A garota de cabelos louros que tinha uma nova família na rua Himmel estava despedaçada. Perdera o irmãozinho e a mãe. Não seria fácil seguir uma nova vida depois disso, e você sabia. Você olhava carinhosamente para Bettina, para Anna-Marie, para todos eles, e para seus pais. E tentava imaginar o que seria se, um dia, os perdesse.

E chegava à conclusão que sua nova vizinha sofria, e sofria muito.

Mas ela vivia; e sorria ocasionalmente.


E você achava engraçado o modo com que ela se irritava e te chamava de saukerl, e sempre acabava retribuindo o elogio com um saumensch. Você a achava encantadora e tão solitária, e às vezes pegava si mesmo no flagra observando o modo com que ela olhava para o céu ou para as palavras em seus livros.

E vocês dois passaram a procurar um ao outro por naturalidade, pelo simples motivo de que, juntos, não estavam sozinhos. Esta frase pode parecer redundante, mas, se não fosse você, talvez ela fosse sozinha pelo resto da vida na rua Himmel, mesmo com tanta gente. Mas vocês se tornaram tão amigos, e ela se apegou aos seus novos pais, e você sorria ao pensar que, talvez, tudo pudesse dar certo para aquela menina com história tão triste.

Era mesmo uma linda amizade, digna de histórias em livros e filmes.


Tudo era pincelado com tons de cinza, por todos os lugares. Era frio, era nublado e era triste.

Mas, de alguma forma, você via as cores se concentrarem nela.


Você pedia beijos por brincadeira; no início. Mas passava noites em claro imaginando como seria sentir os lábios da linda e triste garota sobre os seus. Em sua inocência de criança com um toque de malícia que todo garoto possui à medida que a adolescência chega, você a queria, você a amava.

E sabia disso porque o sorriso dela fazia seu coração acelerar mais que qualquer coisa.


Você a admirava.

Admirava a maneira com que ela era boa, verdadeira. A maneira com que era corajosa e não aceitava calada. Admirava o modo com que quebrava sua fragilidade exterior com toda a força que vinha de dentro.

Vocês apenas queriam entender o mundo, entender a amizade, entender a dor.

E com ela, mesmo sem saber, você também entendia o amor.


E então tudo não passava de corpos largados no chão da rua Himmel. Hans e Rosa Hubermann, sua mãe, Bettina e todos os seus outros irmãos. E você.

É uma pena que não tenha vivido para finalmente sentir os lábios dela, doces e tristes, entre lágrimas, como uma despedida. Ela estava sozinha, então. Estava sem você. E desejava que pudesse ter partido em seu lugar. Porque você era cheio de vida, e era cruel o modo como o fim chegou, tão abruptamente.

Você, Rudy Steiner, era a essência dela, era a salvação.


N/A: Essa one-shot é dedicada ao meu Rudy Steiner (que, diferentemente do verdadeiro, está vivo e não sei se me ama do jeito que eu o amo), mesmo sabendo que ele nunca lerá.