Prólogo/Capítulo 1.1

Os gritos invadiram seus ouvidos.

Desespero, dor, agonia.

Ele não sabia de onde viam, não sabia como acabar com eles e, no entanto, pareciam fincar-se em seu ser, dando-lhe a certeza de que eram reais.

Buscava ansiosamente sua origem, mas havia apenas a escuridão para todos os lados, deixando-o perdido.

Os sons tornavam-se mais intensos a cada segundo, mais insuportáveis. E era como se uma faca partisse seu coração ao meio cada vez que os ouvia, sentia suas entranhas se contorcendo em aflição.

Tinha de fazer algo, tinha que fazer com que parassem. Logo.

Tornaram-se mais altos, tornaram-se berros de absoluto pânico. Tomaram-lhe a mente por completo.

Tentou mover-se, inutilmente. Estava completamente paralisado, não enxergava nada nem ninguém a seu redor. Preenchendo o profundo vazio de escuridão estava apenas o som estridente de um grito cheio de pavor, de sofrimento. Um grito de tortura.

Tentou mover-se com mais ímpeto.

Inútil.

Sentia-se imprestável. Fracassado.

Contraiu o maxilar, tentando conter a excruciante dor de cabeça que ameaçava arrancar seus sentidos. Tentou lutar contra a dor que se espalhava por toda a extensão de seu corpo, ameaçando derrubá-lo. Uma dor intensa, gerada unicamente pelo som dilacerante daquela voz desconhecida que implorava por ajuda.

Podia sentir o sofrimento de quem o emitia.

O som o atravessava como dor física.

Reconheceu a voz, por fim.


Acordou com um cutucão no ombro, sentindo a camisa ensopada de suor. Seu coração batia em um ritmo alucinado, sua cabeça latejava, seus músculos doíam, quase como se o pesadelo tivesse sido real.

Sentou-se na cama e observou um feixe de luz quase imperceptível entrar pela janela, indicando que a manhã se aproximava.

- Harry? – Ouviu Ron falar, de pé a seu lado, com voz sonolenta. – Você me assustou. Estava se contorcendo incessantemente na cama. – Engoliu em seco – Tudo bem, cara?

- E-eu... Argh! – Uma pontada de dor na cabeça o interrompeu e ele levou uma mão à testa. – Tu-tudo bem. Apenas um pesadelo.

O ruivo assentiu, mas continuou a observá-lo com a testa franzida em preocupação.

Levantou-se, ciente de que não conseguiria mais dormir. Sua mente não permitiria.

Caminhou lentamente até o banheiro, buscando recuperar o equilíbrio. Ainda era capaz de ouvir os gritos em sua mente. O gélido nó que se formara em seu peito parecia cada vez mais penoso, mais frio. Foi em direção à pia e abriu a torneira, jogando a água fria em seu rosto, muito embora calor fosse a última coisa que sentia no momento.

Ao menos, conseguira atenuar a dor de cabeça.

Fechou os olhos, tentando acalmar-se. Respirou fundo e deixou a água correr pela sua face, concentrando-se em diminuir o ritmo com o qual seu coração batia.

A culpa é sua, Potter.

O peso que aquelas palavras exerceram sobre suas costas era quase insustentável, ainda mais diante da verdade por trás delas.

Quando voltou para o quarto, a luz matinal já estava um pouco mais presente, embora ainda fraca. Ron encontrava-se cochilando sentado na cama, provavelmente estivera esperando-o. O chão rangeu quando caminhou até sua própria cama e o som fez o ruivo despertar abruptamente. Após alguns segundos de confusão, ele pareceu perceber a presença do moreno e sua expressão tornou-se curiosa.

- O que há?

Harry permaneceu em silêncio, enquanto enxugava o rosto.

- Não quer me contar? – Insistiu.

- Em que quarto está Hermione? – Perguntou, ignorando novamente o amigo.

Mesmo nas sombras, Harry pode ver a expressão do ruivo tornar-se desconfiada e irritada.

- Por que quer saber? – Perguntou rispidamente.

Não estava com cabeça para lidar com os ciúmes de Ron novamente, então apenas sustentou o olhar dele, em tom de desafio, e repetiu a pergunta.

- Em que quarto?

- Final do corredor. – Respondeu, embora ainda parecesse raivoso.

Harry dirigiu-se para fora e caminhou até a porta fechada ao final do corredor. Parou em frente a ela e hesitou.

Sentiu seu coração pesar e o estômago afundar. Teria ele o direito de estar ali?

Relutantemente, levou a mão à maçaneta e a girou, tentando não fazer barulho ao abrir a porta.