Final de tarde. O vento sopra com delicadeza, arrepiando as folhas das árvores que avermelham-se lentamente rumo morte. Li senta-se após uma tarde de treinamentos e observa, do alto de seu templo, a aquarela de cores pintadas no horizonte: o azul do céu tingido pelo alaranjado das nuvens, e o degradê incrível nas montanhas, cuja densa vegetação pincela a paisagem com algum e qualquer tom entre verde e vermelho.
O outono é uma estação maravilhosa (como todas as outras estações) na Ásia e, em particular, ali naquelas montanhas perdidas no meio do continente. É o momento em que as mudanças na Natureza, que ocorrem a todo instante, são mais perceptíveis ao cego olhar humano. A força e a robustez que as árvores esbanjam no verão tornam-se apenas uma sombra distante da seca e frágil imagem que exibem no inverno; e essa intensa mudança ocorre num breve espaço de um ou dois meses. "Tudo passa tão rápido," ele pensa. "E, contudo, é nesse curto espaço que a vida acontece. As folhas nascem, crescem, oferecem sua sombra no verão, e morrem; tudo isso em poucos meses. Perto delas, somos praticamente imortais."
Uma brisa mais intensa sopra, e uma folha cai aos seus pés. O jovem guerreiro observa o cair da folha com um certo ar de reverência. Delicadamente, a toma em suas mãos e perde-se em pensamentos. Olha para o leste, com os olhos além das montanhas e muito além do oceano. "O frio está chegando. Espero que você esteja cuidando-se direito." Larga a folha seca, que rodopia lentamente no ar, antes de ser arrastada para longe por uma outra soprada do destino.
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A quilômetros dali - numa terra muito, muito distante - uma jovem mulher corre apressada para acertar os últimos detalhes de seu último trabalho. "Não é possível! O que aconteceu com aquele arquivo? Eu passei a semana inteira editando aquela porcaria, e agora sumiu assim?" bradava, em alguma coisa similar a desespero e indignação. "E de onde veio esse frio de inverno?" resmungou, enquanto se abraçava na vã tentativa de manter-se aquecida. "Ah, achei! Bom, posso ir embora agora!".
Um vento forte corria pelos corredores abertos da Universidade, fazendo do caminho da sala de aula até a parada do ônibus um desafio à parte naquela tarde. Kinomoto sentou-se encolhida no banco da plataforma enquanto esperava o demorado transporte chegar. Após uma trégua de poucos minutos, um pé-de-vento soprou com força, fazendo seus cabelos esvoaçarem e tamparem-lhe a vista, trazendo um arrepio - daqueles que vêm do mago da alma - a subir correndo por sua espinha. "Droga! Eu devia ter trazido uma blusa, um cachecol, ou algo assim. Ai ai, eu nunca aprendo mesmo." Arrumando os cabelos, a garota notou algo enroscado ali. Após um segundo de pânico indescritível (seguido de um grito abafado), percebeu que tratava-se apenas de uma folha e riu sozinha de sua atitude precipitada.
"Nossa, que folha diferente!" - pensou, após o árduo trabalho de desenroscá-la. Olhou em redor e procurou a árvore de onde ela poderia ter vindo, mas não encontrou. Por alguma razão que ela não sabia apontar naquele momento, aquela folha lhe fez lembrar um velho amor do passado. Sentiu um calorzinho aquecendo o peito. Naquele momento, já não sentia mais frio. Sorriu e lançou a folha novamente aos ventos do destino.
