Arfando, ele se viu coberto do sangue que coroava sua vitória. Ele agora finalmente fazia a própria justiça, estraçalhando a garganta da hipocrisia e da opressão.

Um coro ingenuamente desafinado de crianças na rua anunciava que era Halloween.

E ele agora sentia as vísceras de uma vida inteira em pedaços nas mãos. A história entrecortava sua mente ao mesmo tempo sem ordem e com precisão perturbadora, como as navalhas cansadas que lhe pendiam dos braços.

Agora é que vinha, em vermelho, no sorriso malicioso de Jack O'Lantern¹ dizendo que esta noite estava por demais fino o véu que separa os vivos dos mortos, a parte fatal de sua epifania. Personagens do circo macabro se misturavam em sua visão cada vez menos clara, pontilhada por pingos de sangue, e o rodeavam, dançando a ciranda de sua desgraça. Uma bruxa, um ladrão, uma esposa, um juiz. Dois juízes. Três juízes. Sentiu-se atordoado ao ilogicamente notar que ainda havia lacunas.

E a próxima garganta — a de uma mulher, intrusa na história — que num ímpeto cortou não teve menos de sua voracidade, nem mais de sua lucidez.

O coro na rua crescia, como uma orquestra frenética rumo à apoteose.

Não haveria doces aquela noite. Só travessuras de um destino que não perdoa os tolos.