Luna,
Eu ouvi muitas vezes que a vida humana é feita de escolhas. Para cima, para baixo. Certo e errado. Ser heróico ou covarde. Lutar ou desistir.
Virar a esquerda ou a direita. Uma coisa tão simples, pode mudar sua vida, me diziam.
Nunca me aconteceu. Nunca tive muitas escolhas, pelo contrário, eu era sempre carregada pelas circunstâncias, sem nunca tomar um momento para pensar e decidir. Você estava certa, afinal, quando dizia que eu era uma força da natureza. Eu era, realmente, inclemente e descontrolada, sem avaliar ou pesar suas ações.
Eu seria a quinta Weasley em Hogwarts, naquele ano. Parece, às vezes, que faz muito tempo.
(Parece, algumas outras vezes, que nenhum tempo será o suficiente).
Toda a minha vida estava prestes a mudar, e eu sabia. Andei por tantos vagões, abrindo e fechando todas as portas sem me sentar.
Até encontrar você.
(No quinto vagão, claro. Você sempre ia no quinto vagão. Nunca me explicou porque. Eu nunca perguntei, também.)
Naquele exato momento, eu olhei nos teus olhos azuis, e pensei que não seria assim tão terrível. Por mais estranha que você fosse, Luna, você sempre teve uma tranqüilidade invejável.
Sabia que podia contar com você.
Mas eu não sabia – como poderia? – me abrir, naquele tempo, e nós sabemos como aquele ano acabou. Tantos, tantos anos, e ainda me vem lágrimas nos olhos de lembrar como fui inocente.
Eu senti vergonha. E me encabulava com sua inocência, porque como poderia eu me intrometer nela? Você era toda magia, fé e certeza.
Eu, por outro lado, era sombria, distorcida, estragada. Tentei, até, me afastar. Mas você nunca deixou, não é mesmo? Levei cinco anos para realmente aceitar que você não iria embora, que merecia minha total confiança, que merecia que eu lutasse por você também como tinha lutado por mim.
Talvez, se eu dissesse isso a outra pessoa, achassem que é algo como romance ou grande amor, almas-gêmeas ou sei lá. Mas a maior parte das pessoas realmente só pensa com a cabeça de baixo (tendo-a ou não), e não aprecia o valor de uma amizade.
No meu quinto ano, então, eu resolvi que seria realmente sua amiga. Para o que desse e viesse.
Eu estendi a mão, e você a segurou – naquele toque leve e confiante que é tão característico de Luna Lovegood. E me agarrei naquilo como a única sanidade – por mais insana que fosse – no ano que se seguiu.
Penso em agradecer, tantas vezes, mas como poderia?
Só sei que, quando olho para meu passado, eu vejo Tom e tudo que aconteceu, e a guerra que ele travou.
Quando eu olho para meu presente, eu, finalmente, tenho Harry. Minha casa, meus dois filhos, meus três gatos, quatro travesseiros e cinco amigos.
Nunca me preocupei com futuro (você, então, menos ainda). Mas agora, eu penso, que você certamente estará lá.
Você sempre esteve lá, independente do tempo. Você sorriu para mim e nunca mais deixou de sorrir, ou de me olhar com esses olhos brilhantes e cheios de paz.
Nós aprendemos tantas coisas juntas, eu e você, nesses anos todos. Vivemos tanta coisa juntas. Ainda temos tanto para viver.
Você me ensinou a confiar, me ensinou a acreditar, a me abrir. Você me ensinou sobre zonzóbulos e ronca-fedes, sobre expectativas e realidades.
Sobre amizade.
Sobre coragem e cautela.
Sobre esperança.
Então, espero que não se importe que eu pretendar dar seu nome a minha filha.
A sua afilhada.
E você não ganha o direito de dizer não aqui, não aceitarei outra resposta que não sim.
Porque você esteve lá por mim, quando eu precisei.
Porque você está aqui, agora mesmo, nos iluminando com seu sorriso.
Porque me fez acreditar que eu posso falar as coisas, sem soar ridícula, ainda que eu precise de um papel para isso.
Porque eu quero – e Harry também – que você esteja sempre conosco.
Então, trate de aceitar, ouviu bem?
Com amor,
Ginny.
