Capítulo 1

" Filho da puta "

Essas eram as únicas palavras que Cuddy conseguia pensar. Ela passa os olhos mais uma vez sob o documento em suas mãos. Mais um processo judicial contra House. Mais uma reunião agonizante com o conselho. Manco desgraçado. Ela não se importava com o processo, logo tudo estaria resolvido. No entanto, ela o havia advertido várias e várias vezes. E ele a ignorara completamente.
Mas ele ia pagar. Se o conselho ia comer-lhe a carne, ela ia esfolar ele antes. Ela joga o papel sobre a mesa e sai do seu escritório. Cuddy estava possessa, a raiva a dominara de maneira extraordinária. Seu rosto queimava, ela sentia o sangue pulsando rapidamente em suas veias. No corredor que dava acesso à sala de House, podia se ouvir claramente o som dos saltos Salvatore Ferragamo batendo violentamente contra o chão. Apoiando um dos braços na porta, ela a abriu com extrema violência.

Talvez ela não estivesse preparada para a cena a seguir. House e Stacy estavam no meio de um beijo pra lá de caliente, e palidez ainda não era a palavra correta para descrever o rosto deles ao vê-la. Stacy notou a postura rígida de Cuddy, e saiu da sala tão rápido quanto pôde. Cuddy nem sequer se dera ao trabalho de olhar para ela. House, despreocupado, olha-a nos olhos, analisando a linguagem corporal dela, enquanto Cuddy o encarava furiosa. Ela estava mesmo com raiva. O modo como seu maxilar rangia demonstrava um ódio visceral.

"Eu disse pra você não fazer a lobotomia. E você fez, portanto, você vai ficar suspenso. Sua equipe vai trabalhar em outro departamento por pelo menos uma semana."

"Porque não é minha obrigação lembrá-lo que eu sou sua chefe."

"Também não é minha obrigação olhar para seu enorme traseiro cósmico."

"House" – ela suspira, e indica que vai sair da sala. Mas volta a tempo de terminar – " Faça seu maldito trabalho."

Ele formulara um resposta em sua mente. Mas antes que ele pensasse em dizê-la, Cuddy já havia desaparecido.


Cuddy tentava concentrar-se nas papeladas em sua mesa. Ela solta algumas folhas, apoiando os cotovelos na mesa enquanto massageava as próprias temporas. Por que ela estava tão tensa ? Nesse mesmo minuto, Stacy entra na sala. Cuddy a olha rapidamente e volta a prestar atenção à papelada em sua mesa.

" Estava me procurando Lisa ?"

"Eu preciso que você resolva isso" - Cuddy manteve a mão estendida até que ela pegasse o papel em suas mãos. – "Não me importa como você vai fazer. Se for precisar do House para alguma audiência, leve-o. Se conseguir o acordo, deixe a papelada no Departamento Financeiro e eles cuidarão disso. Dê um jeito. Isso precisa ser resolvido."

Cuddy voltara a concentrar-se nos papéis em sua mesa. Stacy, no entanto, não se movera. Cuddy a encara, questionando a falta de ação da advogada.

" Cuddy, desculpe pelo que você viu, eu ..."

" Stacy" – Cuddy a interrompera, e sua expressão facial demonstrava a falta de paciência dela – " Não me importo de você e do House estarem juntos ou não novamente. Eu não vou me intrometer na vida pessoal dos meus funcionários, embora esteja acontecendo dentro do meu hospital. Agora, você tem alguma dúvida sobre o que eu pedi pra você fazer ? "

" Não, mas ..."

" É só isso, Stacy."

Cuddy estendeu a mão indicando a porta. Ela nem sequer olhava Stacy nos olhos. Assim que ela saiu, Cuddy teve que suspirar pesadamente.

Porque ela estava tão furiosa ? Processos de House eram mais rotineiros que a presença dele no hospital. Flashbacks do beijo que vira lhe atormentavam a mente. O beijo estava incomodando-a. Talvez porque ela soubesse que Stacy iria partir e deixá-lo em pedaços. E só ela sabia como os comentários rude e cruéis dele machucavam. Mas seria mesmo por proteção à si mesma ? Seria o único motivo ? Seria possível que ela ... Não, isso era absurdo de se pensar.

Seu celular começara a gritar histericamente. Ela revira o interior de sua Balenciaga sem pressa. Assim que encontra o celular, a tela se ilumina, iluminando também seus pensamentos.

Noah is calling you.


House estava sentado na portaria do PPTH. Ele havia sido sorrateiro em dispensar o zelador, para que tivesse livre acesso à televisão. Logo iria começar Hilda Furacão.

Ele, com certeza, não ia trocar clichês amorosos e sedutores por um paciente com Guillan-Barré. Pouco justo. Mas enquanto os comercias enchiam a tela de propagandas dispensáveis, House rola os olhos através do vidro, dando uma singela observada no estacionamento. Um volvo lhe chama a atenção imediatamente.

Um volvo ?

E em instantes, a tevê não importava. House se perguntava quem, entre todos os médicos no prédio do PPTH, teria um volvo. Provavelmente, ninguém.

House estava em pé, aproximando-se da porta para enfim ver quem era o cara encostado no carro. Um homem mediano, de traços fortes e bem definidos. Vestia uma jaqueta de couro que certamente lhe havia custado muitas centenas de dólares. Nunca o havia visto, embora ele fosse vagamente familiar.

Uma criança irritante começa a berrar na clínica. Ele tenta se concentrar. Seria ele marido de alguma médica dali ? Improvável. Ele com certeza não era um paciente. Nem mesmo um sócio. A criança voltou a berrar.

" Por favor, dê um sonífero pra essa criatura. Aqui é um hospital, não toleramos essa bagunça."

E após dizer isso à enfermeira, piscou o olho enquanto mantia o dedo indicador nos lábios, num simbólico gesto de silêncio. Quando ele finalmente torna a olhar para o carro magnífico, outra cena lhe rouba a visão. Cuddy estava abraçada ao cara da jaqueta de couro.

" Fuck."

E só havia isso a ser dito. Cuddy sorria genuínamente e o cara correspondia à altura. Havia faíscas e House pode senti-las. Ele imaginou novamente quemseria esse cara. Precisava descobrir o quanto antes.


Noah era, no mínimo, sexy. Ela tinha que assumir. E educado. Um perfeito gentleman. Nunca passara pela mente de Cuddy que ela entraria dentro de um volvo antes de dormir.

" Você está quieta demais, Lisa."

Ele tirou-lhe a linha de raciocínio. Ela olhou-o nos olhos por breves segundos, e tornou a olhar pela janela.

" Tem coisas que não precisam ser ditas."

Ele apenas riu. Ela suspirou.

" Pra onde vamos ?"

" Em um restaurante chinês. Você vai adorar."

" Vamos ver."

Cuddy lhe dera um breve sorriso. Vadio. Ele a tinha levado ao Itiban, o restaurante chinês mais elegante em toda a cidade. Era um restaurante com decoração vintage porém moderna, mesas forradas com tecidos egípcios, uma vista sonhadora da praia. As luzes eram baixas e por isso, a voz de Lauren Hill soou ainda mais tocante do que o normal.

" Você é um cretino."

" E você é uma donzela muito gentil. Mas garanto que até o final da noite, sua opinião será completamente diferente."

" Sem chance."

" É o que veremos. "

E o garçom apareceu com a garrafa de vinho.


Cuddy e Noah sentaram-se na areia, para observar a beleza daquela praia semi-deserta. Realmente, o modo como a luz cálida da lua se refletia no mar era quase filosófico. Não era nenhum momento de romance à la Shakespeare, mas foi inusitado e repentino o modo como eles se concentraram no horizonte, como se cada um buscasse suas respostas.

Cuddy segurava seus caríssimos sapatos na mão, enquanto sentia a umidade natural da areia sob os seus pés. Uma brisa gelada se abatera contra os ombros dela, arrepiando-a.

" Está ficando tarde, Noah. "

Ele usara o peso do corpo para se aproximar dela. Seus joelhos estavam encostados, mas o resto do corpo continuava afastado.

" Apenas mais um pouquinho, Lisa. "

Os olhares se cruzaram no mesmo instante. Ele se inclina, mas não percorre toda a distância até seus lábios. A mão dele pousa na lateral do rosto dela, acariciando-lhe a maçã do rosto com o polegar. Ele cede o controle da situação, esperando até que ela reaja.

Aqueles olhos verdes. Verdes como esmeraldas recém lapidadas. Cuddy não precisaria beijá-lo, se não quisesse. Mas ela queria ? Ela não sabia. Talvez porque ela estivesse com raiva. Talvez aquele fosse o modo da vida colocar todas as coisas em seus lugares. E Noah olhava tão fundo em seus olhos, como se ele pudesse ver por trás da muralha, como se enxergasse sua alma. Chegara o momento de escolher o caminho seguro.

Cuddy apoia-se nos próprios cotovelos, impulsionando-se para cima e eliminando qualquer distância entre eles. Um dos braços de Noah deslizou pela cintura dela e a puxou para ele com força. Ela esparrama as mãos no tórax dele, subindo lenta e delicadamente, roçando pelo seu cabelo espetado, e cruzando-as gentilmente por trás da nuca dele. Enquanto uma das mãos dele a pressiona fortemente contra ele, a outra faz uma ligeira massagem pela parte exterior da coxa dela.

É. Ficar mais um pouquinho não tinha sido uma má idéia.