apoiando-se em Kamus. Uma mão cravava as unhas no braço do francês enquanto a outra ajudava no movimento de masturbação, indicando o ritmo.

Milo gozou abundantemente com um chamamento por Kamus, melando a sua mão e a do francês. Alguns segundos passaram até que a respiração do grego voltasse completamente ao normal.

Mas, após aquele gozo intenso, sentiu-se um pouco mal. Estava extasiado ainda, a paixão falando alto, mas um lado romântico que jamais ousara ter o incomodava.

Não deveria ter deixado Kamus satisfazê-lo... O francês estava com asma, num lugar que evidentemente desprezava pela bagunça e sujeira e ele, Milo, se deixara levar pensando apenas nele mesmo...

E Kamus, agora, estava ali, quieto, daquele jeito típico seu, lindo, altivo, mas uma altivez que às vezes beirava a indiferença com tudo...

Kamus notou o constrangimento de Milo, mais por intuição do que por qualquer outra coisa:

"Milo, o que foi?".

"Nada".

"Como nada? Esqueceu que te conheço desde que era um garoto que adorava aprontar travessuras?".

Milo recompôs suas vestes... Diante do gesto do outro, Kamus também assim o fez. O grego disse, sem olhar para o outro:

"Não deveria ter sido assim a nossa primeira vez".

"Assim como?".

"Você agindo como se eu fosse um cliente. Eu não sou".

Kamus arqueou as sobrancelhas, incrédulo.

"Eu não queria deixar você naquele estado... Enquanto eu tinha um ataque de asma!".

"Tivesse deixado. Entenda, Kamus, eu e você. Droga, não estamos atrás de uma boa foda só".

Kamus se ofendeu até a alma. Tinha sido cordato e desejoso do amante, tentando fazer os dois sentirem prazer naquele mar de pó do melhor jeito possível, e agora Milo criticava seu jeito de agir?

"Oras, está insinuando que eu agi como um puto?".

"E não agiu?".

A pergunta fez Kamus corar até a raiz dos cabelos. De vergonha. Mas de raiva também. Milo entendeu perfeitamente o xingamento na língua nativa do outro:

"Vas au diable Milô ! " (-1-)

Somente então o grego percebeu a extensão da bobagem que havia dito. Deixara seus ciúmes da ex-profissão de Kamus atrapalhar tudo. Diabos, não era ele, Milo, até então, um puto também? Que direito tinha de julgar Kamus?

"Espera, me desculpa, eu... Falei sem pensar".

"Não pensar é mesmo uma característica de quem é acéfalo como você!".

"Ah, droga, Kamus... Eu... Venha cá... Me perdoa".

Mas Kamus estava mesmo irritado, afastou-se.

"Depois a gente conversa mais. Preciso sair daqui antes que um novo ataque me sufoque os pulmões. E eu nem fui pago para suportar isso, não é mesmo?".

Foi a vez de Milo corar, sem jeito.

"Kamus...".

Mas Kamus cortou o que o outro dizia:

"Vou comprar um remédio e alguns baldes e vassouras para limpar esse lixo. Até depois".

Kamus saiu e bateu a porta, irado. Milo estremeceu. Conhecia aquela voz gélida como um iceberg. Se Kamus resolvesse colocar ele na geladeira... Iria ser um começo de vida a dois bem turbulento... Mas a culpa era a de sua língua de trapo e seu cérebro cozido pela paixão. Tinha que aprender que Kamus não deixava nada passar em branco...

-OOO-

Quando Carlo di Angelis saiu da sala de sua patroa, passou pelo salão principal do bordel para vistoriar a equipe de segurança, pois era essa sua função principal ali dentro agora.

Todo de negro, um pull over justo a moldar seu corpo atlético, o italiano tinha ali dentro a aparência de um lince perigoso. Chamou atenção de muitos olhares. Outrora, fora um dos homens mais cobiçados daquele lugar, mas, não gostava daquilo. Mesmo que fosse sair apenas com mulheres, preferia mandar, não ser mandado. O serviço como segurança era, para ele, muito mais apropriado.

Ouviu alguns assovios e burburinho, mas ninguém, homem ou mulher, ousou lhe dirigir a palavra, tamanho era seu ar de poucos amigos. Um homem lindo e perigoso, que não dava margem a menor chance de entrosamento social.

Mas justamente por isso, era uma beleza de tirar o fôlego. Um homem inacessível.

Ele caminhou por entre as mesas e foi para perto de dois seguranças que ficavam ao lado da passarela onde os garotos de programas na noite se apresentavam para leilão. Trocou ordens e informações com eles, até que as luzes se apagaram e uma apresentadora lindíssima indicou que o mais belo do Zodíaco iria se apresentar hoje.

A voz que fazia as apresentações e pedia lances à platéia de lobos famintos anunciou:

"Afrodite! Mais belo do que a própria deusa do amor!".

Carlo virou-se para a direção que os holofotes se apresentavam, com um ar de enfado e indiferença, mas estava um pouco curioso, pois ainda não havia visto o garoto que chegara há poucos meses no famigerado bordel. Já ouvira boatos de que o jovem largara a carreira promissora de modelo para trabalhar ali. Bobagem. Sorriu, malicioso... Um pervertido, de certo. Quem largaria uma carreira idiota, mas honesta, para virar puto?

Ele apareceu vestido com uma minúscula túnica grega, enquanto duas garotas abriam alas para ele jogando rosas para lhe formar um tapete cujo odor era delicioso.

Carlo tentou desviar os olhos, mas não conseguiu. Algo no olhar do garoto, seu jeito felino de andar, o incomodava, mas atiçava sua curiosidade.

Afrodite era uma exótica e inexplicável mistura dos dois sexos. Tinha o tórax largo, músculos bem feitos e evidentemente masculinos, mas, ao mesmo tempo, uma silhueta alongada e tão harmónica que deixaria qualquer artista extasiado pela sua perfeição.

Os cabelos, longos e fartos, pintara-os num azul intenso e a cor esdrúxula realçava a beleza do rosto maquiado, que conseguia ser, ao mesmo tempo, feminil e selvagem.

Era como se um anjo e um demônio habitassem unidos naquele corpo de perdição.

Mas...

Por que aquele rosto, aquele corpo forte e musculoso, lhe era familiar? Não, estava imaginando coisas... Onde já vira aqueles olhos da cor azul violeta, que deixara a própria Elisabeth Taylor roxa de inveja? Aquela boca carnuda... A pinta do lado esquerdo.

Já vira antes aquela exótica mistura de perdição e pecado? Claro que não.Não era possível...

Ouviu a voz do outro segurança...

"Meu deus, já viu algo tão lindo na sua vida?".

O rosto de um menino, de cabelos muito louros e olhos imensamente azuis lhe perpassou a mente rapidamente, como num sonho... Uma criança tão bela que os querubins o invejavam... Uma vez... No internato onde estudara... Na Itália... Um menino lindo como aquele... Que justamente sofria preconceito, injurias e chacotas por ser feminil e bonito demais...

"Menininha, é isso o que você é, agora para de fazer frescura...".

Os garotos o haviam encurralado no vestiário. O apupavam e o tocavam, marcando a criança com humilhações inconfessáveis...

Já o colocavam nu para rirem e macularem a inocência da criança...

Fôra nesse instante que ele, Carlo, aparecendo no vestiário, pegara os colegas atacando o menino como chacais atacam o cordeiro indefeso...

Carlo havia quebrado a costela de um, o maxilar de outro. E, diante desse seu ataque, o bando todo fugiu, como os covardes que eram. Lembrava-se bem do corpo tremulo e assustado do menino, branco como a neve num dia de tênue sol de Inverno.

E seus sentimentos, naquele instante, também não haviam sido puros. Mas lutou contra a bestialidade que todo homem carrega e cobriu o garoto com seu agasalho que, grande demais na criança, a cobria por inteiro...

"Não deveria ter vindo para cá com eles, nessa hora da noite! Você deveria estar com os outros meninos da sua idade!".

A voz soara triste demais para uma criança tão pequena...

"Eles me disseram que havia fantasmas por aqui, e, que seu viesse encontrá-los, poderia conhecer um fantasma de verdade!".

A música e o gingado sensual de Afrodite fez Carlo sair das lembranças de um passado distante...

Ele finalmente respondeu a pergunta do outro segurança:

"Uma vez... Há muito tempo... Mas aquela beleza que eu conheci era a de um anjo, não era como a desse demônio de luxúria e perdição... Um pequeno bambino, digno de ser pintado na capela Sixtina. Ficou poucas semanas no internato e depois sumiu...".

"Ah, duvido que fosse lindo como esse".

Na passarela, Afrodite tirou a roupa. Carlo estremeceu diante da nudez súbita, enquanto todos na plateia gritavam de excitação e ovacionavam. As sifras das ofertas subiam astronomicamente.

Os olhos de Carlo brilharam admiração e desprezo.

"Esse não passa de um viado, Paul. E eu tenho mais o que fazer...".

Mas antes de se retirar, Carlo fitou Afrodite por mais alguns segundos, e, foi nesse exato instante, que o glamouroso garoto de programa, nascido de pai sueco e mãe italiana, reconheceu naquele homem, o rosto de quem, um dia, fora um garoto mais velho que agira com ele como um verdadeiro cavaleiro andante. Estremeceu. Mas não era de frio. Era de pura felicidade de rever o rosto, antes de um adolescente e agora de um homem que povoava seus sonhos mais secretos.

-

Continua…

(-1-) Vas au diable Milô ! - Vá para o diabo Milo !


Jade Toreador: Espero que tenham gostado! Por favor, não deixem de ler a fic CONTO DE NATAL para pegarem o clima dessa trama XD

Áries Sin: simmmm… espero sinceramente que tenham gostado… depois de algumas discordâncias relativamente a certas palavras XP (problemas entre o português do Brasil e o de Portugal) aqui saiu finalmente a minha baby em parceria com a Jade. Até ao próximo capitulo… espero eu

Beijo enorme a todos

J.T. & A.S.