Disclaimer: Harry Potter, nomes, personagens e símbolos correlatos pertencem a JK Rowling e seus parceiros comerciais e nenhum lucro foi ou será auferido com a publicação desta obra.

This obra by Bella Snape is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas 2.5 Brasil License.

Esta obra não pode ser copiada ou reproduzida sem a autorização do autor.

Para mais informações: .br

Ad Extremum

"Sempre estive e sempre estarei ao teu lado, meu olhar te guiou, minhas mãos abriram os caminhos que te trouxeram para mim... "

Capítulo 1 – Ab ovo

Eu o amei.

Eu o amei desde o primeiro instante.

Eu sabia que ele seria meu.

No Final, todos são.

Mas ele era especial! Eu nunca amei assim antes. Nunca, através de infindas noites, eu dediquei meu coração enregelado tão ardorosamente. É certo que os brilhantes e corajosos sempre me atraíram, mas ele era diferente. Ele foi feito para mim, desde o princípio.

Enquanto observo a mulher de rosto austero, que vê com desagrado o crescimento de seu abdômen, e seguro na sarjeta dos meus mais deliciosos vícios o homem responsável por tal desenvolvimento, dou me conta de minha rudeza. Não me apresentei ainda, mas você já me conhece. Todos me conhecem. Eu tenho muitos nomes e muitas faces, mas você pode me chamar de Nyx. Você quer conhecer o meu rosto? Todos querem. É o motivo pelo qual cada ser que respira neste mundo vive. Mas serei complacente. O amor me faz benévola. Imagine-me como uma mulher, pois tudo o que vive passa por mim; imagine-me bela, pois todos que vivem acabam em meus braços; imagine-me sempre usando uma negra capa de viagem, pois o mundo é meu reino e eu sou zelosa dele; imagine-me uma deusa, pois observo, onisciente, a dança dos viventes no tempo, esperando calmamente por meus sacrifícios.

Mas não nos desviemos de minha história, ela é o que me consome agora. Neste exato momento eu adentro um quarto cheio de móveis velhos, mas polidos à exaustão, em uma morada precária, esquecida nos confins sujos de uma grande aglomeração humana. Eileen, a mulher de rosto austero e cabelos negros como a noite mais tenebrosa, está encolhida a um canto, dobrada sobre o imenso ventre; um filete de sangue desce da boca pela pele pálida, coberta de hematomas, e, poeticamente, chora sobre uma poça vermelha, quase negra, na madeira antiga do assoalho. Tobias está de pé, os dentes cerrados de ódio, as mãos fechadas em belicosos punhos. A respiração do homem se acelera a vista do sangue e a raiva cresce, como uma erva daninha, dentro do peito, alimentada pelo silêncio obstinado da mulher ferida. Eu passo por Tobias e o faço lembrar do delicioso sabor ardente do uísque e da sensação intoxicante do blefe bem armado em um jogo de pôquer. E ele se vai.

Um estrondo que faz a velha morada estremecer me confirma que Eileen e eu estamos sozinhas mais uma vez. Um soluço feio escapa dos lábios partidos da mulher que não chora mais, e eu me aproximo. O homem e a mulher são peças insignificantes em um jogo maior, mas ela carrega consigo o que eu mais amo. Eu estendo minha mão pálida e fria em direção a pele distendida do abdômen e a toco de leve. Ela estremece e eu sussurro: Não se preocupe, ainda não é tempo.

Mas as Horas são impiedosas e movimentam-se agilmente em sua dança veloz. E a noite mais escura cobre a terra. Contra o céu negro e impassível não há artefato humano ou mágico que possa dissipar a escuridão. A Luz tenta, debilmente, mas nunca houve uma noite como esta. Eu olho para o céu tenebroso, através da janela do quarto de Eileen, e meu peito se enche de júbilo. Érebo e Tártaro uniram-se. É chegado o tempo!

Cloto se aproxima, neste lugar tão familiar. Os corredores e enfermarias do Hospital St. Mungus para doenças e acidentes mágicos são como um lar para mim. A curandeira se agita entre as pernas da mulher que tem o rosto vermelho e lavado de suor. A obstinada criatura sente as entranhas em chamas com a dor, mas não emiti um som sequer.

Uma ligeira admiração pela mulher me toma. Toda sua mágoa e coragem me tocam brevemente o coração. Eu sorrio e me adianto. Eu quero ser a primeira a segurar a criança em meus braços. Não! Eu não vou tomá-lo ainda. Mas não posso resistir à tentação de ser a primeira a tocá-lo.

Cloto me lança um olhar interrogativo quando eu tomo em minhas mãos o pequeno ser que acaba de sair, silencioso e flácido, das entranhas da mulher ressentida. A criança é pequena e pálida, com raros fios de cabelo, negros como os da mãe. Sim, eu posso ver tudo isto, mesmo através do tom cinzento que assume a pequena face. O cordão umbilical que devia alimentá-lo enrola-se, sinistramente, no delicado pescoço. Por um minuto inteiro, eu o tenho em meus braços, o coração calado e os pulmões vazios.

Cedo demais para mim, a curandeira o pega e corta o sinistro laço. O pequeno coração volta a bater fracamente e Cloto se vai. O bebê é examinado, lavado e enrolado firmemente em um cobertor azul. A criança não faz o menor ruído durante todo o processo. Láquesis adentra o quarto, mas eu a despeço com um aceno displicente de minha mão e me posto ao lado de seu berço. Eu mesma tomarei conta desta criança. Láquesis se vai, furiosa, conjurando contra mim as conseqüências de meu ato. Eu quero que ele sinta o meu amor. Eu quero que ele saiba que não está sozinho. Nunca estará.

Unicamente para meu deleite a pequena criança abre os olhos. Eles são negros como a noite que o acolheu no mundo e parecem ver através da transparência dos meus. Eu sei, pequeno, que você leu meu amor e seu destino em meus olhos verdes. Agora você já me conhece.

Uma sorridente enfermeira pega o bebê, forçando-me a voltar dos cernes do meu amor e de sua inocência, e o oferece a Eileen, que simplesmente vira o rosto e cruza os braços. O sorriso morre no rosto da jovem que segura a criança.

- Qual é o nome dele? – pergunta a enfermeira.

- Severo. – responde a mulher, sem voltar o rosto.