Capítulo I
DOR
"Alice, preciso de roupa nova. Ajudas-me?" Eu sabia que ela não iria dizer que não. A moda para ela significava tudo e seria horrendo se vestisse a mesma indumentária duas vezes. O Edward olhou desconfiado para mim. Ele conhecia-me demasiadamente bem para saber que ir às compras não era das coisas que mais gostava de fazer, tal como a minha mãe.
"Claro que sim, Nessie! Vamos agora mesmo!" Ela tinha ficado radiante por eu ter tomado a iniciativa - o que era bastante raro. Tinha sido totalmente frustrante para a Alice eu ter saído como a minha mãe no que toca a moda. Ela queria ter-me como uma cobaia de experiências com as suas roupas. "Vou esperar por ti no carro." Hum, provavelmente ela já tinha dado uma olhadela no seu futuro e ter visto a sua imagem à espera no carro.
"Sim ela já tinha visto." Boa, esqueci-me que o meu pai lê mentes. Ele riu-se com o meu pensamento e com a careta que fiz. "Então, passa-se alguma coisa que me querias contar?"
"Não, pai. Não se passa absolutamente nada." Disse-lhe calmamente. E a seguir pensei em roupas e mais roupas para manter a minha mente ocupada para que Edward não pudesse controlar o meu raciocínio.
"O que estás a tentar esconder-me, filha?" O olhar dele estava preocupado e levantou-se do sofá onde à pouco estava com a Alice, para vir na minha direcção. Recuei como um protesto para que ele não se aproximasse mais. "Aconteceu alguma coisa? Estou a falar a sério, Nessie. Estás a deixar-me preocupado." Fiquei congelada por momentos enquanto pensava numa resposta para lhe dar que me pudesse ilibar e ter tempo de meter-me no porsche amarelo da Alice rumo a Seattle.
"Não te preocupes paizinho. Está tudo bem comigo." Achei que não estava a convence-lo, por isso tinha que mostrar-me mais carinhosa - eu sabia que ele derreter-se-ia como isso. Cheguei-me ao pé dele e abracei-o. Já estava habituada a que todos na família - excepto o Jacob, que era como família - fossem frios demais, mas a pele do Edward era definitivamente a mais gelada. Queimava-me quando tocava por ser tão fria. Era suportável e nada doloroso, aliás era bastante aconchegante.
"Desculpa." disse-me ele afastando-se de mim. Deu-me um beijo na testa.
"Porquê?" perguntei confusa, olhando para o meu alto pai - teria de olhar para cima. Neste aspecto, saí à minha tia Alice: pequenina.
"Por te queimar de tão gelado ser." Ele riu-se e fiz o mesmo. Esqueço-me que ele consegue ouvir a minha mente e responder às minhas perguntas mentais. Consegues acreditar em mim, quando digo que está tudo bem, pai?
"Estou a tentar, meu amor." Ele sorriu. Obviamente estava preocupado comigo - o que era muito habitual nesta família onde todos se preocupavam mais do que os outros. Gostávamos tanto uns dos outros que o nosso próprio bem-estar dependia do bem-estar dos que amávamos. "Quando me quiseres contar o que estás a esconder nessa cabeça eu vou estar aqui e tu sabes que terás o meu apoio total." Eu sabia que tinha. Independentemente do que fizesse, eu teria sempre o apoio desta família. Era feliz por ter um lar onde todos me amavam. Acenei e saí da sala sorrindo, dirigindo-me à garagem pela porta das traseiras. A Alice já lá estava, mas não no porsche amarelo. Embora fosse o seu mais que tudo, dava demasiado nas vistas e ela só usava em ocasiões apropriadas. Em vez disso estávamos no Volvo prateado do Edward, um carro que já há muito tempo não era usado, pensei para mim mesma.
"Porquê o Volvo?" perguntei para a Alice mal entrei no carro. Ela olhou-me com o seu resplandecente sorriso.
"Porque há muito que não o guio e porque é o mais discreto." Disse satisfeita por ter mais do que uma razão a apontar. Eu nem me apercebi mas quando olhei de novo para a estrada já estávamos a meio caminho de Seattle. Eu ainda não estava permitida pela família a conduzir e por isso, não percebia muito sobre carros. Tinha sempre que alguém levar-me a algum lugar e eu acho que isso era apenas mais uma forma de me controlarem. Eu sabia que era boa o suficiente e inteligente para conduzir um carro e perceber mais sobre isso mas a família não estava de acordo. Eu poderia ir para onde quisesse sem que eles se apercebessem e isso para eles seria um erro tremendo, algo totalmente fatal.
"Estás com saudades da mamã?" Perguntou-me a Alice, em tom de criança, quando reparou que não tinha falado à já uns bons minutos.
"Também." Respondi simplesmente. Não queria tocar no assunto porque iria fazer-me pensar nele. Eu tinha que treinar não pensar nisso para que Edward não ficasse preocupado comigo.
"Minha pequena Nessie, eu consigo ver. A Bella e, suponho que também o Jake, estarão aqui dentro de muito em breve." Disse-me esperançosa. Olhei e vi o olhar cheio de ternura que ela me deitava. Sim, essa imagem seria perfeita. A minha mãe e o Jacob foram numa viagem à uns três dias, visitar a avó Renee. Fiquei muito descontente por não ter ido. Deveria ter feito uma birra, seria o mais certo! Todos me perdoariam a seguir porque para eles ainda sou uma criança. Porque tiveram que separar-me das duas pessoas que mais gosto? Porque é que não conseguiram pensar em mim? Eu sei que tenho todo o amor que preciso em casa. Sei que o meu pai me ama, sei que todos lá em casa me amam - até mesmo Rosalie, que é como uma segunda mãe para mim. Mas separarem-me, ainda que por pouco tempo, das duas pessoas que eu amava acima de tudo era inacreditavelmente doloroso. E estava a pensar no assunto de novo! Não podia! Tinha de mostrar que era forte para superar dias sem ver a Bella e o Jake.
"Consegues saber o que eles estão a fazer agora?" perguntei desviando o olhar. Ela sorriu tenebrosamente. Sorrindo, ela parecia ter mais vida - ainda que isso fosse impossível, apenas no sentido figurado. Talvez não fosse vida a palavra certa - de facto não era. Mas a alegria saía em redor dos seus lábios tão facilmente que me fazia derreter e desejar ser tão bonita quanto ela. Coloquei a minha mão no seu rosto e mostrei-lhe a imagem tão bela que estava a contemplar. A Alice com um longo vestido, maior do que si, pelo que rastejava até o chão. Era cor-de-rosa com tons violetas e roxos - parecia uma borboleta que em breve iria voar para mais um dos seus espectaculares voos. Ela estava de joelhos, debruçada a uma flor que ao seu lado perdia toda a beleza.
"Obrigada Nessie. É impossível dizer-te o quão feliz e grata fico quando me vês com tanto esplendor - ficaria corada se sangue corresse pelas minhas veias." agradeceu apenas continuando com o seu sorriso. Ela estava realmente tocada e perguntei para mim mesma se eu era assim tão especial que conseguia tocar assim tanto nas pessoas - quer dizer, vampiros. "A Bella - e claro, o Jake também deve estar perto - vão daqui a uns minutos começar a caçar." Ela deu uma risadinha. "E vão ter dificuldades para acharem algo que gostem mesmo - locais quentes não são tão bons assim".
Aquilo tinha aumentando o meu humor um pouco mais. Eu agora podia imaginar a mãe e o Jake frustrados a caçar. Riria disso, como a Alice fez, se estivesse em frente àquela situação. A questão de porque é que foram eles os dois à viagem, ainda me assombrava a mente. Concentra-te Renesmee! Não posso pensar nisso.
A Alice despertou a minha atenção quando saiu do carro e eu pude reparar que já estávamos em frente à loja de moda favorita da Alice - naturalmente, era a maior loja de roupa da cidade e a mais cara também.
"Oh, Nessie!" Ela parou pouco antes de entrar na loja com um pequeno grito. Estava a olhar fixamente para dentro dela e eu perguntava-me porquê.
"O que foi?" O seu olhar estava completamente fascinado à loja. Era assim tão bom vir à loja favorita comprar roupa nova para a sobrinha? Suponho que seja.
"Estou a ver que aqui há o vestido que eu tinha vestido na imagem que me passaste!" ela exclamou felicíssima.
"Óptimo. Vamos comprá-lo." disse calmamente caminhando em direcção da loja. A Alice tinha ficado no mesmo sítio a fixar o mesmo ponto. Virei-me para ela. "Vamos?"
Ela despertou do seu transe e com gargalhadas soltas entrou na loja comigo.
Sentei-me num banco castanho que lá estava e deixei a Alice escolher as roupas. Ela olhou rapidamente para todas as secções a analisar todos os vestidos minuciosamente - para os humanos ela estava simplesmente a passar os olhos pelos vestidos, observando os seus tons e cores. Olhou para mim e voltou a passar os olhos pelas várias secções de vestidos. Saltou de excitação quando tinha encontrado o que pretendia. Fiquei totalmente encantada com o vestido que ela trazia nas mãos.
"Veste-o!" disse Alice imediatamente. Peguei no vestido e dirigi-me para os provadores. Tinha-o vestido em menos de cinco segundos mas fiquei nos provadores para que as raparigas que lá trabalhavam não desconfiassem da minha rapidez. A Alice entrou nos provadores e virou-me para o espelho. Não falou. Apenas contemplou-me. Olhei para o meu reflexo no espelho. O vestido era totalmente branco, tinha pequenos brilhos no busto, polvilhados através da parte superior. O laço é de um creme, a meu ver, apenas duas camadas acima do branco. É alinhado com uma tela de creme, o corpete é desossado e desde os joelhos aos pés tem uns pequenos folhos que deixam o vestido mais belo do que ele já é.
"O Edward não vai deixar-me andar com este vestido…" avisei Alice. Ele era um pouco conservador em relação a isso - não que eu gostasse de roupas curtas e aquele vestido nem o era, mas exercia um poder gigante em mim.
"Nem penses que vais deixar o teu vestido na loja. Vais levá-lo. Eu trato do Edward." Respondeu como se já tivesse tratado de tudo - o que provavelmente já o teria feito nas suas visões.
Saímos da loja com cerca de cinquenta sacos cheios de roupa. A Alice exagerava sempre um pouco e era impossível pará-la. Olhei para o relógio do carro e achei inacreditável como eu tinha passado quatro horas às compras. Definitivamente, aquilo tinha-me feito distrair e senti-me bem sem matutar no assunto que me atormentava. Voltando à estrada, o silêncio instalou-se de novo no volvo.
"Obrigada Nessie." disse sem tirar os olhos da estrada. Ela estava estranhamente a conduzir numa velocidade humana.
"Obrigada porquê?" perguntei. Interpretar a Alice não era difícil mas eu não conseguia ver o seu rosto para poder supor a razão do agradecimento.
"Pelo vestido lindo que encontraste." disse esboçando um sorriso continuando fixada na estrada. Fiz uma careta - não estava habituada a uma Alice tão ponderada.
"Se bem te lembras foste tu que o encontraste."
"Não teria reparado nele sem a tua preciosa ajuda, Nessie. Muito obrigada!" Ela tinha olhado para mim e a sua alegria, a sua excitação era algo incrivelmente estranha para que o tema fosse um vestido que tivera visto em imagens na minha mente.
"Alice, conta-me o que te está a dar!" Pedi com um sorriso deixando a minha excitação voar também. "Conheço-te bem. Sei que tens alguma coisa na manga para utilizares esse vestido. Quero saber. Quero saber, já." Ela riu-se confirmando a minha suspeita de planos para o vestido.
"Hum, eu e o Jazz temos vindo a pensar em ir passar uns tempos fora… bem, tu percebes-me."
"Oh, claro!" Eu tinha assistindo inúmeras vezes ao amor incondicional entre a Alice e o Jasper que sempre me tinha deixado sem palavras. A química que eles tinham, o amor entre eles era tão visível que me fazia derreter por dentro e desejar um dia ter um amor como aquele. Eles comunicavam com o profundo olhar - eles podiam ficar horas a olhar um para o outro, contemplando um ao outro - eles eram verdadeiras almas gémeas. Eu também podia sentir o amor entre os meus pais, mas não conseguia que esse amor me tocasse tanto como o de Jasper e Alice. Eles eram completamente um do outro.
Cheguei feliz a casa, com o amor deles na cabeça. Ajudei a Alice a pôr todos os sacos guardados no closet dela e a esconder muito bem os nossos vestidos secretos. Parecendo que não, aquilo tinha-me posto cansada mas ainda não estava preparada para dormir. Fui até à cozinha e bebi leite - daqueles que os humanos bebem, que era horrível para dizer a verdade mas que só servia para matar a sede, já que não me estava a apetecer ir caçar tão tarde.
"Então minha querida, divertiste-te?" O Edward tinha entrado na cozinha e eu tinha quase a certeza que ele me estava a tentar controlar desde que cheguei a casa, procurando a ouvir algo da minha cabeça… - onde estava a minha privacidade? A cara dele mudou rapidamente e senti-me mal por ter pensado aquilo. Obviamente ele estava a ouvir. "Obviamente." repetiu ele num tom triste e preocupado.
"Desculpa pai. Não queria magoar-te."
"Se tu me contasses o que estás a tentar esconder de mim eu provavelmente não tentaria saber por mim mesmo, Renesmee. És minha filha e eu preocupo-me muito contigo."
Suspirei sabendo que ele tinha razão. "Está tudo bem comigo. Tenho saudades da mãe… e do Jake. Não quero pensar neles porque ouvirias os meus pensamentos e também não deve estar a ser fácil estares longe da mãe."
Ele sorriu e veio abraçar-se a mim. "Meu amor, eles voltarão bem depressa. Prometo."
"Todos dizem isso, mas a falta deles está a ser cada vez mas difícil. E se aconteceu alguma coisa? E se-"
"Nessie, tem calma. Se tivesse acontecido alguma coisa a Alice teria visto." Ele já não me enganava com esta.
"A Alice não consegue ver o Jake!"
O Edward surpreendeu-se com o meu grito de revolta. Eu não consegui ficar ali vendo o meu pai a ficar mais surpreendido comigo, talvez mais desiludido. Eu estava a perder as pessoas que amava, tinha a certeza. Dentro de dias, eu estaria sozinha. Eles abandonar-me-iam. Corri o mais depressa que pude para o quarto do Edward - este seria o meu quarto sempre que dormia cá em casa. Era acolhedor o suficiente. Meti a música que a Bella sempre escutava antes de dormir quando era humana. Aquela que o meu pai lhe tinha composto, pelo que me contavam. Isso acalmou-me um pouco. Ou então era Jasper que estava por perto, mas a primeira opção pareceu-me a mais acertada.
Enrosquei-me na gigantesca cama e contorci-me ao som da música até conseguir adormecer.
"Nessie?… Nessie?"
"Mãe, Jake?"
"Sim, somos nós. Estamos aqui ao teu lado."
Não, eles não estavam. Era só mais um sonho. Quantos mais dias iam eles demorar? Porque é que eles foram visitar a avó Renee? Porque não veio ela visitar-nos? Porque é que foi o Jake e não o Edward? Porque é que eu não fui?!
"Renesmee estás bem?" Abri os olhos sabendo que naquele momento estava inevitavelmente no mundo real. O Carlisle estava à porta do quarto, com uma cara preocupada mas pacifica. Fiquei sentada na cama e ele veio sentar-me ao meu lado. "Posso examinar-te ou preferes deixar isso para quando te sentires melhor?" Eu não queria mesmo nada que ele me examinasse agora mas por ser Carlisle, por ele se ter importado pelo o que eu queria, perguntando primeiro, eu fiz esse esforço - ele merecia muito que eu o fizesse. Acenei com a cabeça e ele ajudou-me a levantar e pôs-me no chão, visto que eu estava muito sonolenta. "Tens tido pesadelos, não tens?" perguntou-me enquanto me media.
Coloquei a minha mão no seu rosto e deixei ver um dos piores pesadelos que tive nas últimas noites. O Jake tinha sido atacado por um bando enorme de vampiros maus que odiavam lobisomens, estava a sangrar no chão a contorcer-se de dor e não conseguia defender-se enquanto que a Bella a tentar protege-lo tinha ficado pior que ele, com marcas no corpo e… não! Obriguei-me a esquecer esses pensamentos e tirei a minha mão da cara de Carlisle como se a pele dele queimasse - e embora fosse fria, não queimava como a de Edward. Carlisle franziu a sua testa.
"Isso não me parece ter um final feliz."
"E não tem…" respondi projectando o meu olhar para o chão. "Preferia ser totalmente vampira para não ter que dormir." resmunguei mais para mim mesma.
"Não digas isso, Renesmee. És um criança única - tens um dom em ti magnifico. Os teus pais são tão talentosos quanto tu. Não te deixes ir abaixo. Eles irão voltar, e vais pensar que estes dias de pesadelos foi uma perda de tempo porque estará tudo bem entre eles." Eu acenei simplesmente porque já tinha ouvido muitas vezes aquela frase e por isso conformei-me.
"Carlisle…" Provavelmente, ele sabia o que eu iria perguntar.
"Diz, minha querida."
"O que é que a Bella e o Jacob foram fazer a Phoenix?" Ele iria responder que tinham ido ver a avó.
"Foram visitar a Renee, tu sabes disso." Claro. Claro que eu sabia - era nisso que eu tinha que acreditar.
"E porque foram eles os dois em vez de Bella e Edward, ou eu…?" Carlisle apontou as minhas medidas no bloco.
"Na altura pareceu mais indicado ir o Jacob com a Bella. Parece que foi um grande erro. Tu ainda és muito humana e consegues ter depressões tal como os humanos." Creio que a última frase era um pensamento que ele queria guardar para si mesmo mas que veio para fora.
"Como é que seria mais indicado o Jake ir com a mãe, se a Alice não consegue vê-lo? Pode acontecer alguma coisa e a Alice não vai conseguir ver a Bella por ela estar tão perto do Jacob." disse determinada. Eu estava a exagerar, sabia disso. Mas queria todas as hipóteses possíveis e inacreditavelmente imagináveis que pudesse ter. Carlisle franziu o rosto num tom de extrema preocupação.
"Eu vou chamar o Jasper para te ajudar." Pois claro. Quando eu não podia ter respostas era óbvio que iriam ter de chamar o Jasper porque afinal eu sou meio humana e como ele disse à pouco, tenho depressões extremamente humanas. Argh!
Apesar disso, acenei. Eu sentia um enorme respeito pelo Carlisle e sabia que ele fazia sempre tudo da maneira certa. Não havia como contradizê-lo. Ele fez-me pôr em cima de uma balança e anotou o resultado. Eu não fazia a mínima ideia de quais eram os resultados e nem estava preocupada em saber. Ora crescia, ora mingava horas depois. O meu crescimento ainda era demasiado inconstante.
"Bem, terminei. Agora vou chamar o Jasper." disse mais como um profissional do que como um avô. Chegou-se ao pé de mim e deu-me um beijo na testa - o lado paternal, o lado do avô. "Porque não te vais divertir a seguir?"
Divertir-me? Com o quê? Nem sabia como me divertir sem o Jake. Acenei mais uma vez - o Carlisle tem esse poder sobre mim. Há uma força que me atraí para concordar como tudo aquilo que ele diz. Ele saiu do quarto e eu voltei a sentar-me na cama à espera do Jasper que entraria segundos depois.
"Hum" ele disse num tom curioso.
"O que foi?" perguntei olhando para o seu corpo rígido como uma pedra.
"Não estás ansiosa nem depressiva, como o Carlisle disse que estavas. Ele raramente se engana." Eu estava ansiosa, sim. Ansiosa para que Bella e Jake voltassem. Mas a minha preocupação por eles era maior que a ansiedade. "Mas estás infeliz."
"Infeliz? Não, Jazz. Só estou aborrecida. Queria ter ido com a Bella e o Jake. Está a ser difícil sem eles."
"Hum" disse novo, a sua cara mostrava que não tinha acreditado no que eu lhe tinha dito. Comecei a sentir-me mais relaxada - ele estava a actuar. Os meus músculos já não estavam tensos de preocupação e a minha cabeça já não pesava tanto com tudo o que me tinha posto a pensar nos últimos dias.
"Obrigada." disse-lhe. Ele deu um sorriso torto, amigável e saiu do quarto. O seu trabalho estava feito, eu definitivamente estava mais relaxada embora não tivesse esquecido que precisava da mãe e do Jacob quanto antes para a minha sanidade mental.
Continuava aborrecida, desta vez por não ter nada que me pudesse meter distraída. Não poderia sair de casa porque se o fizesse, iria ser para visitar Charlie, ou Billy, ou até mesmo Seth - mas eu quereria fazer isso sozinha e já que ainda não estava permitida a conduzir meti essa hipótese de lado. O escritório do Carlisle estava cheio de livros e dirigi-me até eles procurando um que me chamasse a atenção pelo nome. Nenhum o fez então eu tirei um livro qualquer da enorme estante e sem, sequer, ler o título comecei a ler. Depressa desisti. Eu não estava com espírito para aquilo. Desci as escadas para o último andar e avistei o piano. Sentei-me no banco e olhei para a sala onde estava o Edward a ver TV - nestes últimos dias era o que tinha feito. Se calhar aquilo fazia distraí-lo o suficiente para não pensar na mãe. Olhei para o teclado, branquíssimo e totalmente limpo. Passei os meus dedos nas teclas, como se estivesse a fazer um carinho nelas. Elas eram muito fracas e com delicadeza baixavam-se ecoando o som em toda a casa. O som despertou a atenção do Edward que me olhou da sala, como se eu tivesse tocado algo inteiramente genuíno - eu apenas tinha passado a minha mão em algumas teclas, não sabia tocar piano. O meu pai levantou-se e chegou-se ao pé de mim. Sorriu e eu olhei-o como uma pergunta do porquê daquele sorriso. Ele sentou-se ao meu lado e dedilhou os seus dedos contra as teclas de uma forma suave - numa melodia perfeita. Não me lembrava daquela melodia. É a de Esme?
"Não" ele riu-se continuando a tocar. "É a de Renesmee."
"Oh" O meu rosto brilhou olhando com admiração e fascínio para os dedos do meu pai tocando a melodia de Renesmee. Ele era o mais maravilhoso pianista que eu já tinha ouvido - e riu-se do meu pensamento. "É linda. Quando a fizeste?"
"Hum" disse pensativo. Parou de tocar e sorrindo olhou para mim. "Já tinha tido algumas ideias de pequenas partes desde que nasceste mas ainda não tinha chegado a altura certa para te mostrar. Achava que não estava suficientemente bom." Ele deu uma risadinha.
"Está totalmente, completamente, suficientemente boa" respondi ainda fascinada. Riu-se ainda mais do meu comentário e envolveu os seus braços no meu tronco dando-me um abraço. Senti protegida e amada, algo que não sentia há dias atrás.
O telemóvel de Edward tocou no seu bolso das calças. Ele tirou o telemóvel e retirou-se da divisão. Mas eu conseguia ouvi-lo de qualquer das formas.
"Sim?… Oh… Mas ele está bem?… E tu, estás bem?… Tudo bem, eu falo com a Emily… Não te preocupes, está tudo bem…"
Bloqueie aquela conversa para ter tempo que pensar. Aquilo só podia ser a Bella ao telemóvel. Tinha de ser. E seguindo a conversa algo tinha acontecido com o Jacob. O meu corpo congelou por momentos e o meu instinto foi abandonar aquela casa. Corri agora para longe, eu tinha de estar com alguém humano o suficiente para estar comigo sem me controlar. Estava cada vez mais rápida nas minhas corridas. Eu sabia que o Edward iria ficar preocupado com a minha fuga mas ele só tinha que seguir o meu cheiro para me encontrar. Cheguei à casa de Charlie mais depressa daquilo que eu pensava que conseguiria. O carro patrulha estava cá fora então eu sabia que ele estava em casa. O cheiro também o denunciou. Há muito tempo que não cheirava o sangue humano e a minha garganta ardeu por sentir de novo o aroma no ar. Eu sabia que estava errado e por isso tentei ignorar - embora fosse muito difícil. Estaria eu a desejar o sangue do meu avô humano? Isso era tão errado! A minha garganta ainda ardia mais e mais. Devia ter ido caçar antes! A minha sede era cada vez maior. Era demasiado tarde. Eu iria atacar o meu avô. Eu iria atacar Charlie.
