Capítulo 1

Enfim, mais uma noite tranqüila onde poderia descansar. Sentou-se na cama e jogou os longos cabelos para frente: gostava de penteá-los antes de deitar-se, para que ficasse sedoso e desembaraçado. Era até saudável, no meio de tantas preocupações, pensou, e a fazia relaxar.

"Toda noite é assim: descanso, tranqüilidade e... solidão." Seus olhos amendoados encheram-se de lágrimas, enquanto as mãos desciam junto com a escova para o colo. Abaixou a cabeça e pensou: "Ó deus, por quê? Por que não posso ser como as outras garotas da minha idade?"Uma lágrima pingou no mármore branco impecavelmente limpo do local.

O quarto era grande e espaçoso, muito bem decorado. Simetricamente dispostos à cama, estavam uma cômoda talhada em mármore branco, onde ficavam sua televisão de plasma, seu notebook (que nunca havia sido ligado) e seu home theater pessoal. Nem sabia para que precisava de outro computador: em seu gabinete já havia tantos quantos pudesse desejar. Do outro lado, ficava sua penteadeira, com seus perfumes, e outras coisinhas femininas... Assim como a cômoda, também era feita em mármore, com puxadores de cristal e três espelhos em ângulos.

A jovem ergueu a cabeça e olhou para frente. O espelho mostrava uma garota magra, nos seus dezoito anos, longos cabelos de um tom purpúreo. Inchados olhos verdes olhavam-na tristemente. O brilho escapava deles como o sol se pondo sobre as montanhas.

i"Ah, como eu queira que meu querido avô estivesse aqui! Sei que me ajudaria a passar por isso... Conheço cada um dos meus deveres, mas como é difícil esconder, sufocar estes sentimentos dentro do meu peito? Haverá um lugar onde poderei guardá-los, ocultá-los por mais tempo? Afinal, uma parte de mim é tão humana, tão frágil... Sofre e padece as mesmas paixões mortais. E estas malditas lágrimas que preenchem minhas amargas noites..." Enfiou a cabeça sobe os travesseiros de pena de gansos americanos, para que suas colaboradoras (era assim que tratava suas empregadas) não ouvissem seus gemidos e soluços.

"Por quê?" , gritava em sua mente, "por que eu?" Esta era uma dor que nunca morreria. Era de fato mais difícil suportá-la do que a uma flecha no peito, ou ainda, sustentar as geleiras com o que chamavam de poder sobrenatural... "De que me adianta tudo isso? Bem ou mal, o mundo está em segurança agora, não preciso disso." Olhava para si mesma com certo asco. "Se minha felicidade não está somente aqui... Por quê? Por que tive eu que nascer para ser... Atena?" , soluçava.

Ouviu passos. Ergueu-se um pouco, apoiada no braço direito e olhou para a porta. Mas não viu ninguém entrar. Logo, não era uma de suas camareiras. Apesar disso, sentiu um energia vindo ao seu encontro, uma energia doce e quente ao mesmo tempo. Suas pupilas dilataram-se e seu olhar desanuviou-se um pouco.

"É ele!", sorriu, entre as lágrimas, "deve ter vindo me desejar boa noite...", trancou os lábios, mordendo-os. "Gostaria que ele estivesse aqui." Levou a mão ao coração. "Posso sentir as batidas de seu coração, confundindo-se com o meu." Virou-se e, enquanto olhava novamente para sua imagem refletida no espelho, um pensamento desagradável passou pela sua mente. No mesmo instante, tomou uma decisão. Uma determinação divina tomou-a. Levantou-se depressa, vestindo seu robe e calçando suas pantufas (que trouxera de recordação de sua infância) e correu para a porta abrir, segurando a respiração, porém... Era tarde. Não viu ninguém exceto uma jovem camareira no final do corredor.

- Nika – perguntou.

- Pois não, senhorita? – adiantou-se a empregada, com o olhar prestativo.

- Você viu mais alguém no corredor? Havia outra camareira por aqui?

- Não, milady. Todos já se recolheram – de repente, seus olhinhos azuis estreitaram-se sobre alguma coisa próxima à porta e sorriu – Veja só, que interessante, senhorita Saori. São flores de alecrim!

- Alecrim? – indagou a jovem – Sim, - inspirou o perfume – é alecrim!

- A senhorita sabia que quando se recebe esse tipo de flor de alguém é como se a pessoa que enviasse estivesse dizendo: "não me esqueça"? – disse Nika, enquanto entregava a flor à sua senhora.

- É mesmo?

- Bom, isso é o que me contaram na cidade de onde eu vim. E tem mais –disse a criada, com ar de conspiração – não é a primeira vez que encontro estas flores em sua porta! A principio, julguei que poderia ser ofertas a sua divindade, porém... – riu, e com um olhar malicioso disse - percebi que não. Se há uma coisa da qual tenho certeza é que a senhorita tem um admirador muito apaixonado e tímido, que deve nutrir um sentimento muito puro e forte. – inclinando a cabeça loira para o lado, pensou: "Será que poderia ser correspondido"?

- Obrigada, Nika. Prestou-me grande esclarecimento. - Virou-se para ocultar um sorriso triste – Talvez tenha razão. Boa noite. – mais baixo – Não diga isto a ninguém!

- Sim, senhora! – disse a serviçal – boa noite.

Entrando em seu quarto, encostou delicadamente na porta enquanto a trancava. Segurava a flor com a outra mão entre os seios. "Amado...", murmurou, ou antes , pensou tão alto que as palavras escaparam de seus lábios. Jogou a cabeça para trás e suspirou. Onde estaria com a cabeça, meu Deus... Abrindo o armário, guardou lá dentro o raminho, retirando uma pequenina flor.

Caminhando bem devagar, tirou o robe e abriu as portas da sacada, que davam para o jardim. Observou a quietude da noite, suas estrelas cintilantes e uma lua minguante muito pálida. Apoiou-se na mureta e ficou assim durante algum tempo, até perceber um farfalhar sob a sacada. Por um momento, seu coração parou. Afinal, após tantos inimigos, era normal sentir-se um pouco apreensiva. No entanto, ela pode discernir entre as folhas um vulto alto, envolto numa capa. Ao vê-lo, nem precisou se esforçar para saber quem era. Seu coração já o sabia...

Continua...


espero que gostem!

Obs.: Es te fic foi originalmente publicada no site AnimeSpirits.