I never really wanted you to see,

the screwed up side of me that I keep,

locked inside of me so deep,

Entrei no castelo sentindo-me... aliviado. Era uma palavra nova em meu vocabulário. Uma palavra que não existia desde que o imbecil do Voldemort voltara e o imbecil do meu pai decidiu se unir a ele. Pago a minha dívida com a sociedade bruxa através de trabalhos comunitários em Hogwarts aos fins de semana. Melhor que meu pai, preso. Minha mãe pegou alguns meses, mas também tem se dedicado às obras comunitárias.

Seria uma grande merda abrir mão das minhas visitas para Hogsmeade, ainda mais que sabia que agora elas ocorriam semanalmente para os estudantes do último ano. Uma pequena celebração à paz. Não tinha mais Lorde das Trevas e tampouco Comensais: a maioria preso e outra parte covarde demais para sair de seus esconderijos. Nada como se esconder atrás da fachada "imperius". Sorri com ironia: meu pai tentou novamente essa desculpa. Era um tolo arrogante.

Aquele ano seria totalmente diferente de tudo que eu já tinha vivido. Não teria Rony e tampouco Harry. Os dois preguiçosos não quiseram voltar para o último ano. Ambos aceitaram uma vaga como auror no Ministério. Não que houvesse muitos bruxos das trevas para se caçar, mas sabíamos que alguns estavam escondidos e mentindo sobre terem sido enfeitiçados.

Tantas mortes... Toda ajuda era bem vinda. Eu também tive a opção de ingressar no Ministério, mas meu lado CDF (que ninguém me ouça) dizia que eu precisava voltar para Hogwarts e prestar os NIEMs. Estudaria com Gina, assim como Neville, Simas e Dino que voltaram para completar seus estudos.

A Sonserina não tinha tantos estudantes nos seus últimos anos. Muitos pediram transferência para outras escolas, mas fiquei secretamente feliz de saber que ainda teria Zabini e Pansy como companheiros de sala. Ele, como eu, também tinha alguns serviços para prestar, enquanto sua mãe aproveitava a lua-de-mel em alguma praia ensolarada. Pansy ficara bem escondida e não se metera, então saiu livre.

Não era fácil voltar. Muitos se sentavam afastados de mim. Exceto por Pansy e Blaise. Eu não era bem visto em nenhum dos dois lados. Como se a guerra se resumisse em dois lados. Como se tudo fosse assim: branco no preto.

Meus olhos foram para a mesa da Grifinória e não pude deixar de achar estranho ver a sangue-ruim da Granger sem os guardas do lado. Ela parecia mais patética ao andar com a Weasley e com Longbottom.

- Você chegou a agradecê-los? – a voz de Pansy me tirou dos meus pensamentos.

- Agradecer? Agradecer o quê? – eu disse fingindo não saber do que ela estava falando. Ignorei a risada que meu amigo soltou pelo nariz.

- Ela e os amigos salvaram sua vida.

- Não agradeço a sangues-sujos – disse de modo frio. Pansy rolou os olhos e cutucou Blaise, dizendo:

- Ele não muda nunca?

- Acho que é uma característica de ser Malfoy. Talvez aprenda se acabar a vida como o pai.

- Cale a boca, Zabini – eu falei irritado. Meu amigo deu de ombros e também olhou para a mesa da Grifinória.

- Pansy tem razão. Eles salvaram nossa vida.

- Nossa? – ele não estava na Sala Precisa.

- Bom, Potter e companhia foram responsáveis pela morte de Voldemort, não é? Acha que nossa vida seria como se o cara de cobra estivesse no poder?

Eu me calei por que não sabia o que responder. Tinha certeza que não estaria em Hogwarts e provavelmente uma cara de cobra e uma caveira, essa hora, estariam tatuadas em meu braço. Uma imagem que me causava pesadelos.

Vi que a Granger se levantou. Lembrei-me de todos os anos anteriores em que ela sempre me lançava um olhar de desprezo antes de se afastar. Ela não me dirigiu um único olhar. E me peguei sentindo falta do desprezo da Granger.

Não é fácil se livrar de um vício de tantos anos. Mesmo que não saibamos que somos viciados. Só soube quando perdi.

Olhei rapidamente pelas mesas evitando que meu olhar se demorasse na Sonserina. O orgulhoso do Malfoy não foi capaz de um simples agradecimento por termos salvo sua vida da Sala Precisa em chamas. Eu até pensei em dizer um "obrigada" por ele não ter nos entregue quando fomos pegos na Mansão Malfoy, mas também lembrava-me muito bem da sua apatia enquanto eu era torturada. Ele não fez absolutamente nada.

Todos tinham no olhar um sentimento de perda, de luto, de sobrevivência. As pessoas sorriam envergonhadas, como se fosse errado estarmos vivos depois de tantas mortes. Como se fosse proibido sorrir. Um pecado. Eu sorria sem medo e sem culpa. Uma recompensa por ter sobrevivido. Eu e meus amigos terminamos de comer. Sempre tive tanta raiva de Malfoy que não deixava de demonstrar isso com meu olhar toda vez que levantava da mesa. Mas agora... Indiferença. Levantei-me sem olhar para a mesa dos sonserinos.

Hogwarts resolveu reabrir, mesmo sem estar totalmente reconstruída. Não tivemos aula na primeira semana. Ficamos organizando, limpando, juntando tijolos... Ou seja, trabalho de elfos. Eu já tinha visto meu cronograma e não tinha gostado nada: a maioria das minhas aulas seria com a Grifinória.

Meu primeiro sábado de trabalho comunitário foi... Reconstruir a Sala Precisa. Não gostei nada daquilo. Sempre imaginei meu último ano como o príncipe da Sonserina e monitor chefe. Grande engano. Estava eu lá, sem varinha, limpando a merda que o idiota do Crabbe aprontou ao lançar o Fogo Maldito naquela sala meses antes. Claro que a monitora chefe era a Granger e o monitor chefe era um corvinal, Terence Boot. Eu já não gostava do cara, agora gostava menos ainda por pegar meu posto. Agora, naquele sábado levemente ensolarado, praticamente todos os estudantes divertiam-se pela escola ou em Hogsmeade e eu estava enfiado em uma sala limpando cinzas. Isso era tarefa para elfo doméstico e não para um Malfoy.

A semana foi estranha sem meus amigos e sem mistérios para resolver. Desde que começara andar com Harry e Rony parecia que estávamos metidos em problemas. Abracei os dois quando os encontrei. Harry e Gina se afastaram para ficarem um pouco sozinhos. Eu e Rony, apesar do nosso acalorado beijo, optamos pela amizade. Tínhamos certeza que como namorados um dos dois não sairia vivo e eu não gostaria de dar as más notícias para Molly.

Sentamos juntos e ele contou animado sobre o treinamento para auror.

- Eles deixaram que eu e Harry fôssemos atrás dos seus pais, Mione! Dentro de alguns dias partimos para Austrália. Claro que Kingsley nos acompanhará, mas...

Sorri. Ficava tranquila de saber que meus dois melhores amigos fariam parte da procura por meus pais e eles recobrariam suas lembranças. Provavelmente, eles me odiariam por um longo tempo. Afastei os pensamentos tristes e fiquei atenta ao que meu amigo falava. Logo a mesa foi ocupada por Neville, Luna e Terence.

Foi um dia gostoso e relaxante depois de passar uma semana cuidando e reformando o castelo. Eu estava ansiosa para que as aulas começassem, apesar de saber que a maioria delas seriam compartilhadas com a Sonserina.

Aula de Poções. Desde que Slughorn assumira o cargo eu detestava essas aulas. Nessa disciplina estavam misturadas todas as casas já que muitos estudantes não se interessavam pela arte de Poções. Preferia Snape.

- Essa aula não será a mesma sem o grande Potter. Ele tinha uma habilidade... – o professor continuou falar sobre as habilidades que o "estrelinha" adquiriu inesperadamente no sexto ano. Olhei para a Granger e vi que sua expressão era de... raiva? Ela tinha os braços cruzados. O que causara aquilo? Ela estava sentada junto com Boot. Ele sussurrou algo para ela, algo que a fiz sorrir, pois sua expressão séria suavizou. Ela balançou a cabeça negativamente, ainda sorrindo.

- Não ligue para o que Slughorn fala. Você é muito melhor em Poções que o Harry.

Sorri ao ouvir o comentário de Terence. Depois da Batalha ele estava muito mais próximo de nós. Soube que sua mãe morrera na luta, protegendo-o de um ataque de Dolohov. Seu pai cuidou para que a morte dela fosse vingada. Quando ele parou com seus elogios a Harry, voltei minha atenção à aula:

- Infelizmente, muitas pessoas foram atacadas por lobisomens nos últimos meses, então precisaremos de um estoque maior dessas poções. Não é uma poção de fácil preparo. Peguem seus livros e abram na página 153. A dupla que preparar as melhores opções ganhará o cobiçado prêmio de Felix Felicis ao final do mês. Comecem.

Sorri para Terence, que abria o livro na página indicada.

Definitivamente eu precisava daquele frasco. Ter sido superado por Potter não foi nada agradável. Não queria ser vencido por uma sangue ruim. Olhei para o lado e vi que não tinha parceiro. Apenas um outro sonserino, Nott, estava nessa aula e ele, sem dúvida, não sentaria comigo. Ele juntou-se a um lufo.

De repente minha visão foi obscurecida por uma barriga gigante.

- Vejo que está sem parceiro, Malfoy.

- Trabalho melhor sozinho.

- O trabalho é em dupla, meu caro.

- Não me importo – dei de ombros e comecei a separar os ingredientes, fingindo que não era observado atentamente por Slughorn. Após um tempo, ele afastou-se.

Fui para o Salão Principal, após um longo banho. Sentei-me à mesa e notei que meus colegas me olhavam de modo estranho.

- PARABÉNS A VOCÊ, NESTA DATA QUERIDA! MUITAS FELICIDADES...

De repente os estudantes de todas as mesas, exceto a Sonserina, levantaram-se e começaram a cantar parabéns. Um bolo enorme veio flutuando e parou em frente à Granger. Ela sorria timidamente.

- Aposto que os amiguinhos dela terão permissão para aparecer aqui – mal Pansy acabou de falar, vi os dois babacas surgindo. Ela correu para abraçá-los. Nunca ninguém me abraçou daquela forma.

- Eu... Vocês realmente me surpreenderam! – eu disse segurando as lágrimas.

- Hoje partiremos para procurar seus pais, Mione – Ron falou animado segurando minhas mãos. Voltei a abraças os dois.

Sabia que era 19 de setembro e percebi que estava a 19 dias convivendo com a sangue-ruim e não dirigimos nenhuma vez a palavra um ao outro. Eu não a xingava e, para ela, era como se eu não existisse. Não estava acostumado com a indiferença. Vi que havia bolo para todos, menos para mim. Draco Malfoy não era ignorado.

Aceitei dividir meu bolo com todos. Menos com Malfoy. Não que fosse amiga ou colega ou qualquer coisa dos outros estudantes da Sonserina, mas queria deixar algo claro: mesmo como inimigo ele não fazia mais parte da minha vida.

Outro sábado limpando e varrendo e tirando pó e cinzas. Detestava aquilo. Aquele sábado completara um mês que estávamos em Hogwarts. Não me preocupei com meu almoço. Queria apenas terminar aquela porcaria de serviço o quanto antes. Minha matéria já estava se acumulando e ainda tinha o ano letivo inteiro de serviços comunitários.

- Malfoy.

Me assustei. Não só por não esperar qualquer tipo de visita, mas por que eu sabia que era ela. E desde que ela optara por sumir da minha vida, eu sentia falta do vício que era provocá-la.

- Granger – joguei meu cabelo para trás e arrumei minhas vestes. Eu deveria estar imundo. Ela me olhou de cima a baixo. E havia algo mais que desprezo em seus olhos, algo que não consegui identificar.

- A diretora me incumbiu de verificar como anda seu trabalho. – vi que ela olhou para a sala atrás de mim. Eu era bom de ler expressões, mas ela estava impassível. – Quanto tempo acha que leva para terminar sua tarefa? Você ainda tem que – ela desenrolou um pergaminho – reformar uma das estufas, reconstruir a sala de trofé-

- Não sei quanto tempo vou levar... – e falei o único xingamento que faria despertar qualquer coisa nela, mesmo que fosse ódio -, sangue-ruim.

Vi a raiva brilhar nos olhos castanhos, ela se aproximou da mim. De repente senti a varinha em meu pescoço. Não tinha notado que eu era tão alto perto dela. Aliás, quando eu tinha ficado tão perto dela?

Queria tratá-lo com indiferença. Queria fingir que ele não existia. Apagar Malfoy da minha vida. Só tinha mais um ano de Hogwarts. Apenas um ano. Não acreditei quando a Diretora pediu que eu, mensalmente, supervisionasse o trabalho de Malfoy para reportar ao Ministério.

Terence até tentou ficar em meu lugar, mas não houve negociação e, pela primeira vez, senti raiva de Minerva. E de Malfoy... Não era justo que depois de tudo que passamos, que passei, eu ainda tinha que ouvir aquelas palavras como se eu... Como se eu fosse menos merecedora da magia que ele.

- Está tudo bem por aqui? – ouvi Terence falando atrás de mim.

Senti a pressão da varinha se desfazendo. Atrás de Hermione, a figura de Boot apareceu. Também tinha a varinha em punho, como se Hermione precisasse de ajuda. Ela não era uma donzela em perigo.

- Hermione, venha... Você não precisa ficar perto dele – olhei para os olhos castanhos. Marejados? Só que ela era tão orgulhosa quanto eu, precisava assumir isso. Ela jamais choraria na minha frente. Ela afastou-se, mas o corvinal continuou parado.

- Não converse com ela, Malfoy. Está me entendendo?

- Os amigos imbecis saíram e você resolveu tomar o lugar deles? Granger não precisa de proteção.

- Sabendo o histórico da sua tia com tortura e sua impassividade, ela pode precisar sim de ajuda.

Soube de uma coisa: eu, às vezes, era muito burro.

- Vai duelar comigo, Boot? – disse escondendo meus sentimentos.

- Esperando uma oportunidade, até lá... Espero por enfrentar você no campo de quadribol. Sou o novo apanhador da Corvinal. Há quanto tempo sua casa não ganha a taça?

- Há tanto tempo quanto a sua. – eu respondi encarando-o. Ele era quase da minha altura. Tinha minha mão escondida sob as vestes, segurando a varinha.

- Harry Potter não é mais o apanhador da Grifinória. Afaste-se de Hermione, Malfoy.

Ele afastou-se e tive uma certeza: agora, mais que nunca, provocaria Hermione Granger.

Após alguns minutos ouvi passos apressados atrás de mim.

- Hermione! – parei ao perceber que se tratava de Terence.

- Obrigada – eu disse sem parar de andar, mas diminuindo a velocidade dos meus passos.

- Ele fez alguma coisa com você? Falou algo?

- O de sempre. Nem sei por que isso ainda me incomoda tanto.

- Ele é um filho da puta preconceituoso. Não ligue para o que ele fala.

Eu sorri, mas sabia que era um sorriso falso.

- Muito bem, muito bem! – disse Slughorn enquanto observava as poções. Vi que ele elogiou a minha de forma contrariada e, como eu esperava... – Sem dúvida a poção da senhorita Granger e do senhor Boot é a melhor! Senhores – ele entregou o pequeno frasco. Por um momento não liguei de ter perdido para a Granger – Estão dispensados mais cedo hoje! – a sala esvaziou-se rápido. Eu não tinha pressa. Observei os "ganhadores" e não tinha como não ouvir a conversa:

- Sabe que só consegui por você – ele disse e eu revirei os olhos diante de uma cantada tão barata.

- Imagina. Você é ótimo em poções, Terence – ela sorriu, eu gostava do sorriso dela. Principalmente depois do feitiço que lancei em seus dentes. Respirei fundo eu não podia gostar daquele sorriso. Deveria estar inalando muito pó do fogo maldito. E aquela troca de elogios estava embrulhando meu estomago e, mesmo assim, eu continuava ali. Entreouvindo a conversa – Vamos dividir. Vou peg- o idiota a interrompeu, tocando sua mão. Vi que ela corou.

- Fique com você. Eu... – agora eu ouviria uma cantada pior que a anterior – Já estou tendo bastante sorte de passar boa parte do meu tempo com você. Não aguentei e comecei a rir. Os dois pareceram, só então, perceber que eu ainda estava na sala.

- Boot, achei que vocês, corvinais, fossem inteligentes e tivessem um gosto mais... refinado. – Certo, certo. Granger não era feia, mas eu não poderia perder minha fama, ok?

Ele se aproximou de mim mais rápido do que eu esperava, mas logo a mão de Granger estava no braço dele.

- Você não precisa disso. Vamos para os Jardins. Luna, Gina e os outros têm esse período livre. – percebi que ele estava relutando em sair sem me azarar. Levantei minha sobrancelha e sorri de lado. Adoraria duelar com aquele idiota. Os dois juntaram o material e saíram. A mão dele repousando ousadamente nas costas de Granger.

Tomei uma decisão. Treinaria loucamente para apanhar o pomo antes dele.

Malfoy era um idiota. O que ele fazia ouvindo minha conversa com Terence? Terence. Ele estava realmente me paquerando? E, afinal, o que eu tinha a perder? Sabia que o Rony andava se encontrando com Padma. E Terence... Era bonito. Não era mais o adolescente desengonçado que fez parte da Armada. Observei-o discretamente enquanto andávamos. Tinha o cabelo castanho escuro, não muito longo. Sua pele também não era muito clara, assim como seus vivos olhos negros. Ele era um contraste vivo com Draco Malfoy.

Por que eu o comparara com Draco? - Hermione? – a pergunta me puxou dos meus devaneios e agradeci – Será que... – ele parou de andar e postou-se na minha frente – Será que poderíamos ir juntos para Hogsmead nesse final de semana... mas ir como... Bem... como um encontro?

Senti meu coração acelerar. Quando eu tinha tido um encontro? Só pude pensar que precisava de Gina. Desesperadamente. Sem conseguir articular uma resposta, assenti. O sorriso dele fez meu coração acelerar.

- Você tem certeza do que está pedindo, senhor Malfoy?

Vi a expressão de incredulidade no rosto da minha antiga professora de Transfiguração.

- Será uma forma de novas aprendizagens, não acha? – assim eu conseguiria a aprovação dela – Principalmente para mim. Eu sinto que... que, preciso me livrar do preconceito em que fui criado.

- A senhorita Granger não vai gostar nada disso – segurei meu sorriso. Era o que eu precisava: saber que ela não ia gostar. Não que para mim fosse fácil, mas sem dúvida: provocar Hermione e saber que nesses momentos ela não me olhava com indiferença, era algo que eu precisava.

- Parece-me uma ideia bem interessante – virei-me verdadeiramente assustado ao ouvir a voz de Dumbledore. Os olhos azuis dele me fitavam por cima dos óculos de meia lua, sentado em seu quadro. De uma forma estranha era como se ele soubesse meus verdadeiros motivos. Encarei a mesa à minha frente.

- Tudo bem... Eu concordo. Falarei com os professores.

Cheguei ao Salão Comunal da Sonserina sorrindo.

- O que você aprontou? – ouvi Blaise perguntar enquanto passava os dedos pelos fios curto do cabelo de Pansy que lia uma revista de fofoca qualquer com a cabeça apoiada em sua perna. Sim, eles começaram a namorar cerca de uma semana atrás.

- Um jeito genial de provocar a Granger novamente.

- Por que quer provocá-la? Deixe a garota em paz, Draco. Afinal, ela não passa de uma sangue-ruim – Pansy falou sem desviar a atenção da revista, mas notei que meu amigo me olhava atentamente. Merda.

- Você sente falta, não é? De provocá-la. – quis interrompê-lo. Vi que Pansy apoiou a revista na barriga e começou a ouvir a conversa. Levantei-me para sair, simplesmente por que não queria ouvir do meu amigo o que eu sabia ser verdade – Você sente falta da atenção dela.

Não respondi.

- Isso é impossível! – Pansy exclamou.

- É impossível, porque não é verdade! Eu apenas quero tornar a vida dela mais difícil. Tudo anda muito calmo por aqui. – virei-me e fui para meu quarto batendo a porta de forma estrondosa.

- Senhorita Granger – ouvi o professor Flitwick falar -, a senhorita poderia sentar-se ao lado do senhor Malfoy.

Abri os olhos em descrédito.

- Não vou me sentar com o Malfoy! – claro que todos na sala olhavam para mim. Eu não costumava desobedecer a um professor assim.

- Desculpe senhorita, mas isso não foi um pedido. Seu parceiro dessa e todas as aulas até o final do ano será o senhor Malfoy.

Enfiei meu material na mochila e sentei-me ao lado dele. Notei que para ele aquilo era muito divertido. Estava tão nervosa, que não pensei mais sobre isso. Apenas bufei contrariada.

Zabini estava certo. Claro que estava certo. Eu sentia falta de provocá-la e não pude deixar de sorrir vitorioso ao vê-la bufar, ao jogar o material na mesa, ao bater nervosamente a pena na mesa. Não havia mais indiferença no olhar da Granger. Senti algo diferente.

A SEMANA TODA. TODA! Aquilo era um pesadelo na terra. TODOS os professores de TODAS as aulas pediram que eu me sentasse e fizesse parceria com o Malfoy. TODOS. Argumentei com Minerva e ela veio com um discurso muito idiota sobre acreditar em mudanças e possibilitar uma chance para Draco Malfoy. Chance. Sei.

Eu e os outros monitores já estávamos atolados com a organização da festa do dia das bruxas, que esse ano seria fora de Hogwarts para os alunos maiores de idade. E ainda eu teria que lidar com esse empecilho: TODOS os dias sentada ao lado do Malfoy.

Rony e Harry tinham me escrito dizendo que ainda não tinham localizados meus pais. O nome que eu inventara era bastante comum na Austrália. Saí do castelo batendo com raiva e ignorando alguns alunos que me chamavam, provavelmente para perguntar sobre a festa ou sobre qualquer coisa. Eu não era um mural de informações.

Cheguei até o campo de quadribol e vi o time da Sonserina treinando. Vi Nott, um dos batedores descer rapidamente ao me ver. Ele gritou algo com o time, que interrompeu o treino.

- O que faz aqui? Pegando informações sobre meu time, Granger?

- Há coisas mais importantes do que quadribol, Nott – vi que o bastão girava em sua mão direita. Bom, eu não gostava daquilo, mas tinha a vantagem de estar com minha varinha e um idiota como aquele não iria me amedrontar.

- Saia, Granger. Adoraria rebater umas goles em você, mas...

- Isso é alguma ameaça? – eu indaguei. Minha varinha não estava apontada para ele, só que estava entre meus dedos.

Não que eu fosse uma boa pessoa. Estava pagando pelos meus erros. Só que fui covarde e não tive coragem de matar Dumbledore. Vi a morte de perto e não gostei nada.

Eu sabia que não era uma boa pessoa. Era covarde e dissimulado. Tinha o sangue sonserino e não era lá muito fã de sangue-ruins, apesar de estar inclinado a abrir exceções depois que conheci Granger (ainda bem que eu era um bom oclumente). Só que algumas coisas eu considerava errado e fora do limite. Seria interessante um duelo com a Granger. Um duelo justo (sim, alguns de nós sonserinos conhecemos e fazemos uso dessa palavra). Agora, uma coisa que era inadmissível para mim era alguém bater em uma mulher.

Eu já vira meu pai batendo em minha mãe. Eu a defendi, mas aquilo custou umas boas semanas de cama. E eu sabia muito bem o que meu colega era capaz de fazer com aquele bastão. Por isso, interrompi a conversa fazendo uso de toda minha frieza:

- O que você quer, Granger? – qualquer pessoa teria se sentido ameaçada. Não a Granger. Garota tola.

- Falar com você – aquilo me surpreendeu e por alguns segundos (milésimos de segundos) minha máscara de indiferença caiu. Gostei da frase dela: Falar com você. Ela nunca queria falar comigo. Por motivos óbvios. E por motivos óbvios ela tinha me procurado.

- Eu cuido disso, Nott – vi que ele apoiou o bastão no ombro sem deixar de olhar para a Granger que sustentou o olhar. A garota era pirada.

- É seu horário de treino.

- Na verdade – olhei para o relógio –, o treino termina daqui 10 minutos. Amanhã nos encontramos novamente – peguei minha vassoura e passei pela Granger. Ela me seguiu. Claro que queria treinar por mais dez minutos. Queria esfregar o pomo de ouro na cara do Boot. – O que você quer, Granger?

- Que história é essa de ser meu parceiro em TODAS as minhas aulas?

- Nossas aulas – eu disse. – Granger, eu quero ser uma pessoa melhor. Acabar com essa história de preconceito – o olhar de incredulidade dela era impagável – E nada melhor como estudar com a san-ops... Com a nascida trouxa mais inteligente de Hogwarts. - Isso é alguma brincadeira, Malfoy? – pior que não era. Minha provocação era bem séria.

- Claro que não é brincadeira, Granger. – os olhos dela se estreitaram. A cabeça inclinou. Seus cachos pendiam para diversos lados. Uma imagem...

- Você está tramando alguma e vou descobrir!

- Como preferir, Granger – sorri sarcástico. Ela virou-se com raiva. Eu gritei: - Ei, grifinória! Segunda começamos, juntinhos, um novo projeto de poções. – falei, pois imaginei que, a cada aula, o professor pediria uma poção diferente - Espero que seu salão de monitora seja bem confortável! – ri mais ainda quando ela mostrou-me o dedo do meio.

O objetivo de Draco era me tirar do sério. Só podia ser! Como Minerva acreditou naquela conversa fiada de que ele reveria algum conceito sobre mim? Nós dois trabalhando juntos era algo improvável. Ou seja... Até o fim do ano nós nos mataríamos. Éramos opostos. Éramos gelo e fogo. O preconceito dele era algo que poderia consumi-lo e, mesmo assim, ele não mudaria.

Entrei no meu quarto batendo a porta com força. Era bom ter um quarto e uma sala de estudo apenas para mim. Eu passava boa parte do tempo no Salão Comunal da Grifinória, mas gostava de estar sozinha. Às vezes. Ouvi uma batida na porta que separava meu quarto do Terence.

- Oi – eu disse meio envergonhada. Eu teria um encontro com ele no dia seguinte. NO DIA SEGUINTE!

- Tudo bem? Alguns estudantes viram você e Malfoy discutindo. Ele aprontou alguma?

Deixei-o entrar.

- Sim... – e contei sobre minha parceria com o loiro idiota nas próximas aulas. Em TODAS as próximas aulas.

- Não é possível que McGonagall tenha concordo com isso! Mas, mas... somos parceiros em Poções!

- Não mais – eu disse tristemente. Estava gostando da companhia dele nas aulas de Slughorn. Não só nas aulas... Fiquei calada, com vergonha dos meus pensamentos.

- Isso é muito injusto – ele disse, eu concordei com um leve aceno de cabeça.

Granger não apareceu para o jantar. Olhei atentamente para a mesa da Grifinória. Gostei de vê-la irritada. De vê-la indo até o campo de quadribol para falar comigo. Ela não foi lá atrás do Potter, do Weasley e tampouco do Boot. Não era qualquer grifinória atrás de um sonserino. Era a Granger atrás de um Malfoy.

Claro que Gina me ajudou com a escolha da roupa, não que eu fosse tão péssima assim em questão de roupa. Só que estava nervosa. Era um encontro afinal... Meus beijos? Um beijo virginal em Vitor, um beijo molhado e desajeito em Cormaco e um beijo confuso em Rony. Esse era meu vasto repertório.

Cheguei em frente ao Três Vassouras e Terence já me esperava. Ele estava bonito. Não que ele fosse tão bonito quanto... Quanto outro garoto de Hogwarts, mas era bonito.

Ele parecia tão nervoso quanto eu.

- Oi.

- Você está linda, Mione – devo ter corado – Aqui está cheio de conhecidos será que podemos ir para outro lugar? – fiquei com medo que ele sugerisse Madame Poodifoot. – Conheço um pequeno restaurante no fim da Alameda Flamel.

- Claro – sorri aliviada. Não era o Madame Poodifoot.

Andamos meio envergonhados e sem ter muito assunto para conversar. Ele abriu a porta para que eu passasse e realmente lá quase não havia estudantes de Hogwarts. Enquanto tomávamos nossa cerveja amanteigada, fomos relaxando e o assunto surgindo. Senti quando ele aproximou-se de mim e entrelaçou seus dedos com os meus.

- Mione, antes de continuarmos – ele disse entre bebericadas de cerveja – Você e Ronald...

- Apenas amigos – eu falei rapidamente. Ele sorriu. Tinha um sorriso bonito. Fechei os olhos quando o vi se aproximar.

Estava deitado, ou melhor, largado, no sofá do Salão Comunal. Trabalhei muito, mas tenho certeza que adiantei o trabalho de meio sábado. Ouvi passos e sabia que todos estavam voltando de Hogsmeade. Abri os olhos e vi Pansy segurando um caixa de bombons para mim. Blaise sentou-se no sofá, empurrando minha perna para o lado.

- Estou exausto! Deixe eu me esticar um pouco, Zabini!

- Pelo menos terá o sábado do dia das Bruxas livre para a festa, né?

- Sim – eu disse me servindo de um chocolate – Obrigado – falei para Pansy – E espero que seja tão boa quanto estão anunciando.

- Será – ele começou a falar sem parar. Deixei meu corpo escorregar no sofá, apoiando minha cabeça no encosto. Juro que não prestei atenção. Estava cansado e ainda tinha um trabalho para fazer. Ele falava e falava. Pansy o interrompeu e eu continuei numa espécie de devaneio até...

- ... Todo mundo está falando sobre isso! Os monitores-chefes se beijando! – ela riu – Granger com aquele ar... Imagino o que eles não andam fazendo nos quartos e banheiros da monitoria.

- Do que está falando? – perguntei me ajeitando.

- Da Granger e do Boot. Eles foram vistos no maior beijo em Hogsmeade. Eu achei que ela estava com o ruivo.

- Ela pode estar com os dois – Blaise falou dando de ombros e aquilo para Pansy seria o tema da nova fofoca de Hogwarts. Ela foi se juntar às outras garotas.

- Granger e o corvinal, hein?

- Isso te incomoda?

- Claro que não! – eu levantei irritado. Por que me incomodaria quem a Granger beijava ou deixava de beijar? Eu que não queria saber daquela boca lindamente imunda. Esqueçam que eu pensei "lindamente". Fui para meu quarto, peguei minha vassoura e decidi que os estudos ficariam para depois. Eu precisava treinar.

Segunda não era meu melhor dia. Aula de poções não ajudava. Slughorn atribuindo erroneamente elogios às poções perfeitas de Harry não colaborava, mas pior que tudo isso era ter que sentar com Malfoy.

Estava ao lado de Terence, nossos dedos entrelaçados. Ele era romântico e passamos sábado e domingo juntos. Ignorava as fofocas dos outros estudantes que diziam que, depois do meu envolvimento com Harry e Vítor, tinha optado por "descer" meus padrões ao me envolver com Terence e Rony.

Adolescente é uma merda.

Conversava em voz baixa com Terence, esperando a aparição teatral de Slughorn, quando fomos interrompidos por um pigarreio.

- Está sentado no meu lugar – a voz inconfundivelmente arrastada e arrogante. As únicas cores no uniforme de Malfoy eram o verde e o cinza que combinavam terrivelmente com seus olhos tempestuosos. Ajeitei meu corpo na cadeira. Eu não acredito que pensei no adjetivo "tempestuosos".

- Não tem seu nome na cadeira, Malfoy – Terence falou encarando o sonserino e levantando-se. Claro que, essa hora, os outros alunos olhavam para nós.

- Meu nome não está na cadeira. Está ao lado da Granger. Fora. – e Malfoy, muito folgado, jogou sua mochila sobre a mesa.

Antes que Terence fizesse alguma besteira que custaria, muito provavelmente, sua participação na festa das bruxas eu levantei-me e coloquei uma mão sobre o seu ombro.

- Deixa para lá. Não vale a pena, Terry.

Terry? Que tipo de apelido era aquele? Parecia nome de elfo doméstico. E ainda um elfo limpador de bosta de hipogrifo. Terry. Granger era patética. Vi que os olhos escuros do corvinal cintilavam de raiva e eu gostaria que ele tivesse me azarado. Seria realmente engraçado ver o monitor-chefe levar uma detenção.

Pena que Granger interrompeu o momento. Terry... Ele passou por mim, mas fiz questão de deixar meu ombro para que trombássemos. Ele perdeu o equilíbrio. Eu não. Terry... Que apelido mais idiota.

Concentre-se na aula. Concentre-se na aula. Esqueça que a doninha quicante está ao seu lado. A aula vai acabar. É apenas o tempo da aula, os professores estão pedindo atividades individuais.

-... Esse é um ponto importante para vocês e geralmente são questões que caem nos NIEMs. Por isso deverão montar um kit de primeiros socorros com as principais poções de cura. Claro que não citarei quais são. Além das poções, deverão escrever um pergaminho da função de cada uma e seus principais usos. Quero opiniões pessoais e não apenas cópia dos livros. O trabalho será entregue no final do ano letivo...

Eu anotava tudo o mais rápido que podia. Olhei para o lado e vi Malfoy observando o professor de braços cruzados. Era mesmo um riquinho mimado que não se comprometia com nada. Balancei a cabeça negativamente e quebrei a ponta da minha pena quando ouvi:

-... E trabalharão com as duplas que estão sentados.

Se eu não estivesse em sala de aula teria dado outro soco em Draco Malfoy.

Agora eu estava realmente feliz com a situação. A única maneira de tornar a vida da Granger mais insuportável era estando ao lado dela o maior tempo possível. Um trabalho de poções daquele porte, sem dúvida, exigiria que ficássemos um bom tempo juntos.

Olhei para o lado procurando o Boot, achei-o me olhando com raiva. Aquilo apenas me divertiu ainda mais. Sorri de forma irônica. Seria divertido passar um tempo com a Granger enquanto ele trabalhava com um lufo, que parecia não saber o que era um caldeirão.

- Hoje, às 19 horas, na Biblioteca – ela disse juntando o material e colocando-o de forma metódica dentro da mochila.

- Lá é um lugar barulhento – eu disse esticando a perna e empurrando a cadeira para trás tornando impossível que ela saísse do seu lugar, já que do outro lado estava a parede.

- Barulhento? – ela perguntou. A voz um tanto aguda pela minha ousadia de chamar a biblioteca de Hogwarts de barulhenta. – Provavelmente você nunca nem pisou na biblioteca de Hogwarts, Malfoy! Fique sabendo que lá – e ela começou discursar sobre fatos tirados de "Hogwarts, uma História". Ela mexia levemente a cabeça enquanto falava e seus cachos balançavam, soltando-se do elástico. Eu não tinha a mínima ideia do que ela dizia. E, juro, eu não ligava a mínima. Senti um empurrão no meu ombro. Senti meu corpo retesar imediatamente e levantei-me.

- Saia do caminho, Malfoy – pela posição que estávamos ele deve ter imaginado que não deixei Hermione passar e ela estava me dando um sermão. Ela estava me dando um sermão, mas, infelizmente, tinha perdido a oportunidade de vê-la encurralada.

- Acha que está falando com quem, Boot?

- Com você mesmo. – percebi que, atrás de mim, Hermione levantou-se nervosa. Só que ela não tinha como passar. Sorri por dentro, mas mantive minha seriedade.

- Parem com isso. Os dois. Saia da frente, Malfoy.

Sem parar de encarar o corvinal, dei um passo para o lado. Ela foi para o lado dele.

- Como eu estava dizendo, - voltei meus olhos para ela – a biblioteca é muito barulhenta. Estarei no horário marcado no seu salão de monitoria. Até mais, Granger – peguei minha mochila, joguei sobre meu ombro e saí. Sorria de lado. Granger boquiaberta e sem reação... Queria ver aquela cena novamente.

Aquele Draco Malfoy era mesmo um folgado. Um arrogante! Por pouco Terence não o azarou! E bem que ele merecia. De jeito nenhum que ele entraria no meu salão comunal. Este era reservado apenas para mim e meus amigos e não para alguém como... Argh! Um idiota que apoia a tortura!

Não ficaria sozinhacom ele de jeito nenhum. Vi que faltavam quinze minutos para o horário marcado. Estava tão nervosa que apenas comi um lanche. Não conseguia nem pensar no banquete que estava sendo servido. Abri a porta do quarto e...

- Indo para algum lugar, Granger? – ela deu um pulo de susto. Eu falei aquela frase em voz baixa.

A cada momento eu tinha uma certeza: Malfoy era um completo idiota. Levei a mão ao peito com o susto que levei e não consegui segurar as palavras:

- Mas que merda você está fazendo aqui? – ouvir a Granger falando palavrão era uma experiência nova que eu tinha gostado. Aliás, detestava admitir que cada vez mais estava gostando das pequenas experiências que vivenciava ao estar ao lado dela. Agradeço à minha mãe por ser um bom oclumente.

- Temos um compromisso marcado. Onde você estava indo?

- Marcamos na biblioteca.

- Não, não marcamos. Deixei bem claro que nosso encontro seria aqui. – olhava fixamente para ela, que corou levemente ao ouvir a palavra "encontro".

- Não ficarei sozinha com você aqui – ela disse apontando para a porta atrás dela.

- Acho que é mais confortável que estudarmos aqui no corredor – eu disse colocando minha mochila no chão.

- Você não pode estar falando sério.

- É apenas um trabalho, Granger. Acha que vou fazer o quê? – e, agora, abram espaço para meu momento Weasley – Torturar você?

Eu não podia acreditar que ele falou aquilo. Quer dizer... Claro que acreditei, afinal não esqueci com quem estava lidando. Queria fingir que ele não tinha me atingido, que aquelas palavras não significavam nada. Só que eu ainda sonhava com as torturas de Bellatrix. Eu ainda acordava gritando e sentindo meu corpo sendo atingido várias e várias vezes. E eu ainda me lembrava de Draco, parado. Impassível.

Fui longe. Percebi. Encarei os olhos castanhos que se encheram de lágrimas. Antes que eu pudesse organizar meus pensamentos para dizer alguma coisa, ela virou-se e entrou no quarto. Não haveria estudo naquela noite.

Voltei pelos corredores sentindo a culpa voltar a pesar nos meus ombros e embrulhar meu estômago. O dia em que Granger e os idiotas foram capturados era um pesadelo à parte em minha vida. Vivendo na Mansão na época da guerra eu vi muita morte. Vi o terror nos olhos das pessoas. Vi uma professora morta ser devorada por uma cobra gigante. Uma cobra que tinha a alma de Voldemort. Quão sinistro isso soa? Era um louco sendo seguido por outros.

Dizer e pensar: "quero que você morra" é bem diferente de fazer aquilo acontecer. De ver aquilo acontecer... Eu...

- Malfoy,...

Puta merda.

- Boot, não quero conversar – eu disse tentando passar. Ele impediu.

- Nem eu. Onde está Hermione? Fique longe dela. – idiota. Cada vez que ele pedia para eu me afastar tinha apenas um desejo: me aproximar ainda mais.

- Acontece que os professores acham que meu lugar é bem perto dela – eu disse pegando minha varinha. Precisava extravar minha raiva. Minha culpa. Minha dor.

- Não ligo para o que eles pensam. Apenas na aula, Malfoy, apenas na aula vou aceitar essa sua aproximação. Caso contrário...

Eu ri sarcástico, interrompendo-o. Ele achava mesmo que poderia me ameaçar? A mim? Draco Malfoy?

- Não vou perder meu tempo com você.

- Ótimo. Estou indo encontrar com a Hermione – ele continuou pelo corredor e eu sabia que ele encontraria uma Granger em prantos. O fato dele poder consola-la me incomodou de uma forma estranha.

A Granger era estranha.

Quando ouvi uma batida na porta, não pude acreditar que ele ousara bater. Achei que tivesse ido embora. Limpei as lágrimas de qualquer jeito. Deveria estar horrível com os olhos vermelhos e inchados:

- Realmente precisava voltar?

- Mione?

- Terry... – sem falar mais nada, pulei nos braços dele. Ele me envolveu sem entender nada.

- O que Malfoy fez? Ele te machucou? Mione,... – Terence me abraçou ainda mais forte. Entramos no quarto e sentamos no sofá. Ele enxugou minhas lágrimas com o polegar. Sorri entristecida pelo gesto delicado.

Contei o que aconteceu. Era estranho não ter Harry e Rony. Terence continuou ali, me ouvindo e me aninhando em seu peito. Vi que ele ficou bravo, mas se fosse meus outros amigos a essa hora estariam colocando a porta do Salão Comunal da Sonserina abaixo. Senti falta dos meus amigos. As palavras e o desprezo de Draco me machucavam. Queria esquecer mesmo que por alguns instantes:

- Terry,... me beija...

Senti os lábios dele nos meus. Aquele não era um beijo atrapalhado, confuso,... Eu... gostava daquele beijo e era como se o beijo não fosse suficiente. Eu precisava sentir-me desejada... Provar para mim mesmo que era mais que uma sangue-ruim como Malfoy e toda sua família pensavam.

Senti os lábios indo até meu pescoço e meu corpo se arrepiou. Deslizei minha mão pelas costas dele. Puxei-o para mais perto. Não sei em que momento deitamos. Ele sobre mim.

- Terry,... – não era uma voz de parar, era uma voz para continuar. Ele entendeu.

Tinha certeza que naquela manhã Granger voltaria a me ignorar e não haveria os olhares de desprezo. Eu tinha estragado minha brincadeira. E de uma maneira estúpida. Agradeci que meus amigos estavam mais interessados em si mesmos e não notaram o modo como olhava para a mesa da Grifinória. Vi quando ela entrou sorrindo de mãos dadas com o idiota. Ele me olhou e viu que eu tinha meus olhos fixos na Granger. O idiota puxou-a pela cintura. Envolvendo-a ainda mais. Eles não combinavam. Granger sorriu para ele. Eu senti uma raiva desconhecida percorrer meu corpo.

- Será que eles transaram?

- Quê? – perguntei ao ouvir a voz da Pansy ao meu lado.

- A Granger está com cara de quem transou. Você não acha meu amooor? – ela perguntou para Blaise que pareceu apenas agora se dar conta que eu estava na mesa.

- E como vou saber disso? – ela deu de ombros perante a pergunta e repetiu:

- Só sei que ela está com cara de quem transou.

Sentei ao lado de Gina ainda sem acreditar na noite que tivera. Sei que estava namorando com Terence há pouco tempo, mas eu o conhecia há anos... Além do mais, senti que estava na minha hora. De transar, claro.

Sussurrei para Gina: "precisamos conversar".

Ela, nada discreta, deu um berro prevendo o que eu tinha para contar. Hogwarts inteira olhava para nós.

- Falei! – Pansy exclamou ao meu lado depois que a representante dos pobretões soltou um grito que assustou até o Pirraça. Claro, ela poderia ter passado boa parte da noite comigo, estudando. Mas, não. Por minha completa e total imbecilidade, o idiota do Boot tinha passado a noite com a min... Com a sangue-ruim.

Encarei-o com raiva. Ele ria com superioridade. Saí da mesa e mal tinha tocado na comida. Fui para minha aula que, (in)felizmente não era com a Grifinória.

Depois do almoço, tinha aula de Feitiços com a Sonserina. Vi Malfoy sentar ao meu lado calado. Ele nunca calava a maldita boca. Estava muito brava com ele, mas aquele silêncio estava me incomodando. Não que eu apreciasse aquela voz roucamente irritante, apenas era óbvio que ele precisava se desculpar.

Tamborilava os dedos nervosamente na mesa. Meu material já organizado. Vi que ele tinha apenas o livro aberto ao meu lado. Bufei.

Eu sempre tinha as palavras certas para provocá-la. Tinha as palavras certas para machucá-la. A frieza combinava comigo. Era minha proteção. Era meu modo de atingir alguém que parecia tão intangível. No entanto, ela apenas parecia inatingível por que eu vira Granger no seu estado mais fraco e fizera piada com isso na noite anterior.

As palavras sumiram da minha mente. Vi que ela começou a bater os dedos na mesa. Ela deveria estar bem nervosa mesmo. Uma palavra, Draco... Apenas uma palavra. Não é tão difícil. Quando você falar não será seguida por azarações... Uma palavra. Oito letras. Ela não está te ameaçando, nem nada... E por que será que mesmo assim isso é tão ruim quanto receber algumas azarações?

- Gr-

- Boa tarde! – o professor entrou na sala interrompendo o que eu ia dizer. Puta merda. Teria que esperar a aula acabar. Apesar de que seria bem mais fácil apenas sussurrar um "desculpe" e continuar como se nada tivesse acontecido. Só que sabia que com Granger as coisas nunca eram tão simples.

Vi que a aula estava para terminar, então juntei meu material antes que o professor terminasse de falar. Sairia correndo como uma louca para não dar tempo dele ficar tão próximo de mim. Pelo menos até a próxima aula.

Eu nunca era a primeira a sair da sala. Mas naquele dia eu fui. Antes de o professor terminar de se despedir e desejar boa semana eu já estava na porta, girando a maçaneta.

- Granger! – ele me alcançou antes do que eu planejara. Quer dizer, eu não queria que ele me alcançasse. Queria? Apertei o passo, andando mais rápido. Gina, sem dúvida, ia perguntar sobre meu estranho comportamento.

Não era possível que existisse alguém mais teimoso que essa garota. Ela saiu sem me dar a menor oportunidade de conversa. Lá estava eu, um Malfoy, um sangue-puro, correndo atrás dela. Nem preciso continuar a dizer os adjetivos que a classificam.

Peguei-a pelo braço ignorando alguns olhares curiosos. Ela tentou interromper meu toque, puxando o braço. Eu ignorei e segurei-a com mais força. Ninguém dava às costas para um Malfoy. Ninguém. Entramos em uma sala qualquer e eu lacrei a porta com um feitiço. Soltei o braço dela com raiva. Eu estava com raiva e nem sabia direito por que.

- Alohomora! – ela disse e tentou abrir a porta. Inutilmente, claro. Eu sorri de lado. Irônico.

- Abra a porta, Malfoy.

- Não. – Eu disse simplesmente. Deixei minha mochila sobre uma cadeira, afrouxei minha gravata. Fazia tudo calmamente. Aquilo a irritava. Eu gostava de vê-la daquele jeito. Era meu vício. Como poderia lutar contra ele?

- Não temos nada para conversar. Já pensei e decidi como faremos nosso trabalho de poções, sem nos encontrarmos – eu gostava quando ela falava assim, de forma rápida e mandona. No mínimo me julgava por Potter ou Weasley achando que eu obedeceria àquele monte de bobagem -... Então eu fico com as poções a partir da letra M. Marcamos um dia no ano que vem para juntar nossas pesquisas em uma só. Agora abra a porta – ela tinha a mão na cintura. Sentei e observei-a atentamente. Os cachos rebeldes em torno do rosto. Os olhos de um castanho vivo. Ela estava ficando impaciente. Eu também, mas não demonstrava. Minha especialidade: não demonstrar o que sentia. Aprendi bem cedo que era melhor viver assim.

- Não trouxe você aqui para falar sobre o trabalho de poções. Sente-se – ela não sentou. Eu levantei e dei alguns passos na direção dela. Granger recuou. Vi que ela procurou pela varinha, fui mais rápido e a desarmei.

- Devolva minha varinha! – ela disse se aproximando e tentando puxar a varinha da minha mão. Eu rapidamente coloquei a varinha dela na minha cintura e a olhei desafiador. – Malfoy,... – aquilo a fez parar. Granger não era de recuar frente a desafios, só que para ela pegar a varinha exigiria uma aproximação que ela não queria. E eu, estranhamente, desejava essa proximidade. Granger tinha cheiro de morango e pergaminho. Uma mistura inusitada que eu gostava.

Ela cruzou os braços. Eu sorri de lado.

- Como eu ia dizendo, não te chamei aq-

- Arrastou. Você me arrastou para cá – ela falou levantando uma sobrancelha e me corrigindo como se eu fosse uma criança que fez algo errado. Gostaria de saber qual castigo ela poderia me dar.

- Certo, Granger. Não te arrastei aqui para falar sobre o trabalho de poções que não será feito como você falou. – vi que ela falaria algo, só que eu não permiti – Vim aqui para falar sobre ontem.

A expressão dela mudou novamente. Nesse ponto também éramos opostos. Granger trazia tantas emoções em suas expressões, em seu rosto, em seus olhos... Ao contrário de mim, que trazia tudo escondido e trancado dentro de mim.

- Não há nada para falar sobre ontem. Devolva minha varinha e abra a porta, Malfoy.

- Não vou abrir a porta e se quiser sua varinha você mesmo deverá pegá-la. – dei um passo, me aproximando ainda mais. Aquele era um jogo. Um jogo que eu estava realmente gostando de jogar. Gostando mais do que eu deveria.

A varinha na cintura dele. Bastava apenas eu chegar um pouco mais perto e esticar meu braço e... Por que aquela proximidade com Malfoy me incomodava tanto? Era um incômodo diferente. Algo que eu preferia não pensar. Voltei a encarar os olhos cinza. Aquilo tudo parecia diverti-lo. Era um jogo. E eu detestava assumir, mas ele estava ganhando.

Descruzei os braços, incerta do que fazer. Mesmo com a varinha o que eu faria? Poderia azara-lo, apesar que isso não me ajudaria a sair da sala. Apenas ele poderia destrancá-la. Só que com a varinha eu me sentia protegida. E precisava dessa proteção, pois eu não poderia contar com Malfoy.

- Apenas me entregue a varinha – ela pediu e havia um tom de... desespero. Eu não faria nada para machucá-la. Ela deveria saber disso. Granger estava com medo? Não parecia medo...

- Granger, você sabe que eu não vou te machucar, certo? – falei sem pensar. Aquela conversa estava se estendendo mais do que eu planejara. Tudo com a Granger estava indo muito além do que eu planejara.

- Claro, não é como você fosse me torturar, certo? – o sarcasmo dela me machucou. Eu queria ter pedido desculpas antes de chegarmos naquilo – Você é do tipo que observa a tortura acontecendo e fica apenas assistindo.

Eu não queria que ele soubesse. Mostrar fraqueza para um sonserino não era bom. Só que eu carregava aquilo há muito tempo e a presença constante dele ao meu lado não estava ajudando em nada.

Malfoy tinha sempre em seu rosto uma expressão fria e de superioridade, mas vi que sua expressão mudou ao ouvir minhas palavras. Culpa? Arrependimento? Ou não era nada disso? Afinal, quando um sangue puro como ele se importaria com alguém como eu? Isso era um fato que eu entendia, mas não aceitava tamanho desprezo. Tamanho descaso.

Percebi que a história era outra. Não se tratava apenas das minhas palavras idiotas sobre tortura. Eu a vi sendo torturada. E não fiz nada. Absolutamente nada. Fiquei parado vendo-a gritar. Senti a garganta secar. Ela achava, e com razão, que eu não me importava. Eu não fiz nada para impedir minha tia. Essa era a dura verdade. Eu sou um covarde.

- Granger,... Escute, eu... – eu não sabia o que dizer. Ela me olhava com mágoa e raiva. Eu a vi sendo torturada e nada fiz. Uma semana depois ela e os amigos me salvaram de morrer na Sala Precisa. Eu não merecia estar perto dela. Eu merecia estar em Azkaban.

- Nós vamos nos atrasar para a próxima aula.

- Granger, desculpe pelo o que eu disse ontem – eu falei rápido. Não era nada fácil eu pedir desculpas. Ela me olhava como se procurasse qualquer traço de mentira em minhas palavras. Eu não poderia julgá-la.

- Ok – Granger falou após alguns instantes. Eu tirei a varinha da minha cintura e entreguei para ela. Destranquei a porta. Ela virou-se para sair e eu falei:

- Hoje. No mesmo horário. – ouvi-a bufar e concordar de forma contrariada.

Na hora do jantar, Terence sentou-se ao meu lado.

- Senti sua falta hoje – ele falou sorrindo. Beijou-me rapidamente. Rolei os olhos ao ouvir as risadinhas ao meu lado.

- Eu também – era uma meia verdade.

- Será que podemos nos encontrar depois do jantar? – senti a mão dele no meu joelho, sob a mesa. Meu corpo arrepiou-se.

- Ela já tem um encontro marcado. Se continuar namorando ao invés de jantar, você vai se atrasar, Granger – olhei para trás ao ouvir a voz de Malfoy. Tenho encontro marcado? Ele era um arrogante mesmo.

- Não temos encontro nenhum, Malfoy. – Terence levantou-se e eu também. Claro que todos olhavam para nós.

- Temos que fazer nosso trabalho de Poções – ele disse simplesmente. Olhei para meu relógio.

- Faltam dez minut – eu comecei a dizer, mas Terry me interrompeu.

- Além do mais ela não vai ficar sozinha com você, não depois do que você disse ontem.

- O que eu disse ontem não diz respeito a você, Boot. É um assunto entre Granger e eu. Além do mais, minhas palavras não quebraram nenhuma regra da Escola...

Depois de dizer essas palavras olhei para Granger. Ela corou. Boot colocou-se na frente dela, quebrando nossa troca de olhares. Aquele corvinal estava me irritando profundamente. E eu não queria esperar a partida entre nossas casas para mostrar quem era o melhor de nós dois.

- Você e Hermione não estudarão sozinhos.

- Não sabia que a Granger tinha dono.

- Parem vocês dois. – ela saiu de trás dele. – É um trabalho, Terry, não tenho escolha.

Sorri ao ver a expressão dele.

- Melhor eu começar logo para terminar logo – ela disse meio insegura. Depois ficou na ponta do pé e sussurrou algo no ouvido dele que eu preferia não ter escutado – Depois eu vou até seu quarto – beijou-o no rosto e me olhou. Mas era diferente da forma que olhava para ele. Granger me olhava com desprezo. Antes aquilo me bastava, agora me incomodava.

Ela seguiu em direção ao quarto. Encarei o idiota por uns segundos, antes de ir atrás dela. Eles tinham um salão e um quarto privativo que se comunicava por uma porta. Assim que chegamos, discretamente lancei um feitiço na porta que ligava os dois quartos para que se o otário batesse, ela não ouvisse. Fiz o mesmo na porta de entrada.

Estava nervosa, então comecei a organizar diversos livros de poções sobre a mesa. Ouvi Malfoy se aproximando e virei-me. Não imaginava que ele estava tão perto. Provavelmente, andou em silêncio e apenas se fez notar quando era necessário. Típico.

- Malfoy, acho melhor começarmos – eu disse numa tentativa de afastá-lo. Ele estava próximo demais. Por que ele estava tão próximo? Tinha a mesa atrás de mim. Não havia como eu me afastar. Evitava olhar nos olhos dele, mas acabei olhando.

Os olhos cinza, como uma tempestade. Acho que jamais seria possível ler qualquer emoção naquele rosto. Naqueles olhos. Ele me olhava atentamente. Quando alguém me olhara com tamanha intensidade?

Aproximei-me em silêncio e me fiz notar quando estava bem próximo dela. Novamente aquele perfume. Morangos e pergaminho. Ela falou qualquer coisa que não registrei. Olhava-a com intensidade. Ela demorou uns segundos até olhar-me nos olhos também. A pergunta correta não é: quando Granger tornara-se tão bonita? A pergunta correta é: quando a beleza de Granger começou a me afetar?

Dei um passo para trás incerto de minhas ações se eu permanecesse tão próximo dela. Percebi que meu vício não era mais apenas provocá-la. Era estar perto dela. Era tê-la olhando para mim. Apenas para mim.

- Melhor começarmos.

Quando olhei o relógio já eram quase dez horas da noite. Eu estava exausta.

- Melhor pararmos por hoje – falei massageando o pescoço.

- Claro – sentia que ele seria irônico. Depois de três horas falando restritamente sobre nosso trabalho era estranho ouvir aquele tom novamente – Precisa se encontrar com seu namoradinho, não é, Granger?

- Como se você também não tivesse seus encontros por aí, Malfoy.

Eu estava com raiva. E não, eu não tinha nenhum encontro, porque desde que voltara para a Escola meu único objetivo tinha sido importuná-la. E minhas saídas do castelo se restringiam às aulas de Herbologia.

Não falei nada. Estava irritado, nervoso, puto. Enfiei meus livros de qualquer jeito na mochila e saí batendo a porta com força.

As semanas passavam lentamente. O que era bom e ruim. Naquele dia de manhã recebi uma coruja de Harry e Rony, dizendo que meus pais haviam sido localizados e que estavam em negociação com o Ministério da Austrália sobre reverter a memória lá mesmo ou quando fossem transferidos para Inglaterra.

- Preparada para festa de hoje, Mione? – Gina me perguntou sorrindo.

- Estou animada. Espero que dê tudo certo e que as pessoas gostem do local.

- Tenho certeza que sim. Pena que Harry não estará. Sinto fala dele.

- Eu também. E do cabeçudo do seu irmão. – continuamos nossa conversa por mais alguns minutos. Até Gina parar de falar e sair da mesa quando Terence chegou.

- Podemos dar uma volta, Mione?

Eu aceitei e levantei-me. Lancei um olhar para a mesa da Sonserina. Malfoy nos olhava. E, mais uma vez, era impossível ler a expressão dele.

Agradeci que não inventaram uma festa à fantasia. Patético. Blaise e Pansy estavam animados ao meu lado. E eu mais animado ainda por sair do Castelo. Mas não demonstrava isso, claro. Estávamos sentados a uma mesa bebendo cerveja amanteigada. Queria algo mais forte, mas aquela não deixava de ser uma festa de escola.

- Ei – Blaise falou – Topa algo mais forte? – olhei para ele e meu amigo percebeu que aquela não era uma pergunta que precisava de resposta. Ele retirou da bolsa da Pansy uma garrafa idêntica à cerveja amanteigada. Sorri.

- O que seria da minha vida sem você, Blaise? – terminei minha cerveja e abri a outra garrafa que estava cheia de uísque de fogo.

- Vamos dançar Blás? – Pansy falou animada. Eles formavam um belo casal. Estava feliz por eles.

- Deixe sua magnífica bolsa por aqui, Parkinson – ela assentiu e deixou a bolsa sobre a mesa. Os dois saíram abraçados e rindo. Sorri de lado sem nem perceber.

- Você sabe sorrir sem ironia, Malfoy? – a voz dela me fez mascarar meus sentimentos.

- Granger... – ela olhou-me atentamente – A festa está boa. Mas faltou bebida de verdade.

Ela sorriu. Já falei que gosto do sorriso dela?

- Até parece que vocês, sonserinos, não dariam um jeito nisso, não é? – ela pegou a garrafa que estava na minha frente antes que eu pudesse impedir e cheirou o conteúdo. – Uísque?

- Devolva a garrafa, Granger – levantei-me. Ela como monitora chefe poderia muito bem me expulsar da festa. Eu não queria ser expulso. – Por favor.

- Não – ela disse – A garrafa fica comigo – para minha surpresa ela deu um gole e não fez careta. Não consegui disfarçar minha surpresa.

- Nós, grifinórios, também sabemos burlar regras, Malfoy. – ela piscou para mim e foi embora com minha garrafa de uísque. Após alguns instantes a segui.

Eu podia notar que Malfoy estava diferente. Ele não me xingava mais e as provocações tinham parado, apesar da sua presença constante me irritar profundamente. Ele era inteligente e nosso trabalho de poções estava indo bem. Muito bem, por sinal. Ele era organizado e tinha várias anotações pessoais em seus livros.

Vi quando ele chegou e sentou-se com o casal de amigos. Parkinson e Zabini. Sempre achei que ela tinha uma queda por Malfoy. Observei-os conversando e vi o sonserino negro puxar, furtivamente, uma garrafa da bolsa da namorada. Malfoy sorriu. Eu sabia que aquilo não poderia ser cerveja amanteigada, apesar da embalagem. Eu sabia que alguns estudantes estavam entrando com bebidas mais fortes. Terence também sabia, mas optamos por fazer vista grossa, desde que os estudantes mantivessem discrição.

Terence estava conversando com uns colegas corvinais e eu não resisti à vontade de dar um susto em Malfoy. Levantei-me. Quando estava me aproximando notei a forma como ele olhava para o casal de amigos e um sorriso verdadeiro e livre de sarcasmos nasceu em seus lábios. Ele ficava ainda mais bonito. Não é segredo para ninguém que Draco Malfoy é um cara bonito.

Terry sorriu ao me ver e se afastou dos amigos, me abraçando e me beijando. Ele sentiu o gosto de uísque em minha boca e se afastou:

- Onde arranjou isso? – perguntou sorrindo.

- Precisa mesmo saber?

- Não – ele sorriu e pegou a garrafa da minha mão, dando um grande gole.

Eu parei de repente. Dividir minha bebida com a Granger era uma coisa. Mas ela dar minha bebida para aquele idiota... Aquilo me irritou. A forma como ele a beijava. E a tocava. A forma como ele enrolava os dedos nos cachos dela. Fazendo-a sorrir. Ele pegou meu cargo de monitor. Minha bebida. E minha sangue-ruim.

Pensei em ir até lá. Caminhei até lá, mas parei de repente.

Não havia nada que eu pudesse fazer. Granger era namorada do idiota. Ela gostava da presença dele. Quanto a mim... ela apenas tolerava. Voltei para minha mesa e peguei outra garrafa da bolsa da Pansy.

A festa estava animada. Todos se divertiam e os professores tinham ido embora, deixando eu e Terry para cuidar da festa. Alguns estudantes estavam ficando embriagados, mas já tínhamos montado uma "força-tarefa" que cuidava desses casos, fornecendo poções e os enviando para o Castelo.

Estava indo para o banheiro quando esbarrei em alguém e quase fui ao chão:

- Deveria prestar atenção por onde anda Granger – ele disse segurando-me pela cintura de forma firme.

Segurei-a perto de mim. Foi por reflexo, mas intencionalmente mantive minhas mãos na cintura dela. O cheiro dela agora se misturava com o uísque. Não tinha ideia onde ela tinha arranjado mais, só que tinha certeza que não era apenas meu amigo que tinha entrado com bebida escondida.

- Desculpe, estava distraída – ela disse. Senti que estava nervosa.

- Acho que você já deve ter percebido que essa nossa recente proximidade não me incomoda nem um pouco, Granger.

Sorri de lado. Ela sem palavras, abrindo e fechando a boca sem saber o que dizer... Linda. Senti as mãos dela em meu peito com intenção de me afastar. Aquilo teve o efeito contrário.

- Malfoy, eu preciso ir ao banheiro.

- Ainda vamos continuarmos nossa conversa.

- Não temos conversa nenhuma para continuar – ela disse ainda tentando me afastar.

- Sim, - eu me aproximei da orelha dela e sussurrei – Nós temos. Vá ao banheiro. Encontro você por aí.

Soltei-a. Ela virou-se e entrou correndo no banheiro. Eu causei algum efeito nela e aquilo já era alguma coisa. Queria que o idiota tivesse visto. Fui para minha mesa, abri mais uma garrafa. Algumas garotas tentaram puxar conversa, mas eu só tinha uma garota em mente. Resolvi dar uma volta, mas mal me afastei da mesa quando uma explosão veio da cozinha. O ambiente foi tomado por gritos e o local começou a pegar fogo. Eu tremi relembrando do que acontecera na Sala Precisa.

A correria começou. Alguns bruxos lançavam feitiços para tentar apagar o fogo, mas nada o continha. Outros bruxos corriam loucamente para a área de saída. Vi Longbottom ajudar um estudante a se levantar e caminhar para saída.

- Temos que sair – eu disse a alguns colegas que estavam ao meu lado e lançavam feitiços para apagar o fogo – Nada pode apagar esse fogo! – eles concordaram com a cabeça e começaram a correr.

Blaise passou por mim, puxando uma Pansy assustada e com o braço queimado.

- Vamos sair daqui, cara! Logo! – eu assenti e fui atrás dele, então parei de repente. Meu amigo percebeu, algumas pessoas se chocaram comigo e depois desviaram – Draco! Precisamos sair!

- Granger... – eu murmurei.

- O que você está falando? – ele gritava, Pansy puxava a mão dele e gritava conosco.

- Granger. Ela está no banheiro. Eu preciso voltar!

- Não posso te deixar aqui, cara – meu amigo disse e fez menção me acompanhar.

- Saia com a Pansy! Avise que estou aqui! – eu precisava gritar. Meu amigo pareceu em dúvida – Tire sua namorada daqui! Vá logo, Zabini!

Corri contra a multidão. Não era uma tarefa fácil.

- Granger! – eu berrei ao chegar ao banheiro. A porta estava emperrada. Fumaça tomava o lugar. Destranquei a porta com a varinha e gritei mais uma vez por ela. Dessa vez chamando o nome tantas vezes proibido – Hermione!

Ela estava parada contra a parede em estado de choque.

- Precisamos sair daqui. Vamos!

- Não temos vassoura. Eu não sei voar! Não temos como sair! – lembrei-me que, na Sala Precisa, Weasley é que estava guiando a vassoura e ela na garupa. Fui até ela e puxei-a pela mão, ela ficou parada.

- Não temos tempo para isso, Granger! Vamos logo! – puxei-a novamente, ela respirava com dificuldade. Fui até a porta. Estávamos sem saída. – Merda! – tossi. Ela também. Tirei minha blusa e molhei-a. Fechei a porta novamente e coloquei minha blusa no chão.

- Vamos morrer...

- Não, nós não vamos morrer Granger. Ainda não. – ela olhava-me assustada.

- Você vai fugir. Vai me deixar aqui. – ela estava em estado de choque. Olhei para os lados ela continuava balbuciando – BOMBARDA! – a parede à minha esquerda veio abaixo. Merda... Era a cozinha.

Quebrei a parede errada. Lancei outro feitiço na parede oposta. Não havia fogo ali, puxei-a novamente. Ela resistia em me seguir.

- Granger, logo tudo isso estará tomado pelo fogo. Vamos logo.

- Você vai me deixar. Não vai fazer nada... – não sabia muito bem onde estávamos, mas era o fundo de alguma loja. Olhei em volta, ou saíamos ou o fogo nos cercaria lá também. O local era iluminado pelas labaredas que estavam atrás de nós. Granger ainda estava em choque, dificultando tudo, ao manter tanta resistência em me seguir.

- Hermione! – eu disse parando em frente dela e segurando-a pelo ombro com uma das mãos – Eu não vou te deixar, está me entendendo? – ela não parecia acreditar – Eu voltei por você. – era loucura, mas não pensei duas vezes: puxei-a para mim e a beijei. Ela retribuiu por uns instantes e depois senti o corpo dela caindo. Hermione desmaiou nos meus braços. Joguei-a sobre meu ombro. Vi um corredor e segui por ele. Abria todas as portas que encontrava. Vi a frente da loja e corri ainda mais. Do lado de fora, estudantes, aurores, bombeiros, professores, medibruxos.

Eu estava sem ar. Apenas tive tempo de pedir ajuda, colocar Hermione cuidadosamente no chão e depois, desmaiei.

Acordei sentindo meu corpo doer. Respirar era dolorido. Tudo estava no mais completo silêncio. Imagens invadiram minha mente. O fogo intenso. Eu sem ação. E Malfoy me salvando... Malfoy me beijando.

- Hermione?

- Terry... – eu disse o nome do meu namorado.

- Hermione, - ele repetiu. Foquei os olhos e sorri. Ele estava preocupado e pareceu ter chorado. -você me desculpa? Eu procurei por você. Achei que estava do lado de fora. Zabini chegou gritando e dizendo que você ainda estava lá. Eu tentei entrar, mas não me deixaram. Eu, eu... – coloquei minha mão sobre os lábios dele. Eu não o culpava.

- Estou bem, Terry.

- Vou chamar Pomfrey. – ele saiu. Olhei para o lado e vi Malfoy deitado. Ele tinha os olhos abertos e encarava o teto.

- Obrigada.

- Como você está? – ele virou-se. Eu fiz o mesmo.

- Estou bem. – estava sem graça. Eu tinha beijado Draco.

- Eu não teria te abandonado lá. Já disse isso, mas é importante que você saiba.

Pela primeira vez ele parecia estar sem suas máscaras. Eu não sabia lidar com aquele Draco.

- Claro que não. – ele parecia... preocupado? – É... Como saímos de lá? Eu não me lembro de nada depois que você me encontrou no banheiro – mentira. Percebi que ele soltou o ar depressa. Voltou a deitar de barriga para cima e encarar o teto. Ele falou e sua voz soou magoada.

- Pela loja ao lado. Quebrei uma parede. Você estava assustada e em estado de choque... Eu te... – beijei. Eu te beijei, Granger, e você retribuiu. Morango, pergaminho, uísque e fumaça. Era seu gosto. Meu vício. – Eu te tirei de lá. Você desmaiou no caminho, deve ser por isso que não se lembra do que houve.

- Obr...

- Não precisa. Minha garganta está doendo, melhor não conversamos agora. – senti uma dor estranha no peito. Fechei os olhos e queria poder não ouvir a conversa e a troca de carinhos entre ela e Terence Boot.

Ainda tinha o gosto dela em meus lábios. Ela não se lembrava e para mim seria impossível esquecer.

As investigações quanto ao que aconteceu na nossa festa estavam acontecendo. Os aurores desconfiavam que foi acidental, mas explosão com fogo maldito ser acidental? Eu não acreditava. Felizmente ninguém morreu apenas alguns feridos. Uns mais sérios que os outros.

Harry e Ron escreveram dizendo que trariam meus pais para Inglaterra e aqui fariam a reversão do feitiço. Marcariam uma data com o Ministério e eu precisaria estar presente. Aquilo me amedrontava. Eles não gostariam nada de saber que passaram mais de um ano vivendo em outro país enquanto uma guerra acontecia.

Era o primeiro jogo de quadribol do ano. Sonserina versus Lufa-Lufa. Todos estavam animados. Terry ia assistir ao jogo para aprender mais sobre a tática dos seus adversários. Eu disse que aproveitaria para estudar.

Só que não conseguia me concentrar nos livros. Eu ficava pensado em Malfoy e no beijo. As palavras: eu voltei por você. Parecia que havia muito mais por trás daquelas palavras. E o beijo. Não era nada como os que eu tinha com Terry. Só de pensar e lembrar aquele beijo... Saí da biblioteca e fui até o campo de quadribol. Claro que grifinórios e corvinais estavam na arquibancada dos lufos, torcendo contra a Sonserina. Encontrei Gina e Terry. Eles observavam atentamente o jogo.

- Oi.

- Hermione! – Gina disse me abraçando. Depois voltou seus olhos para o jogo.

- Achei que ficaria na biblioteca – Terry falou após um breve beijo. Sua atenção voltada aos jogadores. Ele retirou um pergaminho e uma pena. Começou a fazer anotações. – Nem ouse olhar, Gina Weasley. – minha amiga deu de ombros.

- Não queria ficar sozinha – olhei para o céu e vi Malfoy sobre a vassoura. Ele olhava atentamente cada ponto procurando pelo pomo. Lembrei-me de todos os anos em que ele perdera para Harry e quanto aquilo nos alegrava. De repente, me peguei torcendo por ele. Draco nunca vencera de Harry. Nunca levantara a taça de quadribol. Ganhar a competição das casas era algo que eu queria muito. Mas, quadribol... E daí que a Sonserina ganhasse?

Eu tinha que achar aquele pomo. Precisava vencer a partida. Sabia que a Lufa-Lufa não era nosso maior problema. Grifinória também, não. Eles tinham bons artilheiros e batedores, mas estavam sem Potter. Agora os corvinais tinham um time forte. E, por mais que eu negasse, Boot era um ótimo apanhador.

Um balaço passou próximo à minha cabeça.

- Preste atenção, Nott! – eu gritei para meu companheiro de time.

- Cuide do pomo, Malfoy! Eu cuido dos balaços.

- Parece que não está fazendo seu trabalho muito bem!

Malfoy e Nott começaram a gritar algo incompreensível para nós. De repente Malfoy inclinou sua vassoura. Ele tinha visto o pomo. Como eles eram capazes de identificar aquela maldita bolinha voadora eu nunca consegui entender. Eu observava cada movimento dele. A forma como ele parava no ar, parecendo que tinha perdido o pomo por alguns instantes.

Agora ele e o apanhador da Lufa-Lufa voavam atrás do pomo-de-ouro. Eles muitas vezes, sumiam de vista. Depois apareciam.

Eu voava como um louco. Balaços passavam por minha cabeça. A multidão gritava. O outro apanhador pouco atrás de mim. E o pomo lá... Tão perto quanto nunca. Estiquei meu braço. Inclinei meu corpo fazendo a vassoura voar ainda mais rápido. Meus dedos fecharam em torno do pomo. O apito soou. A torcida da Sonserina gritava meu nome.

Ele tinha conseguido. Sem perceber, sorri. Ao olhar para o lado percebi que a Terry me olhava. A pena parada sobre o pergaminho. Não havia quase nada de anotação. Não sei há quanto tempo ele estava me observando, mas sabia que ele tinha notado para quem eu olhava.

Terence começou a passar pela multidão, descendo os degraus rapidamente. Fiquei parada quando ouvi Gina falando comigo:

- Tem algo acontecendo entre você e Malfoy que não estou sabendo?

- Claro que não! – exclamei nervosa.

- A forma como você o olhava... Terry te chamou várias vezes e você tinha os olhos presos em Malfoy.

- Eu... eu não sei o que está acontecendo... eu...

- Mione, agora não é hora de me explicar. Vá atrás do seu namorado! – Eu saí. Apesar de que eu não tinha ideia do que dizer. Ainda ouvi Gina gritando – mas, você também me deve explicações!

Não podia negar que aquela sensação era maravilhosa. Ouvir meu nome sendo clamado. Os jogadores batiam em meu ombro, agradecendo. Elogiando. Eu estava feliz. Meu sorriso se desfez.

- Boot – ele avançou mais rápido do que eu planejara. O golpe foi certeiro no meu rosto. – Seu filho da puta!

- Eu não sou cego, Malfoy! Eu vejo como você a olha!

- Ah é? – sorri de lado ignorando a dor – Com medo, Boot?

- Afaste-se dela, Malfoy. Você não merece uma garota como Hermione – nisso ele tinha razão. Mas claro que ele não precisava saber disso. Abri a boca para responder, quando eu a vi se aproximando.

- Terry... O que houve? – ela indagou olhando para nós.

- Meu recado está dado – ele pegou na mão dela e a puxou. Não gostei disso. Vi os dois andarem rapidamente em direção ao castelo.

- Não é só ele que nota o jeito como você olha para a sangue-ruim, Malfoy.

- Cale a boca, Nott – eu disse pegando minha vassoura do chão. Decidi tomar banho no meu dormitório e ficar por lá até a comemoração que sem dúvida haveria no Salão da Sonserina.

Terence me beijou e não pediu explicações. Agradeci mentalmente. Fomos para meu quarto e senti a urgência do beijo dele. Fazia tempo que Terry e Malfoy se estranhavam. Terry exigia meu corpo e eu precisava disso. Precisava que ele me fizesse esquecer. Mesmo sabendo que apenas um bom obliviate seria capaz de me fazer esquecer o beijo que recebi de Draco Malfoy.

Não sei o que houve para o Boot ter me socado daquele jeito, apenas sei que ele não saía do lado da Granger. Ia buscá-la e levá-la em cada aula. Ele deveria estar saindo mais cedo das próprias aulas para conseguir tal proeza. Quando apareci no salão dela para escrevermos o trabalho ele estava lá.

Ele estava conseguindo me irritar profundamente e na semana seguinte percebi que não era só a mim que ele estava irritando.

- Você não pode ficar saindo de suas aulas mais cedo, Terry – ela disse quando o viu parado do lado de fora da nossa aula de DCAT. Eu me atrasei propositalmente.

- Não custa nada, Mione – ele me olhou enquanto a puxava pelos corredores. Eu fingi ir para o outro lado, mas os segui. Entreouvindo a conversa que eles tinham em um dos corredores.

- É loucura agir assim. Você deveria confiar em mim.

- Meu problema é com o Malfoy. Ele está planejando alguma coisa.

- Eu sei me cuidar. Por favor, não aja desse jeito. – ele demorou a responder, mas acabou soltando um "tudo bem".

Abracei meus amigos que perguntaram umas vinte vezes se eu realmente estava bem depois do incidente do dia das bruxas. Eu tinha recebido licença de Hogwarts para ir até o Ministério e presenciar a restauração da memória dos meus pais.

Como eu imaginei não foi fácil. Nada fácil. Eles brigaram comigo e me senti como uma criança de dois anos que faz alguma bagunça. Os dois pediram para ir embora sem querer ouvir minhas explicações. Eu chorava. Nunca tinha decepcionado meus pais. Harry me abraçou:

- Dê um tempo a eles, Mione. É muita coisa para se absorver em tão pouco tempo.

Meu amigo estava certo, mas mesmo assim eu estava sofrendo.

Granger não apareceu em nenhuma aula e parecia que apenas eu não sabia o motivo. Sexta terminou, sábado chegou e eu agora estou organizando a sala de troféus. Olhava incessantemente para meu relógio. Granger teria que aparecer para verificar meu trabalho. A porta abriu e não disfarcei minha raiva. O idiota.

- Malfoy, vejo que não fez muita coisa.

- Do que está falando? Consertei, limpei e organizei metade dessa sala!

Com um aceno da varinha ele desfez todo meu trabalho. Meu punho fechou de raiva.

- Opsss! O Ministério não vai gostar de saber que não está fazendo seu trabalho, Malfoy.

- Seu filho da puta – peguei minha varinha e apontei para ele. Senti a raiva pulsando. Sabia que estaria fudido se eu o azarasse. Não me importava, mas... o rosto dela invadiu minha mente. Eu seria afastado de Hogwarts. Afastado dela. Aproximei-me dele. O sorriso babaca desfez do rosto. Com um feitiço não verbal, desarmei-o. Medo. Era para ele ter medo mesmo.

- M-Malfoy...

- Escute Boot, que eu vou falar apenas uma vez. Não vou esquecer o que você fez aqui. Só que não vou me vingar agora. Não sou Comensal, mas tive treinamento para ser um e convivi com eles desde que nasci. Isso terá volta – passei por ele, depois voltei. Ele ainda estava parado no mesmo lugar. Encostei minha varinha com força na nuca dele – E quanto a Granger, aproveite seu tempo com ela. Seu pouco tempo, Boot. Eu terei a taça de quadribol, minha vingança e a garota.

Joguei a varinha dele no chão e saí ajeitando minhas vestes.

Voltei para Hogwarts no domingo. Passei o fim de semana com Rony e Harry, eles estavam morando no Largo Grimmauld. Bebemos, conversamos, rimos e comemos como loucos. Ficaram discutindo sobre possíveis motivos para Draco me salvar, enquanto eu apenas me lembrava do beijo e das palavras: voltei por você.

Estava lendo quando ouvi uma batida na porta. Abri-a com meu discurso pronto:

- Terry, falei que... Malfoy?

- Boa noite, Granger – não conseguia esconder minha surpresa.

- O que faz aqui?

- Você sumiu o fim de semana e não compareceu às aulas na sexta-feira. Está tudo bem?

- Como? – ele me olhava sério, mas seus olhos pareciam divertir-se com minha nítida confusão. Era praticamente impossível ver através daquela fisionomia – Quer dizer, está tudo bem. Apenas precisei resolver uns problemas familiares.

- Ótimo. Tenha uma boa noite, Granger.

Não sei quanto tempo fiquei lá. Parada. No batente.

- Hoje minha aula será ao ar livre. Vocês deverão colher o material para seu kit. – aquilo não era nada animador. Aquele professor deveria ter merda na cabeça. Estava um vento gelado e a neve já cobria parte do gramado – Sprout já está sabendo e vocês podem usar o que for preciso das estufas.

- Andar nesse frio... – ouvi Granger murmurando ao meu lado. Ia falar algo quando a voz do professor se fez presente novamente:

- Os grupos podem até se misturar para trocar ideias – imediatamente olhei para o idiota. Ele me lançou um sorriso.

- Nós não vamos nos misturar com nenhum grupo – eu disse em voz baixa para a Granger.

- Mione? – ele estava ao nosso lado. A sala dispersando. A dupla dele o esperando na mesa.

- Oi, Terry – nos levantamos. Terry. Será que ela não percebia o quão idiota aquele apelido soava?

- Podemos fazer juntos. Nós estamos adiantados em nosso trabalho.

- E quem disse que nós também não estamos? – eu falei cruzando os braços.

- Não comecem – Granger falou, tentando manter a calma – Acho que não tem prob-

- Já falei que não vamos nos misturar com nenhum grupo. Há algumas coisas que gostaria de dividir com você. Apenas com você – eu disse olhando-a.

- Malf- não queria saber o que ele tinha a dizer.

- Não se preocupe, Boot. Minha conversa não envolve troféus – eu vi que ele olhou-a rapidamente com medo que eu revelasse seu pequeno golpe baixo. - Do que estão falando?

- Mas, podemos mudar o tópico se vocês quiserem fazer parte de nossa excursão.

- Do que estão falando? – ela tornou a perguntar. O olhar indo dele para mim.

- Nos vemos mais tarde, Mione – ele beijou-a rapidamente nos lábios e saiu.

- Troféus? – ela continuou perguntando.

- Vamos logo, Granger. – ela calou-se e começamos a andar lado a lado. O castelo estava vazio, já que todos estavam em aula. Granger quase entrou em um corredor, para seguir para as estufas, mas eu a impedi segurando-a gentilmente pelo braço – Por aqui.

- As estufas ficam para esse lado. Precisamos sair do castelo e não continuar dentro dele.

- Por aqui, Granger – eu repeti querendo dizer que ela confiasse em mim. Isso era pedir demais. Ela deu de ombros e resolveu me seguir.

- Por que você não fez nada? – ela perguntou e eu parei de andar. Sem entender a pergunta – Por que não fez nada para impedir que sua tia me torturasse. – não esperava aquela pergunta. Não naquele momento. Desviei meus olhos e encarei o chão. Vergonha. Fitei novamente os olhos castanhos, que esperavam por uma resposta.

- Porque eu era um covarde, Granger.

Ela continuou me olhando. Estudando minha fisionomia, procurando por algum traço que minhas palavras fossem mentira.

- E por que me salvou? Por que voltou por mim?

- Você não está preparada para saber a resposta dessa pergunta – eu continuei andando até que parei. Ela tinha dito: Por que voltou por mim?

- Malfoy? – eu tinha parado de repente. Ela não tinha se dado conta do que havia acabado de perguntar. Lembrei-me de nossa conversa na enfermaria e ela tinha dito que não se lembrava de nada depois que eu entrei no banheiro... Encarei-a. Só que, quando eu falei que voltei por ela, nós estávamos no prédio ao lado... Segundos antes do nosso beijo.

- Você se lembra – eu disse simplesmente. Vi que ela abriu a boca algumas vezes.

- N-não sei do que está falando, Malfoy. Precisamos continuar. Para onde estava indo? – ela recomeçou a andar apressadamente. Corri e parei na frente dela.

- Não, não. Você se lembra. Por que mentiu?

- Malfoy... Eu...

Eu era uma idiota mesmo. Como fui me trair daquele jeito? Ele me olhava intensamente e não consegui sustentar aquele olhar.

- Eu não sei, Malfoy... Não sei por que menti. Eu... Só... Eu não sei lidar com esse Malfoy que você é nas últimas semanas.

- Então, você se lembra... – ele disse com um sorriso irônico. Meu corpo se retesou quando o senti se aproximando de mim, a boca dele próxima ao meu ouvido. Um sussurro rouco – Impossível esquecer meu beijo, não é, Granger?

O cheiro dela me causava calafrios. Ela seria minha. Afastei-me. O sorriso ainda em meus lábios, eu queria repetir o beijo... Só que eu esperaria. Tudo deveria ser calculado a partir de agora – Venha, Granger, vou te mostrar um pequeno segredo.

Jamais entenderia Draco Malfoy. Continuamos andando e eu sabia que ainda estávamos nas masmorras. Tenho certeza que se ele me largasse lá eu não saberia voltar.

- Não fique nervosa, Granger. Você sabe que eu voltaria por você, caso você se perdesse – olhei para o lado e vi que ela corou. – Apesar de eu não ser o monitor chefe, o que é um absurdo, diga-se de passagem, consegui uns privilégios.

- Onde estamos indo? Aqui...

Estanquei de repente. Ele tinha me levado para o Salão da Sonserina. Aquilo era loucura.

- Você está louco, Malfoy? Se alguém me vir... Eu sei o que pensam de mim. Principalmente o Nott.

- Está com medo dele, Granger? – notei um tom de desafio.

- Não é isso. Eu apenas... Apenas não gosto do modo como ele me olha.

Parei em frente à entrada do Salão ao ouvir o que ela tinha dito.

- Do que está falando?

- De nada. Deixa para lá. – eu abri a boca para insistir, ela me cortou – Deixa para lá, ok? Não posso entrar aí. – não insisti, mas não deixaria esse assunto para lá.

- Estão todos em aula, Granger. Tenho certeza que não vai se arrepender. – murmurei a senha e entramos.

- É exatamente como Harry e Rony descreveram – o que ela tinha acabado de falar?

- Quando eles estiveram aqui? – perguntei alarmado. Ela começou a rir e, por mais que eu estivesse bravo, não pude evitar que eu sorrisse também.

- Segundo ano. Achávamos que você era o herdeiro. Eles tomaram uma poção polissuco e viraram Crabbe e Goyle.

- E como conseguiram uma poção polissuco? – eu indaguei sem saber o que mais dizer diante de tamanha ousadia daquele trio.

- Eu preparei – ela falou simplesmente, como se fosse acoisa mais banal do mundo.

- Você preparou uma poção polissuco no segundo ano? – não escondi minha admiração. Ela sorriu – Venha por aqui.

Andamos pelo Salão e segui-o por um corredor. Lá estava frio. Não sei como aguentavam. A Grifinória era sempre tão acolhedora. Paramos em frente a uma porta gravada D.M.

- Tem seu próprio quarto?

- Privilégios de ajudar a Ordem e ser odiado por praticamente todos os colegas sonserinos. – ele murmurou novamente uma senha. Depois de conviver por anos com Harry e Rony eu não acreditava que aquele era o quarto de um garoto. Estava todo organizado. Estantes com livros e penas e tinteiros, organizados sobre uma mesa. Não era grande quanto o quarto dos monitores chefes, mas era espaçoso e tinha a vantagem de não dividir com ninguém.

- Você é organizado – foram as palavras idiotas que consegui dizer. Ele riu e continuou andando. Eu o segui.

- Salazar projetou esse quarto, porém ficou fechado por anos. Desde que a Câmara foi aberta pela primeira vez.

- Acharam que a passagem era por aqui?

- É sempre mais fácil culpar um sonserino, não? – ele disse sério. – Venha – ele abriu uma outra porta.

- Malfoy... Onde estamos indo?

- Já disse que não vai se arrepender, Granger. – vi que ela estava parada. Em dúvida. – Um voto de confiança. Venha.

Ela entrou no corredor. Com um aceno da varinha, os archotes se acenderam. Andamos um pouco mais e abri outra porta.

- Bem vinda, Granger – eu dei passagem para ela. Ao ver onde estava à boca dela abriu-se em admiração. Ela estava linda.

Parecia que eu estava em um daqueles aquários enormes. O teto era de vidro e dava uma visão do lago de Hogwarts. Sereianos, peixes e diversos seres passavam sobre nós. Olhei para o lado direito e vi que a parede também era de vidro. Andei até lá, admirada. Pela primeira vez, minha atenção não foi tomada pelos livros que estavam na parede oposta.

Alguns raios de sol entravam pelo vidro e refletiam na sala. Cores azuladas e avermelhadas refletiam no rosto admirado dela. Seus olhos brilhavam. Aquilo realmente deve ter chamado a atenção dela, pois Granger ignorou toda uma estante com livros.

- Malfoy, isso é... Por que me trouxe aqui? – fiz um gesto de cabeça e ela olhou para o fundo da sala.

- Esse era um espaço em que Salazar preparava suas poções longe dos olhos dos outros fundadores. Nessa parede – eu apontei a parede cheia de vasos – há diversas ervas, plantas... O sol reflete aqui todos os dias. A sala muda conforme o sol.

- Isso é... Fantástico – ela ainda olhava para cima e para os lados.

- Tenho os principais ingredientes por aqui. A sala ficou décadas abandonada, então... – ela foi até o fundo da sala e observou minha plantação.

- Não sabia que gostava de Herbologia.

- Não sou fã, mas gosto de poções. De qualquer forma – dei de ombros –, aqui é um bom lugar para ficar quando quero ficar sozinho. Vamos começar.

Não era nada fácil trabalhar com ela ali. E eu sabia que se a beijasse novamente, não a deixaria sair do meu lado. Ela estava confusa, assustada. Eu também estava, mas era sonserino e nunca me importei muito em como alcançar meus objetivos. Desde que fossem alcançados. E com ela seria preciso cautela. Um jogo cuidadoso. Eu ia seduzi-la. Conquistá-la. Boot era um garotinho babaca, não tinha experiência de vida e nada a oferecer para Hermione. Nada.

Tínhamos a mesma idade, mas eu tinha vivido muito mais.

- Que horas são? – perguntei alarmada. – Merda! Malfoy, precisamos ir.

Ela estava certa. Logo alguns sonserinos estariam chegando. De jeito nenhum poderiam ver que eu trouxe uma grifinória para nosso Salão. Nem Zabini me perdoaria por essa. Puxei-a pela mão e voltamos correndo. Chegamos em um corredor e ouvi a risada grave de Nott e outros colegas.

Senti Hermione parando ao meu lado.

- E agora? – ela olhou ao redor. Eu fiz o mesmo. Nada de salas. Apenas uma velha tapeçaria. Ela provavelmente me odiaria por aquilo e eu não queria que fosse assim...