O vento passava em rajadas, carregando as folhas quebradiças para longe. Montes dourados formavam-se aqui ou ali, lentamente sumindo, devorados e transformados em terra. Fazia frio, mas o sol brilhava por cima do mundo com a mesma beleza.
As torres estavam lá, o lago estava lá, o perfume de todas as coisas confundia-se com a brisa, chegando e desaparecendo de repente. Era tudo muito bonito. Remus, como os tordos, as borboletas, os esquilos e suas nozes, os pequenos insetos e os outros alunos, participava da orquestra da vida. Podia senti-lo; notas ecoando, tantas notas, tanta diferença, mas em conjunto, eram harmônicas, pois vinham de um mesmo instrumento. Embora pudesse senti-lo, não o compreendia, ao menos não em palavras.
Suas mãos estavam geladas e vermelhas. O sol aparentava ser o mesmo, e, no entanto, que farsa! Era como um Rei arruinado: a capa majestosa escondia o cetro, que já não possuía força suficiente.
Não trouxera suas luvas, era uma pena, mas lá estava o castelo.
Hogwarts abraçara Remus, acalmara-lhe o espírito, explicara-lhe que sua infância não passava de um corredor escuro e que a vida estava ali. Em pouco tempo, estava cercado por amigos queridos e o seu coração, descrente e assustado, tornou-se cálido. Todos os anos Hogwarts recebia seus filhos, nunca faltando com sua proteção. Seis anos, e mesmo que fosse o dobro, a escola não teria falhado com Remus.
-O que está fazendo? –Sirius surgiu, jogando sua mochila aos pés de Remus e sentando no banco.
-Olhando para aquele velho carvalho.
-E o que há nele para se apreciar, pelo amor de Deus?
-Talvez nada, mas era o que eu estava fazendo.
Outra rajada de vento.
-Vamos ter neve. –comentou Remus.
-Ah, você acha? Estamos quase no meio de Outubro, e você acha que vamos ter neve?
A neve cairia sobre o carvalho, sobre as torres, sobre o lago. As lareiras seriam acesas regularmente e os alunos vestiriam suas capas de inverno.
-Remus, preciso que você faça minha tarefa de Astronomia.
-Sirius, preciso que você pare com isso.
-O que?
-Faça você as suas tarefas, eu posso ajudar, se quiser, mas é tudo.
Sirius riu, socando Remus de brincadeira.
-Você é sempre tão egoísta. –acusou, entre um e outro soco.
-Para com isso, não, aí. Se fosse lua cheia você não se atreveria.
-Se fosse lua cheia, se fosse lua cheia, mas não é. Onde fica marte?
-Ali. –apontou, mas Sirius continuava a socá-lo. –Você poderia parar com isso. –Sirius relaxou a mão e fingiu puxar seus cabelos.
-Isso dói. –gritou o outro alegremente.
-Quer saber de uma coisa? Meu irmão é um imbecil. –declarou Sirius. –Minhas primas, meus pais, e todo o resto. Acha que escapei? Eu acho que sim.
-Sim, pode ser... pare, isso machuca. –Segurou as mãos de Sirius. -Deveria agradecer ao chapéu seletor algum dia... ei, pare, estou caindo. –Ele escorregou com o rosto em um dos joelhos de Sirius.
Remus ainda fingiu lutar um pouco para se libertar, mas Sirius conseguiu soltar as mãos e voltou a puxar os cabelos de Remus. Vagarosamente, enquanto o vento os açoitava e as folhas dançavam, Sirius tornou o movimento mais suave e mais parecido com um afago. Ficaram ambos em silêncio por algum tempo, até que Sirius retirou a mão e permitiu que Remus voltasse a sentar no banco.
-Vou procurar alguém que queira fazer a minha tarefa de Astronomia. –disse Sirius.
Remus suspirou.
-Eu faço.
-Faz? –sorriu. – Obrigado, camarada. Se você soubesse o quanto Astronomia é confuso, mas você não faz idéia.
-Não é confuso.
-É exatamente do que estou falando.
Apolo se retirava dos céus, derramando um brilho dourado em sua despedida. Lá se iam as nuvens laranjas e o céu azulado em seu cortejo divino.
-Eu não trouxe luvas, acho que vou entrar, estou congelando. –Remus anunciou, Sirius o seguiu. Entraram no santuário que os abrigava a tanto tempo sentindo que o mundo era um pouco mais glorioso do que imaginaram.
