Morte e Lápide

Capítulo I

Desespero

Do que adianta sentir o desespero agora?

Não, não é só culpa dele. Desde o começo, você apostou tudo no jogo. Todas as fichas que possuía – o rosto, a privacidade, a identidade, o cargo. Agora não adianta querer voltar atrás, querer tomar rumos diferentes.
Sabia. Sabia desde o momento em que quis aceitar o caso, poderia morrer.

No que você imaginou quando se atou a ele? Clemência, amizade, amor, pena. Queria que ele tivesse misericórdia ou pena?
Você nunca nutriu um terço, por ele. Que seja sincero. Talvez respeito, admiração; ambas as inteligências eram igualadas. E isso que te atraiu.
Ah, sim, você sentiu atração.

E agora, desespero.

Os sinos estão se tornando cada vez mais altos, o som ecoa no seu interior; semelhante à vez de que seus pais morreram. Você tinha o dom de escutar o choro por mais uma alma.
E nesse caso, sua alma.

Não, não se desespere.

Você não está deixando ninguém de suma importância vivo. Alguns que te foram estimadas, já estão mortos; e não se apegue ao pensar nas pobres criancinhas do orfanato. Não, não.
Seja sincero com você mesmo. Apenas se agarre ao pensamento de que uma delas derrotará seu assassino.

Ah, mas que você fosse morto pelas mãos do verdadeiro assassino, não por uma cópia, por um segundo, terceiro ou quarto. Que seja ele. Aquele que você se empenhou tanto pra descobrir.
Mesmo que, sempre tenha sabido quem era, mesmo que vocês dois tenham jogado tênis, dormido juntos, dividido um doce. Que você seja sincero consigo.
Foi tudo por orgulho. E naquele momento era divertido, não angustiante como agora.

Não adianta se desesperar, não agora.

Seria ironia dizer que os céus estariam chorando por você. Era só uma disfunção meteorológica. Não o choro de seres divinos.
Mas, se isso te conforta; que fique recebendo as lágrimas celestiais. Você nunca se comparou com um ser humano normal, sempre acreditou que emoções e crenças era demonstração de fraqueza. E agora, pede por uma alma maior, e sente o desespero, o medo.
É assim que os humanos se sentem com a fragrância da morte.

Você sente desespero como eles, Lawliet.

Quando a sua matéria estiver desfeita, a sua inteligência não servirá pra nada. E tem a consciência disso como ninguém. Mas, que antes, você ainda a ponha em prática com seu assassino.
Lembra da misericórdia?
Você não iria embora, sem demonstrar que perdoa seu assassino, seu traidor.

Mesmo com o desespero crescendo, infidamente, no seu interior, não é L?

E repete uma cena, similar a da Ceia¹. Aquela em que Jesus Cristo, lava e seca os pés de Judas; o seu traidor. Que se alimentou, dormiu e conviveu - era o seu Judas, e você tinha a plena consciência.
Nem com a morte próxima, você não deixa de ser calculista. E que ponha sinceridade. Secou os pés do seu assassino, em pedido de misericórdia. Mas, ele não a daria a você, L.
E se ele o desse, você o mataria.

Sem desespero, L Lawliet.

Ele veio receber seu corpo caído, ele veio fingir - mais uma vez, que era seu amigo. O seu assassino que verá sua vida se extinguir como num sopro. Ele que irá respirar melhor sem você. Sem desespero, sem medo.

Agora, uma lápide será o espaço apropriado para o seu desespero, L.

X

Nota: ¹ A Ceia – uma interpretação minha, ao capítulo 25, em que L seca os pés de Light.
Não sei se observaram ou interpretaram desse modo. L queria dar provas de perdão ao seu assassino e traidor, no ato de secar os pés.
Secar os pés de seu irmão, na bíblia, significa ter humildade, saber perdoar. E Cristo, na Ceia; fez questão de banhar e enxugar os pés de seus apóstolos, e dentre eles, estava Judas Iscariot – Cristo sabia a que Judas, num futuro próximo viria entregá-lo a César (morte). Que foi o que traiu com um beijo, por algumas moedas de ouro.

Construirei uma série de drabbles, sobre o momento da morte de cada personagem.