Sirius
Sirius é a estrela mais brilhante do céu noturno, na mitologia era um dos cães caçadores de Órion. Eu fui o primogênito de meu pai. A seu modo de ver eu era a garantia da perpetuação de nosso nome, seria seu orgulho, quase como um troféu a ser exibido. Às vezes as expectativas tem o peso de âncoras acorrentadas a seus pés. Eu era um Black, e como de todos os outros; certas coisas eram esperadas de mim. Coisas grandes e dignas de admiração. A um Black é imprescindível que se destaque, que seja o centro das atenções aonde quer que se vá, que em uma conversa importante jamais deixem de citar seu nome. De certo modo correspondi a essas expectativas, todos comentavam sobre o primogênito de Wallburga e Orion Black, aquele que havia sido selecionado para Gryffindor e não Slytherin como todos seus ancestrais. Mas eles se esquecem de que antes de ser uma estrela branco-azulada, Sirius apresentava-se como uma estrela vermelha. A mim jamais coube a frieza imposta e fingida pela nobreza bruxa. Sirius era uma estrela quente. Eu gostava do intenso, daquilo que me fizesse sentir vivo e com razão de existir. Era vermelho, era fogo. Gryffindor. Esse foi o primeiro demônio do qual me livrei, a imposição verde e prata. Mas ainda havia esperanças, de todos os males ainda não fora o maior. O sobrenome ainda estava imaculado e havia Regulus; ele, com certeza, não decepcionaria nossos pais. Quanto a mim, andava com nascidos trouxas e traidores do sangue, os cabelos cresciam a um comprimento bem maior do que o considerado tolerável. O palavreado extenso costumava deixar minha mãe de cabelos arrepiados e meu pai furioso. Tio Alphard achava graça. Mas nem isso parecia suficiente. Os anos se passavam e aquela casa se tornava cada vez mais opressora. Na verdade tudo não passava de um circo, o espetáculo era belíssimo e digno de observação, mas se aprofundar nos mistérios encerrados naquelas paredes era se deparar com o reverso de tanta beleza. Ressentimentos acumulados, mentiras empilhadas precariamente formando a base de tudo, adornados por belíssimos blocos de um orgulho infundado. Cada um construía ao redor de si muros de mentiras e falsidades cada vez mais densos, eram máscaras de frieza e autocontrole que fariam o maior dos artistas corroer-se em inveja. Em uma noite tudo começou a desmoronar, foram gritos, choro, havia chamas também. Andromeda fora a primeira a escolher seu destino, apesar de todo choro e tristeza que havia em seu olhar pude notar que caminhava com extrema leveza, era como se o peso do mundo tivesse saído de seus ombros. Naquele instante tive certeza de que algo maior me aguardava. Era a velha escolha se apresentando novamente, ser condenado a uma vida de aparências ou amaldiçoado por escolher seu próprio destino. A maldição me parecia uma benção. Não demorou muito até que eu também me fosse, minha única preocupação era Regulus. Tão novo, influenciável e determinado a se destacar, a ser melhor do que eu. Temia pelo que pudesse lhe acontecer, mas não podia permanecer ali. Caso contrário meu coração se tornaria tão vazio quanto o de todos eles, eu não queria ser um corpo celeste apagado e sem calor. Eu ainda era a estrela mais brilhante do céu noturno. Foi como se a cena de tempos atrás se repetisse, mas ao invés de ver uma Druella chorosa, era Walburga quem ateava fogo a minha fotografia, enquanto gritava a plenos pulmões que jamais voltaria a penar em mim, que para ela eu estava morto. Morto. Ela gostaria de pensar que Sirius Orion Black havia sido carbonizado juntamente com suas roupas e fotografias, mas a verdade é que eu um Black jamais deixa de ser um Black, por mais que eu também gostasse de pensar o contrário. Há em cada um de nós aquele "quê" de arrogância do qual jamais poderá se livrar, há uma sombra que paira no olhar, mesmo daqueles que parecem carregar galáxias em seus orbes como eu. Naquela fogueira apenas meus demônios foram exorcizados. Agora eu era livre, para viver conforme quis e acreditava ser certo. Finalmente estava dançando ao ritmo de minha própria canção. Sem deixar de ser Sirius, Orion e muito menos Black.
